1 CESAR AUGUSTO AREZO E SILVA JÚNIOR Concepção e análise técnico-econômica da recuperação de calor em sistemas de despoeiramento de aciarias elétricas para geração de vapor superaquecido Guaratinguetá 2016 2 CESAR AUGUSTO AREZO E SILVA JÚNIOR Concepção e análise técnico-econômica da recuperação de calor em sistemas de despoeiramento de aciarias elétricas para geração de vapor superaquecido Dissertação apresentada à Faculdade de Engenharia do Campus de Guaratinguetá, Universidade Estadual Paulista, para obtenção do título de Mestre em Engenharia Mecânica na área de Energia. Orientador: Prof. Dr. José Alexandre Matelli Guaratinguetá 2016 3 4 Dezembro de 2016 5 DADOS CURRICULARES CESAR AUGUSTO AREZO E SILVA JÚNIOR NASCIMENTO 12.04.1985 – GUARATINGUETÁ / SP FILIAÇÃO Cesar Augusto Arezo e Silva Ana Aparecida de Campos 2001/2003 Curso Técnico Eletroeletrônica – UNESP - Colégio Técnico Industrial de Guaratinguetá 2005/2011 Curso de Graduação Engenharia Industrial Química – Universidade de São Paulo 6 AGRADECIMENTOS Aos meus pais, Cesar e Ana, que desde cedo me ensinaram o valor da busca pelo conhecimento. Ao meu irmão, Marcos Paulo de Campos Arezo e Silva, que me inspirou a iniciar o curso de engenharia. Ao meu orientador Prof. Dr. José Alexandre Matelli pelo conhecimento, dedicação e motivação para o desenvolvimento deste trabalho. À minha esposa, Elisângela e minha filha Laryssa, que sempre estiveram ao meu lado e compreenderam minhas eventuais ausências. Aos estimados amigos de curso Fernando Henrique de Araújo Mayworm e Caio Felipe de Paula Santos pela parceria durante as atividades do curso de mestrado e apoio à realização deste trabalho. 7 “A vida é como andar de bicicleta. Para manter o equilíbrio, você tem que continuar se mexendo”. Albert Einstein “Felicidade é ter o que fazer, ter algo que amar e algo que esperar”. Aristóteles 8 RESUMO As usinas siderúrgicas caracterizam-se, sob o ponto de vista energético, pela grande intensidade de energia empregada em processos de redução do minério de ferro, fusão das matérias-primas e refino do aço líquido obtido. Quanto aos processos utilizados para a produção de aço, destacam-se o emprego de duas rotas tecnológicas: usinas integradas e semi-integradas (mini-mills). As usinas integradas possibilitam a redução do minério de ferro até ferro-gusa e, a partir deste, a obtenção do aço. As mini-mills caracterizam-se pelo emprego de sucatas metálicas, ferro-gusa ou ferro esponja como matérias-primas e pela obtenção, como produtos, de diferentes tipos de aço. Na operação de refino do aço líquido produzido comumente é necessário o emprego de desgaseificadores a vácuo para remoção de contaminantes e, consequentemente, atendimento às especificações do produto acabado. Com isso, as mini-mills demandam potência elétrica para os processos de fusão do aço e vapor superaquecido para obtenção de vácuo nos ejetores do processo de desgaseificação. Para atendimento a legislações ambientais, sistemas de despoeiramento devem ser aplicados às aciarias, disponibilizando grandes vazões de gases quentes provenientes do forno elétrico. A operação do sistema de despoeiramento indica expressivo potencial para recuperação de calor em processos siderúrgicos. Na presente dissertação propõe-se a coleta e análise de dados de operação do sistema de despoeiramento de um forno elétrico a arco de uma mini-mill brasileira, visando concepção e análise técnica-econômica de uma central de cogeração associada à recuperação de calor destes gases do sistema de despoeiramento. Palavras-chaves: Aciarias elétricas. Cogeração. Eficiência Energética. Geração de vapor. Recuperação de calor. 9 ABSTRACT The steel industry can be characterized by its high demand of energy in the process of reduction and production of pig iron and steel. For the production of steel the following routes can be highlighted: integrated plants and mini-mills. Integrated plants are used for production steel from iron ore, allowing the reduction of iron ore until pig iron, and pig iron to steel. Mini-mills are used for production of steel through metallic scraps and pig iron. In a mini-mill, the transformation of metallic scraps and pig iron to steel is reached in melting shop areas. The melting shop areas adopt vacuum degassers as a commonly equipment to remove contaminants of liquid steel and consequently reach requirements of finished products. As a consequence, in a melting shop, electricity is applied in electric arc furnaces and overheated steam is applied in vacuum degassers. According to environmental restrictions these melting shops are integrated with dust collectors. The dust collected in electric arc furnaces has great amount of energy and can express a high potential to heat recovering systems. The present dissertation has purpose in collect and analyzes data from an electric arc furnace with a dust collector in a Brazilian mini-mill for developing a thermal-economic analysis of a cogeneration plant integrated in this mini-mill. Keywords: Electric arc furnaces. Cogeneration. Energy Efficiency. Steam generators. Heat recovery. 10 LISTA DE FIGURAS FIGURA 2.1 - Diagrama de Sankey para um forno elétrico a arco 25 FIGURA 2.2 - Perfil de temperatura dos gases de exaustão durante um ciclo de 68 minutos em um forno elétrico a arco 27 FIGURA 2.3 - Evolução da mundial de aço nas últimas décadas 29 FIGURA 2.4 - Produção de Aço nos Estados Unidos da América em função das principais rotas de produção 30 FIGURA 2.5 – Evolução da produção mensal de Aço no mundo 30 FIGURA 2.6 - Representação de um Desgaseificador a Vácuo 33 FIGURA 2.7 - Fluxograma de uma mini-mill 34 FIGURA 2.8 - Fluxograma simplificado de uma aciaria elétrica 34 FIGURA 2.9 - Representação dos principais componentes de um forno elétrico a arco 36 FIGURA 2.10 - Diagrama esquemático de um sistema de despoeiramento 38 FIGURA 2.11 - Representação dos vetores formados na sucção do despoeiramento 39 FIGURA 2.12 – Curva de captação do sistema de exaustão primário 40 FIGURA 2.13 – Gases de exaustão gerados durante carregamento de um forno elétrico a arco coletados pelo sistema de sucção secundário 41 FIGURA 2.14 – Vista superior dos dutos de exaustão de um despoeiramento 42 FIGURA 2.15 – Câmara de combustão de um sistema de despoeiramento 43 FIGURA 2.16 – Vista interna da câmara de combustão de um sistema de despoeiramento 43 FIGURA 2.17 – Curvas de temperatura dos gases de exaustão e temperatura da sucata metálica em função do tempo de corrida no forno elétrico 45 FIGURA 2.18 – Representação das tubulações e acessórios que compõem o sistema de pré-aquecimento 46 11 FIGURA 2.19 – Layout do sistema de pré-aquecimento de sucatas metálicas através da recuperação dos gases de exaustão de forno elétrico composto por dois cestos 47 FIGURA 2.20 - Layout do material PCM no sistema de exaustão de gases do forno elétrico a arco 48 FIGURA 2.21 - Perfis de temperatura em função dos tipos de acumuladores de calor 50 FIGURA 2.22 - Layout do arranjo utilizado no reservatório térmico do recuperador de calor proposto 50 FIGURA 3.1– Representação de um ejetor de vapor 53 FIGURA 3.2 – Variações de pressões no interior de um ejetor de vapor 53 FIGURA 3.3 – Esquema de operação com ejetores em série com 5 estágios 54 FIGURA 3.4 – Fluxograma da central utilidades da mini-mill analisada 56 FIGURA 3.5 – Tela do controlador do despoeiramento do forno 57 FIGURA 3.6 – Gráfico do sistema de despoeiramento com temperaturas em diferentes pontos de amostragem 58 FIGURA 3.7 – Gráficos de temperatura dos gases de exaustão após a câmara de combustão em função do tempo e de corridas do forno 61 FIGURA 3.8 – Temperatura dos gases de exaustão após a câmara de combustão em 13 corridas obtidas em um forno elétrico 62 FIGURA 3.9 – Perfil característico de temperatura dos gases de exaustão do forno elétrico analisado durante um ciclo operacional médio de 104 minutos 63 FIGURA 3.10 – Vista frontal da câmara de combustão do sistema de despoeiramento com indicação do local de instalação do recuperador de calor 65 FIGURA 3.11 – Instalação proposta para o recuperador de calor no sistema de despoeiramento 66 FIGURA 3.12 - Fluxograma do sistema de geração e consumo de vapor proposto para a planta siderúrgica 66 12 FIGURA 3.13 - Representação de uma caldeira de recuperação com arranjo horizontal 68 FIGURA 3.14 - Vista lateral do tanque com tubos utilizados no reservatório de calor 70 FIGURA 3.15 - Dimensionamento do número de tubos do reservatório térmico em função do diâmetro 71 FIGURA 3.16 - Vista frontal do arranjo proposto para os tubos do reservatório de calor 72 FIGURA 3.17 - Representação das regiões da caldeira de recuperação de calor 74 FIGURA 3.18 - Superfície de controle da turbina a vapor 76 FIGURA 3.19 - Potência elétrica obtidos no gerador elétrico da turbina a vapor em função da vazão mássica de vapor superaquecido 77 FIGURA 3.20 - Condensador do ciclo térmico 78 FIGURA 3.21 - Superfície de controle da bomba 78 FIGURA 4.1 - Custos específicos do reservatório térmico em função do tempo anual de operação da planta e reserva térmica de 36 minutos 86 FIGURA 4.2 - Variação da massa de sal em função da reserva de calor requerida no tempo 87 FIGURA 4.3 - Variação da massa de sal necessária para a reserva térmica em função do tempo de reserva de calor requerido 88 FIGURA 4.4 - Custos específicos do vapor superaquecido e potência elétrica obtidos na planta proposta 89 Figura 4.5 – Receita anual esperada com a geração de energia elétrica no ciclo térmico proposto 92 13 LISTA DE TABELAS TABELA 2.1 – Aplicação de energéticos em processos siderúrgicos 26 TABELA 3.1 – Estratificação dos dados coletados no forno elétrico 59 TABELA 3.2 – Dados utilizados para o dimensionamento da caldeira de recuperação 69 TABELA 3.3 - Investimento inicial no reservatório de calor 72 TABELA 3.4 - Dados termodinâmicos do processo proposto 73 TABELA 3.5 - Cálculo do investimento no reservatório térmico em função do tempo de reserva 78 TABELA 3.6 - Parâmetros técnico-econômicos da planta analisada 80 TABELA 4.1 - Resultados de variáveis críticas do ciclo térmico 85 TABELA 5.1 - Dados de custo de vapor superaquecido [R$/t] de uma usina siderúrgica do estado de São Paulo 91 14 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS a.a. – Taxa de juros ao ano; ABM – Associação Brasileira de Metalurgia, Materiais e Mineração; CD – Condensador do ejetor de vapor; CR – Caldeira de recuperação; EAF – Forno elétrico a arco; ETA – Estação de tratamento de água; LF – Forno panela; Off-gas – Gás de exaustão do forno elétrico a arco, coletado pelo sistema de despoeiramento; PCM – material utilizado para reserva de calor a partir da mudança de fase (phase change material); Rt – reservatório térmico; TV – Turbina a vapor; US EPA – Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (US Environmental Protection Agency); WSA – Associação Mundial do Aço (World Steel Association). 