UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS E CIÊNCIAS EXATAS CAMPUS DE RIO CLARO OCUPAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E GESTÃO AMBIENTAL DE UNIDADE DE CONSERVAÇÃO DO ESTADO DE RONDÔNIA O ESTUDO DE CASO DO PARQUE ESTADUAL DE GUAJARÁ MIRIM FRANCISCO ONOFRE MATIAS Orientador: Prof. Dr. Vicente José Fúlfaro Dissertação de Mestrado apresentada à Coordenação do Curso de Pós-Graduação (Área de Concentração: Geociências e Meio Ambiente) como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Geociências. Rio Claro – São Paulo 2001. 551.4+ Matias, Francisco Onofre G963z Ocupação, Políticas Públicas e Gestão Ambiental em Unidade de Conservação do Estado de Rondônia: O Estudo de Caso do Parque Estadual de Guajará Mirim RO/Francisco Onofre Matias – Rio Claro: s.n., 2001 212 f. Dissertação (mestrado) – Universidade Estadual Paulista, Instituto de Geociências e Ciências Exatas. Orientador: Prof. Dr. Vicente José Fúlfaro 1. Desenvolvimento Sustentável 2. Política Ambiental 3. Gestão Ambiental 4. Unidade de Conservação. Título DEDICATÓRIA Aos meus pais, que com suas vidas, ensinaram a mim e aos meus irmãos o valor da ética, da solidariedade e da cooperação. AGRADECIMENTOS Ø Ao Prof. Dr. Ene Glória, Reitor da Universidade Federal de Rondônia pelo incentivo e apoio da do na realização deste trabalho; Ø Ao Prof. Dr. Vicente José Fúlfaro pela Orientação que me ofereceu e pela forma generosa e respeitosa como sempre me tratou e pela fraterna amizade da qual honro desfrutar; Ø Aos professores do Curso de Pós-Graduação em Geociências pela disponibilidade e consideração, especialmente, o Prof. Jairo Roberto Jimenez Rueda, Coordenador deste convênio junto à UNESP; Ø Aos funcionários do corpo técnico acadêmico e administrativo do Curso de Pós- Graduação em Geociências – Campus de Rio Claro, que de alguma forma me incentivaram e ajudaram no esforço de realização desta dissertação, dentre esses destacamos as secretárias Laura Narciso, Elaine Brigatto, Darlene de Cássia Armbrust e da colega Siane Cristhina Guimarães pelo auxílio na montagem deste trabalho; Ø Aos colegas Israel Xavier Batista, Antônio de Melo Lisboa, Siane Cristhina Pedroso Guimarães e; Ø Ao Cícero José Lima Silva pela montagem após a qualificação. SUMÁRIO Índice ................................................................................................................................... Índice de Figuras ................................................................................................................. iii Índice de quadros e tabelas................................................................................................... iv Glossário de Sig las e Abreviaturas......................................................................................... Resumo................................................................................................................................ Abstract..............................................................................................................................vi ............................................................................................................................................. INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 1 – CONTEXTUALIZAÇÃO DA PESQUISA....................................................................... 2 – A OCUPAÇÃO E COLONIZAÇÃO DE RONDÔNIA....................................................56 3 – A DEVASTAÇÃO AMBIENTAL DA AMAZÔNIA E DE RONDÔNIA.........................86 4 – ANÁLISE DA GESTÃO TERRITORIAL DE RONDÔNIA NO CONTEXTO DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL...........................................................................99 5 – INTERPRETANDO O MODELO DE GESTÃO AMBIENTAL COMPARTILHADA DE UNIDADE DE CONSERVAÇÃO DE RONDÔNIA.................................................... 118 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................. 204 BIBLIOGRAFIA.............................................................................................................. 206 i ÍNDICE INTRODUÇÃO 1 1 – CONTEXTUALIZAÇÃO DA PESQUISA 7 1.1 – CONTEXTO DO PROBLEMA 7 1.2 – CARACTERIZAÇÃO DO OBJETO DE ESTUDO – O PEGM 11 1.2.1 Criação e Situação Fundiária 11 1.2.2 Localização 11 1.3 – OBJETIVOS 13 1.3.1 Geral 13 1.3.2 Específicos 13 1.4 – REFERENCIAL TEÓRICO 14 1.4.1 Modelos de Desenvolvimento e Conceitos de Gestão Ambiental 14 1.4.2 A Gestão Ambiental como Parte Integrante do Sistema de Planejamento Ambiental Integrado 37 1.4.3 Legislação Ambiental 47 1.5 – ESTRATÉGIA METODOLÓGICA 51 1.5.1 Considerações Gerais 51 1.5.2 Etapas da Estratégia Metodológica 51 2 – PROCESSO DE OCUPAÇÃO E COLONIZAÇÃO DE RONDÔNIA 56 2.1 – A OCUPAÇÃO NO PERÍODO COLONIAL 56 2.2 – A OCUPAÇÃO NO CICLO DA BORRACHA 58 2.3 – A OCUPAÇÃO E COLONIZAÇÃO RECENTE 67 3 – A DEVASTAÇÃO AMBIENTAL NA AMAZÔNIA E OS IMPACTOS AMBIENTAIS RECENTES EM RONDÔNIA 86 3.1 – PRINCIPAIS CICLOS DE DEVASTAÇÃO AMBIENTAL NA AMAZÔNIA 86 3.2 – OS GRANDES PROJETOS GOVERNAMENTAIS E A DEVASTAÇÃO AMBIENTAL RECENTE 89 3.3 – DESMATAMENTO E DESENVOLVIMENTO AGROPECUÁRIO EM RONDÔNIA 93 4 – ANÁLISE DA GESTÃO TERRITORIAL DE RONDÔNIA NO CONTEXTO DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL 99 4.1 – POLAMAZÔNIA 101 4.2 – POLONOROESTE 104 4.3 – PLANAFLORO 111 ii 5 – INTERPRETANDO O MODELO DE GESTÃO AMBIENTAL INTEGRADA DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DE RONDÔNIA 120 5.1 – CONCEITOS DE ADMINISTRAÇÃO/GESTÃO – ANTECEDENTES HISTÓRICOS 120 5.2 – HISTÓRICO E CONCEITUAÇÃO DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO 128 5.3 – CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO 138 5.3.1 Histórico e Limites 138 5.3.2 Zonas de Amortecimento e Corredores Ecológicos 140 5.3.2.1 – Zona de amortecimento 140 5.3.2.2 – Corredores ecológicos 145 5.3.3 Meio Físico 148 5.3.3.1 – Geologia 148 5.3.3.2 – Geomorfologia 151 5.3.3.3 – Pedologia 155 5.3.3.4 – Hidrografia 158 5.3.4 Meio Biótico 160 5.3.4.1 – Vegetação 160 5.3.4.2 – Fauna 161 5.3.5 Meio Antrópico 163 5.3.5.1 – Pressão antrópica 163 5.3.5.2 – Áreas de influências 164 5.3.6 Zoneamento 170 5.3.6.1 – Antecedentes 170 5.3.6.2 – Procedimentos metodológicos 172 5.3.6.3 – Proposta de zoneamento da SEDAM 174 5.4 – GESTÃO INTEGRADA E COMPARTILHADA DE PEGM 178 5.4.1 Fundamentos da Integração Homem/Natureza nas áreas naturais protegidas de Rondônia 178 5.4.2 Proposta de Gestão Ambiental de Unidade de Conservação – Parque Estadual Guajará Mirim – PLANAFLORO/PNUD 182 5.4.2.1 – Histórico 182 5.4.2.2 – Proposta de Gestão Compartilhada do PEGM 184 5.4.3 Condicionantes da Gestão/Compartilhada: 192 5.4.3.1 – Processo de democratização e gestão ambiental 193 5.4.3.2 – Descentralização e autonomia 195 5.4.3.3 – Participação comunitária 197 CONSIDERAÇÕES FINAIS 204 BIBLIOGRAFIA 206 iii Índice de Figuras Figura 01 Mapa de localização do Parque Estadual de Guajará Mirim 12 Figura 02 Os três brasis segundo os IDH – 1986 25 Figura 03 Distribuição dos dois brasis efetivamente ocupados 26 Figura 04 Figura 05 Figura 06 Modelo de Paradigma Fluxograma da Estratégia Metodológica Mapa da Migração Interna nas décadas de 60/70 39 53 68 Figura 07 Estudos de Caso realizados pelo INCRA 70 Figura 08 Mapa de Implantação dos Projetos de Colonização (INCRA) 72 Figura 09 Amazônia Legal em Países Amazônicos 87 Figura 10 Mapa da Migração Interna na década de 80 88 Figura 11 Mosaico de Imagens de Satélite LANDSAT 5 97 Figura 12 Áreas-Programa do POLAMAZÔNIA 101 Figura 13 Mapa da 1ª Aproximação do SZEE/RO 113 Figura 14 Mapa da 2ª Aproximação do SZEE/RO 116 Figura 15 Mapa da Localização e Limites do PEGM 139 Figura 16 Mosaico de Imagens de Satélite LANDSAT –1993 141 Figura 17 Mapa da Zona de Amortecimento e Pressão Antrópica 144 Figura 18 Mapa da Localização do PEGM e o Corredor Ecológico 147 Figura 19 Seção Geológica Esquemática do PEGM 148 Figura 20 Carta Geológica do PEGM 150 Figura 21 Carta Geomorfológica do PEGM 154 Figura 22 Carta Pedológica do PEGM 157 Figura 23 As Sub-bacias formadas a partir da Serra dos Pacaás-Novos 159 Figura 24 Distribuição das classes de vegetação do PEGM 161 Figura 25 Fluxograma das etapas de trabalho do ZSEE/PEGM 174 Figura 26 Mapa da Proposta de Zoneamento do PEGM –1998 178 iv Índice de Quadros e Tabelas QUADROS Quadro 01 Síntese do ZSEE 10 Quadro 02 Assentamento do PIC’s e PAD’s (1970-1978) 76 Quadro 03 Assentamento de colonos no período de 1980/90 79 Quadro 04 Assentamento no período de 1982/2000 82 Quadro 05 Unidades de Conservação do Estado de Rondônia 135 TABELAS Tabela 01 Índice de desenvolvimento humano – ONU/PNUD 23 Tabela 02 População das Unidades da Federação da Região Norte segundo o lugar de nascimento – 1940 65 Tabela 03 Evolução do Número de Migrantes Cadastrados em Rondônia no período 1977 – 1983 77 Tabela 04 Produção Madeira Nativa – mil m3 91 Tabela 05 Evolução do desmatamento em Rondônia 96 Tabela 06 POLAMAZÔNIA –Aplicação de recursos por pólo segundo os subprogramas – 1975/82 (Pólo Rondônia) 103 Tabela 07 POLONOROESTE Estado de Rondônia – Investimentos programados segundo o projeto até 1985 107 Tabela 08 Definição Sintética das Zonas 112 Tabela 09 População residente e taxa de Crescimento Anual dos Municípios de Buritis e Campo Novo – 1996/2000 143 Tabela 10 Área percentual das classes temáticas de Pedologia 155 Tabela 11 Criação e Implantação de Projetos de Assentamentos pelo INCRA 164 Tabela 12 Criação e implantação de Projetos de Assentamento (INCRA) em Campo Novo e Buritis – período 1980-1999. 169 v GLOSSÁRIO DE SIGLAS E ABREVIATURAS AER Avaliação Ecológica Rápida AI Área Indígena ALE Assembléia Legislativa APA Área de Proteção Ambiental BIRD Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento (Banco Mundial) CEPAGRI Comissão Estadual de Política Agrícola CEPLAC Comissão Executiva do Plano de Lavoura Cacaueira CEPA Comissão Estadual de Planejamento Agrícola CETREMI Centro de Triagem e Encaminhamento de Rondônia CIBRAZEM Companhia Brasileira de Armazenamento CODARN Companhia de Desenvolvimento de Rondônia CONAMA Conselho Nacional de Meio Ambiente CONAMAZ Conselho Nacional da Amazônia Legal CONSEMA Conselho Estadual do Meio Ambiente CONSEPA Conselho Estadual de Política Ambiental CONTAG Conselho Nacional de trabalhadores na Agricultura CPRM Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais DNPM Departamento Nacional de Trabalhadores na Agricultura EIA Estudo de Impacto Ambiental EMATER Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural EMBRAPA Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária ESG Escola Superior de Guerra FEE Floresta Estadual Extrativista FERS Floresta Estadual de Rendimento Sustentável FETAGRO Federação dos Trabalhadores na Agricultura de Rondônia FIERO Federação das Indústrias do Estado de Rondônia FINAM Fundo de Investimento da Amazônia FLONA Floresta Nacional FNO Fundo Constitucional do Norte FUNAI Fundação Nacional do Índio FUNTURA Fundação par a Conservação da Natureza IBAMA Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e estatística IBDF Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal IBRA Instituto Brasileiro de Reforma Agrária IEF Instituto Estadual de Florestas INCRA Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária INDA Instituto Nacional de Desenvolvimento Agrário ITERON Instituto de Terras e Colonização de Rondônia. MINTER Ministério do Interior MMA Ministério do Meio Ambiente da Amazônia Legal e dos Recursos Hídricos NUAR Núcleo Urbano de Apoio Rural ONG Organização Não-Governamental PA Projeto de Assentamento PAC Projeto de Ação Conjunta PAD Projeto de Assentamento Dirigido PAIC Programa de Apoio as Iniciativas Comunitárias PAR Projeto de Assentamento Dirigido PC Projeto de Colonização PEA Projeto Especial de Colonização PEGM Parque Estadual de Guajará Mirim vi PGAI Projeto de Gestão Ambiental Integrado PIC Projeto Integrado de Colonização PIN Programa de Integração