1 Campus de Presidente Prudente O RELEVO E O SISTEMA DE AFASTAMENTO E TRATAMENTO DE ESGOTO DA CIDADE DE MARÍLIA-SP Caio Augusto Marques dos Santos Presidente Prudente 2009 2 Campus de Presidente Prudente O RELEVO E O SISTEMA DE AFASTAMENTO E TRATAMENTO DE ESGOTO DA CIDADE DE MARÍLIA-SP Caio Augusto Marques dos Santos Orientador: Prof. Dr. João Osvaldo Rodrigues Nunes Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Geografia – Linha de Pesquisa: Dinâmica e Gestão Ambiental, para obtenção do Título de Mestre em Geografia. Presidente Prudente 2009 3 Santos, Caio Augusto Marques dos. S234r O relevo e o sistema de afastamento e tratamento de esgoto da cidade de Marília-SP / Caio Augusto Marques dos Santos. - Presidente Prudente : [s.n] 2009 192 f. : il. Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Ciências e Tecnologia Orientador: João Osvaldo Rodrigues Nunes Banca: José Tadeu Garcia Tommaselli , Roberto Verdum Inclui bibliografia 1. Marília (SP). 2. Relevo. 3. Esgoto. I. Autor. II. Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Ciências e Tecnologia. III. Título. CDD(18. ed.)910 Ficha catalográfica elaborada pela Seção Técnica de Aquisição e Tratamento da Informação – Serviço Técnico de Biblioteca e Documentação - UNESP, Câmpus de Presidente Prudente. 4 Dedicatória Dedico esse trabalho à minha família... Meu Pai Valdemir, Minha mãe Regina e Meu irmão Vinícius Dedico também a meu orientador e amigo... João Osvaldo. 5 AGRADECIMENTOS Acredito ser o resultado desse trabalho uma combinação de esforços, nem sempre intelectuais e diretamente debruçado sobre ele, não por isso menos importante. Foi a conjunção de pessoas ao meu redor, ora me ajudando a pensar, ora conversando sobre assuntos diversos, ora dando suporte emocional, que possibilitaram a realização dessa pequena contribuição a Ciência Geográfica. Portanto, agradeço... Minha Família: meu Pai Valdemir, minha mãe Regina e meu irmão Vinícius. Meu orientador Prof. Dr. João Osvaldo Rodrigues Nunes. Meu amigo João Osvaldo. República Balão Mágico: Julião (Júlio), Diogão (Diogo), Paulinho (Paulo), Duber (Deuber), Da Pontinha (Rafael Da Ponta), Pedrones (Pedro). Ao pessoal do Laboratório de Sedimentologia e Análise de Solos da FCT/UNESP, que por lá passaram durante o período de realização do trabalho. TCRE Engenharia Ltda. Leandro “Astorga”. Tiago Samizava. DAEM (Departamento de Água e Esgoto de Marília-SP). CETESB (Companhia Ambiental de São Paulo). Colegas do Programa de Pós-Graduação em Geografia. Prof. Dr. José Tadeu Garcia Tommaselli. Prof. Dra. e amiga Maria Cristina Perusi. Minha namorada Érika. Meu amigo-irmão Nelsinho. Meus amigos-irmãos de Marília: Tilico, Benette, Willião, Fernando e Tio Armando. Pessoal da Secretaria de Pós-Graduação. FAPESP (Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de São Paulo). 6 Epígrafe ““Ser amigo certo e fiel é demonstrar uma verdadeira virtude, glória de nossa natureza humana. Nenhum homem, jovem ou velho, pode ter mais honra do que se considerar realmente um amigo de alguém e ser digno da confiança total dessa pessoa”. 1 SUMÁRIO Índice 2 I- Lista de figuras 5 II- Lista de quadros 11 Resumo 12 Abstract 13 Introdução e Justificativa 14 Objetivos 18 Procedimentos Metodológicos 19 Capítulo 1- REFERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO 22 Capítulo 2 - GÊNESE E FORMAÇÃO DO RELEVO DA CIDADE DE MARÍLIA-SP 42 Capítulo 3 - SISTEMA DE ESGOTOS SANITÁRIOS 79 Capítulo 4 - O RELEVO E O SISTEMA DE AFASTAMENTO DE ESGOTOS 96 Capítulo 5 - O RELEVO E O SISTEMA DE TRATAMENTO DE ESGOTOS 150 Considerações Finais 179 Referências Bibliográficas 186 Anexos 192 2 ÍNDICE I- Lista de figuras 5 II- Lista de quadros 11 Resumo 12 