UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” FACULDADE DE CIÊNCIAS AGRONÔMICAS CÂMPUS DE BOTUCATU TRANSDISCIPLINARIDADE E PLANTAS MEDICINAIS NO EMPODERAMENTO DE MULHERES EM BUSCA DE SUSTENTABILIDADE NO SUL DO BRASIL E NORTE DA ESPANHA: EXPERIÊNCIAS DE RESGATE DE CONHECIMENTOS FATIMA CHECHETTO BOTUCATU-SP Junho - 2013 Tese apresentada à Faculdade de Ciências Agronômicas da UNESP - Câmpus de Botucatu, para obtenção do título de Doutora em Agronomia (Horticultura) UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” FACULDADE DE CIÊNCIAS AGRONÔMICAS CÂMPUS DE BOTUCATU TRANSDISCIPLINARIDADE E PLANTAS MEDICINAIS NO EMPODERAMENTO DE MULHERES EM BUSCA DE SUSTENTABILIDADE NO SUL DO BRASIL E NORTE DA ESPANHA: EXPERIÊNCIAS DE RESGATE DE CONHECIMENTOS FATIMA CHECHETTO BOTUCATU-SP Junho – 2013 Tese apresentada à Faculdade de Ciências Agronômicas da UNESP - Câmpus de Botucatu, para obtenção do título de Doutora em Agronomia (Horticultura) Orientador: Prof. Dr. Lin Chau Ming Co-tutora: Profa. Dra. Fátima Cruz Souza Instituto Universitário de Investigación en Gestión Forestal Sostenible Programa de Doctorado en Conservación y Uso Sostenible de Sistemas Forestales TESIS DOCTORAL: Transdisciplinariedad y Plantas Medicinales en el Empoderamiento de Mujeres en Búsqueda de Sostenibilidad en el Sur de Brasil y Norte de España: Experiencias de Rescate de Conocimientos Presentada por Fatima Chechetto para optar al grado de doctora por la Universidad de Valladolid Dirigida por: Dr. Lin Chau Ming Dra.Fatima Cruz Souza III BIOGRAFIA DA AUTORA Fatima Chechetto nasceu em Jacinto Machado, uma pequena cidade do interior de Santa Catarina - Brasil no ano de 1962. Tempo em que, em sua casa não havia luz elétrica, televisão ou internet. Filha dos agricultores Cecília Simão Chechetto e Ernesto Chechetto, partilhou de uma infância, que lhe permitiu um profundo contato com a natureza e com os estudos, junto de seus oito irmãos. Frequentou a Escola Básica Municipal de Jacinto Machado e o Colégio Servos de Maria em Turvo - SC (1970 - 1980). Em 1982 ingressou no Curso de Agronomia da Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, tendo recebido o título de Engenheira Agrônoma no ano de 1986. Atuou como docente e pesquisadora na Universidade do Sul de Santa Catarina de 1989 à 2006, nos Cursos de Engenharia Química, Agronomia e Farmácia e no Centro Universitário Barriga Verde, nos anos de 2007 e 2008. Em 1998 coordenou a I Jornada Catarinense de Plantas Medicinais e em seguida a Associação Catarinense de Plantas Medicinais (1999 - 2001 e 2001 -2004) e a Câmara Setorial de Plantas Medicinais no Conselho de Desenvolvimento Rural na Secretaria de Estado da Agricultura (2000 -2004 e 2006-2008). Em 2003 concluiu o Mestrado em Saúde Coletiva pela Universidade do Sul de Santa Catarina com o tema “Rede Catarinense de Plantas Medicinais: uma Abordagem Transdisciplinar para a Saúde Coletiva” e passou a colaborar junto ao Ministério da Saúde - Brasil como participante do Grupo de Fitoterapia para a construção da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no Sistema Único de Saúde, aprovada pela Portaria Ministerial 971 de maio/2006. Em 2009 ingressou no Programa de Doutorado em Agronomia - Horticultura da Faculdade de Ciências Agronômicas da Universidade Estadual Paulista, Campus Botucatu, sendo bolsista da CAPES no Brasil. No Programa de Estágio de Doutorando no Exterior - PDEE, durante o período de junho de 2011 a maio de 2012, foi bolsista CAPES (BEX 006511-0) na Escuela Universitária de Educación de Palencia - Cátedra de Estudios de Género e Instituto Universitario de Investigación en Gestión Forestal Sostenible de la Universidad de Valladolid - Espanha. Durante os anos de dedicação a docência e a pesquisa, tem partilhado conhecimentos nos meios acadêmicos e comunidades da sociedade civil através de palestras, cursos e oficinas no Brasil e no Exterior, tendo sido declarada Hóspede Ilustre da Cidade de Trujillo - Peru pela Municipalidade Provincial, pela contribuição a favor da educação e ciência (Agosto de 2004). Na Espanha, recebeu publicamente o Certificado de Reconhecimento pelas pessoas participantes das Oficinas “Plantas Medicinais e Mulheres em Busca de Sustentabilidade” pela generosidade e disponibilidade em compartilhar saberes sobre plantas medicinais, na Montanha Palentina (Maio de 2012). IV DEDICO À minha Avó Augusta, exemplo de otimismo, sabedoria e fé À minha mãe Cecília, símbolo do amor em prática À minha filha Aurora, luz da manhã que guia meus caminhos A todas as Mulheres participantes do estudo no Sul do Brasil e Norte da Espanha http://www.google.com.br/url?sa=i&rct=j&q=v%C3%AAnus+de+willendorf&source=images&cd=&cad=rja&docid=EOHefMbAqWigNM&tbnid=xoyZ92STkQur4M:&ved=0CAUQjRw&url=http://pt.wikipedia.org/wiki/V%C3%A9nus_de_Willendorf&ei=l4p-UaWtJ8PC4AOZ2IGICg&bvm=bv.45645796,d.dmg&psig=AFQjCNEHKstA3p8KOkCKWmLCw2Vf6E8JlA&ust=1367333733879639 V AGRADECIMENTOS “Recria tua vida sempre, sempre. Remove pedras e planta roseiras e faz doces. Recomeça” (Cora, Coralina) Inicio meus agradecimentos com um trecho de um belo poema de Cora Coralina, mulher simples, doceira, poetisa e contista, considerada uma das maiores escritoras brasileiras e que teve seu primeiro livro publicado quando já tinha 76 anos de idade. E assim sendo, agradeço primeiramente a Vida que se recria a cada momento, ao Universo e ao Planeta Terra que me acolheu dentre sua diversidade de bichos, de plantas e de gente...com seres animados e inanimados, visíveis e invisíveis que me ensinaram e ensinam tantas coisas, e especialmente com suas plantas medicinais. À Consciência do Feminino, representada no meu imaginário por “Marassínia”, que inspirou ternos sentimentos artísticos, poéticos, intuitivos e afetivos - e para mim - muito reais. Ao meu pai, que já não se encontra neste planeta, mas que com certeza se sentiria feliz em compartilhar comigo mais um degrau, na infindável busca de conhecimentos. As minhas quatro irmãs e meus quatro irmãos e toda a família expandida, incluindo meus antepassados, minha gratidão e admiração. Com meus orientadores fui muito feliz!...Meu orientador no Brasil, Lin Chau Ming, para quem não tenho palavras para expressar minha enorme gratidão. Por ser “como ele é”: com tamanha sensibilidade, curiosidade e abertura de visão. Com tamanha consciência, pureza de coração, integridade e ética. Com tamanha empatia para relacionar-se com as mais diversas pessoas e comunidades. À minha orientadora na Espanha, Fátima Cruz Souza, que me recebeu de braços abertos. Com ela sempre me senti em casa, sempre atenta a tudo, como profissional e como pessoa. Pouco a pouco, pude conhecer, apreciar e admirar o quanto tem sido concretizadora em sua visão de sustentabilidade social. Seus sólidos vínculos são visíveis no entorno local e para além deste. Agradeço a Zuleica Maria Patrício, pelas valiosas sugestões, desde seus profundos conhecimentos sobre pesquisa qualitativa e transdisciplinaridade. A todos os integrantes da banca avaliadora, pela disposição. Todos, são profissionais e seres humanos que admiro muito. À CAPES pela bolsa de doutorado sanduíche na Espanha (BEX 0065/11-0) e pela bolsa de doutorado no país e a todos os brasileiros que através de suas contribuições, possibilitaram meu aprofundamento. Espero poder retornar muito em breve nas dimensões social, econômica e ecológica. À Márcia Lerinna, visionária e conselheira, pelas riquíssimas trocas. Sua leitura de mundo, seu apoio, sua percepção dos meus potenciais, vulnerabilidades e missão foram tão importantes! Ao Yannis que esteve sempre ao meu lado e a todos os seus familiares e amigos que também são os meus, especialmente Aglaia, Helena, Rodrigo e Nilza. Ao casal Alexandre e América, que sempre tão solícitos nos apoiaram, cuidando de nossas coisas, durante a viagem à Espanha. À minha irmã Maria Láide, pelo apoio em todos os níveis, sem o qual não poderia ter concluído esta etapa. A todas as amigas e amigos queridos, que ficaram em Santa Catarina durante minha estadia em Botucatu e na Espanha, especialmente à Amélia Moema, Ceres Trein, Leila Nery, Márcia Helena de Jesus, Margareth Alvarado de Farias, Sônia Claudete da Silva, VI Silvia Eick, Marta Régis Fogaça, Mônica e Géferson Calvette, Nelson Alberto Caldeira, Rosana Guedes Carrinho, Glória Fernandes, Ritha Green, Lúcia Herta Rockembach, Gisele Damian. A todos os professores (as), funcionários(as), amigos e amigas que encontrei em Botucatu, no Programa de Doutorado em Agronomia - Horticultura, especialmente à Almecina Balbino Ferreira, Jaqueline Evangelista, Ana Maria Ramos, Maurício Andrião, Rosângela dos Santos, Margareth Lin, Ezequiel, Taíce, Milena, Iza, Marilza, Bernardo, Elza, Manoel, Camila. A todos os funcionários, professores, amigos e amigas que encontrei em Palencia, na Cátedra de Género - Escuela de Educación y Instituto Universitário de Investigación em Gestión Forestal da Universidade de Valladolid. Especialmente à Iolanda, Carlos, Joseme e à Alicia Puleo, pela generosa recepção e rico aprendizado nas aulas de filosofia e ética. Às amigas brasileiras que partilharam momentos comigo no exterior: Marisol Cardina e Luciana. Aos artistas Gisele Mara Hadlich, Marco Spernega e Barcelos de Souza Fernandes que com luminosidade e carinho deram formas, cores e vida a trama do “Xale de Retalhos de Plantas Medicinais” da tese. À Gabriela Granghelli que com bondade em sua alma pura de criança, esteve ao meu lado nos momentos dos acabamentos finais da arte e escrita, cuidando da revisão e formatação. A todos os sujeitos do estudo, mulheres e homens no sul do Brasil e norte da Espanha. E finalmente às mulheres das comunidades do Sul de Santa Catarina, que têm tantas histórias para lembrar, contar e escrever do longo convívio destes anos de estudos com plantas medicinais, e as mulheres do Norte da Espanha, que em um profundo convívio de alguns meses estarão sempre presentes em meu coração. Procuro encerrar meus agradecimentos com uma frase que expressa o sentido da metáfora escolhida para guiar a escrita desta tese - a da tecitura do “Xale de Retalhos”: “Às mulheres não foi dado durante séculos escrever. Elas traçavam sinais de criação, usando linhas enfiadas em finos orifícios, em teares, manipulando pequenos instrumentos de fabricação caseira. Com isso transfiguravam o mundo, escrevendo signos que substituíam as palavras”(Lélia Almeida). Mas não, sem antes, apesar de já ter dedicado esta escrita à minha filha Aurora, agradecer também a ela, que sempre foi minha inspiração. Desejo que o gosto pela escrita e pela natureza esteja sempre em seu interior, como neste belo poeminha que lhe surgiu em um dia em que andávamos juntas, à beira do Rio Carrión, na Espanha: “É tão bonito ver as gotas da chuva caindo do céu. Até parecem risquinhos de mel. A grama molhada fica amarela, com as folhas espalhadas”(Aurora Chechetto da Silva). Que com alvorecer dos novos tempos possa ela sempre escrever, bem como todas as mulheres que têm tanto a dizer! VII SUMÁRIO Página LISTA DE FIGURAS ........................................................................................................ XII RESUMO .............................................................................................................................. 1 SUMMARY .......................................................................................................................... 3 RESUMEN ............................................................................................................................ 5 1 INTRODUÇÃO..................................................................................................................7 1.1 Gênese, Problematização e Delimitação do Tema ...................................................... 7 1.2 Alinhavando os Objetivos e Finalidades do Estudo .................................................. 