RESSALVA Atendendo solicitação da autora, o texto completo desta tese será disponibilizado somente a partir de 08/03/2021 Inácio Ramos Leite Avaliação e otimização do desempenho do extrato de tanino de Acácia Negra na clarificação de caldo e xarope de cana para fabricação de açúcar São José do Rio Preto 2019 Campus de São José do Rio Preto Inácio Ramos Leite Avaliação e otimização do desempenho do extrato de tanino de Acácia Negra na clarificação de caldo e xarope de cana para fabricação de açúcar Tese apresentada como parte dos requisitos para obtenção do título de Doutor em Engenharia de Alimentos, junto ao Programa de Pós-Graduação em Engenharia e Ciências de Alimentos do Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Campus de São José do Rio Preto. Orientador: Prof. Dr. Roger Darros Barbosa São José do Rio Preto - SP 2019 L533a Leite, Inácio Ramos Avaliação e otimização do desempenho do extrato de tanino de Acácia Negra na clarificação de caldo e xarope de cana para fabricação de açúcar / Inácio Ramos Leite. -- São José do Rio Preto, 2019 170 p. : il., tabs., fotos + 1 CD-ROM Tese (doutorado) - Universidade Estadual Paulista (Unesp), Instituto de Biociências Letras e Ciências Exatas, São José do Rio Preto Orientador: Roger Darros Barbosa 1. Tanino. 2. Clarificação. 3. Caldo de cana. 4. Xarope de cana. 5. Açúcar. I. Título. Sistema de geração automática de fichas catalográficas da Unesp. Biblioteca do Instituto de Biociências Letras e Ciências Exatas, São José do Rio Preto. Dados fornecidos pelo autor(a). Essa ficha não pode ser modificada. Inácio Ramos Leite Avaliação e otimização do desempenho do extrato de tanino de Acácia Negra na clarificação de caldo e xarope de cana para fabricação de açúcar Tese apresentada como parte dos requisitos para obtenção do título de Doutor em Engenharia de Alimentos, junto ao Programa de Pós-Graduação em Engenharia e Ciências de Alimentos do Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Campus de São José do Rio Preto. Comissão Examinadora Prof. Dr. Roger Darros-Barbosa UNESP – São José do Rio Preto Orientador Profa. Dra. Adriana Paula Fuzeto USP - Piracicaba Prof. Dr. Eloízio Júlio Ribeiro UFU - Uberlândia Profa. Dra. Maria Aparecida Mauro UNESP – São José do Rio Preto Profa. Dra. Vânia Regina Nicoletti Telis UNESP – São José do Rio Preto São José do Rio Preto 08 de Março de 2019 Dedico esta tese aos meus amores incondicionais... Leandro, meu filho, por completar minha vida e me escolher como seu herói; Ligia, minha esposa, pelo seu amor, companheirismo e compreensão nos momentos mais difíceis; Marcos e Edi, meus pais, pelos ensinamentos que recebi ao longo de toda a minha vida. Amo vocês! AGRADECIMENTOS Nos últimos anos, muitas pessoas passaram a fazer parte da minha vida, ajudando-me no desenvolvimento desta tese. Deixo aqui, uma palavra de agradecimento: À Deus, por todos os dias de minha vida. Ao meu orientador, Prof. Dr. Roger Darros Barbosa, por todo conhecimento compartilhado e por se colocar disponível em todos os momentos, sempre com muita paciência e respeito. À Universidade Estadual Paulista, Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas de São José do Rio Preto, por disponibilizar toda infra-estrutura necessária para realização desta pesquisa. À Etec Coronel Raphael Brandão, por também disponibilizar sua infra-estrutura para realização de muitos ensaios e análises. Aos meus alunos, Gabriel Gonçalves, Gabriel Cordeiro, Guilherme Mafra, Igor Freire, Matheus Antônio e Rebecca Barrense, por todo auxílio e dedicação a este projeto. Às usinas Vertente e Mandú, por cederam matéria-prima para realização desta pesquisa. Aos integrantes da comissão examinadora de minha qualificação e defesa, Profa. Vânia Regina Nicoletti Telis, Profa. Maria Aparecida Mauro, Profa Adriana Paula Fuzeto e Prof. Eloízio Júlio Ribeiro, pelas observações e contribuições. À minha família, especialmente, a minha esposa, meus pais e minha irmã (Poliana), por todo apoio e incentivo. À todos que, direta ou