15 LISTA DE SÍMBOLOS McicloOC & - Custo total de operação e manutenção da planta – [USD/kWh]; McaldOC & - Custo total de operação e manutenção da caldeira auxiliar – [USD/kWh]; salCp – Calor específico do sal - [J/Nm³K]; m gasCp - Calor específico do gás de exaustão do forno elétrico - [J/kg.K]; v gasCp - Calor específico dos gases de exaustão – [J/Nm³K] vC - Custo específico do vapor superaquecido obtido a partir da caldeira de recuperação - [USD/t]; 2vC - Custo específico do vapor superaquecido obtido a partir da caldeira auxiliar - [USD/t]; elC - Custo de obtenção de energia elétrica na planta de recuperação de calor - [USD/MWh]; 2elC - Custo de obtenção de energia elétrica na planta a partir da caldeira auxiliar - [USD/MWh]; gnC - custo do gás natural empregado - [USD/kW]; De - Diâmetro externo – [m]; Di - Diâmetro interno– [m]; acE - Energia térmica acumulada nos sais do reservatório térmico – [MJ] combE - Potência suprida pelo combustível empregado – [kW]; f - Fator de anuidade - [1/ano]; H - Número de horas de operação anual da planta – [h/ano]; h - Entalpia em um determinado ponto do ciclo térmico – [kJ/kg]; IPL - Investimento total na planta geradora de energia elétrica - [USD]; crIn - Investimento para aquisição da caldeira de recuperação – [USD]; 16 coIn - Investimento para aquisição do condensador – [USD]; tvIn - Investimento para aquisição da turbina a vapor – [USD]; bIn - Investimento para aquisição da bomba de recirculação – [USD]; rtIn - Investimento para instalação de um acumulador térmico com reserva de 36 minutos nas condições do processo – [USD]; k – tempo de depreciação da planta em anos; Gm - Vazão mássica dos gases quentes para a caldeira de recuperação [t/h]; msal – Massa de sal requerida no acumulador de calor [kg]; . m - Vazão mássica de fluído de trabalho no ciclo térmico - [t/h]; bη - Rendimento da bomba empregada no ciclo térmico – [%]; crη - Rendimento da caldeira de recuperação – [%]; geη - Rendimento do gerador elétrico – [%]; tvη - Eficiência isentrópica da turbina a vapor; PCI – poder calorífico inferior – [kJ/m³]; gasQ . – Fluxo de calor liberado pelos gases de exaustão - [kW]; v Q . – Fluxo de calor requerido pelo vapor - [kW]]; sup . Q - Fluxo de calor requerido pelo superaquecedor da caldeira de recuperação - [kJ/kg]; ev Q . - Fluxo de calor requerido pelo evaporador da caldeira de recuperação - [kW]; eco Q . - Fluxo de calor requerido pelo economizador da caldeira de recuperação - [kW]; cQ . - Fluxo de calor rejeitado no condensador do ciclo térmico – [kW] cald Q . - Fluxo de calor requerido pela caldeira auxiliar do ciclo térmico – [kW] 17 perdasQ . - Fluxo de calor rejeitado para o ambiente na forma de perdas – [kW] r - taxa anual de juros [%]; vr - Razão de vapor por MWh produzido na turbina a vapor – [t/MWh] Si - Distância interna - [m]; inT - Temperatura de entrada do vapor na turbina - [K] . v - vazão volumétrica - [Nm³/h]; salV - Volume de sal do acumulador de calor – [m³]; bW . - Trabalho exercido pela bomba – [kW]; tvW . - trabalho obtido no eixo da turbina a vapor – [MW]; elW . - Potência elétrica obtida na turbina a vapor a partir do vapor obtido na caldeira de recuperação – [MW]; 2 . elW - Potência gerada pela turbina a vapor a partir do vapor obtido na caldeira de recuperação e caldeira auxiliar – [MW]; gasρ - massa específica do gás de exaustão do forno elétrico a arco - [kg/Nm³]; salρ - massa específica do sal utilizado no acumulador de calor - [kg/m³]; T∆ - Diferença de temperatura – [K]. 18 SUMÁRIO 1- INTRODUÇÃO 20 1.1 OBJETIVOS 21 2 – REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 23 2.1 - A ENERGIA NA SIDERURGIA 24 2.2 – A INDÚSTRIA DO AÇO 25 2.3 – AS USINAS MINI-MILLS 31 2.4 – OS FORNOS ELÉTRICOS A ARCO 34 2.5 - SISTEMAS DE DESPOEIRAMENTO EM ACIARIAS ELÉTRICAS 37 2.6 - A RECUPERAÇÃO DE CALOR EM FORNOS ELÉTRICOS A ARCO 43 2.6.1 – AQUECIMENTO DE SUCATAS METÁLICAS A PARTIR DOS GASES DE EXAUSTÃO DO DESPOEIRAMENTO 43 2.6.2 - SISTEMAS DE RECUPERAÇÃO DE ENERGIA BASEADOS EM MUDANÇA DE FASE 47 3 – MATERIAIS E MÉTODOS 51 3.1- DESCRIÇÃO DA MINI-MILL ANALISADA 51 3.2– COLETA DE DADOS 56 3.3 – MÉTODOS 58 3.4 – DESENVOLVIMENTO DO RECUPERADOR DE CALOR EM UM SISTEMA DE DESPOEIRAMENTO DE ACIARIA ELÉTRICA 63 3.4.1 - MODELAGEM DO CICLO DE RECUPERAÇÃO DE CALOR PROPOSTO 72 3.4.1.1– MODELAGEM DO RESERVATÓRIO TÉRMICO UTILIZADO NO CICLO PROPOSTO 3.4.2 – ANÁLISE ECONÔMICA 79 19 4 – RESULTADOS 85 4.1 – DISCUSSÃO DOS RESULTADOS 89 5 – CONCUSÃO 93 6– REFERÊNCIAS 95 20 1- INTRODUÇÃO O uso racional de energia tem se tornado uma prioridade para a indústria no Brasil, principalmente após o racionamento de energia elétrica ocorrido em 2001 e o cenário de níveis extremamente baixos nos reservatórios das usinas hidrelétricas brasileiras em 2014 e 2015. O cenário econômico atual, de alta competitividade na indústria siderúrgica global, tem direcionado empresas à busca incessante por oportunidades que possibilitem reduções de custos de produção. Em decorrência destas necessidades, a aplicação de diferentes técnicas para incrementar o desempenho energético de plantas industriais torna-se prioridade. Os custos com energia representam cerca de 20% do custo total de produção do aço. O carvão e o coque são responsáveis por cerca de 40% da demanda energética da indústria siderúrgica, enquanto o gás natural representa cerca de 30% desta mesma demanda. A composição energética das usinas integradas difere sensivelmente da composição em usinas semi-integradas (conhecidas por mini- mills). Nas integradas, 75% da demanda energética são obtidas a partir de combustíveis fósseis, enquanto nas mini-mills 64% dessa demanda são obtidas através de energia elétrica. Os processos siderúrgicos demandam, invariavelmente, elevadas quantidades de energia elétrica, vapor, combustíveis líquidos e gasosos e até mesmo outros insumos, como o oxigênio, argônio, nitrogênio e ar comprimido (US Environmental Protection Agency, 2007). Quanto aos processos utilizados para a produção de aço, destacam-se o emprego de duas rotas tecnológicas: usinas integradas e semi-integradas (mini- mills). As usinas integradas possibilitam a redução do minério de ferro até ferro-gusa e, a partir deste, a obtenção do aço. As mini-mills caracterizam-se pelo emprego de sucatas metálicas, ferro-gusa ou ferro esponja como matérias-primas, e pela obtenção de diferentes tipos de aço como produto. São caracterizadas também pela grande intensidade de energia elétrica requerida pelo processo de fusão e refino do aço líquido. A obtenção de aço líquido ocorre em unidades denominadas aciarias elétricas, através do emprego de fornos elétricos a arco. Nestes fornos, energia elétrica é convertida em calor, que é transferido para sua carga metálica de modo a atingir temperaturas superiores a 1600ºC. 21 Por não ser baseado em coquerias e altos-fornos, o processo de usinas mini- mills não gera gases combustíveis suficientes para serem empregados em centrais geradoras de energia, tal como é comumente realizado em usinas siderúrgicas integradas. O processo de refino do aço líquido produzido em mini-mills é realizado após o processo de fusão e, especialmente em aços especiais, são necessárias operações de desgaseificação a vácuo para remoção de contaminantes, de modo a atender as restritas especificações do produto acabado. A desgaseificação a vácuo ocorre após a operação de refino, com o aço ainda no estado líquido, e é, em grande parte das usinas, efetuada em equipamentos alimentados com vapor superaquecido. Por questões ambientais e de saúde dos trabalhadores, sistemas de despoeiramento são instalados em aciarias para a remoção de materiais particulados dos fornos elétricos, evitando o desprendimento destes resíduos na atmosfera. Os gases removidos apresentam grandes quantidades de materiais particulados e calor. Com isso, é possível adotar estratégias para recuperação destes materiais particulados e do calor rejeitado. Normalmente as aciarias elétricas brasileiras não dispõem de sistemas de recuperação de calor de seus gases de exaustão, sendo estes apenas rejeitos destes processos siderúrgicos. Há, portanto, expressivo potencial para incremento da eficiência energética e redução de custos operacionais nestas usinas através da recuperação de calor em sistemas de despoeiramento para geração de vapor superaquecido e energia elétrica. 1.1 – OBJETIVOS O objetivo principal deste trabalho é avaliar técnica e economicamente oportunidades de recuperação de calor do sistema de despoeiramento de aciarias elétricas em uma usina mini-mill brasileira. O objetivo principal se desdobra nos seguintes objetivos específicos: - Propor um sistema de cogeração de energia elétrica e vapor superaquecido a partir do calor dos gases de exaustão do sistema de despoeiramento de um forno elétrico a arco; 22 - Avaliar a possibilidade do sistema de cogeração atender a demanda de vapor superaquecido associada às operações de desgaseificação a vácuo da usina; - Avaliar a necessidade de utilização de um reservatório térmico para reduzir a influência do regime de batelada da aciaria elétrica. 23 2 – REVISÃO BIBLIOGRÁFICA No presente capitulo são apresentadas referências baseadas em artigos, publicações, teses ou dissertações correlatas ao objeto deste estudo. Neste capítulo são estruturados tópicos que contemplam questões referentes ao uso e conservação da energia, características de plantas siderúrgicas e, por fim, técnicas aplicadas à recuperação de calor em aciarias elétricas. 2.1 - A ENERGIA NA SIDERURGIA O consumo de energia nos mais diversos mercados tem forte relação com a busca contínua pelo desenvolvimento das sociedades modernas. Entretanto, restrições energéticas e consequentes incrementos de preço tornam-se realidade no mundo atual. Com isso, há uma busca vigorosa por novas fontes de energia e também pelo aumento da eficiência energética nos mais diversos segmentos de consumo. Em termos de escala os consumidores de energia podem ser classificados em dois tipos: grande quantidade de pequenos consumidores individuais; e pequena quantidade grandes consumidores. Os grandes consumidores de energia possuem expressivo potencial de reduções que podem impactar em grandes parques geradores, uma vez que seus respectivos consumos representam grande porção da energia gerada. Estes grandes consumidores têm liderado a aplicação de novas tecnologias para o desenvolvimento de processos mais eficientes. Enquanto isso, os pequenos consumidores se caracterizam pela busca de soluções simples e de baixo custo para a redução de seus respectivos consumos de energia (WORLD STEEL ASSOCIATION, 2014). As indústrias, de um modo geral, se caracterizam por serem grandes consumidores de energia. A indústria do aço se destaca no emprego intensivo de energia em seus processos produtivos. A aplicação de diferentes técnicas para a gestão energética, recuperação de calor e até mesmo cogeração contribuem significativamente para a redução do consumo específico de energia na indústria do aço. Neste cenário a redução na demanda de energia para produção de uma 24 tonelada de aço atinge cerca de 60% desde 1960 (WORLD STEEL ASSOCIATION, 2014). A indústria do aço também pode ser caracterizada por grandes restrições relacionadas ao controle da poluição do ar. As fontes de poluição do ar nas indústrias siderúrgicas são normalmente controladas em função dos gases de exaustão de diferentes tipos de fornos. Para isto, o controle da poluição do ar requer a instalação de grandes sistemas de filtragem, os quais demandam elevados investimentos de capital e aumentam ainda mais as demandas energéticas destas indústrias por unidade de produção (BABOS; MARTEGANI, 1988). As usinas siderúrgicas constituídas por aciarias elétricas possuem o forno elétrico a arco como o principal responsável pelo fornecimento de diferentes formas de energia às matérias-primas que são empregadas. A energia elétrica aplicada ao forno é responsável por cerca de 50% da energia necessária para fusão da carga metálica adicionada ao forno, enquanto as reações químicas exotérmicas que ocorrem no interior do forno são responsáveis por cerca de 40%. O restante é fornecido pela combustão de gás natural e adição de carvão ao banho metálico (STEINPARZER et al., 2014). De acordo com Steinparzer et al. (2014), a energia que efetivamente propicia a fusão da carga metálica é de 365 kWh por tonelada. Ainda segundo os autores, as maiores