Nacional PLANAFLORO Plano Agropecuário e Florestal de Rondônia PND Plano Nacional de Desenvolvimento PNUD Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento POLAMAZÔNIA Programa de Pólos Agropecuários e Agrominerais da Amazônia POLONOESTE Programa Integrado de Desenvolvimento do Noroeste do Brasil PP G-7 Programa Piloto para a Conservação das Florestas Tropicais do Brasil PRODEAGRO Projeto de Desenvolvimento agroambiental do Mato Grosso PRRA Plano Regional de Reforma Agrária -INCRA PROTERRA Programa de Redistribuição da Terra e Estímulo à Agro-indústria do Norte e Nordeste RADAMBRASIL Projeto Radar da Amazônia -Brasil REBIO Reserva Biológica RESEX Reserva Extrativista RPPN Reserva Particular ao Patrimônio Nacional SADM Secretaria da Administração SAE Secretaria de Assuntos Estratégicos (Presidência da República) SEAGRI Secretaria de Estado da Agricultura, Abastecimento e Reforma Agrária SEDAM Secretaria de Estado do Desenvolvimento da Amazônia SEPLAN Secretaria de Estado do Planejamento e Coordenação Geral SNUC Sistema Nacional de Gerenciamento de Unidades de Conservação SUDAM Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia SUDECO Superintendência do Desenvolvimento do Centro Oeste SUDHEVEA Superintendência do Desenvolvimento da Borracha SUFRAMA Superintendência da Zona Franca de Manaus UC Unidade de Conservação ZSEE Zoneamento Sócio-Econômico-Ecológico vii RESUMO O povoamento e a colonização do Brasil e da região amazônica ocorreram, desde o início do Brasil Colônia até nossos dias, por razões econômicas e políticas. No início, o povoamento acompanhou os interesses da expansão do domínio português na busca de produtos naturais e da mão-de-obra indígena atreladas à economia do modelo primário-exportador. A expansão no sentido leste- oeste durante o período colonial aconteceu através de expedições militares, de sertanistas aventureiros e de missões religiosas em busca de pau brasil e das drogas do sertão. A ocupação do vale do Guaporé-Mamoré-Madeira teve início com as expedições de Raposo Tavares e Francisco de Meio Palheta, com viagens de comerciantes, jesuítas e com expedições de resgate de índios realizadas por colonos aventureiros e exploradores. A seguir, verificou-se a expansão da fronteira amazônica provocada pela demanda da borracha, nos Séculos XIX e XX. O processo de expansão recente na Amazônia e em Rondônia ocorreu através das ações governamentais, prevendo uma associação entre o capital estatal e o privado nacional e internacional visando promover o desenvolvimento regional numa perspectiva de integração nacional segundo os princípios da ideologia vigente nos governos militares e da Nova República. A política de ocupação e colonização do Governo Federal praticada em Rondônia e conjugada com a implementação de projetos especiais de gestão territorial (POLAMAZÔNIA, POLONOROESTE e PLANAFLORO) visando promover o desenvolvimento regional foram elaborados e executados sem a previsão dos impactos físicos fundiários, econômicos, sociais e ecológicos acarretando, em conseqüência, múltiplas frentes de devastação ambiental. O estudo e análise do processo de ocupação, da gestão territorial dos Projetos Especiais e a gestão ambiental de Unidade de Conservação visando enfrentar os desafios dos conflitos e contradições geradas pela intensificação predatória e da devastação ambiental no Estado de Rondônia constitui o objeto deste trabalho monográfico. PALAVRAS CHAVES: Desenvolvimento Sustentável, Política Ambiental, Gestão Ambiental, Unidade de Conservação. viii ABSTRACT The Brazilian settlement and colonization process in Brazil and in Amazon region occurred, since the beginning of Brazil colony period until nowadays, due to economics and politics reasons. At the beginning, the settlement has jus followed the Portuguese domain of politics expansion in search of natural products and Indians laborer having the economic primary-export as a pattern. The expansion headed for west and east during the colonial period has just turned out to happen thanks to military expeditions, pioneers of “Sertão” (rustic country well known by the hot and dryness climate) and religions missions in search of “Brazil-Wood” and spices from “Sertão”. The occupation of Guaporé-Mamoré-Madeira valley had begun with Raposo Tavares and Francisco de Melo Palheta expedition, with traders on board, jesuit and with expedition of captured indians by the settler adventurous and explorers. Later on, it was possible to realize the Amazon expansion through the frontier, attributed to tuber demanding in the 19th and 20th century. The recently process of expansion in Amazon region and in Rondônia has just occurred through government actions, tending to associate among state capital and national and international private capital looking forward regional development with a perspective of national integration. According to the up to date principle of ideology presented on military governments and also in the New Republic. The occupation and settlement politics from the federal government executed now in Rondônia has the partnership of special projects implementation and territory management (POLAMAZONIA, POLONOROESTE E PLANAFLORO) whic the main target was to support the regional development, created and executed without any forward physic agrarian, economic, social and ecological impact bringing about, in consequence, multiple devastating faces of environment. High study and analysis of this settlement process, territory management of special projects and environment management of conservation unity facing the challenges conflicts and contradictions brought up by predatory intensification and environmental devastating in Rondônia State turned into the objective of this monograph. KEY WORDS: Sustainable development, Environment, Environmental managingment, Conservation unity. INTRODUÇÃO Integrante da imensa região da Amazônia Brasileira, Rondônia foi palco nas últimas quatro décadas, de um processo acelerado e diferenciado de mudança. Definida como uma nova fronteira agrícola, a exemplo do que ocorreu nos demais Estados membros da região amazônica, Rondônia experimentou a implementação de diversas políticas públicas que numa avaliação mais ampla, resultaram em ações inadequadas e enviesadas, sob a égide de um capitalismo em expansão e dependente do sistema econômico mundial. Resultante de um conjunto de estudos e ações empreendidas pelo Governo Castelo Branco conhecidas pela denominação “Operação Amazônica”, em meados da década de 60, teve inicio uma nova estratégia de desenvolvimento visando integrar as três regiões geoeconômicas - Centro-Sul, Nordeste e Amazônia — numa perspectiva geopolítica de integração nacional segundo os princípios ideológicos vigentes no governo militar. No governo Médici (1969/1974) consolidou-se esta estratégia com o estabelecimento do Programa de Integração Nacional (PIN) e o Programa de Colonização e exploração econômica das áreas desapropriadas ao longo das rodovias a serem implementadas (Transamazônica - BR-230, Cuiabá-Santarém - BR-165, Cuiabá-Porto Velho e outras) na região. O planejamento desenvolvimentista e a gestão territorial são orientados através das diretrizes e metas de programas especiais: POLAMAZÔNIA, POLONOROESTE e pelo atual PLANAFLORO. O primeiro - POLAMAZÔNIA - instituído em setembro de 1974 (Decreto nº 74.607) criava 15 “pólos de desenvolvimento na Amazônia”, dentre estes, o pólo de Rondônia, que no período de 1975 a 1982, foram implementadas cerca de 116 projetos de desenvolvimento. O Programa Integrado de Desenvolvimento do Noroeste do Brasil — POLONOROESTE - foi criado pelo Decreto nº 86.029, de 27 de maio de 1981, com financiamento do Banco Mundial, visava viabilizar o ordenamento do setor produtivo primário em Rondônia e Mato Grosso através dos projetos de colonização implementados na década de 70. Tais programas especiais foram elaborados segundo a abordagem “desenvolvimentista” tradicional e autoritária que visava o “crescimento a qualquer preço” e de caráter, essencialmente, 2 predatório. A liberação da BR-364 em 1968, a implementação de programas de assentamentos agrários pelo INCRA, nas décadas de 70/80 e a gestão territorial no Estado desenvolvida segundo os objetivos e metas previstos pelos programas especiais e as diretrizes impostas pelo Banco Mundial geraram uma ocupação desordenada e conflitiva, a exploração predatória dos recursos naturais, a concentração fundiária, a ocorrência de numerosos impactos ambientais e a degradação ambiental no Estado. Não obstante os programas POLAMAZÔNIA e POLONOROESTE terem alcançado algumas das metas definidas (áreas de transporte e desenvolvimento urbano) a maioria delas obteve, apenas, resultados parciais. No que se refere à preservação e proteção ambiental o programa POLAMAZÔNIA desconheceu o problema e previu a aplicação somente, de 0,8% dos recursos na demarcação e desenvolvimento das comunidades indígenas, que não foram efetivamente executadas. Embora tenha previsto como um dos objetivos “assegurar o crescimento da produção em harmonia com as preocupações de preservação do sistema ecológico e de proteção às comunidades indígenas”, a gestão do POLONOROESTE bem mais complexa do que o programa anterior por que exigia a participação de inúmeros órgãos institucionais federais, estaduais, regionais e locais, também, só alcançou parcialmente a consecução de suas metas. Com uma previsão inicial para cinco anos de vigência (1981-1985) o programa se prolongou até 1992. As avaliações realizadas pelos consultores do Banco Mundial identificaram sérias distorções na execução do programa. Na segunda fase (POLONOROESTE II), no período de 1986-1992, o programa tentou corrigir os desvios constatados na fase inicial, redefinindo novas metas, dentre outras, a realização de estudos e pesquisas nos anos de 1987/89 visando a elaboração da Primeira Aproximação do Zoneamento Sócio-Econômico e Ecológico do Estado tendo em vista a necessidade de embasar cientificamente uma estratégia sustentável de ocupação do espaço físico. Tomando por base os dados levantados pelo zoneamento sócio- econômico e ecológico do Estado e levando em consideração, ainda, as numerosas denúncias e críticas realizadas por organizações não-governamentais 3 nacionais e internacionais sobre os impactos ambientais e sociais resultantes da gestão territorial dos programas especiais executados nas duas décadas anteriores, o Banco Mundial reformulou a sua estratégia e procedimentos no fim da década de 80 e inicio da década de 90, na elaboração de um novo programa especial que deveria dar prosseguimento ao processo de gestão e utilização sustentável dos recursos naturais renováveis e de conservação da biodiversidade do Estado - o Plano Agropecuário e Florestal de Rondônia (PLANAFLORO). Na concepção e elaboração deste plano (que contou com a participação de técnicos dos órgãos federais e do Estado) foram atendidas as recomendações do zoneamento que previam: I. A intensificação da exploração agropecuária em áreas já ocupadas ao longo da BR-364 e o apoio aos pequenos agricultores com a melhoria e o fortalecimento da infra-estrutura sócio-econômica da região (zonas 1 e 2); II. a elaboração de estratégias de conservação e proteção ambiental incluindo, por um lado, o apoio às comunidades ribeirinhas, de seringueiros (zonas 3 e 4) e de madeireiros (zona 5) através de UC’s de uso direto — uso sustentável de parcela dos recursos naturais — tais como, reservas extrativistas, florestas de rendimento sustentado, áreas de proteção ambiental, reservas particulares de patrimônio natural e por outro lado, a criação de unidades de conservação de uso indireto — de proteção integral - tais como, parques, reservas biológicas e estações biológicas previstas na zona 6 abrangendo inclusive, as áreas indígenas e unidades legalizadas de conservação. 