Abstract 13 Introdução e Justificativa 14 Objetivos 18 Procedimentos Metodológicos 19 CAPÍTULO 1. REFERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO 22 1. Tempo e Espaço em Geomorfologia: morfogênese e morfodinâmica 22 2. Paisagem e Geomorfologia: um olhar materialista histórico e dialético 28 3. Técnica e Desafio Ambiental 35 CAPÍTULO 2. GÊNESE E FORMAÇÃO DO RELEVO DA CIDADE DE MARÍLIA-SP 42 1. Bacia Sedimentar do Paraná 44 2. Planalto Ocidental Paulista 49 3. Planalto Residual de Marília 52 4. O Relevo de Marília-SP 61 4.1. Rampas Colúvio-Aluvionares 71 4.2. Perfis Topográficos 73 4.3. Caracterização Pedológica 73 4.3.1. Os Argissolos 75 4.3.2. Os Latossolos 76 4.3.3. Os Planossolos 77 4.3.4. Os Neossolos 78 CAPÍTULO 3. SISTEMA DE ESGOTOS SANITÁRIOS 79 1. Breve História do Tratamento de Esgoto 79 2. Legislação 81 3. Caracterização Geral de um Sistema de Esgotos Sanitários 82 4. Fatores Locacionais, Número de Estações e Nível de Tratamento 88 3 5. O Sistema de Afastamento e Tratamento de Esgoto da Cidade de Marília-SP 90 CAPÍTULO 4. O RELEVO E O SISTEMA DE AFASTAMENTO DE ESGOTOS 96 1. Subsistema Barbosa 99 1.1. Estações Elevatórias 104 1.1.1. Estação Elevatória 1.1 104 1.1.2. Estação Elevatória 1.2 105 1.1.3. Estação Elevatória 2.1 106 1.2. Emissários por Gravidade Forçada 108 1.2.1. Emissário 2.1 109 1.2.2. Emissário 2.15 111 1.2.3. Emissário 2.4 112 1.2.4. Emissário 2.5 113 2. Subsistema Pombo 115 2.1. Emissários por Gravidade Livre e Forçada 119 2.1.1. Emissário 3.1 119 2.1.2. Emissário 3.4 121 2.1.3. Emissário 3.5 123 2.1.4. Emissário 3.7 125 2.1.5. Emissário 3.10 126 2.1.6. Emissário 3.12 128 3. Subsistema Palmital 130 3.1. Estações Elevatórias 134 3.1.1. Estação Elevatória 4.1 134 3.1.2. Estação Elevatória 4.2 136 3.1.3. Estação Elevatória 4.3 137 3.1.4. Estação Elevatória 5.1 138 3.1.5. Estação Elevatória 6.1 138 3.1.6. Estação Elevatória 6.2 139 3.2. Emissários por Gravidade Livre e Forçada 142 3.2.1. Emissário 5.1 142 3.2.2. Emissário 5.3 144 4 3.2.3. Emissário 5.4 145 3.2.4. Emissário 5.5 147 CAPÍTULO 5. O RELEVO E O SISTEMA DE TRATAMENTO DE ESGOTOS 150 1. Morfodinâmica das Paisagens: Condicionantes Geomorfológicos, Geológicos/Hidrogeológicos e Pedológicos para Seleção de Áreas 150 2. Estação de Tratamento de Esgotos Barbosa 157 2.1. Dimensão das Unidades do Sistema 160 2.2. O Local de Instalação e Arredores 162 2.3. O Projeto de Geotecnia 163 2.3.1. O Parecer Geotécnico 164 3. Estação de Tratamento Pombo 165 3.1. Dimensão das Unidades do Sistema 169 3.2. O Local de Instalação e Arredores 171 3.3. O Projeto de Geotecnia 172 3.3.1. O Parecer Geotécnico 173 4. Estação de Tratamento Palmital 174 4.1. Dimensão das Unidades do Sistema 177 4.2. O Local de Instalação e Arredores 178 Considerações Finais 180 Referências Bibliográficas 187 Anexos 193 5 I- LISTA DE FIGURAS Figura 1: Mapa de localização da cidade de Marília no Estado de São Paulo. 4 Figura 2: Representações lineares do tempo. 23 Figura 3: Ciclo evolutivo de avanços sobre a natureza. 39 Figura 4: Interação entre as dinâmicas da natureza e da sociedade. 41 Figura 5: Representação Esquemática das Unidades Taxonômicas. 43 Figura 6: Disposição das camadas nas seqüências sedimentares. 45 Figura 7: Seção Geológica Esquemática do Estado de São Paulo. 46 Figura 8: Mapa geológico de Marília e região. 47 Figura 9: Afloramento da Formação Marília. Corte na rodovia SP- 333. 48 Figura 10: Perfuração sobre a Formação Marília para passagem de tubulação do Sistema de Afastamento de Esgoto. Nota-se o afloramento do aqüífero freático. 48 Figura 11: Mapa Geomorfológico do Estado de São Paulo. 50 Figura 12: Mapa hipsométrico de parte do Planalto Ocidental Paulista. O retângulo indica a localização do Planalto de Marília. 