perdas de energia nos fornos elétricos ocorrem na forma de calor associado aos gases de exaustão do forno, os quais são coletados pelo sistema de despoeiramento. As perdas atribuídas aos gases de exaustão dos fornos elétricos atingem 226 kWh por tonelada de aço (cerca de 30% da energia total adicionada ao forno). A figura 2.1 apresenta um balanço de energia típico, na forma de diagrama de Sankey, de um forno elétrico a arco. 25 Figura 2.1 – Diagrama de Sankey para um forno elétrico a arco Fonte: Adaptado de STEINPARZER et al., 2014. O custo de energia na indústria do aço é significante e, em determinados países, pode atingir até 40% do custo total de produção (World Steel Association, 2014). Nas usinas integradas cerca de 50% da demanda de energia é obtida a partir do carvão e 35% a partir da energia elétrica (World Steel Association, 2014). Com isso, a aplicação de técnicas para aumento da eficiência energética nos processos produtivos torna-se relevante para a redução de custos de produção e aumento da competitividade. Além da redução dos custos operacionais, a busca pelo aumento da eficiência energética fundamenta-se na necessidade de redução de impactos ambientais, tal qual a emissão de gases de efeito estufa. As possibilidades que podem ser exploradas no aumento de eficiência energética dos processos variam em função das características operacionais, rotas de produção, matérias-primas e tipos de aços produzidos. Na cadeia de produção da indústria do aço, importantes demandas de energia são empregadas nas operações de mineração e transporte de matérias-primas – podendo atingir cerca de 8% do total requerido na produção do aço (WORLD STEEL ASSOCIATION, 2014). No ano de 2005, aproximadamente 23% da demanda de energia do setor industrial é requerido pela indústria siderúrgica global. Deste total, cerca de 30% são consumidos por mini-mills – em sua grande maioria por fornos elétricos a arco. Neste cenário, melhorar a eficiência energética dos processos de produção de aço 26 pode contribuir expressivamente para a redução da demanda global de energia e, consequentemente, para a redução dos impactos ambientais associados às atividades industriais. Nos fornos elétricos a arco, até 35% da energia empregada é liberada nos gases de exaustão dos fornos para o sistema de despoeiramento, revelando um grande potencial para recuperação deste calor e aumento da eficiência energética em processos siderúrgicos (BRANDT et al., 2014). A tabela 2.1 apresenta os principais consumidores de energia em processos siderúrgicos integrados e mini-mills. Fonte de Energia Consumidor de Energia Aplicação de energéticos como agente redutor Carvão - Coque e injeção carvão pulverizado em altos fornos Energia elétrica Fornos elétricos a arco, laminadores e motores - Gás natural Fornos, geradores de energia e vapor Injeção de gás em altos fornos Óleo Geradores de vapor Injeção de óleo em altos fornos Em função da potência empregada no forno elétrico a arco e das etapas de processamento da carga metálica, ocorrem consideráveis variações na temperatura instantânea dos gases de exaustão. Neste caso, um perfil de temperatura destes gases é obtido através da coleta dos dados experimentais do processo durante os ciclos de operação do forno elétrico a arco. A figura 2.2 apresenta um exemplo de perfil de temperatura dos gases de exaustão para um forno de 120 toneladas e tempo de processamento de 68 minutos. A obtenção do perfil de temperatura dos gases de exaustão do forno elétrico a arco é fator crítico para o dimensionamento do sistema proposto para recuperação de calor associado a este sistema. A análise do perfil temperatura dos gases de exaustão permite determinar a temperatura média e, Tabela 2.1 – Aplicação de diferentes fontes de energia em processos siderúrgicos (Fonte: Adaptado de WSA, 2014). 27 também, especificar eventual necessidade de um acumulador térmico associado ao sistema de recuperação de calor (NARDIN et al., 2014). Figura 2.2 – Perfil de temperatura dos gases de exaustão durante um ciclo de 68 minutos em um forno elétrico a arco. Fonte: Adaptado de NARDIN et al., 2014. Os gases de exaustão dos fornos elétricos a arco são removidos e resfriados antes de serem filtrados. Antes do processo de resfriamento, os gases de exaustão passam por uma câmara de combustão para queimar frações de monóxido de carbono existentes nestes gases. A combustão do monóxido de carbono é realizada principalmente por questões de segurança das pessoas que trabalham nas instalações da aciaria e despoeiramento. As temperaturas dos gases durante a combustão de monóxido de carbono podem atingir 900ºC. Na câmara de combustão deste sistema não há a injeção de outros gases combustíveis que não sejam os residuais provenientes do sistema de despoeiramento do forno elétrico. Antes da coleta dos gases de exaustão nos filtros, é necessário resfriar os gases até valores abaixo de 130ºC através da troca térmica com água ou ar (BABOS; MARTEGANI, 1988). 28 2.2 – A INDÚSTRIA DO AÇO Nos primórdios, o processo de obtenção do ferro metálico ocorria em fornos primitivos, denominados fornos de lupa. Neste processo, o aquecimento do minério de ferro ocorre a temperaturas inferiores ao seu respectivo ponto de fusão, porém suficientes para retirada das impurezas mais voláteis do minério de ferro. O produto obtido neste processo denomina-se esponja de ferro e é posteriormente conformado de maneira artesanal. O desenvolvimento dos processos de obtenção do ferro metálico permitiu, ainda em seus primórdios, a melhoria das propriedades mecânicas do material, tornando o ferro mais duro e resistente à corrosão. O início da adição de calcário e carvão ao minério de ferro possibilitou melhor absorção das impurezas do minério, elevando as propriedades mecânicas do material obtido. Novas técnicas de aquecimento do minério de ferro também foram desenvolvidas, bem como o desenvolvimento dos processos e equipamentos destinados a conformação do ferro esponja fundido. Em torno de 1444, o minério de ferro passa a ser fundido em altos-fornos, processo largamente utilizado até os dias de hoje. As temperaturas obtidas nesses fornos permitem a maior absorção de carbono do carvão vegetal ao ferro líquido, obtendo-se ferro mais duro e resistente. No primeiro alto-forno desenvolvido, a produção diária de ferro era de cerca de 1500 kg. Especialmente a partir do século XVIII, o processo de produção do ferro passa por constantes evoluções, principalmente em termos de produção diária e qualidade do material produzido. A indústria moderna do aço é fortemente correlacionada às atualizações tecnológicas e culturais iniciadas a partir da Revolução Industrial, no século XVIII. Nesse período, comunidades agrárias e rurais começam a migrar para sociedades urbanas e mecanizadas, provocando forte crescimento da demanda pelo aço e, consequentemente, o desenvolvimento de novas tecnologias de produção para o abastecimento deste crescente mercado. Com isso, a indústria do aço se difunde rapidamente na Europa e Estados Unidos. No início do século XX, os Estados Unidos assumem o posto de maior produtor mundial de aço, através do aumento de escala em sua produção como resultado da construção de altos fornos cada vez 29 maiores. O período seguinte ao final da segunda guerra mundial apresenta aumento da expansão da produção mundial de aço, enquanto as crises do petróleo provocam desaceleração deste crescimento na década de 1970. No início do século XXI o crescimento da produção mundial de aço é impulsionado pela expansão econômica chinesa. A figura 2.3 exibe a variação da produção mundial do aço na segunda metade do século XX e primeira década do século XXI. Figura 2.3: Evolução da mundial de aço nas últimas décadas Fonte: LOPES, 2011. A indústria siderúrgica dos Estados Unidos é pioneira no emprego de usinas siderúrgicas do tipo mini-mills, com o objetivo de buscar maior flexibilidade em seus processos e propiciar a reciclagem de sucatas metálicas. As mini-mills utilizam fornos elétricos a arco para fusão de sucatas metálicas e elementos de liga para obtenção de diferentes tipos de aço. Estas unidades são caracterizadas por menores escalas de produção e projetadas para atendimento de mercados regionais. Ao contrário dos altos fornos, as mini-mills não utilizam diretamente o minério de ferro como matéria prima. A figura 2.4 apresenta a evolução da participação das mini-mills na matriz de produção de aço dos Estados Unidos, destacada no gráfico pela rota forno elétrico a arco. Em termos nominais, a produção total de aço nos Estados Unidos sofre leve variação negativa durante o período exibido no gráfico, enquanto ocorre evolução na participação de produção a partir das mini-millls. 30 Figura 2.4: Produção de Aço nos Estados Unidos da América em função das principais rotas de produção Fonte: STUBBLES, 2006. O aço continua sendo um importante material para o desenvolvimento das sociedades devido a sua abundância e baixo custo, além de propriedades mecânicas que possibilitam sua aplicação estrutural em obras de infraestrutura, transportes e equipamentos industriais. Segundo a World Steel Association (2014), a China atinge em 2014 aproximadamente 50% da capacidade de produção mundial de aço. Figura 2.5: Evolução da produção mensal de Aço no mundo Fonte: WORLD STEEL ASSOCIATION, 2014. Produção Mundial de Aço 31 2.3 – AS USINAS MINI-MILLS As usinas siderúrgicas do tipo mini-mill são projetadas para produção de aços para atender mercados das regiões onde estão instaladas, devido à menor escala de produção quando comparadas às usinas integradas. Geralmente, as sucatas metálicas utilizadas nos processos das mini-mills também são geradas em regiões próximas a estas usinas. Além disto, as mini-mills diferenciam-se das usinas siderúrgicas integradas em função de fontes de energia e matérias-primas empregadas no processo de produção do aço. De maneira geral, a obtenção do aço nas mini-mills é realizada a partir do emprego de sucatas metálicas e ferro-gusa, os quais são utilizados como matérias-primas em aciarias. Enquanto isso, em uma siderúrgica integrada, a obtenção do ferro-gusa é realizada através de reações de óxido-redução do minério de ferro em presença de carvão aquecido ao rubro, em equipamentos denominados altos-fornos. O ferro-gusa obtido é processado em aciarias para a obtenção de diferentes tipos de aço (BRANDT et al., 2014). De acordo com Chevrand (2008), a produção de aços em mini-mills constitui importante alternativa para a reciclagem de sucatas metálicas. Com isso, é possível a transformação de sucatas metálicas em produtos semiacabados, e posteriormente, em manufaturados. Segundo o autor, em termos gerais, os principais componentes do processo de fabricação nas mini-mills são: o Fornos elétricos a arco e fornos panela; o Sistema de despoeiramento dos fornos elétricos; o Silos de estocagem de ligas e fundentes; o Pátio de ligas e fundentes; o Pátio de sucatas; o Panelas de aço; o Lingotamentos; o Pontes rolantes; o Estações de desgaseificaçao a vácuo; o Centrais de utilidades. 