4 O PLANAFLORO começou a ter vigência em 1992 e dois anos depois o Banco Mundial realizava uma auditoria/avaliação na execução do plano e diante da constatação de desvios dos objetivos programados (abordados no capítulo 4), estabeleceu em 1996 novas estratégias e medidas corretivas ao planejamento inicial. Além de promover a reorganização da estrutura administrativa, o Banco Mundial criou o Programa de Apoio a Iniciativas Comunitárias - PAIC e o detalhamento do zoneamento, intitulado “Segunda Aproximação do Zoneamento Sócio-Econômico-Ecológico do Estado - ZSEE”. As primeiras Unidades de Conservação estaduais e municipais foram criadas entre 1988 e 1993, seguindo as orientações indicadas pela primeira aproximação do zoneamento. A maioria das UC’s atuais foi institucionalizada após as medidas corretivas promovidas pelo Banco Mundial. O detalhamento e aprofundamento dos estudos e pesquisas da Segunda Aproximação do Zoneamento realizado em uma escala de 1:250.000 conforme ressalta o Relatório Final do Diagnóstico Sócio-Econômico-Ecológico do Estado (1999:12) visava gerar informações básicas ao ordenamento territorial segundo o potencial natural, de modo a subsidiar o planejamento das intervenções públicas e privadas, a fim de atingir a auto-sustentabilidade dos recursos naturais, através de processos de exploração economicamente viáveis ecologicamente equilibrados. O atual processo de gestão territorial do Estado teve continuidade com os desdobramentos que o Brasil Mundial promoveu em 1996 e com os estudos da Segunda Aproximação do ZSEE e das atividades de planejamento ambiental que se verificaram em 1999-2000 visando a elaboração de diretrizes e propostas que deverão subsidiar e instruir a elaboração de um novo programa especial de desenvolvimento para o Estado com base no modelo de desenvolvimento sustentável. Pretende-se com esta pesquisa levantar, descrever e analisar os mecanismos de gestão ambiental utilizados pelas diversas esferas governamentais, a partir dos modelos de desenvolvimento implementados no Estado ao longo das três últimas décadas. Especificamente, pretende-se, ainda, analisar as ações desenvolvidas por órgãos públicos e privados, bem como, pelos demais atores da comunidade local na busca da compatibilização e integração 5 das ações de gestão ambiental em uma Unidade de Conservação localizada no Vale do Guaporé-Mamoré que priorize o envolvimento participativo e co- responsável. Por se tratar de um processo complexo e multidimensional, a gestão ambiental que sempre reflete o pensamento e a ideologia econômica política dominante numa relação dinâmica com diversos condicionamentos que exercem influência no dinâmico e conflitivo processo de gestão. Com base nas considerações iniciais retro expostas, nossa explanação dar-se-á obedecendo as seguintes etapas: • O primeiro capítulo pretende caracterizar o contexto no qual se insere o problema que é objeto esta investigação. Além de especificar os objetivos a serem alcançados nesta pesquisa delineia-se, ainda, os processos metodológicos utilizados neste trabalho; • O segundo capítulo procura visualizar resumidamente o contexto mais amplo das políticas de desenvolvimento e de ocupação da Amazônia e de Rondônia nas quatro últimas décadas; analisa-se, ainda, os desdobramentos desta política de ocupação e de expansão do capitalismo autoritário no espaço territorial de Rondônia; • Resultante do processo de ocupação e colonização implementado no Estado discute-se, no capitulo terceiro, as características dos diferentes impactos ambientais e sociais que consolidou no Estado um capitalismo selvagem, desigual, concentrador, altamente conflitivo e predatório; • No capítulo quarto analisa-se os principais instrumentos de gestão territorial plasmados pelos governos autoritários segundo a doutrina da segurança nacional e as exigências impostas pelos organismos internacionais; • Finalmente, no capítulo quinto, discute-se os resultados obtidos por esta pesquisa na execução da estratégia de desenvolvimento e de gestão ambiental aplicados a nível local e particularmente, em uma Unidade de Conservação – o Parque Estadual de Guajará Mirim – 6 PEGM, caracterizando-se aqui, os papéis assumidos pelos múltiplos atores nos diferentes tipos de intervenções ocorridas, apreendidas, registradas e interpretadas visando, em última análise, a consecução da meta predominante desta pesquisa – o de apresentar generalizações que tenham um caráter criativo e inovador do processo dinâmico e sistêmico da gestão ambiental do Projeto de Gestão Integrada/compartilhado da referida Unidade de Conservação. 1 - CONTEXTUALIZAÇÃO DA PESQUISA 1.1 - CONTEXTO DO PROBLEMA Resultante da estratégia geopolítica definida em meados da década de 60 inaugurava-se na Amazônia uma nova fase de expansão do capitalismo brasileiro. O planejamento do desenvolvimento da Amazônia foi elaborado segundo esta nova visão estratégica consubstanciada na ideologia da “ordem e progresso” amplamente divulgada através do slogan da propaganda oficial “Integrar para não entregar (e que inclusive serviu de lema ao Projeto Rondon) que partia do pressuposto de que se deveria passar da geopolítica das “fronteiras geográficas” para a geopolítica das “fronteiras ideológicas”. Esta estratégia estava assentada nos acordos militares assinados entre o Brasil e os Estados Unidos cuja tese fundamental era: “Entrega-se ao comunismo aquilo que não se entrega aos norte- americanos”(1). Os planos de desenvolvimento previam uma associação entre o capital estatal e o privado nacional e internacional, cabendo ao Estado os investimentos de infra-estrutura, pesquisa e planejamento deixando ao capital privado nacional e estrangeiro os recursos para a implementação dos programas e projetos especiais que selecionavam áreas mais favoráveis ao desenvolvimento e que se tornariam pólos de desenvolvimento regional. Dentre outros programas oficiais que aplicaram recursos em Rondônia deve-se destacar os seguintes: POLAMAZÔNIA, POLONOROESTE e PLANAFLORO. Tais programas tiveram, efetivamente, um papel relevante no processo de gestão territorial do Estado de Rondônia nas últimas três décadas e que serão abordados nos próximos capítulos deste trabalho. Contudo, a análise desta problemática constitui uma visão mais ampla do objeto deste trabalho, uma vez que, tais programas definiram um leque de ações/intervenções que, em três momentos, estabeleceram modelos de desenvolvimento diferenciados e conseqüentemente, modelos de gestão ambiental correspondentes. Coube, entretanto, aos programas POLONOROESTE e PLANAFLORO a tarefa de definir metas e intervenções mais racionais científica e tecnologicamente, tendo em vista o ordenamento territorial do Estado de conformidade com as potencialidades e 8 vulnerabilidades dos recursos naturais, através da realização de zoneamento sócio-econômico-ecológico de Rondônia em duas aproximações. Na Primeira Aproximação do Zoneamento Sócio-Econômico-Ecológico do Estado, elaborado numa escala de 1:1.000.000, tomou como base as informações secundárias existentes e classificou o espaço territorial do Estado em seis “áreas zonais”. Essa primeira aproximação foi instituída em 14 de junho de 1988 pelo Decreto nº 3.782. Posteriormente, durante as negociações sobre o empréstimo do Banco Mundial para o PLANAFLORO, zoneamento foi ratificado pela Lei Complementar nº 52, de 20 de dezembro de 1991. Os estudos e levantamentos da Segunda Aproximação do zoneamento tiveram início em meados de 1986 após a assinatura do contrato entre o Governo do Estado e o consórcio de empresas TECNOSOLO/DHW Consultantes/ EPTISA e concluído no final de 1988. A Segunda Aproximação do Zoneamento Sócio- Econômico e Ecológico do Estado, elaborado na escala de 1:250.000, com base nos estudos realizados foi delimitado, pelo consórcio de empresas em conjunto com os membros da Comissão Técnica do Zoneamento, a partir da identificação das “unidades de solos e terrenos”(SOTRO) que foram agregadas em 43 “unidades territoriais de análise” (UTA’S) e em 12 Regiões de Análise – RA’s. Finalmente, da análise integrada dos estudos temáticos das “Regiões de Análise” concebeu-se os “cenários” da delimitação das áreas especiais de onde foram definidas as três “áreas zonais” e nove “sub-zonas”. Após a consolidação da Segunda Aproximação do Zoneamento Sócio-econômico-ecológico do Estado – ZSEE foi instituído pela Lei Complementar nº 233, de 6 de julho de 2000 e revogadas as leis complementares nº 052/91,152/96,171/97 e 203/98 que estabeleciam normas sobre a questão. Os zoneamentos realizados em 1988/89 e 1998/99 constituíram instrumentos determinantes no ordenamento territorial e na implantação de novos projetos no Estado a partir de uma visão sustentável de desenvolvimento. A Lei Complementar nº 52/91 estabeleceu, em seu Artigo 1º, § 4º, que “os investimentos públicos e privados, no Estado de Rondônia, deverão ser aplicados em consonância com as diretrizes do Zoneamento Sócio- Econômico-Ecológico de Rondônia” (2) 9 Do mesmo modo, o Artigo 3º da Lei Complementar nº 233, de 06 de julho de 2000, prevê que “O ZSEE tem por objetivo orientar a implementação de medidas e elevação do padrão sócio-econômico das populações, por meio de ações que levem em conta as potencialidades, as restrições de uso e a proteção dos recursos naturais, permitindo que se realize o pleno desenvolvimento das funções sociais e do bem-estar de todos, de forma sustentável” (3). No que pese a existência de algumas “incoerências” e “contradições” entre diversas políticas em relação “à gestão dos recursos naturais (política fundiária, política agrícola, licenciamento e fiscalização ambiental etc.) e diversas fragilidades na gestão política do zoneamento sócio-econômico-ecológico” (Millikan:1998:17)(4) o zoneamento, como instrumento de “gestão social e política do espaço, assumiu o caráter mediador entre as demandas sócio-econômicas e a necessidade de promover a proteção e conservação dos recursos naturais, definindo critérios e diretrizes embasadas nas potencialidades e vulnerabilidades destes recursos que resultaram na delimitação de dois eixos básicos: o “eixo desenvolvimentista” constituído pelas áreas de influência da BR-364 e o “eixo conservacionista” localizado a Oeste do Estado, especialmente, no vale do Guaporé-Mamoré-Madeira. Como mostra o quadro síntese do ZSEE abaixo, na Zona 1 e suas quatros sub-zonas localizam-se os maiores percentuais de ocupação humana e as mais elevadas potencialidades naturais. A Zona 2 é constituída por “áreas destinadas à conservação dos recursos naturais, passíveis de uso sob manejo sustentável” com (14,6% do total do Estado). A Zona 3 é composta pelas áreas institucionais (as terras protegidas ou indígenas, ocupando cerca de 20,15% da superfície territorial do Estado e as Unidades de Conservação que atingem o percentual de 14,52% da área total do Estado).(5) 10 Quadro 01 – Síntese do ZSEE Área preservada (%) Área exploração (%) ZONAS Área (hectares) (%) Estado (%) Reserva (hectares) Estado (hectares) Estado 1.1 6.141.734,87 25,75 20 1.228.346,97 5,15 4.913.387,90 20,60 1.2 3.066.401,19 12,86 40 1.226.560,47 5,14 1.839.840,71 7,72 1.3 1.482.380,61 6,22 70 1.037.666,42 4,35 444.714,18 1,87 1.4 1.340.531,12 5,62 80 1.072.424,90 4,5 268.03,22 1,12 Sub-total 12.031.047,79 50,45 4.564.998,77 19,14 7.466.049,02 31,31 2.1 2.565.336,50 10,75 2.2 918.105,54 3,85 Sub-total 3.483.442,04 14,6 3.483.442,04 14,60 3.1 1.808.129,12 7,58 3.2 2.375.250,04 9,96 3.3 4.153.410,90 17,41 Sub-total 8.336.790,07 34,95 8.336.790,07 34,95 Total 23.851.129,90 100,00 16.385.230,88 68,69 7.466.049,02 31,31 FONTE: GOVERNO DE RONDÔNIA. Segunda Aproximação do ZSEE, 2000 Vale salientar que a maioria das UC’s do Estado foram criadas durante a realização dos estudos visando a elaboração dos diagnósticos que antecederam à elaboração da Primeira e Segunda Aproximações do Zoneamento Sócio- Econômico-Ecológico do Estado. As UC’s foram criadas na Amazônia com o surgimento do Projeto uma Análise para a Conservação da Natureza da Amazônia vinculando ao II Plano Nacional de Desenvolvimento durante o governo Geisel (1975-1979). Com base neste projeto foi elaborada a I Etapa do Plano do Sistema Nacional de Unidade de Conservação. Não obstante os programas POLAMAZÓNIA E POLONOROESTE recomendarem a criação de Unidades de Conservação, somente, na década de 90, devido as pressões dos movimentos sociais e ambientalistas nacionais e a repercussão dos desmatamentos e queimadas na Amazônia e mormente, em Rondônia, que antecederam à realização da ECO-92 é que, efetivamente, foram criadas as UC’s atuais. 