25 2 REFERENCIAL TEÓRICO ............................................................................................. 28 2.1 Tomando o Fio de Ariadne para Tecer o Xale de Retalhos: Sustentabilidade na Era Planetária e Protagonismo Feminino ................................................................................... 28 2.2 Desenovelando o Fio de Ariadne: Sustentabilidade, Plantas Medicinais e Resgate Conhecimentos no Empoderamento de Mulheres na Ótica da Transdisciplinaridade ..... 30 2.2.1 A Ótica da Transdisciplinaridade e suas Bases ................................................. 32 2.2.2 As Bases da Sustentabilidade ............................................................................ 39 2.2.3 A Convergência entre Transdisciplinaridade e Sustentabilidade ..................... 43 2.2.4 Transdisciplinaridade e Sustentabilidade na Perspectiva de Gênero e o Empoderamento de Mulheres ...................................................................................... 49 2.2.5 Plantas Medicinais e o Resgate de Conhecimentos Através da Etnobotânica noEmpoderamento de Mulheres em Busca de Sustentabilidade na Ótica Transdisciplinar ........................................................................................................... 58 2.3 A Trajetória das Mulheres ......................................................................................... 68 2.3.1 O Fio Histórico Cultural do Processo de Inferiorização do Feminino ..................... 68 2.3.2 O Fio Histórico Cultural da Consciência do Feminismo ............................................ 69 2.3.3 Avanços da Trajetória das Mulheres no Século XX................................................... 71 2.3.4 A Trajetória das Mulheres a partir do Ano 2000: Interfaces com a Ecologia. ........... 72 2.3.5 Ecofeminsimo como Alternativa a Crise Ética Global ............................................... 77 3 TECENDO A METODOLOGIA DO ESTUDO DESDE A ÓTICA DA TRANSDISCIPLINARIDADE E DA PERSPECTIVA DE GÊNERO ............................. 87 3. 1 Momentos do Estudo .............................................................................................. 104 3.1.1 Entrando no Campo (Definindo o Período, Local e os Sujeitos do Estudo) ............ 104 VIII 3.1.2 Ficando no Campo (Descrevendo o Processo de Coleta, Registro e Análise dos Dados) ........................................................................................................................ 107 3.1.3 Saindo do Campo ..................................................................................................... 117 4 TECENDO A DESCRIÇÃO E ANÁLISE DO PROCESSO DE CONSTRUÇÃO TRANSDISCIPLINAR DE EMPODERAMENTO DESENVOLVIDO ATRAVÉS DO RESGATE DE CONHECIMENTOS SOBRE PLANTAS MEDICINAIS, JUNTO A MULHERES DE COMUNIDADES DA REGIÃO SUL DE SANTA CATARINA- BRASIL DESDE OS ANOS DE 1996 A 2010 ................................................................. 118 4.1 Antecedentes e Contexto: Bordando Memórias e Costurando a Reconstrução Histórica do Início do Processo ......................................................................................... 118 4.1.1 Alinhavando os Primeiros Fios no Bordado: Do Resgate de Conhecimentos Femininos Ancestrais à Abertura de um Espaço Democrático e Participativo ......... 121 4.1.2. Entrelaçando os Fios da Primeira Análise e Reflexão Crítica ................................. 134 4.2. Bordando Memórias e Costurando a Reconstrução Histórica do Processo dos anos de 1997 a 2010 ................................................................................................................... 137 4.2.1 Entrelaçando os Fios do Bordado do Ciclo da Construção do Processo dos Anos de 1997 à 1999: A Troca de Saberes Científicos e Populares ........................................ 137 4.2.2 Entrelaçando os Fios da Segunda Análise e Reflexão Crítica .................................. 162 4.2.3 Entrelaçando o Fio do Bordado do Segundo Ciclo da Construção do Processo nos anos de 2000 e 2001: Do Protagonismo Feminino à Busca de Novos Modelos para o Desenvolvimento, Integrando Ciência, Arte, Cultura e Espiritualidade em Redes ... 167 4.2.4 Entrelaçando os Fios da Terceira Análise e Reflexão Crítica .................................. 199 4.2.5 Entrelaçando os Fios do Bordado do Ciclo de Construção do Processo nos Anos de 2002 e 2003: Da Repercussão Local à Global Dentro do Princípio Hologramático para a Cidadania Terrestre ................................................................................................. 206 4.2.6 Entrelaçando os Fios da Quarta Análise e Reflexão Crítica ..................................... 220 4.2.7 Entrelaçando os Fios do Bordado do Ciclo da Construção do Processo nos Anos de 2004 e 2005: Das Relações de Competitividade e Domínio à Solidariedade e Sororidade .................................................................................................................. 223 4.2.8 Entrelaçando os Fios da Quinta Análise e Reflexão Crítica ..................................... 234 4.2.9 Entrelaçando o Fio do Bordado do Ciclo da Construção do Processo nos anos de 2006 e 2007: Da Consolidação das Políticas Nacionais à Socialização dos Resultados e Busca de Autonomia ............................................................................................... 236 IX 4.2.10 Entrelaçando os Fios da Sexta Análise e Reflexão CríticaErro! Indicador não definido. 4.2.11 Entrelaçando os Fios do Bordado do Ciclo da Construção do Processo nos Anos de 2008 e 2009: Da Influência das Lideranças Femininas Pioneiras às Novas Lideranças com Novas Racionalidades e Sensibilidades ............................................................. 252 4.2.12 Entrelaçando os Fios da Sétima Análise e Reflexão Crítica .................................. 263 4.2.13 Entrelaçando os Fios do Bordado do Ciclo de Construção do processo nos Anos de 2010 e 2011: Tomando a Caneta nas Mãos para Narrar a Própria História: A Transição....................266 4.2.14 Entrelaçando os Fios da Oitava Análise e Reflexão Crítica ................................... 269 4.3 Apresentando a Primeira Metade do Bordado do Xale de Retalhos de Plantas Medicinais: Síntese I ........................................................................................................ 270 5 APERFEIÇOANDO O PROCESSO IDENTIFICADO NA ANÁLISE DE DADOS DO TRABALHO COM MULHERES DO SUL DE SANTA CATARINA COM VISTAS A SUA APLICAÇÃO JUNTO A MULHERES DO NORTE DA ESPANHA -MONTANHA PALENTINA - ESPANHA ............................................................................................... 276 5.1 Tecendo a Descrição do Contexto: Entrelaçando Realidades e Alinhavando Conhecimentos .................................................................................................................. 276 5.2 Construindo o Processo Transdisciplinar com Mulheres da Região Norte da Espanha- Montanha Palentina com Foco no Resgate de conhecimento sobre Plantas Medicinais e a Promoção do Empoderamento no Âmbito do Des. Sustentável ............... 291 5.2.1 Alinhavando a Entrada na Montanha Palentina para o Início do Processo de Construção Participativo ........................................................................................... 291 6 INICIANDO O PROCESSO DE EMPODERAMENTO E IDENTIFICANDO OS CONHECIMENTOS DAS MULHERES DE COMUNIDADES DA MONTANHA PALENTINA SOBRE PLANTAS MEDICINAIS EM BUSCA DE SUSTENTABILIDADE NA ABORDAGEM TRANSDISCIPLINAR ........................... 303 6.1 Entrelaçando os Fios do Bordado Através da Primeira Oficina “ Plantas Medicinais e Mulheres em Busca de Sustentabilidade”: Da Abertura de um Espaço Democrático e Participativo ao Reconhecimento e Valorização do Saber Feminino Ancestral ............... 303 6.2 Entrelaçando os Fios do Bordado Através do Resgate de Conhecimentos de Guardiã do Patrimônio Natural e Cultural em Plantas Medicinais da Montanha Palentina ........... 309 6.3 Entrelaçando os Fios do Bordado Através da Busca de Contribuições para a Interação de Conhecimentos: Antropologia e Interculturalidade ...................................... 315 X 6.4 Entrelaçando os Fios do Bordado Através da Segunda Oficina “Plantas Medicinais e Mulheres em Busca de Sustentabilidade”: Do Questionamento de Modelos de Desenvolvimento e Ciência ao Resgate de Conhecimentos Sensíveis e Intuitivos sobre Plantas Medicinais ............................................................................................................. 324 6.5. Entrelaçando os Fios do Bordado na Busca de Redes Locais de Produtores Ecológicos de Plantas Medicinais para a Transição ao Desenvolvimento Agrícola Sustentável ......................................................................................................................... 334 6.6 Entrelaçando os Fios do Bordado Através da Terceira Oficina “Plantas Medicinais e Mulheres em Busca de Sustentabilidade”: Do Fortalecimento da Diversidade na Unidade ao Desejo de Visibilização, Reconhecimento e Apoio Intercultural ................................. 342 6.7 Entrelaçando os Fios do Bordado Através do “Círculo de Mulheres” na Montanha Palentina: Ampliando a União de Compreensões Racionais e e Intuitivas pelo Princípio Hologramático ........................................................................................... 356 6.8 Entrelaçando os Fios do Bordado Através do Florescimento da Criatividade: A Inclusão da Sensibilidade Artística e Estética como Elos entre os Seres Humanos e a Natureza ............................................................................................................................. 364 6.9 Entrelaçando os Fios do Bordado Através da Ampliação de Redes Transnacionais e Locais na Perspectiva da Produção Ecológica de Plantas Medicinais na Montanha Palentina ............................................................................................................................ 367 6.10 Entrelaçando os Fios do Bordado Através da Quarta Oficina “ Plantas Medicinais e Mulheres em Busca de Sustentabilidade”: Da Expressão dos Sentimentos dos Participantes ao Desejo de Continuidade ................................................................................................ 372 6.11 Entrelaçando os Fios do Bordado Através da Quinta Oficina “ Plantas Medicinais e Mulheres em Busca de Sustentabilidade”: Resgatando Conhecimentos sobre Cosméticos Naturais e Ouvindo sobre Percepções Femininas dos Mundos Visível e Invisível........... 377 6.12 Entrelaçando os Fios do Bordado Através da Interação e Socialização Transdisciplinar de Conhecimentos entre os Atores Sociais: “Seminário Interdisciplinar Sobre Plantas Medicinais e Sustentabilidade” .................................................................. 384 6.13 Entrelaçando os Fios do Bordado Através da Apresentação das Atividades do Ciclo de Oficinas “Plantas Medicinais e Mulheres em Busca de Sustentabilidade” na Montanha Palentina : A Entrega do Xale ........................................................................................... 411 6.14 Destacando a Segunda Metade do Bordado do Xale de Retalhos de Plantas Medicinais: Síntese II ........................................................................................................ 421 XI 7 POTENCIALIDADES E LIMITAÇÕES NA UTILIZAÇÃO DA TRANSDISCIPLINARIDADE E RESGATE DE CONHECIMENTOS EM PLANTAS MEDICINAIS COMO ESTRATÉGIA PARA O EMPODERAMENTO DAS MULHERES E POSSIBILIDADES DE CONTRIBUIÇÕES À SUSTENTABILIDADE NAS COMUNIDADES DO SUL DO BRASIL E NORTE DA ESPANHA ................... 427 8 CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................... 436 9 REFERÊNCIAS ............................................................................................................. 442 XII LISTA DE FIGURAS Página FIGURA 1. Representação simbólica da busca do significado do nome Marassínia pela pesquisadora ....................................................................................................... 