32 Na maior parte dos casos, as mini-mills operam a partir de aciarias elétricas. Nestas aciarias, a área de pátio de sucatas é destinada ao processamento, preparação da carga metálica conforme tipo de aço a ser produzido e carregamento do forno elétrico a arco. O forno elétrico a arco é responsável pela fusão da carga metálica, remoção da escória sobrenadante e, consequente, equalização da temperatura para vazamento do aço líquido. Após o processo de fusão da carga metálica no forno, o aço líquido é vazado em uma panela com revestimento refratário, que, por sua vez, é transportada ao forno panela para operação de refino e ajuste de temperatura do aço líquido para posterior conformação mecânica no lingotamento. De acordo com as especificações do aço a ser obtido, o equipamento de desgaseificação a vácuo é empregado para remoção de contaminantes. O processo de desgaseificação a vácuo consiste em um método necessário para a remoção de gases dissolvidos em uma solução liquida (neste caso, aço líquido). O princípio de remoção dos gases ocorre em função da diminuição da pressão no interior do recipiente que contém a solução, reduzindo a solubilidade do gás no meio líquido. Assim, durante o processo de desgaseificação a vácuo, os gases são removidos do meio líquido (aço). Após a operação de desgaseificação, a pressão do recipiente é equalizada com a pressão atmosférica. A figura 2.6 ilustra um equipamento destinado ao processo de desgaseificação a vácuo do aço líquido obtido no forno panela. Neste processo, uma panela contendo aço líquido é inserida no desgaseificador, que é fechado hermeticamente. A linha de exaustão é utilizada para a retirada dos gases removidos do aço líquido. A obtenção do vácuo nos desgaseificadores utilizados em aciarias é, comumente, realizada através do emprego de vapor superaquecido de média pressão. 33 Figura 2.6: Representação de um Desgaseificador a Vácuo Fonte: Adaptado de SOUZA, 2007. O fluxograma ilustrado na figura 2.7 representa os processos de produção de uma aciaria elétrica com dois fornos elétricos a arco e um sistema de despoeiramento que opera em função de ambos os fornos elétricos. Após o processo de desgaseificação é possível à conformação do aço líquido em dois lingotamentos distintos. A forma geométrica do material semiacabado obtido nos lingotamentos é distinta. Enquanto no lingotamento contínuo são obtidos tarugos de perfil quadrado, no lingotamento convencional são obtidos blocos de dimensões superiores, denominados lingotes. Figura 2.7: Fluxograma de uma mini-mill. Fonte: Adaptado de SOUZA, 2007. 34 Os tarugos e lingotes produzidos em aciarias são destinados a processos subsequentes de conformação mecânica para obtenção de materiais com propriedades mecânicas e formas geométricas que possibilitem a aplicação em diversos tipos de indústrias. A Figura 2.8 apresenta um fluxograma simplificado da produção de aço em uma usina semi-integrada. Figura 2.8: Fluxograma simplificado de uma aciaria elétrica Fonte: Adaptado de SOUZA, 2007. 2.4 – OS FORNOS ELÉTRICOS A ARCO Em uma usina siderúrgica, a área de aciaria é responsável pela produção e conformação mecânica do aço produzido. A fabricação de aço através do emprego de sucata metálica e ferro-gusa em fornos elétricos a arco constitui um processo denominado semi-integrado. As matérias-primas utilizadas em uma aciaria elétrica são compostas por ferro-gusa ou ferro esponja, fundentes e fluxantes para formação da escória, a qual é responsável pela remoção de impurezas presentes no aço líquido. Os fornos elétricos a arco têm sido utilizados nas siderúrgicas modernas como vasos fusores, isto é, responsáveis pela fusão da carga metálica. O refino do 35 aço líquido (ajustes de composição química e de temperatura), por sua vez, tem sido realizado em equipamentos denominados fornos panela, os quais são mais eficientes em termos energéticos e operacionais (Souza, 2007). O desenvolvimento do primeiro forno elétrico a arco se deu na França, em 1899, mas os Estados Unidos destacam-se como o berço do desenvolvimento desta rota tecnológica. Em 1909, a empresa US Steel instalou o primeiro forno elétrico de uso comercial. Porém, a oferta de energia impede o sucesso imediato desta tecnologia. Por volta da década de 1930, a utilização industrial dos fornos elétricos a arco é novamente explorada pela empresa norte-americana Northwestern Steel and Wire Company, mas a oferta de sucata se constituiu numa barreira para a expansão da tecnologia naquela ocasião. Apenas nos anos 1960 a tecnologia do forno elétrico tem uma difusão significativa, consolidando a produção de aço pela rota tecnológica semi-integrada. O princípio de funcionamento de um forno elétrico a arco é baseado na transferência de calor de um arco elétrico, produzido no interior de um cesto metálico com revestimento refratário, até uma carga metálica composta por sucata metálica e elementos de liga. A fonte de energia elétrica do forno é conectada a eletrodos de grafite, os quais são responsáveis pela geração do arco elétrico no interior do forno. O dimensionamento dos fornos elétricos a arco compreende a instalação de sistemas elétricos de alta potência, podendo superar os 100 MW. No interior do forno, a carga metálica atinge temperatura com valores próximos a 1600ºC, propiciando a fusão da carga metálica e obtenção de aço líquido. O arco elétrico é obtido pela excitação dos eletrodos no interior do forno elétrico e pode atingir temperaturas de 3500º C. Além da energia térmica gerada pelo arco elétrico, a instalação destes fornos pode requerer a utilização de aquecedores a gás natural e oxigênio. O oxigênio, além de oxidante da reação de combustão de gás natural, é utilizado para oxidação de elementos químicos indesejáveis na obtenção do aço líquido. Por questões ambientais e de saúde dos trabalhadores, os fornos possuem sistemas de coleta dos gases originados durante operação, sendo estes denominados sistemas de despoeiramento (BRANDT et al., 2014). A figura 2.9 apresenta um diagrama esquemático típico um forno elétrico a arco, contemplando os pontos de entrada de matérias-primas e utilidades e saídas de aço líquido, escória e gases de exaustão do forno. 36 Figura 2.9: Representação dos principais componentes de um forno elétrico a arco Fonte: Adaptado de BRANDT et al., 2014. A operação de um forno elétrico a arco inicia-se com o carregamento de cal em seu interior, com a finalidade de recobrir sua base interna e minimizar eventuais danos aos refratários em função de impactos da carga metálica a ser adicionada ao forno. Em seguida, ocorre a adição de sucata metálica e elementos de liga. Ao final do processo de carregamento, eletrodos de grafite conectados à fonte de energia elétrica são inseridos no forno. Arcos elétricos formados entre os eletrodos aquecem a carga metálica até sua fusão. O oxigênio presente na sucata metálica e em óxidos contidos nos elementos de liga, ou ainda o oxigênio injetado no forno durante o processo de desoxidação, produz efervescência no banho líquido. A efervescência é controlada com o objetivo de remover elementos prejudiciais à qualidade do aço, tais como fósforo, nitrogênio e inclusões não metálicas. Ao final do processo, a escória sobrenadante é retirada do forno, deixando o aço líquido pronto para ser removido (SOUZA, 2007). O aço líquido é transportado para o forno panela, onde ocorre o ajuste de composição química e equalização de temperatura do aço para posterior conformação mecânica no lingotamento contínuo. De acordo com o tipo de aço obtido, é necessário emprego do processo de desgaseificação a vácuo antes do ajuste de temperatura para conformação (BRANDT et al., 2014). 37 2.5 – SISTEMAS DE DESPOEIRAMENTO EM ACIARIAS ELÉTRICAS Os sistemas de despoeiramento são instalados em aciarias para captação e filtragem de poeiras e materiais particulados gerados no processo de carregamento e fusão de cargas metálicas. A instalação destes sistemas consiste em fator crítico para o atendimento das legislações ambientais e de saúde dos trabalhadores de aciarias (NARDIN et al., 2014). Os equipamentos destinados à exaustão de gases dos fornos elétricos a arco são usualmente denominados sistemas de despoeiramento. A figura 2.10 apresenta um diagrama esquemático típico de um sistema de despoeiramento. Neste caso, o escoamento dos gases de exaustão do forno é realizado através de três exaustores que direcionam o fluido para um sistema de filtragem, localizado após um ciclone axial que remove material particulado dos gases. A exaustão forçada dos gases do interior do forno provoca a transferência de grandes quantidades de calor para os gases de exaustão (NARDIN et al., 2014). Figura 2.10 – Diagrama esquemático de um sistema de despoeiramento Fonte: Adaptado de NARDIN et al., 2014. Os sistemas de despoeiramento são basicamente compostos por exaustores, dutos, sistemas de resfriamento dos gases e casas de filtros. Os exaustores coletam os gases de exaustão dos fornos, transportando-os até a casa de filtros através de dutos. As condições operacionais dos fornos fazem com que haja frequentes variações na vazão mássica dos gases de exaustão, sendo necessária a instalação 38 de válvulas de controle nos dutos de exaustão. Devido aos requisitos de segurança dos filtros utilizados, os gases de exaustão dos fornos elétricos a arco devem ser resfriados antes de entrarem na casa de filtros. A temperatura dos gases na entrada dos filtros não deve exceder 130ºC. O resfriamento dos gases de exaustão é normalmente realizado com água industrial (KICKINGER et al., 1999). A figura 2.11 ilustra a operação de um sistema de exaustão mostrando os vetores do fluxo de massa entre o forno e a coifa de captação. Figura 2.11 - Representação dos vetores de fluxo mássico formados na aspiração do despoeiramento Fonte: KICKINGER et al., 1999. A operação de um forno elétrico a arco gera grandes quantidades de materiais particulados e poeira nas diferentes etapas de produção, os quais são transportados através dos gases de exaustão do forno. Na etapa de carregamento da carga metálica, ocorre grande liberação de gases devido à combustão de resíduos de óleo e materiais voláteis contidos na sucata. Durante a fusão da carga metálica, ocorre à liberação de gases de exaustão devido à injeção de oxigênio e elementos de liga no interior do forno. 39 Usualmente, o sistema de despoeiramento é composto por duas partes, sendo estas: sistema de sucção primário e sistema de sucção secundário (KNOTH; RUMMLER; DONINGER, 1999). O sistema de sucção primário é responsável pela captação dos gases de exaustão durante operação do forno elétrico com a tampa fechada, enquanto o sistema de sucção secundário é responsável pela captação dos gases de exaustão durante adição de carga metálica no forno, a qual ocorre com a tampa aberta. O sistema de exaustão secundário é normalmente instalado no teto da aciaria, formando uma coifa capaz de coletar os gases de exaustão que saem do forno elétrico a arco, como ilustrado anteriormente na figura 2.11 (KNOTH; RUMMLER; DONINGER, 1999). A figura 2.12 representa a instalação do cotovelo de exaustão do sistema primário em um forno elétrico a arco. A captação dos gases de exaustão do forno é responsável por evitar o escape destes nas instalações da edificação da aciaria. Ao aspirar gases do forno, o sistema de exaustão acaba por remover calor do forno, constituindo-se, portanto, em uma etapa crítica para a eficiência energética do processo produtivo. Figura 2.12: Curva de captação do sistema de exaustão primário Fonte: SIEMENS VAI, 2006, p.10. A operação de aciarias elétricas consiste na obtenção periódica de grandes massas de aço líquido em fornos elétricos a arco, que trabalham em regime de bateladas. Em cada batelada, ocorre a abertura da tampa do forno para adição fracionada de cargas metálicas e, por fim, retirada do aço líquido obtido. A captação dos gases de exaustão do forno com a tampa aberta é feita pelo sistema de 40 exaustão secundário, normalmente instalado em coifas no teto da edificação da aciaria. A figura 2.13 mostra um forno elétrico a arco durante o processo de carregamento de carga metálica e a consequente liberação de gases de exaustão. Neste momento, os sistemas de exaustão primário e secundário permanecem em operação. Figura 2.13: Gases de exaustão gerados durante carregamento de um forno elétrico a arco coletados pelo sistema de sucção secundário Fonte: SIEMENS VAI, 2006, p.10. A instalação do sistema de despoeiramento compreende longos segmentos de dutos de elevados diâmetros, interligando os pontos de captação primária e secundária do forno aos sistemas de combustão e, posteriormente, resfriamento e filtragem. A figura 2.14 exibe uma vista superior das instalações externas de um sistema de despoeiramento de uma mini-mill brasileira. 