11 1.2- CARACTERIZAÇÃO DO OBJETO DE ESTUDO - O PEGM 1.2.1 - CRIAÇÃO E SITUAÇÃO FUNDIÁRIA Integrante do “Corredor Ecológico” do Estado, o Parque Estadual de Guajará Mirim – objeto de estudo deste trabalho, foi criado pelo Decreto Estadual nº 4.575, de 23 de março de 1990 e demarcado em 1994. Os levantamentos sócio-econômicos e fundiários realizados na área identificaram a existência de 7 títulos definitivos expedidos pelo Estado de Mato Grosso e registrados no Cartório de Guajará Mirim em nome de Isaac Benayon Sabbá, correspondendo a 53.601 ha. Os trabalhos identificaram a presença de 21 posseiros que habitavam os prolongamentos das linhas 29 e 30, com propriedades de 108 ha em média e ocupação superior a 6 anos. Detectaram, ainda, a existência de 23.000 ha. de terras devolutas ao norte do parque. Na demarcação dos limites do parque, atendeu-se as sugestões do Instituto de Terras de Rondônia – ITERON de não incluir as áreas ocupadas pelos posseiros ao longo das estradas 29 e 30 do Projeto de Colonização Sidney Girão e de anexar a porção de terras devolutas. 1.2.2 – LOCALIZAÇÃO O Parque Estadual do Guajará Mirim – PEGM está localizado no extremo Oeste do Estado ( Figura 01) e sua área de abrangência demarcada (207.148,269 ha.) está situada nos municípios de Guajará Mirim e Nova Mamoré. O acesso ao PEGM pode ser realizado por via fluvial e terrestre. Por via fluvial o PEGM pode ser atingido navegando-se o Rio Ouro Preto ou o Rio Jaci- Paraná em direção as suas nascentes. Os roteiros por via terrestre são: • A partir da cidade de Nova Mamoré e RO-425 (120 km do PEGM) através das linhas D e 29; 12 • Pelo município de Buritis (70 km do Parque) o acesso é realizado pela linha de penetração conhecida como “Um” e os limites são o Rio Capivari e o morro do Oriente; e • Pelo município de Campo Novo (80 km do PEGM) realizado pela BR- 421. A Figura 01 abaixo mostra a sua Macro-localização. Mapa 01 – Localização do Parque Estadual de Guajára-Mirim – PEGM Figura 01 13 1.3 - OBJETIVOS 1.3.1 – GERAL: Descrever e analisar o processo de gestão ambiente, em nível estadual (políticas e programas especiais públicas implementadas no Estado) e em nível local, a implementação do Projeto de Gestão Ambiental Integrado — PGAI na Unidade de Conservação de uso indireto — o Parque Estadual de Guajará Mirim — PEGM. 1.3.2 – ESPECÍFICOS: P Identificar os mecanismos administrativos e de gerenciamento utilizados pelas diferentes esferas governamentais (federal, estadual e municipal) visando obter resultados integrados das políticas públicas referente à gestão ambiental; P Analisar as ações desenvolvidas visando a sensibilização e difusão da temática ambiental junto às comunidades beneficiadas visando atingir a participação e a co-responsabilidade no planejamento e execução do PGAI; P Levantar dados quantitativos e qualitativos produzidos pela gestão democrática do PGAI frente aos entraves e às pressões sócio- econômicas localizadas nas zonas de amortecimento ou de entorno: P Analisar as ações relativas à gestão descentralizada desenvolvidas no PGAI e áreas de entorno visando a conscientização e participação ativa dos atores comunitários no processo de planejamento, tomada de decisão e gestão compartilhada da PGAI; e P Verificar, através de estudo e análise em nível local, as contribuições concretas ao desenvolvimento de uma gestão descentralizada, participativa e inovadora. 14 1.4 - REVISÃO DA LITERATURA 1.4.1 - MODELOS DE DESENVOLVIMENTO E CONCEITOS DE GESTÃO AMBIENTAL O debate sobre os modelos de desenvolvimento a serem adotados pelos países industrializados e desenvolvidos, e mormente, pelos países subdesenvolvidos do III Mundo, nas décadas logo após a II Grande Guerra Mundial, foi intenso e na maioria das vezes, otimista. Referindo-se a esta questão, Celso Furtado (1975) menciona o exemplo da “tendência de idolatria dos mitos” que se observa na literatura sobre o desenvolvimento neste período concluindo que “90% se baseia na idéia implícita de que o desenvolvimento econômico, como praticado nos países que lideraram a revolução industrial, pode ser universalizado, e, mais precisamente, que os padrões de consumo presente usufruídos pela população dos países industrializados poderiam ser compartilhados pelas massas das populações que vivem e rapidamente se expandem no Terceiro Mundo, contando que trabalhassem muito e se comportassem bem”. (6) Constituindo-se como a principal potência hegemônica do Primeiro Mundo, os EUA estabeleceram, através de diversos planos, a previsão de tendências da economia norte americana, detalhando, inclusive, “as prováveis tendências da demanda de recursos naturais não renováveis”. Tais planos tomavam implicitamente, segundo Furtado (1975 op. cit.), a hipótese de que “o mundo fora dos Estados Unidos é ilimitado”. Ao mesmo tempo, proliferaram outros modelos de desenvolvimento elaborados do ponto de vista dos países em desenvolvimento e/ou subdesenvolvidos, desde teorias que concebiam o processo de desenvolvimento como uma seqüência de fases indispensáveis e que já ocorrera com os países desenvolvidos (veja-se como exemplo a teoria de Rostow que defende a idéia de que o crescimento econômico é constituído de diversos estágios: inicia-se com estágio da alavancagem e, a seguir, atinge etapas diferenciadas até alcançar o estágio da maturidade) até aquelas que partiam da análise de diferentes variáveis 15 existentes nos países subdesenvolvidos. Brüseke (1995) enumera algumas destas teorias, a saber: a) da teoria do subconsumo (Luxemburgo); b) da teoria do exército industrial de reserva (Stemberg); c) da teoria dos monopólios mundiais (Lênin); das contribuições subseqüentes de Baran, Bettelhein, Amin, Palloix, Sweezy; d) da teoria da dependência representada, de um lado, por Sunkeí, Furtado, Jaguaribe etc. e, por outro, por Frank, dos Santos, Córdova, Cardoso, lanni etc.; Lembremo-nos que nesse contexto desenvolveu-se a discussão da teoria do capitalismo periférico (Senghaas) e de heterogeneidade estrutural. Não vamos ignorar, também: e) a teoria da causalidade circular-cumulativa (Myrdal) f) a teoria da modernização, respectivamente, do desenvolvimentismo (Hirschman, Prebish, Knakal, Pinto etc.); g) a teoria do câmbio desigual (Amin, Emmanuel, MandeI etc.) e finalmente, h) a teoria do marcado mundial capitalista (Bosh, Scholler). (7) Estes modelos tradicionais de desenvolvimento referem-se ao modo capitalista de produção cujo fim último é a expansão do capital, pela produção e apropriação da mais-valia e a utilização racional dos recursos (a utilização racional dos recursos inclui, além dos elementos materiais e conceptuais, o emprego econômico e a adequação aos fins de todo o esforço humano – a força de trabalho – despendido no processo de produção). Grosso modo, estes modelos de desenvolvimento podem ser conceituados como a forma de desenvolvimento que se reduz a fenômenos parciais definidos por variáveis micro e macro-econômicas e maximiza a disponibilidade dos recursos naturais para atender as demandas produtivas através da racionalização do trabalho visando maximizar a geração de renda (produtividade). No que pese a abordagem da administração conter alguns fundamentos teóricos válidos para toda forma de organização social, a atividade administrativa 16 se insere na teia de relações das forças econômicas, políticas, sociais, culturais etc. e das contradições decorrentes destas relações em conflito em cada período histórico e em cada formação social determinada. Como reflexo destes estilos de desenvolvimento econômico surge o tipo de gerenciamento que tem como critério administrativo a eficiência econômica, ou seja, a produtividade. Como a acumulação capitalista não ocorre de maneira homogênea, mas ao contrário, apresenta uma trajetória com fluxos e refluxos (que Marx chama de ciclos e Schumpeter de crises) que os mecanismos do mercado não conseguem evitar. A história do capitalismo, segundo estudo de Dobb (1974) é marcada por diversos estágios em seu desenvolvimento. Entretanto, em cada país ou região o modo de produção capitalista apresenta características próprias não obstante algumas semelhanças com outras regiões ou países. “A história do capitalismo foi sempre dominada pelo desenvolvimento desigual: entre países, entre regiões, dentro de cada país, entre grupos, de indústria e entre indústria e a agricultura”.(8) Contudo, o sistema produtivo ao longo de sua evolução apresenta estágios diferenciados: o primeiro, no momento histórico da livre concorrência (auto-regulamentação) em que as leis de mercado regulavam o processo espontaneamente; o segundo, o desenvolvimento econômico é regulado pelo Estado, tendo em vista a necessidade de corrigir determinadas desigualdades ou descontinuidades do sistema econômico; e finalmente, o estágio atual em que predomina os grandes oligopólios transnacionais (desregulamentação). A acumulação capitalista no Brasil após a lI Grande Guerra e nas décadas de 50 e 60, quer por necessidade endógena de consolidar o processo de industrialização e urbanização do país, quer ainda, devido as pressões do sistema econômico internacional sob a hegemonia da economia dos EUA, atingiu o estágio da regulação pelo Estado. Nesse período o Estado experimentou uma crescente participação e iniciativa no processo de crescimento econômico partindo da estratégia de que somente através do planejamento centralizado, a exemplo do que já ocorrera nos países “socialistas” e em alguns países 17 capitalistas europeus, notadamente na França, poderia desenvolver-se. O planejamento como o principal instrumento de racionalidade visando alcançar a eficiência e a produtividade capitalista passou a ser, assim, um fator indispensável à prosperidade econômica. O desenvolvimento econômico do país na segunda parte da década de 60 e inicio da década de 70, foi fundamentado na estratégia geopolítica da doutrina do regime militar, cuja tese fundamental era “o que não se entregar aos Estados Unidos entregar-se-á à União Soviética” não conseguiu atingir ao objetivo proposto – o de integrar as três grandes regiões geoeconômicas do país: Centro- Sul, Nordeste e Amazônia. Analisando as políticas públicas executadas pelo Governo Federal visando a ocupação da Amazônia, Oliveira (1997) afirma: “O Centro-Sul deveria ter o processo de industrialização solidificado e sua agricultura modernizada, além, de participar’do ‘desenvolvimento do Nordeste’ e da ocupação, via “Operação Amazônia”, da região Norte do país” (9) O “milagre econômico brasileiro” resultante da intervenção do Estado neste período não corrigiu as desigualdades regionais e sociais. O crescimento do “bolo” econômico beneficiou, apenas, a pequena minoria dominante (os 10% mais ricos), concentrando ainda mais a renda regional e aumentando o percentual da maioria excluída e marginalizada socialmente. As transformações tecnológicas no processo produtivo, a expansão da urbanização das cidades, o aumento da demanda por serviços da infra-estrutura (saneamento, moradia, educação, saúde etc.), o crescimento do desemprego e da massa populacional mais pobre, por um lado, e as pressões exercidas pelo movimento popular organizado, por outro, obrigaram o governo central a assumir a responsabilidade pela correção das metas econômicas, acrescentando a estas, metas