9 FIGURA 2. Representação simbólica da consciência do feminino: arquétipo Marassínia 23 FIGURA 3. Área de abrangência do estudo. Brasil, estado de Santa Catarina, região sul de Santa Catarina (AMUREL) e cenários da região sul de Santa Catarina ......... 120 FIGURA 4. Cultivo de camomila e calêndula com participação de docentes e discentes do Curso de Agronomia – Unisul (Santa Rosa do Sul, junho/1996) ................... 122 FIGURA 5. Implantação de horto de plantas medicinais. local: Morro do Bino, Santa Rosa do Sul, SC. vista do horto e espécies cultivadas ............................................. 124 FIGURA 6. Trabalho comunitário com plantas medicinais no assentamento de Santa Rosa do Sul, Santa Catarina (mai/1997). (a): horta de plantas medicinais cultivadas pelos agricultores. (b e c): encontro para estudo e utilização de plantas medicinais. ...................................................................................................... 126 FIGURA 7. Divulgação sobre a organização da Pastoral da Saúde na região sul de Santa Catarina, Tubarão (mai/1996). ........................................................................ 130 FIGURA 8. Primeiro encontro do Grupo de Estudo e Utilização de Plantas Medicinais da região Sul de Santa Catarina ........................................................................... 140 FIGURA 9. Primeiro boletim informativo da Equipe Interdisciplinar em Plantas Medicinais da região Sul de Santa Catarina. .................................................. 141 FIGURA 10. Encontro mensal da Equipe Interdisciplinar em Plantas Medicinais da região Sul de Santa Catarina ...................................................................................... 144 FIGURA 11. I Jornada Catarinense de Plantas Medicinais (Tubarão/SC, set 1998) ....... 150 FIGURA 12. Reunião do Grupo de Estudos e Utilização de Plantas Medicinais da região Sul de Santa Catarina após a I Jornada Catarinense de Plantas Medicinais ... 150 FIGURA 13. Folder da II Jornada Catarinense de Plantas Medicinais e mandala de sementes e frutos construída durante o evento ............................................... 154 FIGURA 14. Boletins de plantas medicinais, produto dos encontro do Geuplam, durante o primeiro ciclo do processo .............................................................................. 162 XIII FIGURA 15. Encontro do Grupo de Estudo e Utilização de Plantas Medicinais na Universidade do Sul de Santa Catarina, Tubarão/SC ..................................... 167 FIGURA 16. Participantes de curso de extensão “Cultivo e Uso de Plantas Medicinais” organizado pelo Grupo de Estudos e Utilização de Plantas Medicinais para a região Sul de Santa Catarina ........................................................................... 168 FIGURA 17. Divulgação sobre as reuniões do GEUPLAM para o estudo de plantas medicinais no jornal da Universidade do Sul de Santa Catarina. ................... 169 FIGURA 18. Ata da primeira reunião da Câmara Setorial de Plantas Medicinais – Conselho de Desenvolvimento Rural - Secretaria de Estado da Agricultura e Desenvolvimento Rural - Santa Catarina. ...................................................... 170 FIGURA 19. Reunião da Câmara Setorial de Plantas Medicinais - CEDERURAL - Secretaria de Estado da Agricultura e Desenvolvimento Rural de Santa Catarina para reconstrução do Programa de Fitoterapia e Plantas Medicinais.......................................................................................................176 FIGURA 20. Reunião entre representantes da Unisul/Unesc e Comunidade/Pastoral da Saúde. Criciúma, maio de 2001 ...................................................................... 182 FIGURA 21. Folder da III Jornada Catarinense de Plantas Medicinais. .......................... 186 FIGURA 22. Construção de Jardim de Cura de Plantas Medicinais. Florianópolis, SC .. 188 FIGURA 23. Proposta de Programa de Fitoterapia e Plantas Medicinais para o Estado de Santa Catarina construído participativamente por integrantes da CSPM........189 FIGURA 24. Construção da Colcha de Retalhos de Plantas Medicinais durante a III Jornada Catarinense de Plantas Medicinas. Lages, SC................................... 190 FIGURA 25. Momentos da III Jornada de Plantas Medicinais. Lages, SC...................... 192 FIGURA 26. Proposta de Política Nacional de Plantas Medicinais e Medicamentos Fitoterápicos discutida em Fórum Nacional em Brasília ................................ 193 FIGURA 27. Apresentação dos trabalhos da Associação Catarinenese e Câmara Setorial de Plantas Medicinais no Fórum Nacional para a discussão da Proposta de Política Nacional de Plantas Medicinais e Medicamentos Fitoterápicos. Brasília, dezembro de 2001 ............................................................................ 193 FIGURA 28. Boletins sobre plantas medicinais, produto dos encontros do GEUPLAM, durante o segundo ciclo do processo. ............................................................. 199 FIGURA 29. Confraternização do Grupo de Estudo e Utilização de Plantas Medicinais para região Sul de Santa Catarina, dezembro de 2002 ................................... 208 XIV FIGURA 30. Folder de IV Jornada Catarinense de Plantas Medicinais........................... 211 FIGURA 31. Encontro simbólico entre Raiz e Semente. IV Jornada Catarinense de Plantas Medicinais. Itajaí. Santa Catarina ................................................................... 211 FIGURA 32. “Árvore da Vida” construída em oficina durante a VI Jornada Catarinense de Plantas Medicinais. Itajaí. Santa Catarina ...................................................... 212 FIGURA 33. Momentos da IV Jornada Catarinense de Plantas Medicinais. Itajaí. Santa Catarina ........................................................................................................... 212 FIGURA 34. Participação de representantes da Associação Catarinense e Câmara Setorial de Plantas Medicinais no Seminário Nacional de Plantas Medicinais, Fitoterápicos e Assistência Farmacêutica. Brasília, 2003. ............................. 213 FIGURA 35. Documento do Ministério da Saúde sobre a organização do Grupo Gestor de Medicinas Naturais e Práticas Complementares para o SUS: Grupo de Fitoterapia ....................................................................................................... 214 FIGURA 36. Incentivo à produção agroecológica de plantas medicinais a partir de discussões geradas no GEUPLAM ................................................................. 215 FIGURA 37. Boletins sobre plantas medicinais, produto dos encontros do GEUPLAM, durante o terceiro ciclo do processo ............................................................... 220 FIGURA 38. Documento sobre a criação da Gerência de Fitoterapia na Estrutura da Secretaria de Estado de Santa Catarina. ......................................................... 223 FIGURA 39. Participantes de reunião da Câmara Setorial de Plantas Medicinais no Cederural - Secretaria de Estado de Agricultura e Desenvolvimento Rural de Santa Catarina para organização da V Jornada Catarinense de Plantas Medicinais. Florianópolis, 2005 ..................................................................... 228 FIGURA 40. Folder da I Jornada Internacional e V Jornada Catarinense de Plantas Medicinais........................................ ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO. FIGURA 41. Boletins sobre plantas medicinais, produto dos encontros do GEUPLAM, durante o quarto ciclo do processo. ................................................................ 234 FIGURA 42. Material de divulgação da política nacional de plantas medicinais e fitoterápicos .................................................................................................... 239 FIGURA 43. Edições da Revista Plantas Medicinais: Recursos Naturais para o Bem Estar da Humanidade ............................................................................................... 244 XV FIGURA 44. Aprofundamento dos estudos sobre plantas medicinais e discussões sobre sustentabilidade com lideranças da Pastoral da Saúde no estado de Santa Catarina. .......................................................................................................... 246 FIGURA 45. Boletins sobre plantas medicinais, produto do encontro do GEUPLAM, durante o quinto ciclo do processo. ................................................................ 251 FIGURA 46. Reunião do GEUPLAM sob a coordenação de nova liderança .................. 260 FIGURA 47. Folder da VI Jornada Catarinense de Plantas Medicinais .......................... 267 FIGURA 48. Visita da pesquisadora à Espanha (Albacete e Palencia) ............................ 268 FIGURA 49. Representação da primeira metade do Xale de Retalhos (metáfora), com os produtos e momentos do processo .................................................................. 275 FIGURA 50. Cenários da Montanha Palentina ................................................................ 280 FIGURA 51. Área de abrangência do estudo. Espanha. Comunidad Autónoma de Castilla y León. Província de Palencia. Montanha Palentina ...................................... 281 FIGURA 52. Imagens da Universidad de Valladolid, Campus Palencia, Cátedra de Estudios de Género ......................................................................................... 286 FIGURA 53. “I Reunião Internacional de Investigação em Igualdade entre Mulheres e Homens: Estado da Questão”, Universidad de Valladolid, Campus Palencia 288 FIGURA 54. Material de divulgação da primeira Oficina “Plantas Medicinais e Mulheres em Busca de Sustentabilidade” ....................................................................... 294 FIGURA 55. Material de divulgação da Associação de Mulheres pela Igualdade “Tejiendo Cambios” ........................................................................................................ 301 FIGURA 56. Salinas de Pirsuega, Montanha Palentina ................................................... 303 FIGURA 57. Momentos da I Oficina “Plantas Medicinais e Mulheres em Busca de Sustentabilidade”, Salinas de Pisuerga, Montanha Palentina ......................... 304 FIGURA 58. Chegada das mulheres a residência da anciã de 103 anos, conhecedora de plantas medicinais. Cervera de Pisuerga, Montanha Palentina ...................... 309 FIGURA 59. Anciã mostrando a pesquisadora as plantas medicinais que utiliza diariamente ..................................................................................................... 310 FIGURA 60. Anciã falando sobre plantas medicinais para as mulheres visitantes.......... 311 FIGURA 61. Plantas medicinais utilizadas diariamente pela anciã de 103 anos ............. 312 FIGURA 62. Anciã mostrando porta-retrato com fotos da família .................................. 313 FIGURA 63. Pomada de cêra de abelhas, sebo de carneiro, azeite de oliva, camomila e arruda .............................................................................................................. 313 XVI FIGURA 64. Momentos da visita a anciã de 103 anos. Cervera de Pisuerga. Montanha Palentina ......................................................................................................... 314 FIGURA 65. Livro apresentado à pesquisadora pelo antropólogo: “La Voz de las Trece Abuelas” ......................................................................................................... 320 FIGURA 66. Estalaya, Montanha Palentina ..................................................................... 325 FIGURA 67. Momentos da II Oficina “Plantas Medicinais e Mulheres em Busca de Sustentabilidade”, Estalaya, Montanha Palentina .......................................... 