41 Figura 2.14: Vista superior dos dutos de exaustão de um despoeiramento Fonte: ACOSTA, 2003. A concepção do projeto e instalação de sistemas de despoeiramento deve considerar parâmetros operacionais e técnicos, tais quais: produtividade do forno, tipos de cargas metálicas empregadas, dimensões dos fornos e acessórios, restrições ambientais, entre outras. Os limites de emissões em aciarias são definidos e regulados por autoridades ambientais e legislações específicas ao redor do mundo. A operação do sistema deve atender os requisitos técnicos e ambientais com o menor emprego de capital inicial e operacional. As principais restrições a serem consideradas no projeto são o dimensionamento dos exaustores e volume dos filtros empregados. Além disso, a operação do equipamento deve buscar um compromisso entre a maior retirada possível de gases (para atender as legislações ambientais) e a menor retirada possível de calor do forno (para manter o processo energeticamente eficiente) (KNOTH; RUMMLER; DONINGER, 1999). O aumento do regime de operação do forno elétrico a arco impõe duas restrições técnicas ao sistema de despoeiramento. A primeira restrição ocorre devido ao aumento da temperatura média dos dutos, cotovelos e coifas de exaustão, requerendo ajustes no sistema de resfriamento com água industrial para evitar danos estruturais. A segunda restrição refere-se ao aumento da formação dos gases de exaustão e escape destes no interior da edificação da aciaria, sendo necessário aspirá-los pela coifa e sistema de exaustão secundário. Ambas as restrições devem ser modeladas e consideradas para o correto dimensionamento do sistema. Além das restrições técnicas, o dimensionamento e operação do sistema devem considerar pontos adequados para o atendimento das legislações ambientais com a 42 menor retirada possível de calor do forno elétrico a arco pelo sistema de despoeiramento. O aumento da retirada de calor do forno reduz da eficiência energética do processo, com impactos diretos no custo operacional e no tempo de fusão da carga metálica no interior do forno (KNOTH; RUMMLER; DONINGER, 1999). Os gases de exaustão, após serem captados do forno elétrico a arco, são direcionados para a câmara de combustão. A velocidade dos gases na câmara de combustão não deve exceder 10 m/s, de modo a evitar o arraste para os filtros de particulados sólidos presentes nos gases de exaustão. Baixas velocidades de escoamento proporcionam a sedimentação de sólidos no interior da câmara, que deve possuir um volume útil capaz de armazenar os sólidos sedimentados por até duas semanas. Assim, minimizam-se as interrupções do forno elétrico para limpeza do interior da câmara. Além disso, os traços de monóxido de carbono presentes nos gases de exaustão são queimados no interior da câmara, evitando riscos de segurança das pessoas que acessam as instalações do despoeiramento (ACOSTA, 2003). As figuras 2.15 e 2.16 possibilitam a visualização das instalações externa e interna de uma câmara de combustão. O resfriamento das paredes da câmara é realizado para minimizar a degradação térmica destas. Neste caso, o resfriamento é realizado através da recirculação de água industrial em tubos instalados em contato com o interior das paredes da câmara de combustão. A água industrial utilizada no resfriamento da câmara de combustão é direcionada para uma torre de resfriamento antes de ser bombeada novamente para o resfriamento da câmara de combustão. Figura 2.15: Câmara de combustão de um sistema de despoeiramento Fonte: ACOSTA, 2003. 43 Figura 2.16: Vista dos tubos internos utilizados para resfriamento da câmara de combustão. Fonte: ACOSTA, 2003. 2.6 - A RECUPERAÇÃO DE CALOR EM FORNOS ELÉTRICOS A ARCO Fornos elétricos a arco apresentam expressivo potencial para recuperação de calor na indústria siderúrgica. Do ponto de vista técnico-operacional, esta recuperação de calor pode contribuir para a redução de custos de produção através do aumento da eficiência energética e, também, redução do consumo de água para resfriamento dos gases de exaustão. Dentre as diferentes aplicações para o calor recuperado dos fornos elétricos, destacam-se: aquecimento de água de processo; pré-aquecimento de ar de combustão em processos siderúrgicos; geração de vapor superaquecido, tanto para consumo industrial como para geração de energia elétrica; e pré-aquecimento de sucatas metálicas (BABOS; MARTEGANI, 1988). 2.6.1 – AQUECIMENTO DE SUCATAS METÁLICAS A PARTIR DOS GASES DE EXAUSTÃO DO DESPOEIRAMENTO A recuperação de calor nos gases de exaustão dos fornos elétricos a arco pode ser combinada com o pré-aquecimento de cargas metálicas utilizadas como matérias-primas nos próprios fornos. Com isso, a transferência de calor sensível do arco elétrico para a carga é menor, resultando em um tempo menor até que a carga 44 atinja o ponto de fusão. O tempo de operação menor implica em menor consumo de energia elétrica. Segundo Babos e Martegani (1988), a aplicação do pré-aquecimento da sucata metálica pode reduzir entre 2,5 a 7,5% do consumo de energia elétrica dos fornos elétricos. Além da redução do consumo de energia, outros benefícios podem ser obtidos, tais como: redução do tempo de fusão, redução do consumo de eletrodos de grafite e redução do consumo de gás natural. Um pré-aquecimento da sucata à 400ºC pode ser responsável por um aumento de 6,1% na produção horária do forno e redução de 3,0% no consumo de eletrodos. A principal desvantagem associada ao pré-aquecimento é a oxidação de parte da sucata metálica antes do carregamento do forno, com perdas de matéria-prima que podem atingir 0,5% durante a exposição a temperaturas dos gases de exaustão de 950ºC. O percentual de oxidação aumenta de modo diretamente proporcional com a temperatura dos gases de exaustão do forno. Além disso, outra fonte de preocupação ocorre devido à necessidade de sincronismo dos tempos de pré- aquecimento com os tempos de carregamento do forno, tornando a operação da aciaria mais complexa (BABOS; MARTEGANI, 1988). A temperatura média da sucata metálica pode atingir valores próximos a 400ºC ao final do ciclo de pré-aquecimento. Esta variável é função da temperatura média dos gases de exaustão, da composição química da sucata, do tempo de aquecimento e da vazão mássica destes gases. Em sua pesquisa, Babos e Martegani (1988) obtém um perfil de temperaturas dos gases e da sucata metálica, onde foi possível atingir valores médios de 400ºC na sucata após 30 minutos de aquecimento do cesto contendo sucata metálica. Este tempo constitui um parâmetro crítico do processo, pois deve estar ajustado com o tempo médio de alimentação do forno com sucata metálica. A figura 2.17 mostra os perfis de temperatura dos gases de exaustão e da sucata metálica conforme dados obtidos por Babos e Martegani (1988). 45 Figura 2.17 – Curvas de temperatura dos gases de exaustão e temperatura da sucata metálica em função do tempo de corrida no forno elétrico Fonte: BABOS e MARTEGANI, 1988. No trabalho de Babos e Martegani (1988), o sistema de pré-aquecimento de sucata é composto por duas estações de aquecimento. Durante o ciclo normal de operação do forno elétrico a arco, os cestos com sucatas metálicas pré-aquecidas são retirados alternadamente das estações de aquecimento e transportados até o forno, que é carregado com até quatro cestos de sucata em uma mesma corrida. Em casos de manutenção nas estações de pré-aquecimento, válvulas de bloqueio são acionadas, sendo possível desviar toda a exaustão diretamente para o sistema de despoeiramento. A figura 2.18 exibe um esquema do sistema de pré-aquecimento proposto, enquanto a figura 2.19 possui detalhes do leiaute do sistema. 46 Figura 2.18 – Representação das tubulações e acessórios que compõem o sistema de pré- aquecimento Fonte: BABOS e MARTEGANI, 1988. Figura 2.19 – Layout do sistema de pré-aquecimento de sucatas metálicas através da recuperação dos gases de exaustão de forno elétrico composto por dois cestos Fonte: BABOS E MARTEGANI, 1988. 47 2.6.2 - SISTEMAS DE RECUPERAÇÃO DE ENERGIA BASEADOS EM MUDANÇA DE FASE O calor dos gases de exaustão dos fornos elétricos a arco pode ser recuperado para a geração de energia elétrica a partir de um ciclo Rankine, para a obtenção de vapor de processo para plantas siderúrgicas e para aquecimento de água ou matérias-primas do processo siderúrgico. Entretanto, a acentuada variação da temperatura dos gases de exaustão ao longo do tempo torna a recuperação de calor um desafio. Com isso, diferentes técnicas têm sido avaliadas para minimizar os efeitos da variação de temperatura em processos de recuperação do calor associado aos gases de exaustão de fornos elétricos a arco. O emprego de acumuladores de calor, ou reservatórios térmicos, surge como uma alternativa necessária em função desta restrição de processo. Neste caso, um trocador de calor pode ser instalado na câmara de combustão do sistema de despoeiramento para recuperar o calor do sistema de exaustão. Em princípio, este calor recuperado pode gerar vapor superaquecido. A fonte de calor é obtida a partir da vazão mássica dos gases de exaustão do forno e é conectada a um sistema de acumulação de calor para compensar os efeitos transientes do processo produtivo. O sistema de recuperação de calor deve ser capaz de gerar vapor superaquecido durante todas as etapas operacionais padronizadas de um forno elétrico a arco. Em casos de interrupções prolongadas para manutenção do forno, o sistema de geração de vapor deve ser paralisado. 48 Figura 2.20– Layout do material PCM no sistema de exaustão de gases do forno elétrico a arco Fonte: NARDIN et al., 2014. A partir dos dados de temperatura dos gases de exaustão do forno e, consequentemente, da temperatura média determinada, do custo do investimento e da aplicação deste processo é desenvolvido um projeto para recuperação de calor com acumulador térmico. Neste caso, células cilíndricas de alumínio revestidas por aço inox são utilizadas para o acúmulo de calor. No instante em que a temperatura dos gases está acima da temperatura média determinada ocorre a alimentação do sistema com energia suficiente para a geração de vapor e para a fusão do alumínio contido nas células. Nos instantes em que a temperatura dos gases de exaustão estiver abaixo da temperatura média determinada ocorre a liberação de energia das células cilíndricas, através do calor latente do alumínio das células. O calor liberado pelas células cilíndricas é somado ao calor contido na vazão de gás e é suficiente para manter a produção de vapor superaquecido no sistema (NARDIN et al., 2014). No desenvolvimento de seu projeto, Nardin et al. (2014) considera a aplicação de diferentes materiais e dimensões para o sistema de acumulação de calor. Os materiais do revestimento dos acumuladores de calor são selecionados para possibilitar maior resistência mecânica ao escoamento de gases com elevados teores de materiais particulados e menor resistência térmica. Os materiais utilizados 49 para o acumulador são selecionados em função do calor latente e efetiva fusão nas temperaturas operacionais do processo, de tal modo que o acumulador possa fornecer calor quando a temperatura instantânea dos gases for menor que a temperatura média estabelecida e armazenar calor quando a temperatura instantânea dos gases for maior que a média estabelecida. Por fim, as geometrias dos componentes do sistema de recuperação de calor são analisadas. Com isso, é possível determinar um perfil de temperatura para o sistema com diferentes materiais empregados no acumulador térmico e nas distintas condições operacionais do forno elétrico a arco, bem como selecionar os materiais mais eficientes. A utilização do recuperador de calor com acumulador de calor é simulada em diferentes configurações, as quais têm seus dados medidos e ilustrados na figura 2.21. A seleção da configuração adequada do recuperador de calor é realizada em função da maior estabilidade de temperatura do recuperador de calor de acordo com a operação do forno elétrico a arco. Figura 2.21 – Perfis de temperatura em função dos tipos de acumuladores de calor Fonte: NARDIN et al., 2014. A figura 2.22 exibe o arranjo das células cilíndricas utilizadas no acumulador proposto. 