sociais. Observa-se, assim, a redefinição do modelo tradicional de desenvolvimento econômico, acrescentando-se a dimensão social. No redimensionamento do modelo de desenvolvimento, o crescimento econômico é planejado pelo Estado visando estabelecer mecanismos que permitam garantir o atendimento dos componentes sociais incluídos nas 18 “necessidades básicas” da população através de uma maior distribuição de renda e uma melhoria na qualidade de vida dos cidadãos. Os planos de desenvolvimento da década de 70 além da intenção dos governos militares de transformar o Brasil em uma “potência mundial” previam, ainda, metas sociais. Assim é que, no I Plano Nacional de Desenvolvimento (I PND), período de 1970-74, foi previsto como um dos objetivos a “participação ampla da classe média e dos trabalhadores nos resultados do desenvolvimento” e no II PND (período de 1975-79) encontrava-se como um dos objetivos, “realizar política de melhoria da distribuição de renda, pessoal e regional, simultaneamente com o crescimento econômico”. Esses planos, os planos regionais e os programas especiais, em seu conjunto, fracassaram ou no máximo, alcançaram algumas metas parciais. Agravada pela crise da economia mundial o “modelo de desenvolvimento brasileiro” foi levado à exaustão. O Presidente Figueiredo que sucedeu a Geisel não elaborou plano de desenvolvimento. Contando com inúmeros problemas (inflação elevada, recessão, déficit crescentes no balanço de pagamentos que aumentavam a divida externa. dentre outros) o governo passou a agir “pragmaticamente” de acordo com as injunções do cotidiano. No plano mundial, a crescente instabilidade na economia começou no início da década de 70 com repercussão na economia do país. Na análise de Benakouche (1981) a crise mundial foi provocada por diversos fatores, a saber: “.. .pela queda das paridades cambiais fixas, pela alta vertiginosa dos preços dos produtos de base e dos alimentos, e pela eclosão da crise do petróleo. Isto se traduziu, em 1974-75, por uma recessão generalizada, conjugada com inflação. ............................................................................................................................... Na verdade, porém, a economia mundial continuou a registrar momentos difíceis, caracterizados, dentre outros fenômenos, pela estagflação, a qual acentuou-se, principalmente, durante o período de 1979-80, e que persistirá, sem dúvida, ainda por algum tempo”. (10) Benakouche (op. cit.) prossegue na sua análise afirmando sinteticamente que “a crise atual é uma crise do regime de acumulação” e identifica a origem da crise, por um lado, nos limites de ordem técnica e social interpostos à 19 intensificação do capital e no desenvolvimento do fordismo (Benakouche destaca dois aspectos: o primeiro, do lado do processo de trabalho, onde as técnicas de ‘medição de tempos e movimentos’ são levados a um nível elevado, ocorrendo a passagem das máquinas universais para máquinas especializadas e o segundo, do lado da valorização da força de trabalho, isto é, da extração do sobretrabalho e da formação do valor de troca, obtendo-se assim, um considerável aumento da intensidade e da produtividade do trabalho permitindo, dest’arte, a produção em larga escala) e por outro, no processo de “transnacionalização do capital que conduziu a uma desestabilização, à uma “des-coerência” dos sistemas produtivos nacionais”. No que pese o fato de que nessa nova ordem econômica o Estado perde o controle da regulação econômica, no entanto, conserva as funções referentes à gestão da força do trabalho e da repressão. O aprofundamento da crise fiscal e do desequilíbrio externo na primeira metade da década de 80 e a transição política representada pela instalação da Nova República constituíram o divisor de águas entre o regime militar dos governos de Geisel e Figueiredo que implementaram o redistributivismo conservador e o novo regime de caráter democrático. As pressões sociais provocadas pelos movimentos sociais organizados exigem reorientação dos rumos das políticas públicas. Na visão de MeIo (1998), “... Mais uma vez se observa um deslocamento no eixo analítico do binômio crescimento versus distribuição de renda para a questão da eficiência (gerencial) e eficácia social de políticas — para além das considerações tradicionais sobre os trade off entre eficiência (alocativa) e eqüidade vigente durante a década de 70” (11) A análise do estágio intervencionista do governo militar (no período 1974/83) evidencia o tipo de racionalidade empresarial que constituía o fulcro dos planos de desenvolvimento e das ações governamentais ineficientes na área da política social. Os críticos deste período intervencionista identificam o modo operante do mesmo ressaltando o seu caráter burocrático privatista, centralizado, excludente e ineficaz. A partir de 1984, as analistas e os setores organizados após caracterizar os fatores que exerciam influência sobre esta questão apontaram para dois instrumentos de caráter político-institucional que poderiam superar a dimensão 20 gerencial do mistargeting que os governos da Nova República iriam enfrentar como desafio. Melo (1998) sugere os seguintes: “A participação dos atores excluídos na arena decisória das políticas (e seu corolário, a transparência nos processos decisórios) e a descentralização (pela qual os problemas associados ao gigantismo burocrático poderiam ser superados)” (12) A participação que se restringia a uma participação excludente como previa o planejamento “participativo” do governo autoritário e centralizador constituía-se em mera aceitação passiva e de colaboração às ações impostas de cima para baixo. No tocante à descentralização, o Governo Federal exercitava, apenas, pequenas doses de desconcentração, que em última análise, reforçavam o poder central. Uma das questões que foi amplamente debatida refere-se a da alocação desigual e de caráter regressivo das políticas públicas. O Banco Mundial (1981) reporta-se sobre esta questão chamando-a de mistargeting (que designa a incapacidade das políticas alcançarem os segmentos sociais que configuram uma população-meta). Meio (1998) destaca que o motivo da preocupação, “... não é a irrelevância do gasto social público, mas a forma pela qual o expressivo volume de recursos envolvidos é (mal) alocado. É neste ponto que a dimensão gerencial do mistargeting é expressiva: os benefícios ao feridos pelos segmentos sociais representam parcelas pouco expressivas do dispêndio total em termos dos custos associados à manutenção de estruturas organizacionais gigantescas” (13) Apesar da crise em que o país se encontrava mergulhado, o governo da Nova República que assumiu no período de transição a partir de 1985, no que se refere ao caráter das políticas públicas resolveu priorizar as questões relativas à gestão e ao controle democrático das decisões governamentais. Por outro lado, a crise da economia mundial e inserida nela, a do Brasil, ensejou o aparecimento de inúmeras correntes de pensamento que tentavam redefinir os rumos do desenvolvimento do país. Os novos condicionamentos históricos exigiam por um 21 lado, convergir os esforços para sair da crise e por outro lado, tentar definir uma nova estratégia paradigmática que permitisse a formulação de um novo estilo de desenvolvimento que promovesse a correção dos vieses da estratégia desenvolvimentista do governo militar Estudando algumas opções tecnológicas e o desenvolvimento do Terceiro Mundo, André Furtado (1998) enumera algumas destas concepções: a) a Escola da Regulação que “enfatiza o esgotamento das relações de trabalho fordistas, que se traduziu por um recrudescimento das lutas trabalhistas durante os anos 60 e 70 nos países líderes do capitalismo”; b) os neo- shumpeterianos que “apontam o esgotamento dos ganhos de produtividade do cluster de inovações, que assegurou o ciclo expansivo do pós-guerra como sendo a causa principal da crise” c) outros autores próximos da Escola da Regulação colocam que “os desajustes macros econômicos provocados pela acelerada internacionalização da economia mundial – cujo epicentro encontra-se, na economia americana...” - seria a causa da crise; d) “Uma outra corrente de autores, no entanto, tem chamado a atenção para a importância dos limites ecológicos na explicação da atual crise mundial (Furtado, 1985; Herrera, 1977, Sachs, 1980, Passet, 1979). (14) O debate sobre os modelos de desenvolvimento – suas bases teóricas e metodológicas – e os fatores que contribuíram para a formação das crises durante as décadas de 60, 70 e 80 foram acrescidos com as propostas de modelos que enfatizavam o aspecto axiológico e o ecológico. No primeiro caso, o novo modelo prioriza o homem integral sendo denominado por uns de desenvolvimento humano (ONU) e por outros, de desenvolvimento integrado ou equilibrado. Os métodos utilizados anteriormente para medir o desenvolvimento restringiam-se, no caso do crescimento econômico, aos índices ou indicadores macroeconômicos e aos indicadores sociais quando se referiam ao modelo econômico-social. A Organização das Nações Unidas (ONU) redefiniu alguns desses conceitos e suas metodologias, propondo os indicadores de “desenvolvimento humano”. Analisando esta abordagem Giustina (2000) destaca que “É preciso que os indicadores, além da riqueza, evidenciem a tragédia, e por isso é necessário, além de superar o método das médias, adotar indicadores 22 que evidenciem as condições em que vivem as pessoas, em concreto, os abastados e os excluídos”. (15) No início da década de 80, após levantamento realizado utilizando-se o Produto Nacional Bruto (PNB) de cada país foi elaborada uma lista classificatória das maiores economias do Mundo, na qual a economia brasileira alcançava o lugar, deslocada para o 11º no final da década. Esta comparação baseado num único critério mascarava a verdadeira situação do país, já que não considerava o tamanho da população e como ocorria a partilha dos bens produzidos. O Banco Mundial realizou levantamento semelhante em 1992 adotando como critério o PNB per capita. No Relatório sobre o Desenvolvimento Mundial, o Brasil desceu para o patamar de 37º lugar entre 125 países. Tendo em vista corrigir os vieses presentes nas classificações existentes, a ONU pesquisou, em todos os países o estado da população considerando os seguintes indicadores: a) renda; b) expectativa da vida; e c) educação. Tais indicadores baseiam-se na definição de desenvolvimento formulada pela ONU: “Desenvolvimento é um processo de ampliação do campo de oportunidades oferecidas à população de um país”. (16) Os dados levantados permitiram calcular esses indicadores e ainda, puderam gerar informações sobre um conjunto de condições reais de vida das populações que vão permitir a caracterização das condições de bem-estar ou de qualidade de vida. Nesta visão de “desenvolvimento”, os recursos econômicos constituem um fator importante de acesso às oportunidades, contudo, acrescentam-se a ele outras informações relevantes, a saber: saúde, longevidade e escolaridade. A partir das relações entre esses indicadores calcula-se os índices de Desenvolvimento Humano (IDH) numa escala de 0,000 a 1.000 pontos. O IDH calculado em 1991, o Brasil alcançou o 60º lugar entre 130 países. Em 1996, a situação do Brasil piorou em função de mudança metodológica. Nesta avaliação, atribuiu-se um valor menor ao fator “renda” à medida em que cresce a economia, pois a maior renda média nem sempre se transfere para a melhoria da qualidade 23 de vida da população. No Relatôrio de 1998, o Brasil colocou-se em 79º lugar com 739 pontos de IDH, resvalando para a situação do país de baixo desenvolvimento, aos invés de país em desenvolvimento médio, como era classificado anteriormente. A tabela abaixo mostra a distribuição dos estados brasileiros em três faixas de conformidades com os IDH da ONU em 1996: Tabela 1 – ÍNDICE DE DESENVOLVIMENTO HUMANO — ONU/PNUD, 1996 