328 FIGURA 68. Momentos finais da II Oficina “Plantas Medicinais e Mulheres em Busca de Sustentabilidade. Estalaya, Montanha Palentina ............................................ 331 FIGURA 69. Produtos desenvolvidos no projeto de licores e plantas medicinais em Tordehumus .................................................................................................... 337 FIGURA 70. Escola de Capacitação Agrária de Santa Espina. Montes de Torozos ........ 339 FIGURA 71. Visita a agricultores ecológicos em San Pedro de La Tarce ....................... 340 FIGURA 72. Canduela, Montanha Palentina. Chegada das mulheres para a III Oficina “Plantas Medicinais e Mulheres em Busca de Sustentabilidade” ................... 343 FIGURA 73. Momentos iniciais da III Oficina “Plantas Medicinais e Mulheres em Busca de Sustentabilidade”. Canduela. Montanha Palentina .................................... 343 FIGURA 74. Atividade realizada no do Projeto de Cooperação Transnacional “Ecosolidariedade entre Territórios” Brasil-Espanha. Gravatal, SC, BR.......351 FIGURA 75. Momentos da visita a produtores de plantas medicinais vinculados a Associação Palentina de Plantas Aromáticas e Medicinais (APAPAM)........371 FIGURA 76. Villanueva de Henares. Montanha Palentina .............................................. 372 FIGURA 77. Momentos da IV Oficina “Plantas Medicinais e Mulheres em Busca de Sustentabilidade”. Villanueva de Henares. Montanha Palentina.................... 374 FIGURA 78. Monasterio. Montanha Palentina ................................................................ 377 FIGURA 79. Momentos da V Oficina “Plantas Medicinais e Mulheres em Busca de Sustentabilidade”. Monasterio, Montanha Palentina ...................................... 381 FIGURA 80. Caminho de acesso para “El Roblón de Estalaya”, Montanha Palentina .. 387 FIGURA 81. “El Roblón de Estalaya”. Montanha Palentina ........................................... 388 FIGURA 82. Exposição artística: “Visão das plantas da Montanha Palentina, através das Lentes Femininas de Verena Iglesias” ............................................................ 389 FIGURA 83. Momentos iniciais do “Seminário Interdisciplinar sobre Plantas Medicinais e Sustentabilidade”. Universidade de Valladolid. Palencia............................... 393 XVII FIGURA 84. Cultivo agroecológico de amêndoas com alecrim. San Pedro da la Tarce . 394 FIGURA 85. Cultivo agroecológico de funcho. San Pedro de la Tarce ........................... 395 FIGURA 86. Discussões do segundo bloco, sessão I do Seminário Interdisciplinar sobre Plantas Medicinais e Sustentabilidade”. Universidade de Valladolid. Palencia ........................................................................................................................ 396 FIGURA 87. Participantes das Oficinas “Plantas Medicinais e Mulheres em Busca de Sustentabilidade” com a palavra no Seminário Interdisciplinar Sobre Plantas Medicinais e Sustentabilidade. Universidade de Valladolid. Palencia ........... 397 FIGURA 88. Apresentação organizada pelas participantes das Oficinas “Plantas Medicinais e Mulheres em Busca de Sustentabilidade” ................................. 401 FIGURA 89. Momentos iniciais da apresentação das atividades do Ciclo de Oficinas “Plantas Medicinais e Mulheres em Busca de Sustentabilidade”. Casa de Cultura. Cervera de Pisuerga. Montanha Palentina ........................................ 412 FIGURA 90. Apresentação organizada pelas participantes das Oficinas “Plantas Medicinais e Mulheres em Busca de Sustentabilidade” ................................. 415 FIGURA 91. Entrega de cesta artesanal de plantas silvestres a anciã. Cervera de Pisuerga, Montanha Palentina ........................................................................................ 416 FIGURA 92. Entrega de certificado de reconhecimento a anciã. Cervera de Pisuerga. Montanha Palentina ........................................................................................ 416 FIGURA 93. Anciã recebe de presente um xale das participantes das oficinas “Plantas Medicinais e Mulheres em Busca de Sustentabilidade”. Cervera de Pisuerga. Montanha Palentina.........................................................................................417 FIGURA 94. Anciã veste o xale e segura um maço de narcisos da Montanha Palentina, enquanto agradece. Cervera de Pisuerga. Montanha Palentina ...................... 418 FIGURA 95. Participantes das Oficinas “Plantas Medicinais e Mulheres em Busca de Sustentabilidade” acompanham a anciã. Cervera de Pisuerga. M.P...............419 FIGURA 96. Presentes recebidos pela pesquisadora de participantes das Oficinas “Plantas Medicinais e Mulheres em Busca de Sustentabilidade”. Cervera de Pisuerga. Montanha Palentina ........................................................................................ 419 FIGURA 97. Marassinia recebe o “Xale de Retalhos” ..................................................... 420 FIGURA 98. Representação da segunda metade do “Xale de Retalhos” (metáfora), com os produtos e momentos do processo .................................................................. 426 1 RESUMO Este estudo, partiu do princípio de que no caso das plantas medicinais, as mulheres historicamente detinham um certo poder na arte de cura e construção de conhecimentos, que ao longo dos séculos de domínio patriarcal foi “ocultado”. Neste contexto, vislumbrou- se a possibilidade do resgate deste poder, levando-se em conta que a construção de uma “sociedade planetária” sustentável depende da necessidade de se discutir os rumos do desenvolvimento sustentável e a construção de um novo paradigma aberto a discutir as bases das relações de gênero. Neste sentido, o objetivo do estudo, foi desenvolver um processo de construção transdisciplinar com mulheres de comunidades da região Sul de Santa Catarina - Brasil e do Norte da Espanha - Montanha Palentina, tendo como foco, o resgate de conhecimentos teórico-práticos sobre plantas medicinais e a promoção do empoderamento dessa população, no âmbito do desenvolvimento sustentável. Através da abordagem qualitativa integrativa à luz da transdisciplinaridade e da perspectiva de gênero, o estudo concretizou-se, utilizando-se de análise documental com base no método de sistematização de práticas sociais e método de pesquisa participante com princípios da etnografia. Inicialmente o desenvolvimento do processo baseou-se em uma experiência de pesquisa participativa com plantas medicinais e mulheres, no Sul do Brasil. Em reuniões mensais, com representantes de diversas titulações universitárias, as mulheres encontraram um espaço, desde uma perspectiva inclusiva e ampla, onde trocavam conhecimentos sobre 2 plantas medicinais, sendo estas, “tema gerador”, para outros debates que abordavam questões relacionadas ao feminino e a natureza. Assim, as mulheres tiveram a oportunidade para colocar seus saberes adormecidos, resgatar a autoestima e aumentar o senso de coesão. A partir da ampliação da consciência do poder comunitário, as mulheres começaram a alargar sua atuação na esfera coletiva, a nível estadual e a nível nacional, passaram a atuar na construção de Políticas de Plantas Medicinais e Fitoterápicos, aprovadas em 2006 no país. Dentro deste referencial, iniciou-se a proposta do processo de construção, envolvendo mulheres na Montanha Palentina - Norte da Espanha. A abertura de um espaço participativo com o respeito e integração em relação as várias formas de conhecimento, como propõe a visão transdisciplinar, levou o grupo ao dar continuidade ao processo. Isto se deu, com a aproximação paralela de outros atores sociais locais envolvidos com a temática. Em momentos de encontros em oficinas, a dinâmica de resgate de conhecimentos em plantas medicinais se aprofundou, e discussões avançaram no sentido de se questionar situações relacionadas ao desenvolvimento. Pouco a pouco, se construiu o empoderamento individual e coletivo e o processo ganhou força, com o encorajamento das mulheres, em participar da organização de eventos, junto a universidade local e a comunidade. Como produto das experiências no Sul do Brasil e Norte da Espanha, foram registrados conhecimentos etnobotânicos sobre cento e trinta plantas medicinais. Mas, as possibilidades da utilização da etnobotânica foram muito além disto, ao promover a abertura de espaços democráticos e participativos, nos quais possibilitou-se o exercício da solidariedade e sororidade, o reconhecimento do saber feminino ancestral, a promoção da diversidade cultural e biológica, a troca de conhecimentos científicos e populares, a participação política das mulheres, o exercício de um pensamento sistêmico e ecológico, a integração de arte, cultura e espiritualidade, a promoção do cultivo e/ou manejo de plantas medicinais, bem como, a potencialização de redes sociais locais e interculturais e a valorização e visibilização dos conhecimentos das mulheres. Finalmente, o processo proporcionou o reforço das relações comunitárias entre mulheres e homens, alargando a consciência ecológica e a compreensão de noção de Cidadania Terrestre, concretizando um caminho, comprometido com o desenvolvimento sustentável em equidade. Palavras-chave: plantas medicinais, etnobotânica, transdisciplinaridade, sustentabilidade, mulheres, empoderamento. 3 TRANSDISCIPLINARITY AND MEDICINAL PLANTS IN THE EMPOWERMENT OF WOMEN IN SEARCH OF SUSTAINABILITY IN SOUTHERN BRAZIL AND NORTHERN SPAIN: RESCUE OF EXPERIENCES OF KNOWLEDGE. Botucatu, 2013, 496p. Tese (Doutorado em Agronomia/Horticultura) Faculdade de Ciências Agronômicas, Universidade Estadual Paulista e (Doctorado en Conservación y Uso Sostenible de Sistemas Forestales) Instituto Universitário de Investigación en Gestión Forestal Sostenible, Universidad de Valladolid Author: FATIMA CHECHETTO Adviser: Prof. Dr. LIN CHAU MING Co-Adviser: Profa. Dra. FATIMA CRUZ SOUZA SUMMARY This study, assumed that, in the case of medicinal plants, women have historically held a certain power, in the art of healing and in its knowledge construction, which over the centuries of patriarchal domination was "hidden". In this context, envisioned the possibility of rescue of this power, taking into account that the construction of a sustainable "planetary society" depends on the need to discuss the direction of sustainable development and the construction of a new paradigm open to discuss the bases of gender relations. In this sense, the objective of this study was a process of developing and building in a transdisciplinary way, with women from communities in the Southern region of Santa Catarina-Brazil and the Northern Spain - Montaña Palentina focusing, the theoretical-practical knowledge rescue about medicinal plants and the promotion of the empowerment of the population, in the context of its sustainable development. Through a qualitative approach in the light of integrative transdisciplinarity and the gender perspectives, the study was carried out, using documentary analysis based on the method of systematization of social practices and the research method of participants with principles of Ethnography. Initially the development process was based on an experience of participatory research with medicinal plants and women, in Southern Brazil, where in monthly meetings with representatives from various 4 University titrations women found a space, from an inclusive and broad perspective, where exchanged knowledge about medicinal plants, these being "theme generator" for other discussions that addressed issues related to women and nature. Thus, women have had the opportunity to put their dormant knowledge, rescue the self-esteem and increase the sense of cohesion. From the expansion of the consciousness of the Community power, women began to broaden their activities in the sphere of collective, statewide and nationally, began to