50 Figura 2.22 – Layout do arranjo utilizado no reservatório térmico do recuperador de calor proposto. (a) Representação das dimensões unitárias do cilindro utilizado para reserva de calor. (b) Representação das dimensões do arranjo de cilindros utilizado para constituição do acumulador de calor proposto Fonte: NARDIN et al., 2014. O recuperador de calor, quando instalado no sistema de despoeiramento, deve ser projetado para amenizar o incremento da perda de carga do sistema de exaustão, mantendo as condições operacionais de exaustão dos materiais particulados das áreas operacionais da aciaria elétrica. Um efeito desejável que pode ser obtido com a instalação de um recuperador de calor no sistema de despoeiramento é o incremento da separação de material particulado no interior da câmara de combustão. O aumento da separação do material particulado na câmara de combustão é proporcional à alteração no regime de escoamento dos gases em função da resistência ao escoamento dos gases de exaustão devido ao contato destes com as paredes externas do recuperador de calor. Neste caso, para permitir a remoção mecânica do material sedimentado no piso da câmara de combustão o recuperador de calor deve ter suas dimensões reduzidas, restando cerca de 2,0 m de altura entre a cota zero e o limite inferior do recuperador (NARDIN et al., 2014). 51 3 – MATERIAIS E MÉTODOS O capítulo 3 é organizado como segue. Em um primeiro momento, são apresentadas características da unidade siderúrgica analisada. Em seguida, são apresentados materiais e metodologias utilizados para a coleta e tratamento dos dados coletados no processo analisado, os quais possibilitam a determinação de características técnicas fundamentais ao desenvolvimento do ciclo térmico proposto neste trabalho. A definição e a modelagem dos componentes do ciclo térmico proposto são apresentadas ao longo deste capítulo. Por fim, são calculados parâmetros técnico-econômicos da planta de recuperação de calor proposta nesta dissertação. 3.1 - DESCRIÇÃO DA MINI-MILL ANALISADA Em uma mini-mill brasileira localizada no interior de São Paulo, o aço líquido é produzido em um forno elétrico a arco e refinado em um forno panela. O forno elétrico desta planta possui capacidade nominal de 90 toneladas de aço e potência elétrica de 45 MVA. O forno panela é combinado com uma estação de desgaseificação a vácuo para remover contaminantes do aço e, consequente, atender às restritas especificações do produto acabado. A desgaseificação a vácuo requer a aplicação de vapor superaquecido e é feita a partir de cinco estágios de ejetores que demandam vazões de até 16 t/h de vapor (pressão nominal de geração de vapor superaquecido de 1,50 MPa e temperatura mínima de 473 K). Nesta planta, o vapor superaquecido também é utilizado no aquecimento de soluções ácidas destinadas a decapagem química de bobinas de aço semiacabadas. Este processo demanda até 6 t/h de vapor à 1,2 MPa. O forno elétrico desta usina é capaz de processar uma corrida (batelada) a cada 100 minutos. A operação do forno é realizada através de carregamentos sequentes com sucata metálica e cal. Em condições normais, cada corrida necessita de 3 cestos de sucata, carregados a medida que o forno funde toda a sucata metálica adicionada no cesto anterior. O aço líquido obtido no forno é transportado até o forno panela para ajustes de composição química e temperatura. Por fim, o 52 aço líquido é direcionado a uma estação de vácuo e submetido a pressões absolutas de até 100 Pa, com tempos de vácuo variando em função da composição química e aplicações posteriores do aço. O aço líquido obtido após o processo de desgaseificação é transportado em panela até a área de lingotamento contínuo, onde o aço é solidificado e conformado em perfis de seção quadrada, denominados tarugos. A estação de desgaseificação a vácuo opera cerca de 30 minutos por hora. O desgaseificador a vácuo da unidade é composto por ejetores de vapor em série. O princípio de funcionamento dos ejetores de vapor é baseado na conversão da energia potencial do vapor em energia motriz (alta velocidade no interior do ejetor) proporcionando a sucção dos gases contidos no aço líquido. O vapor utilizado na entrada do ejetor deve ser superaquecido para evitar a condensação na entrada da câmara de sucção, evitando a redução da sucção dos gases do desgaseificador (HEAT EXCHANGE INSTITUTE, 2012). O controle da temperatura e pressão do vapor tem impacto direto no desempenho operacional dos ejetores. Segundo a (HEAT EXCHANGE INSTITUTE, 2012) o vapor com título menor que 0,97 pode provocar sensível incremento na taxa de desgaste dos bicos dos ejetores, acarretando em perdas no processo do desgaseificador. A figura 3.1 apresenta a ilustração de um ejetor de vapor do desgaseificador a vácuo. Figura 3.1: Representação de um ejetor de vapor Fonte: HEAT EXCHANGE INSTITUTE, 2012. 53 Em um ejetor de vapor a razão entre a pressão absoluta na descarga e a pressão absoluta na entrada da câmara de sucção é definida como taxa de compressão. Esta taxa é um parâmetro crítico para o projeto e operação do desgaseificador a vácuo. A utilização de ejetores em série permite a obtenção de maior taxa de compressão. A figura 3.2 exibe alterações de pressões típicas em diferentes pontos de um ejetor. Figura 3.2: Variações de pressões no interior de um ejetor de vapor. Fonte: HEAT EXCHANGE INSTITUE, 2012. A figura 3.3 exibe um sistema de desgaseificação com 5 estágios de ejetores em série, tal qual o equipamento que opera na planta analisada no presente trabalho. Os estágios são conectados e a saída de cada estágio alimenta o seguinte. Após cada estágio ocorre o resfriamento dos gases que saem do estágio anterior. Em cada estágio ocorre a alimentação da câmara de sucção dos ejetor com vapor superaquecido. 54 Figura 3.3: Esquema de operação com ejetores em série com 5 estágios. Fonte: HARRIS, 2005. A central de geração de vapor da planta deve garantir uma distribuição de vapor superaquecido a temperaturas e pressões estáveis em conformidade com a especificação do desgaseificador a vácuo. As linhas de distribuição de vapor possuem purgadores para drenagem de residuais de condensados que ocasionalmente podem ocorrer no interior das tubulações, especialmente em paradas da caldeira ou do desgaseificador. A aciaria desta usina possui um sistema de despoeiramento para o forno elétrico e um sistema de despoeiramento para o forno panela. Os sistemas de despoeiramento não possuem sistemas destinados à recuperação de calor do processo. Os materiais particulados contidos nos gases de exaustão dos fornos são resfriados com água e escoados até elementos filtrantes do tipo manga. Ao final do processo de filtragem, o material removido dos filtros e descarregado em caçambas 55 de aço. O material obtido no despoeiramento pode ser reaproveitado em processos siderúrgicos e de outras indústrias, como a de construção civil. O sistema de despoeiramento é acionado por dois motores de 1250 kW. O procedimento de limpeza da câmara de combustão do sistema de despoeiramento consiste na remoção semanal dos sólidos sedimentados no piso da câmara com pás mecânicas, durante paradas do forno para manutenção preventiva. O sistema de geração de vapor da usina é composto por duas linhas de distribuição de vapor superaquecido, as quais são alimentadas por duas caldeiras aquatubulares de 20 t/h e 2,2 MPa. A linha de alimentação do desgaseificador a vácuo necessita de vazões instantâneas de vapor superaquecido de até 20 t/h durante operação (com pressão de 1,5 MPa e temperatura mínima de 473 K). Uma linha de distribuição secundária de vapor é utilizada para aquecimento de tanques de soluções ácidas, destinadas a decapagem química de bobinas de aço. As linhas de distribuição de vapor possuem válvulas redutoras de pressão em cada um dos dois consumidores. Originalmente, a linha foi projetada para atender também o processo de pré-aquecimento de óleo combustível pesado e uma estação de vácuo desativada em meados da década de 90. Estes consumidores foram desativados após atualizações tecnológicas dos processos da unidade. A figura 3.4 apresenta o fluxograma de geração e distribuição de vapor da unidade. Figura 3.4: Fluxograma da central utilidades da mini-mill analisada. Fonte: Próprio autor. 56 Na planta analisada a energia necessária para a combustão nas caldeiras é proveniente de gás natural adquirido da concessionária local. O processo de geração de vapor não possui nenhum tipo de recuperação de calor dos processos de produção de aço. A água desmineralizada utilizada nas caldeiras é obtida em estação de troca iônica e bombeada a temperatura ambiente ao desaerador térmico da caldeira. No desaerador térmico, ocorre o aquecimento da água desmineralizada comprimida através da troca térmica com vapor da caldeira à 130ºC em pressões de 250 kPa. Por fim, a bomba de alimentação das caldeiras coleta água desmineralizada do desaerador térmico e pressuriza a mesma à pressão de trabalho nas caldeiras. As caldeiras possuem capacidade nominal de geração de vapor superaquecido a 2,2 MPa e 573,15 K. A vazão de vapor superaquecido obtida nas caldeiras é controlada em função da demanda do desgaseificador a vácuo e varia entre 6,0 e 22,0 t/h. A redução de geração de vapor nas caldeiras em função do processo de desgaseificação impõem maiores consumos de combustível nestas, além de maiores números de paradas e partidas das caldeiras. O aumento do número de paradas e partidas das caldeiras contribui para a deterioração de seus tubos internos. As caldeiras operam em distâncias longas (até 2,0 km) dos pontos consumidores. 