Região/Estado IDH Índice de esperança de vida Índice de educação Índice de PIB Norte 0.727 0.706 0.777 0.697 Rondônia 0.820 0.701 0.807 0.953 Acre 0.754 0.701 0.709 0.854 Amazonas 0.775 0.711 0.764 0.850 Roraima 0.818 0.688 0.838 0.928 Pará 0.703 0.709 0.770 0.631 Amapá 0.786 0.714 0.845 0.798 Tocantins 0.587 0.730 0.835 0.223 Nordeste 0.608 0.658 0.714 0.452 Maranhão 0.547 0.644 0.687 0.311 Piauí 0.534 0.657 0.657 0.288 Ceará 0.590 0.669 0.714 0.388 Rio Grande do Norte 0.668 0.670 0.731 0.603 Paraíba 0.557 0.636 0.682 0.354 Pernambuco 0.615 0.623 0.750 0.471 Alagoas 0.538 0.615 0.638 0.363 Sergipe 0.731 0.683 0.751 0.760 Bahia 0.665 0.691 0.732 0.541 Sudeste 0.857 0.730 0.875 0.966 Minas Gerais 0.823 0.738 0.843 0.888 Espírito Santo 0.836 0.737 0.839 0.931 Rio de Janeiro 0.844 0.700 0.867 0.965 São Paulo 0.868 0.740 0.895 0.970 Sul 0.860 0.753 0.870 0.957 Paraná 0.847 0.737 0.851 0.954 Santa Catarina 0.863 0.758 0876 0954 Rio Grande do Sul 0.869 0.764 0.883 0.960 Centro-Oeste 0.848 0.726 0.860 0.959 Mato Grosso do sul 0.848 0.738 0.855 0.952 Mato Grosso 0.767 0.717 0.841 0.742 Goiás 0.786 0.727 0.854 0.778 Distrito Federal 0.869 0.723 0.902 0.981 Brasil 0.830 0.710 0.825 0.954 Fonte: ONU/PNUD/IPEA No que pese alguns casos atípicos (o Distrito Federal, Estado de Rondônia e Roraima que obtiveram IDH acima de 0,800) a classificação dos Estados segundo o IDH evidencia as desigualdades regionais e a divisão do 24 Brasil em três brasis distintos: o Brasil 1 cujos indicadores se aproximam dos indicadores dos países do primeiro mundo. Este Brasil abrange os Estados cujos indicadores se encontram acima do índice de 0,800 na escala da ONU. Este Brasil atinge uma população de aproximadamente 101,5 milhões de habitantes (estados das Regiões Sudeste e Sul, o Distrito Federal, e ainda, o Estado de Mato Grosso do Sul), ou seja quase 60% da população brasileira. O IDH da ONU que é uma combinação de quatro indicadores básicos (taxa de analfabetismo, número médio de anos de estudo, renda per capita e esperança de vida) mascara, contudo, a real situação das camadas sociais nestas regiões: elevados índices de concentração de renda com ostentação de luxo e em contrapartida, registra-se o contraste com a miséria das periferias e das favelas e o aumento do desemprego e da violência. O Brasil 2 é constituído pelos Estados que alcançam o índice entre 0,800 e 0,700 na tabela do IDH da ONU. São os Estados das regiões Norte e Centro- Oeste, exceto os Estados de Rondônia e Roraima mencionados acima como casos atípicos e dos Estados do Mato Grosso do Sul que obteve um índice de 0,848 (e encontra-se incluído no Brasil 1) e do Distrito Federal com um índice de 0,869, e o de Tocantins que obteve o IDH igual a 0,587, semelhantes aos índices dos Estados do Nordeste. Trata-se de uma área cuja extensão é de aproximadamente 60% do território nacional e uma população que atinge o percentual de 12% do total da população brasileira. Apresentando uma densidade demográfica baixa, contudo, nas últimas cinco décadas ocorreu um deslocamento migratório intenso e desordenado sob os auspícios de projetos governamentais ou privados (nacionais e internacionais) gerando, em conseqüência, uma devastação ambiental incalculável. Constituída pela imensa floresta tropical amazônica, pela área dos cerrados e do pantanal matogrossense, os estudiosos da região – Ab’Saber (1991), Godt & Sachs (1995), Fearnside (1991), Romeiro (1995), Reydon (1999) e outros – sugeriram que as propostas de desenvolvimento sustentável para esta região deveriam ser específicas e fundamentadas em bases científicas, economicamente viáveis e socialmente aceitáveis. Finalmente, o Brasil 3, formado pelos Estados do Nordeste e que alcançaram índices inferiores a 0,700 com exceção do Estado de Sergipe que alcançou o IDH de 0,731. Esta região representa 18% da área territorial nacional e 25 cerca de 28% da população brasileira, concentrada às margens do Atlântico, especialmente, nos três grandes centros urbanos da região: Salvador, Recife e Fortaleza. Neste Brasil, primeiro a ser ocupado, foi historicamente vítima da concentração: no início da colonização, com o sistema de capitania imposto pela metrópole colonizadora, depois com a implementação da economia da cana de açúcar e mais recentemente, com a concentração de terras, além do fenômeno de seca e da expulsão permanente dos habitantes das zonas rurais para as áreas urbanas da própria região ou para as demais regiões do país. Comparando-se os três brasis (figura nº 02) a partir da análise dos dados disponíveis, constata-se que predomina o contraste entre o Brasil relativamente desenvoLvido – o das regiões Sul e Sudeste – em contraposição ao Brasil subdesenvolvido da Região Nordeste, ou seja, o Brasil das desigualdades extremas. O outro Brasil – o das regiões Norte e Centro-Oeste – é o que apresenta grandes potencialidades, além de deter mais de 60% do território nacional, dispõe de: 150 milhões de hectares de terras agricultáveis, a maior reserva de floresta tropical do mundo, mais de 30% da biodiversidade do planeta, recursos minerais não calculados, etc. Mapa 02 – Os três brasis segundo os Indicadores de Desenvolvimento Humano (IDH) – 1986 Figura 02 26 Após 500 anos de sua descoberta, o Brasil real é aquele delimitado pelo Tratado de Tordesilhas. Não obstante o grande contraste entre os Brasil 1 e 3, é nesta área que se concentra 87% da população brasileira, mais de 90% da população urbana do país, mais de 85% da renda nacional, cerca de 90% da energia elétrica do pais e mais de 80% dos meios de comunicação e transporte, e ainda, de outros serviços básicos de infra-estrutura. (Veja Figura nº 3) Mapa 03 – Distribuição da população nos dois brasis efetivamente ocupado – Censo 2000- Figura 03 27 O enfoque ecológico com debates esparsos na década de 60 teve o seu marco definitivo no inicio da década de 70 com a realização da Conferência de Estocolmo (1972 e a realização do estudo por Dennis L. Meadows e um grupo de pesquisadores do MIT (Massachusetts lnstitute of Technology) denominado “The Limits to Growth” (1972). A Conferência de Estocolmo além de discutir temas da pauta referente à política internacional do período da Guerra Fria, mormente, de segurança militar e desenvolvimento debateu, também, o temática ambiental numa perspectiva sistêmica, considerando os aspectos econômicos e sociais do desenvolvimento como intimamente interligados com as questões ambientais. O estudo de Meadows et aIIi (1972) promoveu uma reflexão sobre o processo de industrialização acelerada e as políticas de desenvolvimento econômico das décadas de 60 e 70, o rápido crescimento populacional, o aumento da desnutrição, a deterioração ambiental e o desgaste e diminuição dos recursos não-renováveis. Este estudo propunha que fosse congelado o crescimento da população mundial e do crescimento econômico mostrando, por um lado, que os recursos não-renováveis são limitados e por outro, que o crescimento acelerado da população mundial poderia resultar em conseqüências maléficas imprevisíveis. Os prognósticos contidos nos relatórios desses eventos resultaram em duas conseqüências básicas: a) a primeira, de cunho teórico, a busca por novos paradigmas de desenvolvimento que representasse um salto e superação dos modelos convencionais de desenvolvimento econômico e social, de caráter predatório e insustentável em relação à natureza; b) a segunda, a emergência e expansão de organizações e agências estatais de meio ambiente e a nível internacional, do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente – UNEP. No Brasil, foi criado a Secretaria Especial do Meio Ambiente – SEMA, pelo Decreto nº 73.030, de 20 de outubro de 1973, órgão vinculado ao Ministério do Interior a partir destes relatórios surgem as primeiras idéias de um novo modelo: o do ecodesenvolvimento. O termo “ecodesenvolvimento” foi usado pela primeira vez por Maurice Strong, mas coube a lgnacy Sachs a tarefa de formular os princípios básicos deste novo modelo alternativo de desenvolvimento. A postura básica deste novo modelo foi a de ser antitecnocrática pois, como sugere Vieira (1998) 28 “... preconizava uma gestão mais racional dos ecossistemas locais, gestão esta que deveria incluir a valorização do know-how e da criatividade endógena das comunIdades” (17) A partir de uma visão sistêmica ele formulou os fundamentos desta nova concepção de desenvolvimento. Embora não concorde com a idéia de “crescimento zero” proposto pelo Clube de Roma, Sachs (1975) defendeu a posição de que o planejamento do crescimento econômico deve ocorrer em sintonia “com uma gestão racional do meio ambiente” e orientar-se para a “satisfação dos objetivos sociais”. A posição de Sachs (1975:49-50) em relação ao novo modelo alternativo de desenvolvimento é bem clara quanto situa o papel que cabe a cada componente do processo: “A lógica empresarial consiste, sempre que possível, em internalizar os lucros e externalizar os custos sociais. Por isso, a essa racionalidade estreitamente produtivista é preciso contrapor uma visão mais ampla, com horizonte temporal bem mais longo, e estribada em um critério de racionalidade social. Dentro desta ótica os recursos devem ser encarados com dois critérios: o de sua destinação para a realização dos objetivos sociais prioritários, e também, de uma conservação por solidariedade diacrônica com gerações futuras. A gestão do espaço-único – recursos rigorosamente finito – exige, por um lado, um espaço imaginativo para compatibilizar vocações múltiplas e concorrentes para seu uso e, por outro, a preservação das opções para o futuro. (...) Por fim, a gestão do meio-ambiente deve ir além da tarefa modesta e defensiva de eliminação de poluições locais mais incômodas, preocupando-se com os equilíbrios ecológicos globais e a longo prazo, com os processos cumulativos e muitas vezes irreversíveis a nível de oceanos e clima, que um dia poderão culminar em uma deterioração drástica das condições de habitat total do homem”. (18) A concepção de ecodesenvolvimento formulada por Ignacy Sachs pode ser desmembrada em duas fases: a primeira, em 1974, no qual Sachs denomina 29 a este modelo alternativo como sendo um “estilo de desenvolvimento” que poderia ser aplicado a projetos localizados em áreas rurais e urbanas “orientados prioritariamente pela busca de satisfação de necessidades básicas pela promoção da autonomia (self-reliance) das populações envolvidas no processo” a segunda, a abordagem foi reelaborada e ampliada (1986), definindo no processo de planejamento participativo quais as “estratégias plurais de intervenção, adaptadas a contextos sócio-culturais e ambientais específicos” deveriam ser utilizadas. Sachs considera que para promover a harmonia entre as ações de dinamização sócio-econômica era necessário aprofundar e consolidar uma cultura política democrática participativa e promover uma distribuição eqüitativa do “ter” e uma gestão ecologicamente prudente’’ do meio ambiente. Caracterizando o modelo do ecodesenvolvimento, Vieira (1998) afirma que é preciso conceber e selecionar ou criar instrumentos de avaliação segundo os seguintes critérios: 1) Prioridade ao alcance de finalidades sociais (satisfação de necessidades básicas e promoção da eqüidade); 2) Prudência ecológica (ou sustentabilidade ecológica) 3) Valorização da participação e da autonomia (self-realiance) e 4) Viabilidade econômica; (19) Como se observa, os desenvolvimentistas ecológicos priorizam, inicialmente, o suporte do meio ambiente integrado às necessidades sócio- culturais e às condições de um subsistema político democrático autônomo e participativo, para a seguir, compatibilizar a viabilidade econômica. Prevê, ainda, uma relação harmoniosa (equilibrada e integrada entre a eficiência alocativa do desenvolvimento as condições do meio socio-ambiental sob a coordenação e responsabilidade do Estado. O modelo conceitual prevê, a nível