53 Figura 13: Organização da drenagem em estrutura concordante horizontal, com início da incisão do talvegue. 55 Figura 14: Fundo de vale em berço resultado do entalhamento linear em uma das bordas do Planalto de Marília. Ao longo das vertentes é possível identificar os patamares estruturais associados aos terraços fluviais. As letras correspondem aos antigos níveis do curso d’água. 56 Figura 15: Evolução do entalhamento dos talvegues por imposição tectônica (efeitos epirogenéticos). 56 Figura 16: Recuo da camada resistente por solapamento basal da camada friável, subjacente. 57 Figura 17: Recuo Paralelo das vertentes por desagregação mecânica (clima seco), com conseqüente soerguimento de nível de base. 58 Figura 18: Fundo de vale em “V”. A tendência de evolução do relevo seria a abertura do vale (nível de base) e a incisão do talvegue seria remontante, ou seja, em direção a malha urbana circundante. 58 Figura 19: Fundo de vale de fundo chato. Evolução do relevo se verifica pelo distanciamento das bordas e a camada resistente se suavizando. 59 6 Figura 20: Morfologia tabuliforme atual, evidenciando os principais elementos resultantes da evolução das estruturas concordantes horizontais. 60 Figura 21: Mapa Geomorfológico do perímetro urbano do município de Marília-SP. 62 Figura 22: Mapa Hipsométrico do município de Marília-SP. 63 Figura 23: Mapa clinográfico do município de Marília-SP. 64 Figura 24: Vista aérea da expansão urbana sobre o topo do Planalto de Marília. Percebe-se o limite que a escarpa oferece ao perímetro urbano da cidade. 65 Figura 25: Casa de condomínio fechado próximo a escarpa. 66 Figura 26: Favelas em áreas próximas a escarpa. 66 Figura 27: Fundo de vale em “V” em área em que a distância entre as escarpas é curta. 67 Figura 28: Vale de fundo chato dando origem a uma planície aluvial em área em que a distância entre as escarpas é grande. 68 Figura 29: Planície aluvial localizada em um vale de fundo chato originado por entalhamento linear entre as bordas de duas escarpas. 69 Figura 30: Escarpas abruptas características do Planalto de Marília. Observa-se o avanço da urbanização até seus limites. 69 Figura 31: Cabeceira de drenagem em anfiteatro formada pelas rampas de colúvio. 70 Figura 32: Rampas colúvio-aluvionares. A com círculo amarelo indica uma rampa mais recente no ciclo coluvial, e a com o círculo vermelho indica uma rampa mais antiga. 73 Figura 33: Análise dos perfis topográficos 1 (ETE Barbosa - ETE Palmital), 2 (ETE Barbosa - ETE Pombo) e 3 (ETE Pombo - ETE Palmital), ilustrados nos mapas geomorfológico, hipsométrico e clinográfico. 73 Figura 34: Componente paralelo à esquerda e componente perpendicular à direita. 74 Figura 35: O relevo condicionando níveis de infiltração e de escoamento. 75 Figura 36: Perfil topográfico com tendência de localização dos tipos de solos conforme o relevo da cidade de Marília-SP. 78 7 Figura 37: Eixos de expansão urbana sobre o relevo. 91 Figura 38: Estação elevatória do Subsistema Barbosa (bacia do Cascatinha) sendo construída. 92 Figura 39: Sistema de Afastamento e Tratamento de Esgoto de Marília-SP. 93 Figura 40: Ilustração esquemática de uma estação elevatória. 98 Figura 41: Subsistema Barbosa e principais emissários. 99 Figura 42: Localização do subsistema Barbosa no mapa hipsométrico do município. 101 Figura 43: Localização do subsistema Barbosa no mapa clinográfico do município. 102 Figura 44: Ponto de lançamento de esgoto bruto na bacia do Córrego Barbosa. 103 Figura 45: Localização da estação elevatória (EE) 1.1 e respectivo emissário por recalque (ER). 105 Figura 46: Perfil topográfico do emissário por recalque 1.1. 