indiretamente, contribuíram para a execução desta Tese de Doutorado, o meu muito obrigado. “Papai, você é o Hulk!” Leandro Franzão Leite (Meu filho, aos 3 anos) RESUMO A clarificação do caldo e do xarope de cana é uma das etapas mais importantes do processo de fabricação de açúcar, considerando que uma boa clarificação pode resultar em efeitos altamente benéficos na qualidade e rendimento do produto final, o açúcar cristal ou refinado. Agentes auxiliares de clarificação são muito utilizados nesta etapa. Atualmente, na indústria brasileira e de outras nações grandes produtoras de açúcar, está consolidada a utilização de hidróxido de cálcio, ácido fosfórico e gás anidrido sulfuroso. Contudo, este último, sempre foi muito questionado por questões ambientais e de saúde humana. Novos agentes de clarificação vêm sendo estudados e apresentados como possíveis opções. Neste contexto, o presente trabalho avaliou e otimizou o desempenho do extrato de tanino de Acácia Negra no processo de clarificação de caldo e xarope de cana voltado para fabricação de açúcar. Dosagens de tanino entre 300 e 500 ppm, associadas à caleagem simples aplicada em pH 7,3 com dosagem de 3 ppm de floculante aniônico, proporcionaram os melhores resultados de 32,3 a 33,7% de remoção de cor, e de 88,8 a 93,3% de remoção de turbidez, demonstrando ser um agente auxiliar promissor para clarificação do caldo. Os resultados mostraram que a dosagem de 400 mg kg-1 de sólidos dissolvidos deste extrato natural, associadas à caleagem aplicada em pH 6,5, com dosagem de 15 mg kg-1 de sólidos dissolvidos de floculante aniônico, permitiram a diminuição da cor do xarope bruto de 12.774 UI para 9.714 UI, coloração inferior à obtida por meio da clarificação convencional, na qual obteve-se um xarope com 11.576 UI de cor. Houve redução no teor de amido e dextrana no xarope clarificado, e efeitos positivos na remoção de turbidez do xarope, ainda que não tão intensa quanto à cor. A aplicação de extrato de tanino na clarificação industrial do caldo e do xarope requer dosagens inferiores às dosagens de agentes de clarificação tradicionais e fácil adaptação da planta industrial, sem alterar parâmetros usuais dos processos, como pH do caldo e do xarope caleado, e dosagem de floculante aniônico. Palavras-chave: Tanino. Clarificação. Caldo de cana. Xarope de cana. Cana-de- açúcar ABSTRACT Clarification of cane juice and syrup is one of the most important steps in the sugar manufacturing process, whereas good clarification can result in highly beneficial effects on the quality and yield of the final product, crystal or refined sugar. Auxiliary clarifying agents are widely used in this step. Currently, in the Brazilian industry as well as in other producing countries, the use of calcium hydroxide, phosphoric acid and sulfur dioxide gas is consolidated. However, the latter has always been much questioned by environmental and human health issues. New clarification agents have been studied and presented as possible options. In this context, the present work evaluated and optimized the performance of the Acacia Negra tannin extract in the clarification process of sugar cane juice and syrup aimed at sugar production. Tannin dosages between 300 and 500 ppm, associated with the simple liming applied at pH 7.3 with a dosage of 3 ppm of anionic flocculant, gave the best results of 32.3 to 33.7% of color removal, and of 88.8 to 93.3% turbidity removal, proving to be a promising auxiliary agent for juice clarification. The results showed that the dosage of 400 mg kg-1 of dissolved solids of this natural extract, associated with liming applied at pH 6.5, with a dosage of 15 mg kg-1 of dissolved solids of anionic flocculant, allowed the decrease of the color of the untreated syrup of 12,774 IU to 9,714 IU, less than that obtained by conventional clarification, in which a syrup of 11,576 IU color was obtained. There was also a decrease in the starch and dextran contents in the clarified syrup, and a positive effect on the turbidity