macroeconômico atender à demanda social que não deve se restringir ao consumo de bens e serviços no mercado, mas deve ampliar sua ação para incluir bens e serviços extra-mercado. Na perspectiva do Ecodesenvolvimento no tocante ao processo de produção, Vieira enfatiza os seguintes aspectos: 1) A utilização de tecnologias compatíveis com as peculiaridades do contexto histórico e sócio-ecológico 30 durante o processo de gerenciamento ambiental; 2) as políticas de gestão e de abastecimento de matérias-primas devem definir modos de exploração adequada que possam manter um controle dos impactos ambientais negativos e proporcionar uma melhoria da qualidade de vida das populações beneficiadas; 3) o envolvimento sinérgico da sociedade civil organizada é considerado relevante tanto na “definição e articulação política das necessidades coletivas e na identificação de potencialidades econômicas em cada contexto sócio-ecológico” quando no processo de “organização do trabalho de gestão dessas potencialidades” (20) A noção de equilíbrio é aceitar, mormente entre os autores que adotam a visão sistêmica, como um fenômeno momentâneo. Tal visão tanto ocorre na área das ciências da natureza quanto nas ciências sociais. A discussão sobre este conceito tem estimulado a apresentação de modelos e estilos de desenvolvimento e as formas de gestão ambiental e/ou ecológica. Analisando o critério da viabilidade econômica como elemento do conceito de ecodesenvolvimento, Weber (1997) considera que “A presença da variabilidade, da incerteza e da irreversibilidade nas dinâmicas dos sistemas nos conduz a colocar a questão do desenvolvimento em termos de gestão das interações que se processam entre as variabilidades econômicas e sociais, por um lado, e as variabilidades naturais, por outro – tanto no espaço quanto no tempo” (21) Weber (op. cit.) alerta para a “presença da variabilidade, da incerteza e da irreversibilidade nas dinâmicas dos sistemas tanto no domínio da natureza quanto na esfera da vida social”. A discussão sobre este conceito tem estimulado a apresentação de modelos e estilos de desenvolvimento, e ainda, de gestão ambiental e/ou ecológico. Com base nesta visão, Weber assinala que “Pensar um desenvolvimento a longo prazo implica visualizar, com base em objetivos estrategicamente colocados, as melhores modalidades possíveis de gestão das interações entre diferentes fontes de variabilidade (natural e social)” (22) 31 Após destacar alguns aspectos que ele considera indissociáveis no “desenvolvimento viável”, Weber enfatiza o “estabelecimento de uma relação de conivência” com os ecossistemas, ao invés de ignorá-los. Não percebendo diferença entre os conceitos de ecodesenvolvimento e de desenvolvimento viável, a concepção deste modelo de desenvolvimento cujos objetivos se enquadram em horizontes temporais de longo prazo requer que, antes de realizar o trabalho científico deve-se proceder o debate político e social. Decorrente desta discussão, emergiu em 1974, na Conferência de Cocoyok, o conceito de desenvolvimento sustentável (traduzido em francês por développement durable), embora ele tenha se tornado conhecido mundialmente após a publicação do Relatório Brundtland, em 1987. Como os modelos convencionais de desenvolvimento vigentes redundavam num aumento da concentração do capital, da população excluída e da pobreza causavam, ainda, expressivos danos ao meio ambiente, postulava-se agora, a partir de um estudo sobre as relações entre meio ambiente, desenvolvimento e segurança, no período compreendido entre os anos de 1983 e 1987, e expresso no relatório “Nosso Futuro Comum”, por um novo modelo de desenvolvimento. Este relatório conhecido como Brundtland (resultado de uma comissão da ONU como nome World Commission on Environment and Development presididas por Gro Harlem Brundtland e Mansour Khalid), parte de uma análise ampla e complexa das causas socioeconômicos e ecológicos da sociedade global visando elaborar estratégias de desenvolvimento de longo prazo tanto para países não industrializados quanto para os países desenvolvidos. O documento enfatiza a interligação entre economia, tecnologia, sociedade, política e meio ambiente, além de tomar um posicionamento ético quando ressalta a importância dos países e órgãos institucionais nacionais e internacionais, bem como, a presente e as futuras gerações venham a assumir responsabilidades por um desenvolvimento limpo e sustentável. As propostas apresentadas, tanto pela Conferência de Estocolmo quanto as constantes do Relatório “Nosso Futuro Comum” foram ampliadas e aprofundadas pela Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento do Rio de Janeiro, em 1992, e pelo Fórum Global das ONG’s, eventos que ficaram conhecidos como ECO-92. 32 O CNUMAD do Rio de Janeiro, após debates e negociações desgastantes aprovou os seguintes documentos: 1) Declaração do Rio de Janeiro sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento; 2) Convenção sobre Mudanças Climáticas; 3) Declaração de Princípios sobre Florestas; 4) Convenção sobre a Biodiversidade; e 5) Agenda 21. Dentre este, a Agenda 21, transformada em Programa 21 pela ONU, constituiu o principal documento aprovado na ECO-92. A Agenda 21 é, antes de tudo, um plano de ação de longo prazo que visa alcançar os objetivos do desenvolvimento sustentável. Este documento além de consolidar as decisões dos relatórios, protocolos e outros documentos elaborados pela ONU nas décadas anteriores inclui, também, as decisões tomadas nas demais convenções da EC092. Abordando as mais variadas e complexas questões relativas ao desenvolvimento sustentável e ao meio ambiente, a Agenda 21 propicia aos Estados signatários relevantes contribuições para que sejam elaboradas as agendas nacionais, regionais e locais. Após a realização da ECO-92 o conceito de desenvolvimento sustentável foi sensivelmente ampliado. Transcrevemos abaixo alguns destes conceitos de autores e instituições: • “Desenvolvimento sustentável é aquele que atenda às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade das gerações futuras de atenderem as suas próprias necessidades”(Relatório Brundtland – 1987). • Na essência, “o desenvolvimento sustentável é um processo de transformação no qual a exploração dos recursos, a direção dos investimentos, a orientação do desenvolvimento tecnológico e a mudança institucional se harmonizam e reforçam o potencial presente e futuro, a fim de atender às necessidades e aspirações humanas” (CMMAD: 1998, p. 49). 33 • “A gestão e conservação da base de recursos naturais e a orientação da mudança tecnológica para assegurar a alcançar a contínua satisfação das necessidades humanas para as gerações presentes e futuras” (FAO); • “Desenvolvimento sustentável é um processo de ampliação do campo de oportunidades oferecidas à população de um país de tal forma que, atendendo da melhor maneira possível às necessidades das gerações atuais, se preserve a capacidade e as possibilidades de as gerações futuras atenderem às suas próprias necessidades”(Penteado: 10997, p. 44). • “Conjunto de vida humana dentro dos limites da capacidade de carga dos sistemas ambientais” (Christofoletti, 1993). • “O desenvolvimento sustentável não representa um estado estático de harmonia, mas, antes, um processo de mudança, no qual a exploração dos recursos, a dinâmica dos investimentos e a orientação das inovações tecnológicas e institucionais são feitas de forma consistente face às necessidades tanto atuais quanto futuras” (Vedin, 1998). • “Quando falamos de desenvolvimento sustentável, temos que considerar não só os aspectos materiais e econômicos, mas o conjunto multidimensional e multifacetado que compõe o fenômeno do desenvolvimento: os seus aspectos políticos, sociais, culturais e físicos. A sustentabilidade do todo só pode repousar na sustentabilidade conjunta de suas partes. Esses fatores e os seus respectivos equilíbrios repousam sobre fatores qualitativos, como o são os graus de coesão e harmonia social, questões como cidadania, alienação, valores éticos e morais, o grau de polarização social e política, os valores da sociedade e o nível entrópico do sistema” (Stahel: 1998, pp. 108-9). • Entendemos como Desenvolvimento Sustentável a gestão e administração dos recursos e serviços ambientais e a orientação das mudanças tecnológicas e institucionais, no sentido de assegurar e alcançar a contínua satisfação das necessidades humanas para as gerações presentes e futuras, dentro dos limites da capacidade de sustentação dos sistemas ambientais” (Rodriguéz: 1997, p. 55). 34 • Processo de mudança contínua, na qual a utilização dos recursos, a orientação das invenções e da evolução tecnológica, os rumos do desenvolvimento ecológico, a mudança das instituições, estando de acordo com o potencial e as necessidades das gerações atuais e futuras” (Becker, 1993). A Agenda 21 é um documento dividido em 4 seções e 40 capítulos. A seção I trata das dimensões sociais do desenvolvimento sustentável; a Seção II aborda as dimensões ambientais (atmosfera, oceanos, ecossistemas frágeis, biodiversidade, desenvolvimento rural e agrícola sustentáveis, manejo saudável da biotecnologia etc.; a Seção III refere-se a participação dos grupos sociais no processo de desenvolvimento sustentável; e a Seção IV reporta sobre os meios para implantar os programas e as atividades previstas e recomendadas nas seções anteriores. Contudo, considerando-se os objetivos deste trabalho, serão destacadas algumas recomendações da Agenda 21, a saber: “I. fortalecimento das autoridades locais como parceiros do processo de desenvolvimento sustentável: O documento recomenda que cada autoridade local deve tomar a iniciativa de dialogar com os cidadãos, as organizações comunitárias e empresariais visando elaborar uma Agenda 21 local. A ênfase no desenvolvimento local não prescinde o Estado (federal e estadual) e os organismos internacionais do processo de desenvolvimento, mas ao contrário, recomenda que estes devem estimular formas criadoras de compatibilizar e integrar as políticas nacionais e regionais às ações de gerenciamento local; II. a ênfase do pluralismo tecnológico: a Agenda 21 reconhece a importância para o desenvolvimento sustentável dos conhecimentos e das tecnologias provenientes tanto das atividades de pesquisa e desenvolvimento (P&D) quanto das práticas e costumes comunitários e tradicionais; 35 III. documento recomenda às empresas da indústria e comércio a utilização do manejo do meio ambiente visando a promoção de uma produção mais limpa (cleaner production), bem corno, da responsabilidade empresarial. Ressalta, ainda, a participação do Estado na definição de uma política ambiental que permita induzir práticas ambientais sustentáveis por parte das empresas IV. a utilização de uma abordagem integrada no processo de planejamento e gerenciamento dos recursos terrestres (solo, minerais, água, biota, etc). Prevê, ainda, a criação de mecanismos que possam facilitar a Intervenção e participação ativa das populações beneficiadas pelos programas, especialmente, as comunidades e populações locais”. (23) Após a realização da ECO 92 cujo eixo principal dos debates foi como atingir um novo estilo de desenvolvimento que interiorize a proteção ambiental, a maioria dos setores ambientalistas ampliou o conceito de desenvolvimento sustentável já definido no Relatório da Comissão Brundtland “Nosso Futuro Comum”, embora uma reduzida minoria constituída de duas vertentes extremadas, defendesse posições priorizando ou o desenvolvimento ou meio ambiente (CIMA 1991). No que pese a existência de divergências, um aspecto da teoria do Desenvolvimento Sustentável é aceito com consenso: o conceito de sustentabilidade. A concepção de sustentabilidade constitui um conceito de gênero que deve abranger inúmeras categorias (geoecológicas, econômicas, social etc.). Um exemplo da sustentabilidade é o proposto por FEARNSIDE (1991) para o desenvolvimento agrícola da Amazônia. Para Fearnside (1986) a sustentabilidade agrícola “... requer um balanço razoável de nutrientes no sistema, incluindo compreensão por perdas através de lixiviação, erosão e exportação de nutrientes nos produtos colhidos. Outras exigências para produtividade contínua, como controle de compactação do solo, devem também ser satisfeitas. Exigências de energia devem ser satisfeitas a partir de recursos renováveis. Probabilidade de destruição por pestes 36 ou doenças devem ser prevenidas e deve levar-se em consideração o uso da terra que substituiria um sistema, caso este fosse vítima desses problemas biológicos” (24) Dest’arte, pode-se mencionar outras formas de sustentabilidade: urbana, turística etc. que seriam exigidas conforme as categorias que seriam objeto de intervenções através do planejamento ambiental. 