105 Figura 47: Localização da estação elevatória 1.2 e respectivo emissário por recalque. 106 Figura 48: Perfil topográfico do emissário por recalque 1.2. 106 Figura 49: Localização da estação elevatória 2.1 e respectivo emissário por recalque. 107 Figura 50: Perfil topográfico do emissário por recalque 2.1. 107 Figura 51: Na foto da esquerda pode-se ver uma rampa de colúvio, por onde alguns emissários descerão, visto na foto da direita. 109 Figura 52: Localização do conduto forçado por gravidade 2.1. 110 Figura 53: Perfil topográfico do emissário 2.1. 110 Figura 54: Localização do conduto forçado por gravidade 2.15. 111 Figura 55: Perfil topográfico do emissário 2.15. 111 Figura 56: Localização do conduto forçado por gravidade 2.4.. 112 Figura 57: Perfil topográfico do emissário 2.4. 112 Figura 58: Localização do conduto forçado por gravidade 2.5. 113 Figura 59: Perfil topográfico do emissário 2.5. 114 Figura 60: Travessia aérea do curso d’água com uso de conduto feito de ferro dúctil. 114 8 Figura 61: Subsistema Pombo e principais emissários. 116 Figura 62: Localização do Subsistema Pombo no mapa hipsométrico do município. 117 Figura 63: Localização do Subsistema Pombo no mapa clinográfico do município. 118 Figura 64: Localização do emissário 3.1. 120 Figura 65: Perfil topográfico do emissário 3.1. 120 Figura 66: Perfil topográfico do primeiro trecho forçado por gravidade do emissário 3.1. 121 Figura 67: Perfil topográfico do segundo trecho forçado por gravidade do conduto 3.1. 121 Figura 68: Localização do emissário 3.4. 122 Figura 69: Perfil topográfico do emissário 3.4. 122 Figura 70: Perfil topográfico do trecho forçado por gravidade do emissário 3.4. 123 Figura 71: Localização do emissário 3.5. 124 Figura 72: Perfil topográfico do emissário 3.5. 124 Figura 73: Perfil topográfico do trecho forçado por gravidade do emissário 3.5. 125 Figura 74: Localização do emissário 3.7. 126 Figura 75: Perfil topográfico do emissário 3.7. 126 Figura 76: Perfil topográfico do trecho forçado por gravidade do emissário 3.7. 126 Figura 77: Localização do emissário 3.10. 127 Figura 78: Perfil topográfico do emissário 3.10. 127 Figura 79: Perfil topográfico do trecho forçado por gravidade do emissário 3.10. 128 Figura 80: Localização do emissário 3.12. 129 Figura 81: Perfil topográfico do emissário 3.12. 129 Figura 82: Perfil topográfico do trecho forçado por gravidade do emissário 3.12. 130 Figura 83: Subsistema Palmital e principais emissários. 130 Figura 84: Localização do subsistema Palmital no mapa hipsométrico do município. 132 Figura 85: Localização do subsistema Palmital no mapa clinográfico do município. 133 9 Figura 86: Localização da estação elevatória 4.1 e do seu respectivo emissário por recalque. 135 Figura 87: Perfil topográfico do emissário por recalque 4.1. 135 Figura 88: Localização da estação elevatória 4.2 e seu respectivo emissário por recalque. 136 Figura 89: Perfil topográfico do emissário por recalque 4.2. 136 Figura 90: Localização da estação elevatória 4.3 e seu respectivo emissário por recalque. 137 Figura 91: Perfil topográfico do emissário por recalque 4.3. 138 Figura 92: Localização da estação elevatória 6.1 e seu respectivo emissário por recalque. 139 Figura 93: Perfil topográfico do emissário por recalque 6.1. 139 Figura 94: Localização da estação elevatória 6.2 e respectivo emissário por recalque. 140 Figura 95: Perfil topográfico do emissário por recalque 6.2. 140 Figura 96: Localização do emissário 5.1. 143 Figura 97: Perfil topográfico do emissário 5.1. 143 Figura 98: Perfil topográfico do trecho forçado por gravidade do emissário 5.1. 144 Figura 99: Localização do emissário 5.3. 