removal, in despite as not being as large as it was obtained for color removal. In general, the application of tannin extract in the clarification of sugarcane juice and syrup requires lower dosages of the traditional clarifying agents and easy adaptation of the industrial plant, without altering the regular process parameters as pH of the juice and syrup and the dosage of the anionic flocculant. Keywords: Tannin. Clarification. Sugarcane juice. Cane syrup. Sugarcane. LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Produção mundial de beterraba sacarina e cana-de-açúcar nos últimos anos. 26 Figura 2 - Principais produtores de açúcar bruto centrifugado do mundo. 27 Figura 3 - Formação de sacarose a partir de glucose e frutose. 28 Figura 4 - Fluxograma do processo de extração e tratamento do caldo. 31 Figura 5 - Fluxograma do sistema de evaporadores em múltiplos-efeitos (5 efeitos). 33 Figura 6 - Fluxograma dos processos de cristalização e cozimento (3 massas cozidas e duplo magma). 35 Figura 7 - Unidades monoméricas de poliacrilamida parcialmente hidrolisada. 45 Figura 8 - Ponte entre partículas presentes no caldo e cadeias do floculante aniônico. 46 Figura 9 - Percentual de impurezas vegetais (A) e de amido (B) presente no caldo de cana observado nas safras 2010/2011, 2011/2012, 2012/2013 e 2013/2014 na Usina Santa Fé, SP. 49 Figura 10 - Flotador de xarope utilizado na clarificação de xarope. 56 Figura 11 - Processo Talodura® de clarificação de xarope. 57 Figura 12 - Estruturas moleculares: (a) ácido gálico; (b) ácido elágico; (c) ácido hexadihidroxidifênico; (d) galotaninos; (e) elagitaninos. 58 Figura 13 - Estrutura de tanino condensado: catequina (flavan-3-ol). 59 Figura 14 - Acácia Negra (Acácia mearnsii). 60 Figura 15 - Estrutura química do tanato quaternário de amônio. 61 Figura 16 - Fluxograma dos ensaios para tratamento do caldo de cana por caleagem simples. 72 Figura 17 - Protótipo modificado e utilizado para realizar a flotação por ar disperso: (a) Sistema motor-aerador; (b) Impelidor. 78 Figura 18 - Fluxograma dos ensaios de clarificação do xarope. 80 LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Produção mundial de beterraba e cana-de-açúcar em 2019. 25 Tabela 2 - Composição da cana-de-açúcar madura e sadia. 29 Tabela 3 - Produtos da degradação do açúcar encontrados na cana-de- açúcar após atrasos entre corte e a moagem. 30 Tabela 4 - Parâmetros químicos do açúcar cristal branco e VHP. 64 Tabela 5 - Delineamento composto central rotacional para a clarificação do caldo de cana. 75 Tabela 6 - Valores estabelecidos para o DCCR por caleagem simples para clarificação do caldo de cana em pH fixo 7,3. 76 Tabela 7 - Valores estabelecidos para o DCCR para clarificação do caldo de cana por caleagem simples com dosagem fixa de floculante aniônico. 76 Tabela 8 - Delineamentos fatoriais completos para clarificação do xarope bruto. 82 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS � Área m2 a Coeficiente linear – Equações 28, 29 e 30 [admensional] Abs Absorbância [admensional] �� Aceleração resultante da força externa m s-2 b Coeficiente angular – Equações 28, 29 e 30 [admensional] b Comprimento interno da cubeta m ⁰Be Graus Baumé (escala hidrométrica) [⁰Be] ⁰Brix Teor de sólidos solúveis totais [%] �� Coeficiente de arraste [admensional] �� Diâmetro da partícula m DCCR Delineamento composto central rotacional / DQO Demanda química de oxigênio mg O2 / L �� �� Aceleração do corpo m s-2 f Fator de correção – Equação 31 [admensional] fd Fator de diluição – Equação 29 [admensional] � Força resultante kg m s-2 �� Força de arraste kg m s-2 FAD Flotação por ar dissolvido / �� Força de empuxo kg m s-2 �� Força externa kg m s-2 FAOSTAT Food and Agriculture Organization of the United Nations / � Aceleração da gravidade m s-2 �� Aceleração do campo m s-2 ICUMSA International Commission for Uniform Methods of Sugar Analysis / � Massa do corpo kg NTU Unidades nefelométricas de turbidez NTU pH Potencial hidrogeniônico / PIB Produto