act in the construction of medicinal plants and herbal medicine policies, approved in 2006 in the country. Within this framework, the proposal of the construction process, involved women in Montaña Palentina-Northern Spain. The opening of a participatory space with respect and integration of all forms of knowledge, as proposed by the transdisciplinary vision, led the group to give continuity to the process. This took place, with the parallel approximation of other local social actors involved with the subject. In moments of meetings in workshops, the dynamics of knowledge on medicinal plants rescue deepened, and, discussions have advanced towards questioning development-related situations. Little by little, it built the individual and collective empowerment and the process gained momentum, with the encouragement of women to participate in the organization of events, along with local University and the community. As a product of experiences in Southern Brazil and Northern Spain, ethnobotanical knowledge was recorded over one hundred and thirty medicinal plants. The possibilities of use of ethnobotany was too much out of it, by promoting the opening of democratic and participatory spaces, in which it enabled the promotion of solidarity and the recognition of female ancestral knowledge, namely the promotion of cultural and biological diversity, the exchange of scientific and the popular knowledge , the political participation of women, the thought of a systemic and ecological integration of art, culture and spirituality, the promotion of the cultivation and/or management of medicinal plants, as well as, the potentiation of local social networks and intercultural appreciation and evaluation of the knowledge of women. Finally, the process resulted in the strengthening of the community relations between women and men, extending eco-consciousness and understanding of concept of Earth Citizenship, making a path, committed to sustainable development in equity. Keywords: medicinal plants, ethnobotany, transdisciplinarity, sustainability, women, empowerment. 5 TRANSDISCIPLINARIEDAD Y PLANTAS MEDICINALES EN EL EMPODERAMIENTO DE LAS MUJERES EN BÚSQUEDA DE SOSTENIBILIDAD EL SUR DE BRASIL Y NORTE DE ESPAÑA: EXPERIENCIAS DE RESCATE DE CONOCIMIENTOS. Botucatu, 2013, 496p. Tese (Doutorado em Agronomia/Horticultura) Faculdade de Ciências Agronômicas, Universidade Estadual Paulista e (Doctorado en Conservación y Uso Sostenible de Sistemas Forestales) Instituto Universitário de Investigación en Gestión Forestal Sostenible, Universidad de Valladolid Autora: FATIMA CHECHETTO Tutor: Prof. Dr. LIN CHAU MING Co-tutora: Profa. Dra. FATIMA CRUZ SOUZA RESUMEN Esta investigación, parte del presupuesto, que en el caso de las plantas medicinales, las mujeres históricamente han celebrado un cierto poder, en el arte de la construcción de sanación y conocimiento, que durante siglos de dominación patriarcal fue "escondido". En este contexto, se prevé la posibilidad de rescate de este poder, tomando en cuenta que la construcción de una "sociedad planetaria" sostenible depende de la necesidad de discutir la dirección del desarrollo sostenible y la construcción de un nuevo paradigma abierto a discutir las bases de las relaciones de género. En este sentido, el objetivo de esta investigación fue desarrollar un proceso transdisciplinar de construcción con mujeres de comunidades en la región sur de Santa Catarina - Brasil y la Montaña Palentina - norte de España, centrándose, en el rescate de conocimientos teórico-prácticos sobre plantas medicinales y la promoción del empoderamiento de esta población, en el contexto del desarrollo sostenible. A través de un enfoque cualitativo a la luz de la visión transdisciplinar y la perspectiva de género, la investigación se lleva a cabo, mediante el análisis documental basado en el método de sistematización de prácticas sociales y del método de investigación participante con los principios de la etnografía. Inicialmente el proceso de desarrollo se basó en una experiencia de investigación participativa con plantas medicinales y las mujeres, en el sur de Brasil. En reuniones mensuales con representantes de varias titulaciones de la Universidad las mujeres encontraran un espacio, desde una perspectiva inclusiva y amplia, donde intercambiaron conocimientos sobre plantas 6 medicinales, estas siendo, "tema generador", para otros debates donde se abordaron cuestiones relacionadas con las mujeres y la naturaleza. Por lo tanto, las mujeres han tenido la oportunidad de poner su conocimiento latente, rescatar la autoestima y aumentar el sentimiento de cohesión. Desde la expansión de la conciencia comunitaria, las mujeres comenzaron a ampliar sus actividades en la esfera del colectivo, estatal y nacional, actuando en la construcción de las políticas de plantas medicinales, aprobadas en el año de 2006 en el país. En este marco, empezó la propuesta del proceso de construcción, con las mujeres en la Montaña Palentina - norte de España. La apertura de un espacio participativo con respeto e integración con todas las formas de conocimiento, como lo propone la visión transdisciplinar, dirigió al grupo para dar continuidad al proceso. Esto ocurrió, con el cercamiento paralelo de otros actores sociales locales involucrados con el tema. En momentos de encuentros en talleres, se profundizó la dinámica de rescate del conocimiento sobre plantas medicinales, y las discusiones han avanzado hacia cuestionar situaciones relacionadas con el desarrollo. Poco a poco, si construyó el empoderamiento individual y colectivo y el proceso cobró impulso, con el apoyo de las mujeres a participar en la organización de eventos, junto con la Universidad local y la comunidad. Como producto de las experiencias en el sur de Brasil y norte de España, se registraron conocimientos etnobotánicos sobre ciento treinta plantas medicinales. Pero, las posibilidades de utilización de la etnobotánica fueran mas allá, promoviendo la apertura de espacios democráticos y participativos, en la cual permitió la promoción de la solidaridad y sororidad, el reconocimiento del conocimiento ancestral femenino, la promoción de la diversidad cultural y biológica, el intercambio del conocimiento científico y popular, la participación política de las mujeres, el ejercicio de un pensamiento sistémico y ecológico, la integración de arte, cultura y espiritualidad, la promoción del cultivo y manejo de plantas medicinales, así como, la potenciación de las redes sociales locales y el apoyo intercultural y la visibilizacion de los conocimientos de las mujeres. Finalmente, el proceso resultó en el fortalecimiento de las relaciones comunitarias entre mujeres y hombres, ampliando la conciencia ecológica y comprensión de la noción de Ciudadanía Terrestre, de una manera a concretizar un camino, comprometido con el desarrollo sostenible en equidad. Palabras claves: plantas medicinales, etnobotánica, transdisciplinariedad, sostenibilidad, mujeres, empoderamiento. 7 1 INTRODUÇÃO 1.1 Gênese, Problematização e Delimitação do Tema Em 1999, como professora universitária, na finalização de um curso de Pós- graduação a nível de especialização usando a abordagem transdisciplinar, intencionava produzir uma monografia interligando temas do feminino, plantas medicinais e sustentabilidade. Iniciei com minhas referências viciadas nos “padrões científicos convencionais” resultando em um esforço infrutífero, já que recorria somente à minha dimensão racional. E olha que tentei... Afinal, dois meses e meio depois do nascimento de 8 minha filha Aurora, em período de licença da Universidade, resolvi deixar falar o coração... E então aconteceu MARASSÍNIA. O nome Marassínia surgiu através de uma “busca xamânica”. O xamanismo é um sistema de conhecimentos que fez, e ainda faz parte, de muitas tradições tribais. Na concepção de Sams (1993), o xamanismo deriva, na tradição dos povos indígenas, da atenta observação da natureza como regra de vida que se cumpre gerando conhecimento acumulado como um repositório de noções acuradas sobre os modos de ser revelados pela Terra em suas interações com os fenômenos cósmicos. Neste sentido, a adequação de todas as formas de vida aos ciclos e ritmos telúricos, é considerada fundamental para a saúde não só de seres humanos e animais, como também do próprio Planeta . A pesquisadora brasileira Elaine Elisabetsky, em conferência durante o 11º Congresso Internacional de Etnofarmacologia, em Albacete-Espanha destacou que bem mais do que mostram reportagens em jornais sobre Pelé ou Gisele Bundchen, pelos quais o Brasil é conhecido internacionalmente, o xamanismo como busca espiritual tem se difundido pelo mundo inteiro, sem que as pessoas se dêem conta de que boa parte destes conhecimentos, vêm das inúmeras tribos indígenas brasileiras (ELISABETSKY; SÁ, 2010). E foi através do xamanismo urbano, que tive acesso a Marassínia. O xamanismo urbano tem como principal referência a inspiração nas práticas xamânicas das sociedades indígenas, e busca sua fundamentação, não apenas nas cosmologias desses povos. Se fundamenta também na mitologia clássica e em obras acadêmicas como as de Carl Jung e outras referências da ciência, como a biologia molecular, a genética e a física quântica. Em todos os casos, parte sempre do pressuposto de que se trata da busca de ligação com tradições imemoriais, e do resgate de uma sabedoria perdida ou restrita a pequenos grupos que ainda manteriam um modo de vida em contato com a natureza (MAGNANI, 2005). Desta forma, em uma busca xamânica, através das batidas ritmadas de tambor, fiz perguntas quanto ao trabalho a ser desenvolvido em minha profissão e recebi como resposta que devia trabalhar com Marassínia. Que Marassínia estaria ligada a cor verde e as plantas medicinais. No princípio, achei que era o nome de uma planta medicinal em particular. Recorri a livros tentando encontrar algum nome científico semelhante mas não encontrei. 9 Então voltei-me novamente para dentro, e fiz outra busca ou viagem xamânica, para descobrir mais a respeito deste nome : “Chegando na África, encontro com uma mulher de olhos grandes e rosto anguloso. Ela me leva até uma anciã que trabalha com plantas. Apresento-me a ela, através de meu nome xamânico. Também se apresenta: chama-se MARIBÚ. Tem a pele muito escura, é bastante magra. Usa óculos. Está rodeada de ervas. Maribú começa a contar sobre MARASSÍNIA, já que havia lhe perguntado sobre o significado de tal nome: – No início a Terra era avermelhada. Com a chegada das plantas tingiu-se de verde. E a Terra passou a se chamar Marassínia, mesmo antes de ser chamada de Gaia. Poderiam ser outros e vários nomes, mas para ti, a consciência da Terra como entidade feminina através de suas plantas, especialmente as medicinais, surgiu com o nome de Marassínia, que significa “A Grande Avó Verde”. Você vive Marassínia todos os dias no seu trabalho científico com as plantas medicinais. E honra Marassínia quando realiza o contato intuitivo-espiritual com elas. Marassínia, na verdade é tua própria consciência, que se conecta com a Consciência Coletiva do Planeta Terra, no tocante ao feminino e às plantas medicinais” (Figura 1) Figura 1. Representação simbólica da busca do significado do nome Marassínia pela pesquisadora (Imagem: Gisele Mara Hadlich) 10 Meus estudos e escritos na época, passaram a uma tentativa de estar mais próxima desta perspectiva do resgate do poder de cura e transformação através da consciência do feminino, compreendendo a Terra em um sentido figurado, no seu aspecto relacionado às plantas, como a “Grande Avó Verde”, em parte, através das plantas medicinais. Procurei para tanto, entender como ao longo do tempo na história da humanidade a consciência do feminino teria levado, ou poderia levar futuramente, os seres humanos a algumas ações com poder de transformação. Neste sentido, busquei compreender qual tem sido a