145 Figura 100: Perfil topográfico do emissário 5.3. 145 Figura 101: Perfil topográfico do trecho por gravidade forçada do emissário 5.3. 145 Figura 102: Localização do emissário 5.4. 146 Figura 103: Perfil topográfico do emissário 5.4. 146 Figura 104: Perfil topográfico do trecho por gravidade forçada do emissário 5.4. 147 Figura 105: localização do emissário 5.5. 147 Figura 106: Perfil topográfico do emissário 5.5. 148 Figura 107: Perfil topográfico do trecho por gravidade forçada do emissário 5.5. 148 Figura 108: Principais unidades aqüíferas do Estado de São Paulo. 153 Figura 109: Modelo hidrogeológico conceitual do Aqüífero Bauru. 154 10 Figura 110: Localização da estação de tratamento Barbosa. 157 Figura 111: Perfil esquemático, sem escala, da estação de tratamento Barbosa. 160 Figura 112: Imagem de localização da área e arredores da estação de tratamento Barbosa. 162 Figura 113: Fotos da área escolhida para instalação da estação de tratamento Barbosa. 163 Figura 114: Localização da estação de tratamento Pombo. 166 Figura 115: Perfil esquemático, sem escala, da estação de tratamento Pombo. 168 Figura 116: Imagem de localização da área e arredores da estação de tratamento Pombo. 171 Figura 117: Fotos da área escolhida para instalação da estação de tratamento Pombo. 171 Figura 118: Localização da estação e tratamento Palmital. 173 Figura 119: Perfil esquemático, sem escala, da estação de tratamento Palmital. 176 Figura 120: Imagem de localização da área e arredores da estação de tratamento Palmital. 177 Figura 121: Fotos da área escolhida para instalação da estação de tratamento Palmital. 179 Figura 122: Porcentagem de emissários por gravidade e recalque dentro do Sistema de Afastamento de Esgoto. 182 Figura 123: Porcentagem de emissários por subsistema. 182 Figuras 124, 125 e 126: Porcentagem de emissários por gravidade (livre ou forçada) e recalque em cada subsistema. 183 Figura 127: Porcentagem dos emissários analisados do subsistema Pombo e Palmital por gravidade livre ou forçada. 183 Figuras 128 e 129: Porcentagem de emissários por gravidade livre ou forçada individualizados para o subsistema Pombo e Palmital. 184 Figuras 130 e 131: Materiais dos emissários por gravidade forçada analisados individualizados para o subsistema Pombo e Palmital. 185 Figuras 132 e 133: Materiais dos emissários por gravidade livre analisados individualizados para o subsistema Pombo e Palmital. 185 11 II- LISTA DE QUADROS Quadro 1: Enquadramento dos corpos d’água. 94 Quadro 2: Comprimento dos emissários por recalque e gravidade. 97 Quadro 3: Extensão dos condutos no Subsistema Barbosa. 103 Quadro 4: Extensão dos condutos por bacias. 104 Quadro 5: Características dos conjuntos elevatórios do Subsistema Barbosa. 108 Quadro 6: Comprimento dos emissários no Subsistema Palmital. 134 Quadro 7: Comprimento dos emissários por bacias. 134 Quadro 8: Características dos conjuntos elevatórios do Subsistema Palmital. 142 12 RESUMO Para a concepção, projeção e construção de grandes obras de engenharia, a análise geomorfológica torna-se fundamental. A cidade de Marília-SP, por apresentar peculiaridades na morfologia do relevo que a sustenta, tem seu sistema de afastamento e tratamento de esgotos fortemente influenciado pelas suas características. Localizada na morfoestrutura da Bacia Sedimentar do Paraná e na morfoescultura do Planalto Ocidental Paulista, mais precisamente no Planalto Residual de Marília, representa um típico relevo Tabuliforme de centro de bacia. Dessa forma, em combinação com os outros elementos técnicos, econômicos e ambientais, chegou-se ao projeto de três subsistemas de afastamento e tratamento, Barbosa, Pombo e Palmital, a partir das seis bacias