interno bruto / � Fator de correção [admensional] � Área da seção reta do sólido na direção normal ao escoamento m2 TCA Tricloroacético / UI Unidades ICUMSA UI UNICA União da Indústria de Cana-de-Açúcar / � Velocidade m s-1 V Volume m3 ��� Velocidade relativa entre partícula e fluido m s-1 VHP Very high polarization / �� Velocidade terminal m s-1 x1 ; x2 ; x3 Variáveis independentes do DCCR / LISTA DE LETRAS GREGAS ρ Densidade do fluido kg m-3 ρS Densidade do sólido kg m-3 µ Viscosidade dinâmica kg m-1 s-1 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO 19 1.1 Objetivos 21 1.1.1 Objetivos gerais 21 1.1.2 Objetivos específicos 21 1.2 Organização da Tese 22 2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 25 2.1 A Indústria Açucareira no Brasil e no Mundo 25 2.2 Características da Matéria-prima 27 2.3 O Processo de Fabricação de Açúcar 31 2.4 Clarificação do Caldo de Cana-de-açúcar 36 2.5 Agentes Químicos Convencionais Aplicados na Clarificação de Caldo 36 2.5.1 Hidróxido de cálcio 37 2.5.1.1 Preparo do hidróxido de cálcio para clarificação 37 2.5.1.2 Principais processos de caleagem 38 2.5.1.3 Principais reações no processo de caleagem 40 2.5.2 Fosfatos 41 2.5.3 Dióxido de enxofre 41 2.5.3.1 Principais reações envolvidas na sulfitação 42 2.5.3.2 Vantagens de desvantagens da utilização do dióxido de enxofre 43 2.5.4 Dióxido de carbono 44 2.5.5 Floculantes 45 2.5.6 Dextranase 47 2.5.7 Amilase 48 2.6 Aspectos Físicos da Sedimentação de Partículas em um Fluido na Etapa de Sedimentação/Decantação do Caldo 50 2.7 Aspectos Físico-químicos dos Mecanismos de Coagulação Coloidal do Caldo 53 2.8 Clarificação de Xarope 54 2.9 Taninos 57 2.10 Aspectos Sobre a Qualidade e o Refino do Açúcar 63 2.10.1 Polarização 64 2.10.2 Cor 65 2.10.3 Resíduo insolúvel 65 2.10.4 Partículas magnetizáveis 66 2.10.5 Amido 66 2.10.6 Dextrana 66 2.10.7 Dióxido de enxofre 67 2.10.8 Cinzas condutimétricas 67 2.10.9 Açúcares redutores 67 3 MATERIAL E MÉTODOS EXPERIMENTAIS 69 3.1 Tratamento do Caldo de Cana com Extrato de Tanino 69 3.1.1 Caldo de cana 69 3.1.2 Agentes clarificantes 70 3.1.2.1 Ácido fosfórico 70 3.1.2.2 Leite de cal 70 3.1.2.3 Floculante 71 3.1.2.4 Extrato de tanino de Acácia Negra 71 3.1.3 Ensaios de clarificação do caldo de cana 72 3.1.3.1 Ajuste de Sólidos Solúveis, Fosfatação e Dosagem de Tanino 73 3.1.3.2 Caleagem simples 73 3.1.3.3 Clarificação de caldo 73 3.1.4 Ensaios preliminares por caleagem simples auxiliado com tanino 74 3.1.4.1 Determinação da dosagem de ácido fosfórico no caldo 74 3.1.4.2 Determinação da faixa de dosagem de extrato de tanino aplicada ao caldo 74 3.1.5 Planejamento experimental para a clarificação do caldo de cana 75 3.1.6 Avaliação complementar dos ensaios de clarificação de caldo 76 3.2 Tratamento de Xarope com Extrato de Tanino 77 3.2.1 Xarope de cana 77 3.2.2 Agentes clarificantes 77 3.2.3 Material utilizado nos ensaios de flotação 78 3.2.4 Ensaios de clarificação do xarope 79 3.2.5 Determinação das condições operacionais do flotador para clarificação do xarope 80 3.2.6 Planejamento experimental para clarificação de xarope 81 3.3 Métodos Analíticos 82 3.3.1 pH 82 3.3.2 Fosfatos inorgânicos 83 3.3.3 Turbidez 83 3.3.4 Cor ICUMSA 83 3.3.5 Amido 84 3.3.6 Dextrana 85 3.3.7 Dureza total 86 3.4 Análise Estatística dos Dados 86 Referências bibliográficas 88 4 ASSESSMENT AND OPTIMIZATION OF BLACK ACACIA TANNIN EXTRACT PERFORMANCE FOR THE CLARIFICATION OF SUGARCANE JUICE TOWARDS SUGAR MANUFACTURING 93 5 DISPERSED AIR FLOTATION FOR THE CLARIFICATION OF SUGARCANE SYRUP USING BLACK ACACIA TANNIN EXTRACT 116 6 MECHANISMS AND INFLUENCE OF THE FORMATION OF CALCIUM PHOSPHATE IN THE CLARIFICATION OF IMPURE SUCROSE SOLUTIONS OBTAINED FROM SUGAR CANE - A REVIEW 136 7 CONCLUSÕES GERAIS DA TESE 166 8 SUGESTÕES PARA TRABALHOS FUTUROS 168 Apêndice A 170 19 CAPÍTULO 1 1 INTRODUÇÃO O Brasil é o maior produtor e exportador de açúcar do mundo, representando cerca de 20% do açúcar produzido e 40% do açúcar exportado. Na fabricação deste produto, o