influência desta consciência a nível mundial, principalmente no campo científico. Ao mesmo tempo, a nível menos globalizado e mais próximo, no Estado de Santa Catarina, na região Sul de Santa Catarina, desenvolvia um trabalho de pesquisa e extensão com plantas medicinais junto a comunidades, muitas delas envolvendo mulheres anciãs, com conhecimentos ancestrais. Nesta trajetória, fui me dando conta que nenhum trabalho externo é verdadeiramente possível, sem que haja uma correspondência interna profunda. O trabalho externo apenas reflete nosso estado de ser. Não sendo desta forma, apenas estaríamos reproduzindo escritos, utilizando somente uma das dimensões - a racional - como seres humanos. Como não é este o enfoque da visão transdisciplinar, pois procura resgatar todas as dimensões para a construção do conhecimento, fui buscando integrar vivências e experiências internas praticadas até então. O trabalho da monografia a que me referi acima, na época intitulado “Resgatando Marassínia”, foi um exercício para uma elaboração mais aprofundada no ano de 2003. Naquele ano, concluía o mestrado em Saúde Coletiva, que resultou na dissertação: “Rede Catarinense de Plantas Medicinais: Uma Abordagem Transdisciplinar para a Saúde Coletiva”. Em uma etapa posterior de graduação acadêmica, de junho de 2011 a junho de 2012, parte do tempo da escrita deste trabalho de tese para obtenção do título de doutorado, dentro de um circuito de viagem e interação com a cultura europeia, a partir do Programa de Doutorado no País com Estágio no Exterior - PDEE - CAPES no Norte da Espanha, deparei-me com um forte desafio. Me parecia um desafio que ultrapassava o do aprendizado e forçava o próprio espírito na tentativa de unir as partes, tornando não mais importante “o que iria escrever”, mas o exercício de “como construir para escrever”. Na chegada à Espanha, descortinou-se a oportunidade de exercitar uma visão apreciativa do planeta, estando voltada para um processo de interiorização, podendo olhar com amplitude, 11 tudo o que me cercava. Refletia sobre os acontecimentos da trajetória humana, desde os primórdios da terra, procurando entender como os processos ocorreram, mergulhada em leituras de livros com autores sobre a abordagem transdisciplinar. Isto possibilitou uma visão macro, da dinâmica que o coletivo criou e porque chegamos como humanidade, no estágio planetário em que estamos: imersos em uma grande crise e necessitando urgentemente descobrir caminhos para a sustentabilidade. Esta oportunidade extrapolou em muito, o foco do trabalho antes pretendido, no sentido de uma evolução em compreensão, que me fez rever a proposta do projeto de tese que vinha elaborando até a chegada na Espanha. Este reposicionamento do projeto não se refletiu na intenção e tampouco na direção, mas na amplitude e suas possíveis repercussões, dentro de uma visão de perspectiva global de compreensão da humanidade e a inserção, bem como a co-relação das ações locais que trata este trabalho. Passei então a me perguntar: quem sou eu, dentro deste posicionamento global? Como posso construir um novo caminho, colocando no concreto da escrita, idéias e experiências de anos de vida e que convergem num tópico que é o tema do doutorado? Como utilizar na construção deste caminho, todas as minhas dimensões desde a biológica à espiritual, como requer a transdisciplinaridade, sem me apartar de nenhuma delas, num todo coerente e compreensível? Como integrar neste processo a criança, a adolescente, a mulher e a anciã que coexistem dentro de mim? Como dar vazão ao amor pelas plantas e aos estudos, a agricultora, a pesquisadora, a educadora, a mãe, a buscadora espiritual? Como entrelaçar conhecimentos de diversas correntes? Passei a fazer uma retrospectiva da educação formal, vivências e experiências por mim acessadas ao longo da vida e que hoje constituem meu repertório de conhecimentos híbridos, com os quais pretendo percorrer a aventura da construção desta tese. Memórias foram acessadas desde o contato com a vida rural na infância: a solidão, a timidez, os medos, a forma peculiar de me relacionar com as plantas, as pessoas e o planeta...os estudos...as leituras apaixonadas de livros... desde o primeiro deles nas memórias de infância - “O Guarani” de José de Alencar - quando a imaginação corria solta sobre os cenários naturais fantásticos. Depois... “O Meu Pé de Laranja Lima” que despertou em mim a conversa com ameixeiras, goiabeiras e bergamoteiras. Da infância, seguem as memórias do contato com a filosofia cristã, por conta da fé de meus antecessores italianos. Mais tarde...saindo do meio rural para estudar, o contato chocante 12 com a urbanização, a universidade, o distanciamento da filososofia cristã na qual fui criada em uma busca espiritual de outras filosofias... filosofias orientais e ocidentais, estudos sobre astrologia, yoga, vivências em comunidades: Nazaré Paulista, Figueira, o contato com a cultura indígena: guaranis, xamanismo urbano, terapias integrativas e complementares, antroposofia (agricultura biodinâmica, pedagogia waldorf, medicina antroposófica), taoísmo, budismo... Experiências e vivências vão se encontrando... e todas elas, sem dúvida colaboram na construção do caminho. Desde as referências da infância transcorrida no meio rural em Jacinto Machado, pequeno município do Sul de Santa Catarina, conservo viva a sensação do frescor do ambiente simples e natural onde aprendi a amar e conhecer as plantas, e em especial as medicinais. O contato prático com estas, vem dos sábios conhecimentos repassados pela “nona” Augusta, muitos destes, recebidos por ela através de contatos com indígenas. A oitava de nove filhos de pais de origem italiana, desde cedo fui iniciada na labuta do trabalho agrícola, mas também desfrutei de um ambiente cultural. Todos os irmãos que me antecederam progrediam nos estudos e a maioria deles vivia em regiões distintas do país a fim de completar suas formações. Quando retornavam de férias, traziam tantas e tão ricas histórias que ampliavam meu pequeno mundo. Para mim, estudar era “um caso de amor”, além das plantas. A noite, depois de um dia intenso de trabalhos na “roça”, sob luz de lamparina me deleitava em leituras e tarefas escolares. Secretamente, ou nem tanto, pois adorava deixar correr minha imaginação e dialogar com as plantas, nutria sonhos de me tornar professora, pesquisadora e poder me expressar através das palavras e da escrita, apesar da minha enorme timidez. Ao terminar os estudos básicos na escola pública, optei como a maioria dos meus irmãos por estudar em um outro município próximo, em um colégio particular. Apesar de ser um colégio pago, meus pais com auxílio de bolsas de estudo, se esforçavam para manter-nos lá, pois tinha fama de preparar bem para o vestibular. E já que não tinham muitas posses, consideravam que a melhor herança que poderiam deixar para os filhos era o conhecimento. Em época de escolha de uma profissão, prestei como opção vestibular para o Curso de Arquitetura e fui classificada. Foi um período de profundas mudanças. Transferindo-me para o meio urbano a fim de realizar o curso, o contato com a natureza 13 diminuiu e caí em grande crise. Acabei mudando minha opção profissional e prestei vestibular novamente, para o Curso de Agronomia. Nesta época não consegui discernir o porquê da mudança e uma grande dúvida permaneceu em meu íntimo quanto ao meu trabalho. Iniciei uma busca então, no campo do auto-conhecimento, pesquisando e vivenciando várias filosofias espiritualistas e terapias naturais. No Curso de Agronomia, especialmente me interessava pelas disciplinas relacionadas às plantas, sociologia e extensão rural e procurava me envolver com projetos de pesquisa-extensão nas comunidades. Optei realizar o trabalho final do Curso de Graduação, no Oeste de Santa Catarina, na organização de mulheres rurais. Nos contatos com agricultores, ouvia muito sobre a influência da lua para o cultivo e para o corte de madeiras e assim, quando se apresentou um astrólogo do Rio de Janeiro na Universidade, em uma conferência sobre Astrologia Agrícola, resolvi me aprofundar. O aprofundamento me levou ao interessse por astrologia humana e foi aí que me deparei com os ensinamentos de Emma de Mascheville, através de uma de suas discípulas. Ouvindo sobre Emma, que já não se encontrava neste planeta, aprendi a admirar a mulher, neta da baroneza Von Hoffmann da Transilvânia, que viveu seus primeiros anos na Suiça, em Monte Veritá, onde seu tio havia fundado uma comunidade de naturistas e reformadores, pregando a volta à natureza. Em Berlim, quando estourou a Grande Guerra Mundial, ajudou seu pai, pertencente a um grupo liderado por Herman Hesse, na atenção a fugitivos e prisioneiros da guerra. E mais tarde, com a esperança de se preparar a humanidade para novos tempos, acompanhava sua família a América, radicando-se no Brasil e tornando-se uma das maiores autoridades mundiais em astrologia, conhecida por sua profunda ética astrológica, e pelo trabalho pedagógico que sempre buscou realizar neste campo (GARCIA, 1994). Seus ensinamentos me introduziram na riqueza do simbolismo astrológico, permitindo-me a abertura com uma comunicação universal, que exercita um apurado grau de síntese e unidade, em um corpo de conhecimentos organicamente integrados, sistêmicos. E assim continuei, após concluir a faculdade, a pesquisar no campo científico em uma pós-graduação a nível de especialização. Em paralelo desenvolvia estudos em outros campos, dedicava-me ao aprofundamento da astrologia humana e participava de um grupo de teatro com temas educativo-ecológicos. Porém, estes eram dois compartimentos em minha vida separados, já que não sabia como, ou ainda não era o momento de integrá- los. 14 Mais tarde, quando descobri minha vocação para a educação, assumi a disciplina de Botânica Econômica, no Curso de Agronomia, que estava iniciando na Universidade do Sul de Santa Catarina - UNISUL. Ao ler a proposta de ementa, senti que iria percorrer um longo caminho de volta às raízes. Identifiquei-me totalmente, principalmente com a parte que compreendia o tema plantas medicinais. Logo no primeiro dia de aula, fazendo uma reflexão com os alunos a respeito da opção pelo Curso de Agronomia em nossas vidas, compreendi o porquê de minha escolha. Quando havia iniciado o Curso de Arquitetura, e atuando em meio urbano, senti falta de minhas raízes ligadas à natureza. Ter abandonado Arquitetura e escolhido Agronomia foi para mim uma tentativa de estar mais próxima dela, resgatando minhas raízes e buscando minha cura para a crise que estava vivenciando, em meio ao mundo urbano. A partir desta época, o fascinante mundo das plantas medicinais me envolveu por completo. Feliz por ter descoberto meu caminho profissional e de vida, lancei-me a participar de congressos, ler todos os livros que encontrava sobre o assunto, e praticar na construção de um trabalho de pesquisa e extensão. Querendo compartilhar meu amor pelo assunto, encontrei outras pessoas também interessadas e, em 1996, formamos a Equipe Interdisciplinar em Plantas Medicinais da Região Sul de Santa Catarina. Iniciava na época uma liderança que foi acontecendo naturalmente, amplificando a atuação através da voz e da escrita, como sonhara na infância. Quanto mais estudava e praticava a partir desta temática multidimensional, mais o conhecimento se ampliava a respeito da ciência e da visão de mundo, que trouxera a humanidade inumeráveis conquistas, mas também precipitara a humanidade e o planeta a níveis insustentáveis. Na multidimensionalidade que a temática sugere, é que iniciaram as inquietações e indagações para a a construção deste trabalho científico transdisciplinar. O caráter multidimensional da temática “plantas medicinais” tem sido reconhecido como ponto crucial para o desenvolvimento de estudos e ações nesta área, em função dos conhecimentos milenares, que demandam abertura