de esgotamento em que a cidade é dividida. Assim, tendo como objetivo principal verificar a adequabilidade ambiental das áreas escolhidas para a construção das estações de tratamento do ponto de vista geomorfológico, analisou-se, ainda, a influência que o relevo teve no dimensionamento hidráulico dos emissários (diâmetros e extensões), no tipo de escoamento (livres ou forçados por gravidade), nos materiais de que são feitos (PVC, ferro dúctil ou ferro fundido), nas estações elevatórias (potência de bombas, alturas manométricas, linhas de recalque, material dos condutos e diferenças altimétricas), além da morfodinâmica das áreas das estações de tratamento. Para tanto, juntamente com trabalhos de campo, utilizou-se os mapas geomorfológico, hipsométrico e clinográfico da cidade, além de perfis topográficos, como ferramentas de auxílio para a pesquisa. Palavras-chave: Marília-SP, Geomorfologia, Relevo, Esgoto, Estações de Tratamento e Emissários. 13 ABSTRACT To major engineering works design, projection and building, geomorphological analysis became fundamental. Marilia city, Sao Paulo, featuring peculiarities in its the relief morphology that sustains it, has its sewage removal and treatment system strongly influenced by their characteristics. Located at Paraná Sedimentary Basin morphostructure and at Paulista Occidental Plain morphosculpture, precisely on the Marilia Residual Plateau, the city represents a typical middle-basin Mesa relief. Thus, in combination with others technical, economic and environmental elements, three treatment and withdraw systems have been projected – Barbosa, Palmital and Pombo – from six sewer basin the is city divided. Thus, aiming to verify the environmental suitability of the selected areas for the construction of sewage treatment by the geomorphological point of view, we analyzed also the influence that the field had the hydraulic design of the emissaries (diameters and lengths), in type of flow (free or forced by gravity), for the materials they are made (PVC, ductile iron or cast iron), the pumping stations (power pump, manometer elevation lines, repression, and material of the grafts varied altitude) in adition of the morphodynamics of treatment plants areas. Therefore, along with field work, we used geomorphological, hipsometric and clinographic maps, in adition to topographic profiles, as tools to aid the research. Keywords: Marília-SP, Geomorphology, Relief, Sewage, Treatment Stations and Emissaries. 14 INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA A cidade de Marília-SP localiza-se no Centro-Oeste Paulista (Figura 1). Geomorfologicamente situa-se na morfoestrutura da Bacia Sedimentar do Paraná e na morfoescultura do Planalto Ocidental Paulista, mais precisamente no Planalto Residual de Marília. Figura 1: Localização da cidade de Marília-SP. 15 O tipo de relevo que o caracteriza é o Tabuliforme. Típico em centro de bacias sedimentares, seu processo de evolução está relacionado com as alternâncias climáticas ocorridas durante o período geológico do Quaternário. Ele é caracterizado por camadas sedimentares horizontais ou sub-horizontais que correspondem a chapadas, chapadões e tabuleiros que lembram a presença de mesa, uma extensão de mesa ou tabuleiros mantidos por camadas basálticas ou sedimentos mais resistentes, além de concreções ferralítico (CASSETI, 2001). Especificamente na cidade, o relevo é composto por um grande compartimento de topo (espigão divisor de águas da bacia hidrográfica do Rio do Peixe e da bacia hidrográfica do Rio Aguapeí) interligado a topos secundários, cujo domínio das vertentes tem por característica interligar os topos às escarpas (delimitadoras