processo de clarificação do caldo de cana é uma das etapas mais importantes, posto que uma boa clarificação surte efeitos altamente benéficos na qualidade e rendimento do produto final. Esta etapa, todavia, carece de entendimentos e estudos com base nos fundamentos físico-químicos, em função dos diferentes fenômenos e reações que ocorrem durante esta fase. Grande parte dos processos de fabricação de açúcar em operação no Brasil, principalmente aqueles voltados à produção de açúcar branco, realizam a clarificação em duas etapas: decantação e flotação. Estes processos de separação são auxiliados por meio de insumos químicos alcalinos, oxidantes e agentes floculantes, os quais são fundamentais para a obtenção de um açúcar de qualidade. O caldo clarificado via decantação, ainda rico em não açúcares e compostos coloridos, é concentrado na etapa de evaporação. Quando concentrado, ele recebe o nome de xarope, o qual é normalmente tratado por meio de processo de flotação, para fabricação de açúcar branco. Esta etapa deve ser considerada como uma segunda clarificação, uma vez que a decantação não elimina todos os compostos indesejáveis. Além disso, o efeito da concentração do caldo insolubiliza compostos que antes estavam dissolvidos, os quais passam a estar em suspensão, juntamente com resíduos de incrustações e de corrosão de equipamentos. Muitos destes compostos podem ser considerados precursores de cor ou ainda ficarem ocluídos nos cristais, prejudicando a cor do açúcar (ALBUQUERQUE, 2011). Auxiliares de clarificação são muito utilizados tanto na decantação como na flotação. Na prática, está consolidada na indústria brasileira a utilização de ácido fosfórico e do gás anidrido sulfuroso (ALBUQUERQUE, 2011). Caldos com alto teor de P2O5 clarificam com mais facilidade, pois sua presença precipita parte dos colóides e das matérias corantes presentes no meio (BAIKOW, 1982; MARQUES; MARQUES; TASSO JÚNIOR, 2001). O anidrido sulfuroso, por sua vez, quando absorvido pelo 20 caldo, atua como um forte agente redutor sobre substâncias corantes do caldo, reduzindo sua cor. Além disso, o SO2 inibe a formação de compostos coloridos e aumenta a velocidade de sedimentação nos decantadores (RODRÍGUEZ, 2009). Na etapa de flotação, os fosfatos reagem com o cálcio presente no caldo, resultando na floculação de compostos e na diminuição da turbidez do xarope (ALBUQUERQUE, 2011). Considerando que a clarificação do caldo é realizada basicamente em duas etapas (decantação e flotação) e que a eficiência de ambas depende fortemente da presença de insumos químicos, atuando como agentes auxiliares de clarificação, como produtos alcalinos, oxidantes e agentes floculantes, é indiscutível a relevância destes tratamentos químicos. No entanto, há muito que melhorar no que diz respeito à clarificação. Muitos compostos solúveis, insolúveis, coloides e sólidos suspensos não são removidos nas etapas do tratamento e podem incorporar cor ou ainda ficarem ocluídos nos cristais, prejudicando a qualidade do produto. Alguns destes compostos, como proteínas e aminoácidos, podem ser considerados precursores de reações de escurecimento. Polissacarídeos, como amido e dextrana, presentes em quantidades significativas em determinados períodos da safra de cana-de-açúcar, também não são removidos integralmente, podendo trazer dificuldades operacionais, além de diminuir a pureza e prejudicar a granulometria do açúcar. Além dos insumos químicos normalmente utilizados pela indústria açucareira no Brasil, outros agentes vêm sendo estudados e apresentados como possíveis opções. Peróxido de hidrogênio, aluminatos de sódio, ozônio, dióxido de carbono, dentre tantos outros compostos vem sendo testados em laboratório e industrialmente (ALBUQUERQUE, 2011; HAMERSKI; AQUINO; NDIAYE, 2011; MADHO; DAVIS, 2008). No entanto, pouco se evoluiu, considerando que o setor açucareiro, em sua grande maioria, encontra-se refém do tradicional processo de sulfitação do caldo para fabricação de açúcar branco (ALBQUERQUE, 2011) que