3.2 – COLETA DE DADOS A coleta dos dados do processo de despoeiramento e operação do forno elétrico é realizada em uma aciaria elétrica de uma mini-mill brasileira. As instalações da aciaria em questão possuem sistemas de automação e controle suficientes para a coleta dos dados de campo necessários à análise e dimensionamento do sistema de recuperação de calor proposto nesta dissertação. O sistema de despoeiramento da aciaria em questão possui um sistema de automação e controle composto por controladores lógicos programáveis conectados em redes sistemas de supervisão configurados em computadores do tipo servidor. As variáveis de processo do sistema de despoeiramento e forno elétrico são processadas no controlador lógico programável de acordo com rotinas definidas no programa de controle. Os operadores do processo podem verificar condições 57 operacionais dos equipamentos e realizar comandos elétricos a partir do sistema de supervisão ou painéis de controle disponíveis na sala elétrica e proximidades das instalações físicas do equipamento. O sistema de supervisão também possibilita a edição de telas gráficas e o armazenamento de dados das variáveis de controle em seu respectivo banco de dados. A análise dos dados das variáveis de controle é realizada para diagnóstico de falhas ou estudos para melhorias nos processos. As instalações do sistema de despoeiramento possuem termopares para medição de temperatura dos gases se exaustão em diferentes pontos, em faixas de até 1000ºC. A coleta e armazenamento destas temperaturas ao longo dos ciclos de operação do forno elétrico a arco possibilita a determinação dos padrões de temperatura dos gases de exaustão. As temperaturas de entrada e saída da câmara de combustão são fatores críticos para o desenvolvimento do sistema de recuperação de calor proposto neste trabalho. No desenvolvimento deste estudo são utilizados dados coletados no sistema supervisório do despoeiramento para coleta e armazenamento dos dados de temperaturas dos gases de exaustão e dados do regime de operação do forno elétrico, conforme figuras 3.5 e 3.6. Os dados disponíveis nos sistemas de controle deste forno possibilitam o complemento da análise do perfil de temperatura dos gases em função do tipo de aço, tempos de processamento e paradas operacionais ou de manutenção. Figura 3.5 – Tela do controlador do sistema de despoeiramento do forno. Fonte: ACOSTA, 2003. 58 Figura 3.6– Gráfico do sistema de despoeiramento com temperaturas em diferentes pontos de amostragem. Fonte: Próprio autor. 3.3 – MÉTODOS Os dados das variáveis de processo necessários ao desenvolvimento deste trabalho foram tratados com o auxílio de bases de dados do sistema de supervisão da aciaria e editor de planilhas. Com isto, é possível o agrupamento dos parâmetros críticos provenientes do sistema de despoeiramento e forno elétrico e, por fim, determinar a curva característica de temperatura dos gases de exaustão em função do tempo, para todas as corridas do forno analisadas. Ao todo foram coletadas mais de 500.000 amostras do processo analisado ao longo de 40 dias de operação da aciaria. Neste período, é possível a coleta de dados das variáveis de processo nas diversas condições operacionais e de manutenção da planta. A tabela 3.1 apresenta um extrato simplificado dos dados coletados no processo de despoeiramento e forno elétrico a arco. As variáveis contidas nesta planilha são correlacionadas com descrição da corrida e tipo de aço processado, os 59 tempos de forno ligado (power on) e forno desligado (power off) e temperaturas médias dos gases de exaustão. Tabela 3.1 – Estratificação dos dados coletados no forno elétrico (fonte: próprio autor). A partir dos dados coletados, é possível analisar a influência das condições operacionais do forno elétrico a arco na temperatura dos gases de exaustão. O tipo de carregamento dos elementos metálicos contidos nas matérias-primas, a composição química e interrupções operacionais ou de manutenção contribuem para consideráveis alterações nas temperaturas dos gases de exaustão. Por fim, o tempo de ciclo (tap to tap) e a potência empregada no forno elétrico são considerados primordiais para a determinação de um perfil de temperatura dos gases de exaustão ao longo de diferentes bateladas do forno. O tratamento dos dados coletados possibilita a obtenção de gráficos de temperatura dos gases de exaustão em função do tempo de corrida processada no forno elétrico a arco para aproximadamente 500 corridas. A figura 3.7 exibe o comportamento da temperatura dos gases de exaustão em função do tempo em quatro diferentes corridas obtidas no forno. A análise dos dados que compõem estes gráficos permite a verificação de variações nos tempos de abertura do forno para carregamento da carga-metálica e ocorrências de interrupções de manutenção durante o processamento das corridas. Nos períodos de abertura do forno para carregamento da carga metálica, em especial do primeiro cesto, ocorre considerável redução na temperatura dos gases de exaustão. Em ocorrências de interrupções do 60 forno elétrico com metal líquido ocorrem moderadas reduções de temperatura dos gases de exaustão. Figura 3.7 – Gráficos de temperatura dos gases de exaustão após a câmara de combustão em função do tempo e de corridas do forno. Fonte: Próprio autor. Após análises individuais dos dados obtidos por corrida, é realizado tratamento destes e iniciada a determinação de um perfil característico de temperatura dos gases de exaustão em função do tempo, nas diferentes condições operacionais do forno elétrico a arco analisado. Para isso, é calculado o tempo médio por corrida e agrupados todos dados de temperatura dos gases de exaustão nas diferentes corridas analisadas. A figura 3.8 exibe uma composição inicial dos gráficos sobrepostos exemplificando 13 corridas analisadas. Neste caso, é possível avaliar a rápida redução de temperatura nos primeiros minutos do ciclo, em função do carregamento do primeiro cesto de sucata e, posteriormente, avaliar uma maior estabilidade na temperatura nos minutos finais de cada corrida devido ao processo de injeção de oxigênio no forno nos minutos finais de corrida, após o carregamento do terceiro cesto e durante o processo de desoxidação do aço líquido obtido. 61 Figura 3.8 – Temperatura dos gases de exaustão após a câmara de combustão em 13 corridas obtidas em um forno elétrico. Fonte: Próprio autor. Por fim, é possível a determinação de um perfil característico de temperatura dos gases de exaustão através do tratamento dos dados coletados em todos os ciclos de operação do forno elétrico a arco durante todo o período analisado. Para isto, foram analisados dados de aproximadamente 500 corridas produzidas no forno elétrico a arco. Além da curva de temperatura ao longo do tempo, foi possível determinar a temperatura média dos gases de exaustão, o tempo médio por corrida, a potência média empregada no forno elétrico e os tempos de forno em operação e parado por corrida. A curva de temperatura é obtida em função da média da temperatura ao longo do tempo das corridas analisadas, com descarte dos dados das corridas que apresentaram tempo total de paradas do forno superior a 60 minutos (menos de 5% das corridas analisadas). O perfil de temperatura obtido permite a visualização com clareza dos intervalos de carregamento do primeiro, segundo e terceiro cestos e, também, do período de estabilização de temperatura nas proximidades do final de corrida. Além disso, esta avaliação permite determinar o tempo máximo que a temperatura dos gases permanece abaixo e acima da temperatura média. Este tempo é determinante no cálculo do tempo de reserva do acumulador térmico necessário ao sistema, em condições normais de operação. A figura 3.9 mostra o perfil obtido de temperatura dos gases de exaustão para o forno elétrico a arco. 62 Figura 3.9 – Perfil característico de temperatura dos gases de exaustão do forno elétrico analisado durante um ciclo operacional médio de 104 minutos. Fonte: Próprio autor. O perfil de temperatura dos gases de exaustão durante a operação do respectivo forno é crucial para o dimensionamento do sistema de recuperação de calor proposto. No desenvolvimento do presente trabalho, são calculadas as demandas térmicas da unidade de desgaseificação e determinados os modos de operação da caldeira de recuperação de calor integrada a uma caldeira auxiliar. A análise dos dados que compõem o gráfico da figura 3.9 permite a obtenção do tempo de 17 minutos como o máximo período que a temperatura dos gases de exaustão permaneceu abaixo da temperatura média por corrida do forno. Nesta mesma análise observa-se que a temperatura média dos gases de exaustão é de 328,6ºC, sendo desconsiderada a redução de temperatura ocorrida no carregamento do primeiro cesto. A operação de um ciclo térmico com menor influência da variação da temperatura dos gases do forno é obtida, no presente trabalho, a partir da utilização de um reservatório térmico composto por um tanque preenchido com uma mistura de sais de nitrato de sódio e potássio. Neste caso, os gases de exaustão do forno têm seu calor transferido para o reservatório térmico e, em seguida, para a caldeira de recuperação. 63 3.4 – DESENVOLVIMENTO DO RECUPERADOR DE CALOR EM UM SISTEMA DE DESPOEIRAMENTO DE ACIARIA ELÉTRICA A vazão mássica e a temperatura dos gases de exaustão do sistema de despoeiramento do forno elétrico indica expressivo potencial para recuperação do calor. A recuperação de calor a partir destes gases pode ser associada a uma planta de cogeração, visando gerar energia elétrica e vapor superaquecido para atendimento aos processos de produção de aço. Assim, considera-se a instalação de um recuperador de calor associado aos gases quentes provenientes do processo de despoeiramento para geração de vapor superaquecido e trabalho mecânico em uma turbina a vapor. A câmara de combustão do sistema de despoeiramento do forno elétrico a arco se caracteriza como um local recomendado para a instalação do sistema de recuperação de calor. Nesta câmara os gases de exaustão possuem temperaturas elevadas e há a disponibilidade de área para a instalação da caldeira de recuperação de modo menos invasivo ao sistema de despoeiramento da unidade, sem impor grandes alterações ao processo produtivo. Além do aumento da eficiência energética do processo, a instalação da caldeira de recuperação na câmara de combustão do sistema de despoeiramento possui as seguintes vantagens: 1) Instalação do sistema com menores alterações operacionais no processo do forno elétrico a arco; 2) Redução da velocidade dos gases de exaustão, incrementando a sedimentação de sólidos no interior da câmara de combustão; 3) Funcionalidade na limpeza das paredes externas dos tubos da caldeira de recuperação durante paradas para remoção de sólidos sedimentados na câmara de combustão; 4) Redução do consumo de água industrial para resfriamento dos gases de exaustão do sistema de despoeiramento na entrada dos filtros. 64 A figura 3.10 ilustra uma câmara de combustão de um forno elétrico a arco, sinalizando o ponto de instalação da caldeira de recuperação proposta neste trabalho. Figura 3.10 – Vista frontal da câmara de combustão do sistema de despoeiramento com indicação do local de instalação do recuperador de calor. Fonte: Adaptado de NARDIN et al., 2014. A concepção do sistema de recuperação de calor é iniciada após a definição do local adequado para a instalação da caldeira de recuperação, no interior da primeira câmara de combustão. A instalação de duas câmaras de combustão em paralelo possibilita a obtenção de maior segurança operacional da caldeira de recuperação e execução de bloqueios da caldeira para manutenção sem necessidade de interrupções do forno. Neste caso, em eventual problema de fornecimento de água de alimentação da caldeira ou necessidade de parada da caldeira para manutenção, os dampers da primeira câmara de combustão são automaticamente fechados, isolando a caldeira de recuperação dos gases de exaustão do forno. Neste instante, são abertos os dampers da segunda câmara de combustão, possibilitando que os gases de exaustão passem por ela e, posteriormente, pelos exaustores do sistema de despoeiramento. Após o comando de recolocação em operação da caldeira de recuperação, os dampers da primeira câmara de combustão são abertos e os da segunda câmara são fechados. A estratégia proposta permite a operação do forno elétrico independentemente das condições operacionais da caldeira de recuperação, Além disso, a instalação da segunda câmara de combustão propicia as mesmas condições operacionais do sistema de despoeiramento nos momentos de parada da caldeira de recuperação. A 65 figura 3.11 exibe o arranjo proposto para a instalação da caldeira de recuperação e câmaras de combustão em um forno elétrico a arco. Figura 3.11 – Instalação proposta para o recuperador de calor no sistema de despoeiramento. (Fonte: próprio autor). A definição do ciclo térmico proposto no presente trabalho é representada na figura 3.12, a qual contempla a integração da turbina a vapor com o sistema de desgaseificação a vácuo, possibilitando a alimentação da turbina com pressões de vapor de até 2,2 MPa e do desgaseificador a vácuo com pressões de vapor de 1,5 MPa. Neste caso, todo o vapor gerado é consumido no desgaseificador a vácuo ou convertido em trabalho na turbina a vapor. A caldeira auxiliar contemplada no ciclo térmico em questão já está em operação na planta analisada. 