para a complexidade levando ao questionamento do que se entende por ciência no século XXI. Os estudos de Patrício et al. (1999) mostram que mediante os paradigmas predominantes, neste último século a ciência nos possibilitou conhecer muito e desenvolver as mais variadas tecnologias. Por outro lado, a falta de respeito com a vida se manifesta no desequilíbrio 15 ecológico e cultural, colocando em risco de extinção espécies animais, vegetais e componentes da tradição que promovem a vida. D’Ambrósio (1993) aborda sobre a origem do problema, na concepção científica, no seu aspecto reducionista e atomista. Assinala que esta concepção é contra a natureza e a vida, conduzindo o ser humano a privilegiar um único modelo de desenvolvimento, ignorando a complexidade cultural e social. O autor, a partir desta reflexão, entende que sobreviver à crise atual depende de uma visão global ou holística da realidade, e que esta visão emana, por sua vez, das grandes tradições da humanidade e das conclusões mais recentes da física. Isto, segundo o autor, exige uma mudança radical que se aplica a todos os níveis do saber e do fazer. Mas, como o entendimento de uma nova concepção de ciência pode auxiliar na busca de sustentabilidade a partir de reflexões e ações que envolvem a temática “plantas medicinais”? Di Stasi (1996b) propõe o exercício da interdisciplinaridade. Chechetto (2003), sugere que para compreender e interpretar as múltiplas concepções e integrar a diversidade existente quando se aborda a temática, exige-se, além da interdisciplinaridade, a prática da transdisciplinaridade. E o que seria a transdisciplinaridade? Qual sua ligação com a ciência do século XXI, baseada em sistemas complexos? Partindo do entendimento de interdisciplinaridade, esta surge, como consequência da complexidade de um objeto de estudo, que convoca para sua compreensão múltiplas visões, sendo a interação a condição necessária para seu exercício (Bustelo citado por PATRÍCIO, 1995; FAZENDA, 1992). Sobre a transdisciplinaridade, essa requer antes de mais nada uma atitude interdisciplinar; e vai além disto, ao integrar o saber das diferentes disciplinas com o saber popular e tradicional (PATRICIO, 1991a; D’AMBROSIO, 1993). Com base nestas reflexões, nasceu o desejo de contribuir de forma mais significativa, na construção de caminhos em busca da sustentabilidade através da visão transdisciplinar, nos meios onde estava atuando com plantas medicinais, e que tornara-se mais concreto ao produzir conhecimentos no mestrado em Saúde Coletiva. Na ocasião, como docente na universidade nas áreas de ensino, pesquisa e extensão convivia de um lado com conhecimentos e informações científicas sobre plantas medicinais na academia, de outro lado, com os saberes e práticas em comunidades detentoras de outros conhecimentos. 16 Atuava também na organização da área de plantas medicinais em Santa Catarina, convivendo com meios políticos e artístico-culturais como Coordenadora da Associação Catarinense de Plantas Medicinais e da Câmara Setorial de Plantas Medicinais, no Conselho de Desenvolvimento Rural - Secretaria de Estado da Agricultura, e indagações me impulsionavam. Instigava-me compreender como se desenvolveu o processo de construção da Rede Catarinense de Plantas Medicinais tendo em vista os elementos teórico-práticos de enfoque transdisciplinar aplicados neste processo, desde o início da organização da área no Estado. Para dar conta de meu propósito recorri a uma metodologia de acordo com a nova visão de mundo no campo científico, ou seja: com a mudança de paradigma: a metodologia holístico ecológica, criada por Patrício (1999). Após a conclusão e defesa do trabalho, as reflexões propostas no estudo, contribuíram para o direcionamento de um caminho teórico-prático de transformação a partir dos princípios transdisciplinares, identificados no processo de construção da Rede Catarinense de Plantas Medicinais. Estes princípios reforçavam a ideia da unidade de pensamento e da integração de setores e saberes (CHECHETTO, 2003). Passei então a socializar este conhecimento em palestras e publicações com o objetivo de contribuir para uma revisão de valores que norteiam as ações no campo da saúde coletiva baseadas na disciplinaridade e no reducionismo, que impedem avanços na área de plantas medicinais e em outras áreas. Ampliava também a inserção na esfera coletiva, atuando no Grupo de Fitoterapia do Ministério da Saúde - Brasil, para a construção da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares para o Sistema Único de Saúde - SUS (PNPICS), política aprovada em maio de 2006. Em 2009, aprovada na seleção do Doutorado em Agronomia, no Programa de Horticultura da Universidade Estadual Paulista, na área de etnobotânica - plantas medicinais, surgiu a oportunidade de aprofundar os conhecimentos construídos no mestrado e aproveitar as experiências acumuladas nos anos anteriores. Especialmente sobre a experiência do Grupo de Estudos e Utilização de Plantas Medicinais - GEUPLAM envolvendo a equipe inter-transdisciplinar da qual participara e ainda em curso, entre comunidade e universidade, com mulheres conhecedoras de plantas medicinais da região Sul de Santa Catarina. 17 Esta experiência faz parte do início da organização da área de plantas medicinais em Santa Catarina e perdura por 15 anos, em longo intercâmbio de conhecimentos científico e popular. Atualmente estes estudos contam com o apoio de Universidades da região, incluindo a Universidade Federal de Santa Catarina. Participantes do projeto, compreendem sua importância, não só quanto ao resgate de conhecimentos, fundamentais para a sobrevivência de pesquisas com plantas medicinais, mas também como um espaço para a participação e discussão de temáticas mais amplas, que envolvem sustentabilidade. Adotando uma concepção holística da realidade, o grupo discute a temática “plantas medicinais” de forma abrangente, de maneira que as mulheres possam colocar seus conhecimentos adormecidos, resgatar sua auto-estima e aumentar o senso de união. O processo de construção desta experiência iniciado em 1996, bem como os dados gerados necessitavam ser acompanhados, descritos e analisados, no doutorado a que me propus. Em setembro de 2010, em visita a uma das conexões da Rede Catarinense de Plantas Medicinais, na Universidade de Valladolid – Palencia - Espanha, na área de Desenvolvimento Rural e Psicologia do Trabalho, as possibilidades de aprofundamento desta proposta se ampliaram. Trabalhos realizados pela Doutora Fatima Cruz Souza na Escuela Universitária de Educación desta Universidade e Instituto de Gestión Forestal Sostenible estão focados na linha do desenvolvimento rural sustentável, aplicando-se metodologias qualitativas de abordagem integrativa e alguns dos quais, envolvendo grupos de mulheres. Na região da Montanha Palentina, desenvolvem-se projetos que se referem ao despovoamento, como uma grave ameaça a sobrevivência dos territórios rurais, e a manutenção do patrimônio natural e cultural associado. Neste contexto, as mulheres têm papel fundamental, sendo protagonistas do êxodo rural, tendo sido expulsas conforme Cruz- Souza (2006). A autora, depois de ter entrevistado mulheres de comunidades ao norte da Espanha, propõe ações para o desenvolvimento rural sustentável daquela região, entre elas, a construção de redes entre grupos de mulheres, inclusive a nível internacional, impulsionado o intercâmbio de experiências, apoio a construção de identidades femininas com plena participação de mulheres, promoção do desenvolvimento rural integral na visão da perspectiva feminina como narradoras válidas de suas próprias necessidades, expectativas e experiências e busca de soluções criativas a seus problemas cotidianos. 18 Diante deste contexto, incluindo a necessidade da busca por um caminho que leve ao desenvolvimento sustentável, insere-se a constatação de Migliori (2009), de que as estratégias conhecidas, advindas de um modelo dominado pela cultura patriarcal, já não estão dando conta para encontrar soluções diante da crise planetária existente. Neste sentido, a construção de uma “sociedade planetária” sustentável depende da necessidade de se discutir os rumos do desenvolvimento sustentável e a construção de um novo paradigma aberto a rever as bases das relações de gênero. Daí a necessidade da participação das mulheres, como defendem Herrero, Cembramos e Pascual (2011), porque têm desenvolvido habilidades e conhecimentos de sobrevivência que os construídos pela cultura patriarcal desconhecem e que são de grande importância para a construção da sustentabilidade. Para tanto, segundo Cruz-Souza (2012), é necessário equilibrar as relações de poder que possibilitem, o que em teoria de gênero se vem denominando como “empoderamento” de mulheres. No caso das plantas medicinais, as mulheres historicamente, detinham um certo poder, na arte de cura e construção de conhecimentos que ao longo dos séculos de domínio patriarcal foi “retirado”(BORGES, et al., 2010). Neste contexto, vislumbrou-se este estudo, no sentido da possibilidade de resgate destes conhecimentos, utilizando-se a etnobotânica pelo seu caráter transdisciplinar e a perspectiva de gênero, para se promover o empoderamento. O estudo justifica-se portanto, na expectativa de que os conhecimentos advindos deste, possam contribuir na busca de caminhos em direção ao desenvolvimento sustentável, a partir do empoderamento de mulheres no Sul do Brasil e Norte da Espanha, por meio do resgate de conhecimentos sobre plantas medicinais, na abordagem transdisciplinar e perspectiva de gênero. Justifica-se ainda pelas possibilidades de aprofundamento quanto a metodologias qualitativas de abordagem integrativa, em consonância com paradigmas emergentes em direção à sustentabilidadade. E como parte da utilização de todas as minhas dimensões, na construção dos conhecimentos que compõem esta tese, a fim de atender a perspectiva transdisciplinar a que me proponho, é que “ressurgiu” Marassínia. Apoiada em Fazenda (2010), uma das expoentes da pesquisa interdisciplinar no Brasil, que aponta caminhos e traz reflexões sobre este tipo de pesquisa que bem poderiam 19 ser utilizadas para o pesquisador transdisciplinar, fui resgatando a presença ativa de Marassínia. A autora acima referida, reforça a necessidade de se descobrir o valor e o sentido da pesquisa na vida dos pesquisadores, buscando alternativas para o dilema de ordem teórico/metodológico em suas formações, tendo inclusive, a preocupação em avançar nos cuidados e valor do uso de metáforas, nas questões de subjetividade e a importância atribuída a dimensão simbólica. A autora ainda alerta para o fato de que pesquisas desta natureza não nascem do acaso e sim de uma vontade construída. Em sua opinião, seu nascimento não é rápido e: “(...) exige uma gestação prolongada, uma gestação em que o pesquisador se aninha no útero de uma nova forma de conhecimento - a do conhecimento vivenciado e não apenas refletido, a de um conhecimento percebido, sentido e não apenas pensado (...) das dúvidas construídas e trabalhadas surge um desafio - o desafio de criar uma teoria, uma teoria nascida de uma prática intensamente vivida. Este desafio vai se explicitando na superação de múltiplos obstáculos. O primeiro deles, o mais fundamental é vencer as amarras pessoais e deixar o peito aberto para que flua toda a emoção que a ação praticada provocou. Este processo é tão ou mais longo que o da nidação da teoria, pois exige uma adesão irrestrita ao processo de desvalimento da prática, exige o rompimento com estereótipos adquiridos no passado, rompimento às descrições padronizadas, exige a descoberta enfim, do símbolo que gestou e sustentou toda a prática vivida. Esse símbolo (...) é próprio de cada um, portanto exige do pesquisador um tempo próprio de maturação, uma forma própria de narrar e descrever, uma forma própria de reorganizar a ação, uma estética própria na apresentação e, sobretudo, exige de cada um, o compromisso com o desvelamento de uma ética própria que determinou seu próprio modo de ser - o que o marca, o distingue, o personaliza como ser único, habitante e construtor de uma forma própria...”