sempre foi muito questionado por causar reações adversas à saúde em pessoas sensíveis aos sulfitos (FAVERO; RIBEIRO; AQUINO, 2011). Nos últimos anos muitos trabalhos têm sido publicados relacionados a processos utilizando taninos como auxiliar de coagulação e floculação, ainda que nenhum aplicado ao caldo ou xarope de cana de açúcar. Taninos são compostos naturais, com habilidade de se combinar com proteínas, alcaloides e outros polímeros, sendo muito utilizados na indústria coureira, no tratamento de água e efluentes, entre 162 industriais e permanecer no produto final, e, posteriormente serem detectados por análises físico-químicas. O conhecimento das reações químicas que ocorrem nos processos de caleagem e fosfatação junto com os processos complementares de clarificação (adição de agentes floculantes e surfactantes) também contribuem para o melhor entendimento e controle de toda a clarificação das soluções impuras de sacarose. De modo sucinto, a clarificação baseia-se na precipitação de fosfatos de cálcio (floculação primária) e na formação de novas estruturas (aglomerados) a partir da união de compostos não açúcares aos precipitados de fosfatos de cálcio (floculação secundária). Há boa e vasta experiência prática acumulada no setor, mas ainda são necessárias pesquisas a fim de se alcançar a máxima complexação entre os não açúcares e os fosfatos formados nas diversas etapas de clarificação do caldo, xarope ou calda de açúcar cristal. 9 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALBUQUERQUE, F. M. Processo de fabricação do açúcar. Recife: Ed. da UFPE, 2009. 275 p. AMJAD, Z. 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Mestre Jou, 1981. 166 CAPÍTULO 7 7 CONCLUSÕES GERAIS DA TESE Os resultados obtidos mostraram-se promissores, uma vez que o caldo clarificado (por caleagem simples, fosfatação, floculação e sedimentação) com o auxílio do extrato de tanino de Acácia Negra apresentou valores de cor e turbidez significativamente melhores do que os alcançados por outros tratamentos, incluindo tratamentos convencionais, além de aumentar a remoção da dureza e de polissacarídeos (amido e dextrana). O extrato de tanino de Acácia Negra também apresentou bom desempenho como auxiliar de clarificação de xarope de cana-de-açúcar, por flotação com ar disperso, com redução na cor e nos teores de amido e dextrana no xarope clarificado. Apesar da clarificação do xarope usando a flotação por ar disperso não ser um processo que concorra diretamente com a sulfitação do caldo de cana, acredita-se que sua aplicação associada com a utilização do extrato de tanino de Acácia Negra possa viabilizar o processo de fabricação de açúcar branco sem a utilização do dióxido de enxofre, o qual apresenta restrições por ter características alergênicas e aumentar os custos industriais. A adaptação de uma planta industrial para utilização de tanino de Acácia Negra como auxiliar de clarificação de caldo e xarope seria mais simples do que outros processos alternativos, como a carbonatação e a ozonização de caldo, ou a sulfitação e a carbo-flotação de xarope. A adição do extrato de tanino no processo tradicional de caleagem simples ou na flotação de xarope por ar disperso poderia ser introduzida sem alterar parâmetros usuais do processo, como pH e dosagem de floculante aniônico. As dosagens de extrato de tanino de Acácia Negra aplicadas nos tratamentos conduzidos no presente estudo foram significativamente menores do que as dosagens de agentes de clarificação tradicionais, como o SO2, condição que pode viabilizar a sua utilização. Contudo, sendo o extrato de tanino um agente de custo unitário mais elevado do que outros insumos tradicionais disponíveis no mercado, uma análise econômica aprofundada deve ser realizada, levando em consideração os possíveis ganhos de qualidade, produtividade e mercado, além da redução de custos com a 167 manutenção da planta industrial que, tradicionalmente, sofre com os efeitos corrosivos causados pelos compostos derivados do enxofre.