66 Figura 3.12 – Fluxograma do sistema de geração e consumo de vapor proposto para a planta siderúrgica. Fonte: Próprio autor. A aplicação de uma caldeira de recuperação no interior da câmara de combustão do sistema de despoeiramento permite a obtenção de vapor superaquecido na aciaria analisada. No ciclo térmico proposto é instalado um reservatório térmico entre a saída dos gases de exaustão do sistema de despoeiramento primário e a entrada da caldeira de recuperação. A caldeira de recuperação, a caldeira auxiliar, a turbina a vapor e o desgaseificador são instalados para permitir a operação de modo independente ou conjunto. Neste caso, as caldeiras são dotadas de válvulas específicas para o seccionamento das redes de alimentação e distribuição de vapor. A caldeira de recuperação a ser instalada no sistema deve fornecer pressão nominal de vapor superaquecido de 2,2 MPa a 300º C e vazão 20 t/h, conforme necessidades dos processos de alimentação da turbina a vapor e desgaseificador a vácuo. A caldeira de recuperação é integrada a uma caldeira auxiliar do sistema de distribuição que opera com as mesmas características de pressão, temperatura e 67 vazão nominal de vapor. O balanço de vapor da planta possibilita a geração de potência elétrica no gerador de uma turbina a vapor de condensação e a alimentação do desgaseificador da aciaria. Em casos de indisponibilidade da caldeira de recuperação, a turbina a vapor deve ser parada, enquanto a caldeira auxiliar da planta, já existente na unidade siderúrgica, deve alimentar o desgaseificador a vácuo com vapor superaquecido. Nos instantes de paralisação do desgaseificador a vácuo para manutenção ou troca de ciclos todo o vapor gerado em ambas as caldeiras é direcionado à turbina a vapor. Por características operacionais do desgaseificador a vácuo, a pressão de vapor é reduzida a 1,5 MPa em uma válvula redutora de pressão. A pressão mínima de vapor para a operação do desgaseificador a vácuo é de 1,2 MPa, enquanto a temperatura mínima de vapor é de 220ºC. A representação contida na figura 3.13 ilustra uma caldeira de recuperação com arranjo horizontal dos tubos. Figura 3.13 – Representação de uma caldeira de recuperação com arranjo horizontal Fonte: LORA; NASCIMENTO, 2004. Uma caldeira de recuperação pode ser definida como um trocador de calor em contracorrente, composto por diferentes seções de tubos montados 68 geometricamente em sequência, visando maximizar a recuperação de calor dos gases e geração de vapor (LORA; NASCIMENTO, 2004). A caldeira de recuperação do ciclo térmico proposto possui arranjo horizontal dos tubos e é composta por um economizador, um evaporador e um superaquecedor, operando em apenas um nível de pressão. No interior da caldeira os gases de exaustão do forno elétrico trocam calor com o fluído de trabalho no superaquecedor, posteriormente no evaporador e, por fim, no economizador. A temperatura mínima dos gases de exaustão da caldeira deve ser de 130ºC para de evitar a condensação destes gases no interior da caldeira. Os gases de exaustão desta caldeira são direcionados aos filtros do sistema de despoeiramento da aciaria. Com a recuperação de calor dos gases de exaustão do forno elétrico é possível reduzir a vazão de água de resfriamento destes gases. A temperatura dos gases de exaustão deve ser menor que 130ºC na entrada da casa de filtros do sistema de despoeiramento. O dimensionamento da demanda térmica necessária para obtenção de vapor superaquecido na caldeira de recuperação é realizado conforme premissas contidas na tabela 3.2. A caldeira de recuperação do em questão não deve possuir sistema de queima suplementar de combustível. Neste caso, se a temperatura do vapor na saída da caldeira de recuperação é inferior a 250ºC a distribuição de vapor da caldeira de recuperação é automaticamente interrompida, podendo acarretar na parada da turbina e/ou do sistema de desgaseificação a vácuo. A caldeira auxiliar do sistema permanece em operação para aumentar a confiabilidade do sistema de desgaseificação a vácuo e até da potência elétrica obtida na turbina a vapor. Tabela 3.2 – Dados utilizados para o dimensionamento da caldeira (fonte: próprio autor). Pressão [MPa] Temperatura vapor [ºC] Approach Point [ºC] Pinch Point [ºC] Temperatura gases na entrada da caldeira [ºC] Temperatura mínima dos gases na saída da caldeira [ºC] 2,2 300 5 10 328,6 130 A análise da energia contida nos gases de exaustão do forno elétrico a arco é realizada para a avaliação do potencial de recuperação calor através da instalação da caldeira de recuperação e obtenção de vapor conforme condições requeridas. 69 Para isto, é desenvolvido memorial de cálculos com a quantificação do calor liberado pelo forno elétrico a arco nos gases de exaustão e modelagem do ciclo térmico proposto no item 3.4.1. O reservatório térmico utilizado no ciclo proposto é desenvolvido por tubos de aço inoxidável preenchidos com uma mistura de sais de nitrato de sódio e nitrato de potássio e instalados horizontalmente no interior de um tanque de aço. A mistura de sais é composta, em massa, por 60% nitrato de sódio (NaNO3) e 40% de nitrato de potássio (KNO3). O tanque do sistema possui revestimento com materiais para reduzir a transferência de calor ao meio. Durante a operação do forno elétrico os gases de exaustão passam pelo tanque e transferem calor para a mistura de sais, provocando a fusão da massa de sais do reservatório térmico. Após escoar pelo reservatório térmico os gases de exaustão alimentam o superaquecedor da caldeira de recuperação. A figura 3.14 apresenta a instalação proposta para o tanque utilizado para o reservatório térmico. Figura 3.14 – Vista lateral do tanque com tubos utilizados no reservatório de calor. Fonte: Próprio autor. A tabela 3.3 correlaciona o número de tubos necessários para a reserva de calor com o diâmetro destes tubos. Para efeitos dos cálculos do volume interno de cada tubo em função do diâmetro é fixado o comprimento de 25 metros por tubo. Este comprimento é compatível com a área disponível para a instalação do tanque nas proximidades do forno elétrico. A operação do reservatório térmico é baseada no acúmulo de calor proporcionado pela massa de sais contidos no interior dos tubos. A fusão destes 70 sais ocorre entre 220°C a 240°C e a ebulição ocorre a temperaturas acima de 550ºC. Durante a operação do forno elétrico o escoamento dos gases de exaustão permite a manutenção do reservatório térmico com a massa de sais no estado líquido. Enquanto a temperatura dos gases de exaustão é menor que a temperatura da massa de sal ocorre a transferência de calor dos sais do reservatório térmico para os gases de exaustão do forno e, consequentemente, à caldeira de recuperação. A massa de sais do reservatório térmico é dimensionada para a operação da caldeira de recuperação, conforme as condições requeridas para o vapor obtido, por até 36 minutos com a temperatura de entrada dos gases de exaustão no reservatório em 250ºC. Neste caso, o calor liberado pela massa de sal é suficiente para manter a temperatura dos gases na saída do reservatório térmico em valores próximos a 328ºC, conforme dimensionamento realizado no item 3.4.1.1 deste trabalho. No sistema proposto a tubulação de coleta dos gases de exaustão do forno elétrico é conectada ao tanque do reservatório térmico, permitindo o escoamento dos gases de exaustão em contato com a superfície externa dos tubos que estão preenchidos pela massa de sais. Após escoar pelo reservatório térmico os gases de exaustão são direcionados para a caldeira de recuperação do ciclo e, por fim, à casa de filtros do sistema de despoeiramento. O item 3.4.1 deste trabalho propõe a modelagem do ciclo térmico proposto, permitindo a determinação do volume de sais necessários para reserva de calor por 36 minutos nas condições do processo. Neste caso, o volume de 41,88 m³ de sais de nitrato de sódio e potássio é suficiente para atender a necessidade de reserva térmica do ciclo proposto. Com a determinação do volume de sais necessários é possível dimensionar os tubos de aço que são utilizados no interior do reservatório. A figura 3.15 exibe um gráfico que correlaciona o diâmetro dos tubos utilizados no reservatório térmico com o número de tubos necessários para o tempo de reserva requerido pelo sistema. 71 Figura 3.15 – Dimensionamento do número de tubos do reservatório térmico em função do diâmetro. (fonte: próprio autor). A utilização de tubos de diâmetro de 6 polegadas é proposta na instalação do reservatório térmico em função do menor número de tubos necessários e compatibilidade com o volume disponível para a instalação do tanque do reservatório térmico no interior da aciaria analisada. Durante a operação do forno elétrico os gases de exaustão trocam calor com a massa de sais dos tubos proporcionando a fusão destes sais e o acúmulo de calor para a liberação ao sistema, em momentos de menor temperatura dos gases de exaustão. Com isso, é proposto um arranjo com 90 tubos no interior do tanque do reservatório. A figura 3.16 ilustra uma vista frontal dos tubos no interior do reservatório exibido na figura 3.14. 72 Figura 3.16 – Vista frontal do arranjo proposto para os tubos do reservatório de calor. Fonte: Próprio autor. As dimensões do reservatório térmico devem ser realizadas em posterior projeto do ciclo térmico conceitualmente proposto neste trabalho conforme modelos térmicos baseados em métodos numéricos e experimentais e variaram de acordo com as distancias no eixo horizontal (S1 e L) e vertical (S2 e h) entre os tubos do reservatório térmico. O desenvolvimento do sistema de recuperação de calor proposto neste trabalho contempla uma análise econômica através da determinação dos custos de investimento, de operação e manutenção deste sistema. Com isso, é possível determinar os custos específicos associados à obtenção de vapor superaquecido e energia elétrica na planta proposta. A utilização do reservatório térmico possibilita a redução dos custos operacionais da planta em função da não utilização de queima suplementar na caldeira de recuperação, porém aumenta a demanda de capital para investimento e manutenção do referido ciclo térmico. As necessidades de investimento para a implantação do reservatório térmico podem ser realizadas de acordo com GAGGLIOLI et al., (2014). Neste caso, os valores por equipamento ou instalação são calculados baseados em custos unitários em função do volume de sais necessários ao reservatório térmico. Os valores por equipamento e o investimento total para a aquisição deste reservatório para uma massa de sais de 41,88 m³ é exibido na tabela 3.3. 73 Tabela 3.3 - Investimento inicial no reservatório de calor (fonte: GAGGLIOLI et al., 2014). Custos [EUR] Tanque do sistema 9