(FAZENDA, 2010. p. 6) Para Fazenda (2010), a pesquisa interdisciplinar exige, a busca da marca pessoal de cada pesquisador e o exercício em buscar sua “marca registrada” envolve uma viagem interior, que identifica-se com seu modo próprio de ser no mundo, no qual busca o encontro com sua metáfora interior. Este exercício de descoberta de sua metáfora interior, permite ao pesquisador um contato tão profundo com seu próprio eu, que o obriga a uma 20 percepção em totalidade de seu papel no mundo e do papel dos outros que com ele interagem. A autora, nos últimos anos tem se aproximado dos estudos de Gauthier que afirma a importância da metáfora como referência, não apenas para o sujeito que pesquisa, mas para o grupo que dela compartilha. A mesma, comenta sobre as formas que os analistas junguianos interpretam as influências do inconsciente coletivo e dos arquétipos na estruturação básica da personalidade humana, incluindo símbolos e mandalas. Segundo Jung (2000), o ser humano é um animal simbólico e necessita destes para processar as informações e desenvolver sua individualidade, que conterá fenômenos diversos preenchidos ou não, de forte carga emocional. Jung criou conceitos importantes sobre a psique humana e seu significado simbólico. A análise de signos, símbolos, arquétipos (pré-disposição para experimentar e simbolizar situações humanas universais de diferentes maneiras), imagens, sonhos, mitos, inconsciente coletivo, persona, sombra e self constituem as bases da Psicologia Analítica criada por ele. Como pesquisador, dedicou-se profundamente aos meios pelos quais se expressa o inconsciente. Em sua teoria, enquanto o inconsciente pessoal consiste fundamentalmente de material reprimido e de complexos, o inconsciente é composto fundamentalmente de uma tendência a sensibilizar-se com imagens (símbolos), que constelam sentimentos profundos de apelo universal, os arquétipos, da mesma forma que os animais e seres humanos parecem possuir atitudes inatas, chamadas de instintos. Também enquanto pesquisador, Jung explorou funções psicológicas do pensamento, sentimento, sensação e intuição, as camadas da psique inconsciente pessoal e coletiva. Argumentou que o inconsciente pessoal possui conteúdos mentais adquiridos durante a vida do indivíduo, que foram esquecidos ou reprimidos, enquanto que o inconsciente coletivo é uma estrutura herdada, comum a toda a humanidade, composta dos arquétipos. Sugeriu que camadas mais profundas do inconsciente independem de leis de espaço, tempo e causalidade, gerando correspondência entre acontecimentos interiores e exteriores por meio de um significado comum, a qual denominou “ sincronicidade”. Explorou exaustivamente sonhos e imagens artísticas de seus pacientes. Suas obras, além de influenciarem a psicologia, influenciaram várias áreas do conhecimento como antropologia, sociologia e muitos outros campos como arte, literatura e mitologia. 21 Jung, criticava a visão materialista sobre a ciência. Defendia que, o materialismo não passa de um culto a um Deus exteriormente concreto por meio da razão , um tipo de fé nos princípios limitadores das leis físicas. Acrescentava que a razão impõe limites muito estreitos e apenas convida a viver o conhecido, e que convém recebermos igualmente os aspectos racionais e irracionais da vida. Um caso que ilustra estes pensamentos é o do conhecido “escaravelho dourado”. Neste caso, Jung atendia uma paciente que apresentava uma forte resistência à terapia, sendo que a monotonia afetava paciente-terapeuta. Até o dia em que a paciente relatou que tivera um sonho com um escaravelho dourado.Assim que acabara de contar o sonho, escutou-se um estampido na vidraça. Era uma espécie de besouro de cor dourado muito raro na região e época do ano em que estavam. Daí em diante a análise deslanchou, ocasionando o renascimento daquela personalidade, estabelecendo-se a relação entre renascimento e o antigo símbolo egípcio do besouro. Retornando aos trabalhos científicos orientados por Ivani Fazenda, a forte presença arquetípica reconhecida por analistas junguianos nas mandalas pesquisadas no âmbito da psicologia analítica são encontradas nos estudos das teses de orientados por Ivani Fazenda, quando da descoberta das metáforas interiores, também reforçadas por Gauthier (2004). A mandala nestes trabalhos, adquire a configuração de uma imagem desenhada ou descrita através de formas e esta, acompanha o pesquisador durante todo o processo da pesquisa, e muitas vezes de tão marcante acaba por identificar a pesquisa e seu próprio autor. Nos casos acompanhados por Fazenda, sendo o objeto de estudo a interdisciplinaridade, a imagem sempre acaba contemplando aspectos da totalidade do conhecimento numa espiral ascendente, e a mesma acredita que parte do poder de síntese que estas imagens detêm é incorporada à identidade do pesquisador, auxiliando-o posteriormente na recomposição de outros aspectos de sua vida. Por compreender seu universo de ações e significados, o pesquisador interdisciplinar aceita dividir sua própria percepção do mundo e dos seres humanos, demandando por isto, um tipo especial de pesquisador, com sensibilidade para compreender os outros e respeitá-los. O processo de pesquisar desenvolvido pela autora e seu grupo de trabalho, demandou uma formação especial na forma de pesquisar - a formação para a escuta 22 sensível - e a todo o processo que compreende a aquisição de uma escuta sensível na pesquisa, Fazenda, denominou “amor”. Melhor adquirindo contornos de um rigor epistemológico, a explicitação deste amor, expressa-se oceanicamente contemplando a plenitude da emoção vivida na ação praticada e muitas vezes resulta na forma de mítica ou poética, não no aspecto racional dos mitos e dos símbolos, mas no aspecto de sua sensibilidade. Desta maneira, revelando o lado artista, poético e sensível dos pesquisadores (FAZENDA, 2010). E é desta maneira que Marassínia ganha corpo e voz nesta tese, ao representar uma de minhas dimensões como pesquisadora orientada pela visão transdisciplinar, mas também como integrante da metáfora interior escolhida, na figura arquetípica coletiva do poder da consciência feminina no Planeta Terra, em parte, através das plantas medicinais. Para a pesquisadora, termo que escolhi para expressar-me durante a escrita, Marassínia é resgatada novamente e apresenta-se em uma viagem xamânica, quando ressurge entre as Montanhas Etíopes, da antiga Abissínia, que em árabe significa “comunidade reunida”: (Figura 2): 23 Figura 2. Representação simbólica da Conciência do Feminino: Arquétipo Marassínia (Imagem: Barcelos de Souza Fernandes) “Aqui estou, já que há tantos anos querias conhecer-me. Na verdade, já me conheces, pois sempre estive desde os primórdios, no âmago de todas as mulheres como consciência... também na dos homens...talvez seja verdadeiro o que a ciência vem discutindo... que todos os humanos são descendentes de uma única mulher que viveu na África, há cerca de 200 mil anos e que os cientistas denominaram “Eva Mitocondrial”, a Grande Avó de todos...não significa que foi a única mulher existente na época, mas foi a única que produziu uma linhagem direta de descendentes por linha feminina, que persiste até hoje...pois se assim for...eu já estava lá, como Consciência do Feminino no Planeta. Mas... hoje eu queria te mostrar nestas rochas, aqui nas grutas das montanhas etíopes, estas gravações em pedras... são ensinamentos muito antigos, que servem para os tempos atuais e que devem ser lembrados sempre: - o conhecimento Ancestral é Patrimônio da 24 Humanidade , ninguém tem o direito de roubá-lo...deve ser partilhado para beneficiar a todos - sempre te acompanhei...mas agora te acompanharei, e a todos os participantes mais de perto, no resgate da consciência do poder feminino, em parte através das plantas medicinais, na construção do processo que pretendem nesta pesquisa. Te acompanharei de forma invisível, mas poderás me ouvir muito bem. Antes de deixares estas terras da África, eu gostaria de pedir um presente, que é para mim, mas também por extensão, para todos os cidadãos terrestres. Um “Xale de Retalhos”, tecido com as marcas de cada etapa desta trajetória. Saberás em que momento devo receber este presente. Vou explicar o que significa o xale, nas palavras de uma nativa americana, James Sams, descendente das Tribos Cherokee e Seneca, professora na Tenda Escolar do Clã do Lobo, que escreve sobre as tradições de povos indígenas da América do Norte...” (Marassínia. Representação da Consciência Feminina no Planeta, em parte através das plantas medicinais). E Marassínia, lê para a pesquisadora uma passagem do livro da professora Jamie Sams: “o lar fica onde está o coração...os Nativos Americanos foram os guardiães da terra por vários séculos. Na época em que foram obrigados a seguir a Trilha das Lágrimas, e a abandonar as áreas onde viviam, o sentimento de perda foi devastador. Eles só tinham a uni-los os Ensinamentos Vivos que representavam o Espírito do Povo. Cada uma das Tribos sabia que poderia erigir um novo lar em outro local, pois enquanto os Ensinamentos estivessem vivos, o Espírito do Povo também continuaria vivo. Terminada a fase da Trilha de Lágrimas, muitas tradições novas começaram a brotar das cinzas do espírito alquebrado do Povo. A Cerimônia do Peiote, a Tomada do Xale, assim como diversos ensinamentos assinalaram o árduo caminho de volta ao coração, ao espírito e ao lar da América Nativa.... o Xale simbolizava o retorno ao lar e aos braços da Mãe Terra e significava sentir-se envolvido pelo seu amor e pela sua proteção...honrando o caminho dos ancestrais...(...) tomar o Xale também significa que se deseja trocar informações e deixar que vivam todos os Ensinamentos Tradicionais para que a excelência de cada um possa ser compartilhada por muitos” (SAMS,1993. p. 289-292). Marassínia ainda acrescenta: “O Xale remete a ancestralidade, a essência feminina. Uma mulher com Xale é sinal de respeito às avós anciãs”. E assim, tendo internamente 25 assumido o desafio e o compromisso proposto por Marassínia de tecer o “Xale de Retalhos” como metáfora escolhida, é que iniciei a tecitura, sendo este, urdido na escrita das experiências práticas sobre o resgate de conhecimentos em plantas medicinais. Resgate este, com vistas ao empoderamento e a sustentabilidade, a partir de uma leitura de mundo, usando as lentes da perspectiva de gênero e da transdisciplinaridade. Para dar conta de realizar a tarefa pretendida, busquei os objetivos e finalidades do estudo. 1.2 Alinhavando os Objetivos e Finalidades do Estudo A questão que norteia este estudo é: Qual seria o processo de construção transdisciplinar que pudesse resgatar conhecimentos teórico-práticos sobre plantas medicinais junto a mulheres de comunidades da região Sul de Santa Catarina-Brasil e do Norte da Espanha de maneira a promover o empoderamento dessa população e o desenvolvimento sustentável local? Para responder a esse questionamento estabeleceu-se o seguinte objetivo geral: - Desenvolver um processo de construção transdisciplinar com mulheres de comunidades da região Sul de Santa Catarina-Brasil e do Norte da Espanha- Montanha Palentina, tendo como foco o resgate de conhecimentos teórico-práticos sobre plantas medicinais e a promoção do empoderamento dessa população no âmbito do desenvolvimento sustentável local. Este objetivo geral foi operacionalizado, através dos seguintes objetivos específicos: - Descrever e analisar o processo de construção transdisciplinar de empoderamento desenvolvido através do resgate de conhecimentos teórico- práticos em plantas medicinais, junto a mulheres de comunidades da região Sul de Sant