37 1.4.2 - A GESTÃO AMBIENTAL COMO PARTE INTEGRANTE DO SISTEMA DE PLANEJAMENTO AMBIENTAL INTEGRADO O fracasso dos modelos de planejamento tradicional (que prioriza a racionalidade econômica) ou o estratégico-militar por se revelarem como insustentáveis e irracionais ambientalmente, exige em nossos dias, que se opte pelo planejamento ambiental que utilize um modelo de planejamento holístico e sistêmico que inclua a visão ecossistêmica em suas três dimensões: ecossistemas naturais, ecossistemas urbanos e agroecossistemas. O planejamento ambiental deve estar calcado na visão especializada do espaço territorial nos seus principais aspectos: natural, econômico-social, cultural e político. Esta visão de planejamento é fundamentada na concepção de desenvolvimento sustentável que postula a harmonia entre o desenvolvimento socioeconômico e a conservação do meio ambiente com ênfase na preservação dos ecossistemas naturais e na diversidade genética. Por isso, o levantamento, o estudo e análise dos diferentes fenômenos interdependentes dos ecossistemas que constituem o objeto do planejamento ambiental deve ser efetuado por uma equipe multidisciplinar. Tais procedimentos que embasam o planejamento ambiental devem promover estudos integrados que pressupõem o entendimento da dinâmica de funcionamento do ambiente natural sem e com as intervenções humanas. Na visão de Franco (2000), a “palavra planejamento carrega em seu valor semântico o sentido de empreendimento, projeto, sonho e intenção. Para esta autora, o termo empreendimento “revela o ato de intervir ou transformar uma dada situação, numa determinada direção, a fim de que se concretizem algumas intenções”. Superando a visão positivista que predominou até o fim do século XX, a partir da década de 80 simultaneamente ao aparecimento do modelo de desenvolvimento sustentável surgiu esta nova modalidade de planejamento orientada para as intervenções humanas segundo a capacidade de suporte dos ecossistemas. A partir desta visão, Franco (2000), conceitua Planejamento Ambiental como 38 “... todo o planejamento que parte do princípio da valoração e conservação das bases naturais de um dado território como base de auto-sustentação da vida e das interações que a mantém, ou seja, das relações ecossistêmicas”. (25) Como instrumento de uma política ambiental, o planejamento ambiental deve programar o uso do território, as atividades produtivas, o ordenamento dos assentamentos humanos e o desenvolvimento da sociedade em consonância com a vocação natural da terra e a proteção e qualidade do meio ambiente. Para Rodriguez (1997) ao planejamento ambiental cabe a tarefa de traçar as pautas para a Gestão Ambiental segundo duas dimensões: I. “como uma categoria operativa” encarregada de definir o estilo de comando, direção, controle e fiscalização do uso dos recursos, através de diferentes instrumentos de normalização, decisões econômicas, financiamentos e outras disposições institucionais; e II. “como uma categoria política”- através de um processo de mediação de interesses e conflitos entre os atores sociais, culturais e políticos que atuam sobre o meio ambiente.” (26) Na figura 04 abaixo, Rodriguez sugere um modelo de paradigma em que relaciona Desenvolvimento Sustentável, Política Ambiental, Planejamento Ambiental e Gestão Ambiental. 39 POLÍTICA AMBIENTAL MEDIAÇÃO DE INTERESSES E CONFLITOS GESTÃO AMBIENTAL PLANEJAMENTO AMBIENTAL PLANEJAMENTO REGIONAL IMAGEM-OBJETIVO CATEGORIA CONCEITUAL FONTE: RODRIGUES (1997) Figura 04 Como um sub-sistema de um sistema mais amplo (o dinâmico processo de planejamento ambiental), a Gestão Ambiental, como define Vedovello (2000) “... refere-se a implementação da Política Ambiental, através de ações de gerência, coordenação, execução, controle e monitoramento das atividades sócio-econômicas e mesmo culturais, que se relacionam com o meio ambiente” (27) O conceito de Vedovello discrimina o conjunto de ações integradas de um processo mais amplo de gestão ambiental. Contudo, diferentes modalidades de gestão podem ser definidas, conforme as condições e características do ecossistema e das intervenções antrópicas efetuadas no meio ambiente. Depende, ainda, do modelo de desenvolvimento que se pretende implementar. Tomando por base a abordagem do ecodesenvolvimento, alguns estudiosos sugeriram “uma modalidade de gestão patrimonial da relação sociedade-natureza” resultante de um planejamento democrático que define “estratégias integradas de desenvolvimento sensíveis à questão ambiental”. Como defende Vieira (1998), 40 “... não se trata de situar a condição humana nem acima e nem abaixo da natureza. Para a posição ecodesenvolvimentista, o comportamento humano surge como a expressão de um conjunto de interdependências tecidas entre a base biológica-genética dos sistemas orgânicos e seu processo de aprendizagem social, adquirida historicamente em contextos sócio-ambientais específicos” (28) Esta proposta de gestão ambiental requer, por um lado, uma certa identidade sociocultural entre a comunidade e o meio ambiente e por outro, que o espaço determinado para fins de planejamento seja, “... em princípio, suficientemente amplo e homogêneo do ponto de vista ecológico, de forma a assegurar uma gestão a mais integrada possível da potencialidade dos recursos existentes” (29) Orientada por esta concepção de desenvolvimento (ecodesenvolvimento) algumas experiências realizadas em diversos países são denominadas como “sistema de gestão de recursos em propriedade comum” que enfatizam o “uso sustentado dos recursos para tornar-se algo compartilhado pela comunidade, aumentando as chances de êxito de formas de gestão capazes de favorecer o alcance simultâneo de uma distribuição mais eqüitativa da riqueza gerada e de aumento das margens de sustentabilidade dos recursos da comunidade” (30) Uma outra modalidade de gestão que obteve uma ampla aceitação no mundo ocidental, mormente nos EUA, no início da década de 80, foi a administração de qualidade total como uma extensão do movimento de Total Quality Management (TQM). A versão de Callenbach et alIi (2001) é bem esclarecedora a respeito da questão: “A administração de qualidade total se concentra no contínuo aprimoramento dos processos empresariais a fim de atender mais plenamente as necessidades e expectativas do cliente” (31) 41 Em meados da década de 80, quando a crise da economia mundial se acentuou, gerando uma instabilidade e volatização econômica expressiva, decorrente “da globalização da economia, pelo aumento da concorrência por parte do Japão e da Alemanha e pela aceleração do desenvolvimento tecnológico” as empresas passassem a viver num clima de “guerra permanente” (Vaill: 189). Analisando esta mudança turbulenta na área organizacional das empresas, Peter Senge (1990), segundo a opinião de Callenbach et alli (1993), “... sustenta que as organizações que sobreviverão e florescerão são as voltadas para o futuro – as que são capazes de assimilar informações novas, adaptar, mudar. Em essência, capazes de aprender” (32) E prossegue Callenbach et alli (1993: op. cit.): “Senge acredita que o sucesso das organizações reside na capacidade do grupo e das pessoas que o compõem de assimilar cinco tecnologias: pensamento sistêmico, domínio pessoal, modelo mentais, visão compartilhada e aprendizagem em equipe” (33) No plano ambiental o modelo da “gestão da qualidade” é considerada complexa e complicada por que a “qualidade” de se constituir um valor essencialmente imaterial. Analisando o conceito de “qualidade” Ollagnon (1998) assevera que “A ‘qualidade’ de um meio natural constitui uma realidade ao mesmo tempo material e imaterial, sob certos aspectos mensurável, graduável e, em todo caso, “qualificável cuja degradação ou ausência de degradação pode ser considerada como prejudicial para a atividade, a identidade e a capacidade de adaptação dos atores envolvidos. Esta qualidade representa tanto uma herança das gerações passadas quanto algo transmissível, de forma atenuada ou ampliada, às gerações futuras, bem como aos demais usuários de hoje”. (34) 42 Prossegue, ainda Ollagnon (1998), sobre o conceito mais amplo de “sistema-qualidade”: “O ‘sistema-qualidade’ representa o ecosociossistema de onde “emerge” a qualidade. De forma operacional, ele constitui a unidade natural e humana suficientemente ‘ativa’ para que nela possa ser tratado o essencial do problema da qualidade. É no ‘sistema-qualidade’ que se desenvolve o ‘ciclo’ do ‘recurso’ o ‘ciclo da vida da espécie animal’, o ‘conjunto de interações naturais e humanas onde ofertas e demandas por qualidade onde se estrutura um estado de meio”. (35) Na essência esta modalidade de gestão manifesta-se através da ação humana que influencia o estado de qualidade. E como esclarece Ollagnon (op. cit.), “Esta gestão da qualidade é aquela que coloca em ação o sistema de ação no âmbito do ‘sistema-qualidade’ e sua definição pode ser obtida por meio de três critérios: • capacidade de escolher e manter um ‘estado de qualidade • capacidade de confrontar cada ação elementar com seu impacto sobre a resultante ‘qualidade’ no ‘sistema-qualidade’ através de ‘regras de gestão’, adaptadas no âmbito do sistema de ação; e • capacidade de reatualizar os objetivos de qualidade e as regras de gestão por meio da negociação no âmbito do sistema de ação” (36) A abordagem da Gestão pela Qualidade recebeu na última década do Século XX, inúmeras contribuições e reformulações normativas, contando com a participação da maioria dos países da União Européia, ONG’s e instituições de pesquisas. Além das pressões exercidas pela sociedade e dos mercados consumidores, por iniciativa de algumas grandes empresas desenvolveu-se um conjunto de normas aprimoradas (série ISO 14.000) com abrangência 43 internacional, através do qual as corporações tentam implantar “em todo e qualquer lugar onde desenvolvem atividades”. Analisando a questão, Cavalcanti (1998) considera que “As normas propostas pela série ISO 14.000 visam, portanto, equacionar um problema econômico, que colocará a empresa moderna diante de duas opções: adaptar-se e desenvolver um aprimorado sistema de gestão, ou correr o risco de perder espaços de mercado, por não se adequar aos princípios das normas que estão sendo formuladas” (37) Duas instituições internacionais exercem, o papel de órgão normatizador internacional na indústria, comércio e serviços. São eles: A Organização Internacional de Normalização (lnternational Organization for Standardization - ISO) que é uma federação mundial fundada em 1946 constituída por cento e onze países-membros e o Comitê Técnico & 207 (ISO/TC 207) criado em março de 1993 pelo Conselho Estratégico de Meio Ambiente (órgão que fazia parte da ISO) que recebeu dentre outras atribuições, a de formular uma série de normas voltadas à gestão ambiental. A Conferência das Nações Unidas Rio-92 elaborou documentos que justificava a necessidade de criação de grupos de trabalho para a realização destas ações normativas internacionais. Conforme a transcrição de Cavalcanti (op. cit.), no Sumário Exec