do Planalto de Marília) e tende a ficar mais acidentado, quanto mais se aproximam delas. Por possuir essa morfologia, torna-se zona dispersora de drenagem. Os córregos que nascem nas cabeceiras dos espigões fluem nas mais diversas direções, muitas vezes recortando a malha urbana e desaguando nas escarpas até alcançarem os rios principais que drenam a região ao entorno do município. Foi esta peculiar morfologia do relevo que influenciou a concepção do Sistema de Afastamento e Tratamento de Esgoto, desde sua configuração mais geral, composta por três subsistemas (Barbosa, Pombo e Palmital), até a locação e características hidráulicas de cada emissário e escolha das áreas para construção das estações de tratamento. Desse modo, a Geomorfologia ganha relevância para estudos com fins de instalação de grandes empreendimentos, por estudar as formas de relevo, suas características morfológicas, materiais que o compõem, processos atuantes, fatores controlantes e dinâmica evolutiva. Aplicar os conhecimentos da Geomorfologia na análise do Sistema de Afastamento e Tratamento de Esgoto de Marília respalda-se não só na necessidade de conhecer as características do relevo da cidade, mas também pela a importância do tratamento do esgoto produzido para melhoria da condição de vida da população e não poluição de solos e águas. Sabe-se que toda e qualquer atividade econômica sempre se inicia com uma apropriação de algum bem ambiental: a terra, os minérios, a 16 vegetação, o ar, as águas, os animais. Ao longo do processo produtivo, parte do que foi apropriado é devolvido ao mesmo ambiente, agora sob a forma de resíduos sólidos, líquidos ou gasosos, que são despejados nas águas, na atmosfera ou no solo. Uma vez completado o ciclo produção-consumo, o bem já utilizado, quando não compensador seu reaproveitamento, é abandonado no ambiente. O desenvolvimento econômico intensifica as intervenções sobre a natureza e a devolução ao ambiente dos resíduos. Há, conseqüentemente, uma interação entre esses dois sistemas, o econômico e o natural. Aquilo que se retira e volta ao ambiente, por obra das atividades econômicas, passa a ganhar relevância para ambos, não podendo mais ser ignorado. Conforme a lei da conservação da massa, matéria e energia nunca são criadas nem eliminadas, o que acontece é sua transformação de uma forma para outra. Conclui-se, portanto, que não se pode criar algo do nada nem transformar algo em nada, ou seja, tudo que existe provém de matéria e energia preexistentes, só que em outra forma. Todas as atividades, sejam elas oriundas das dinâmicas da natureza ou da sociedade são realizadas a partir de matéria e energia proveniente do próprio planeta, isto é, de elementos naturais que, sob aproveitamento humano, tornam-se recursos. A intensificação da exploração desses recursos naturais pelas sociedades ao longo do tempo deu-se pela sua capacidade de acumular riquezas simultaneamente ao seu desenvolvimento tecnológico. Assim, avanço das técnicas tem como conseqüência crescente busca por recursos naturais. Sabendo da não aniquilação total das matérias e energias em todas as atividades dos seres vivos, elevação no consumo de recursos naturais significa aumento da produção de resíduos e rejeitos, muitas vezes indesejáveis a quem os eliminou. Esses, quando não reutilizados para outros fins, seja pela própria sociedade, ou pelas dinâmicas naturais, através, principalmente, dos ciclos biogeoquímicos, devem ser dispostos de maneira adequada, sob o risco, em caso contrário, de provocar poluição ambiental. Um dos desafios atualmente é a busca do equilíbrio entre as ações da sociedade com a conservação dos recursos naturais. Nas cidades esse desafio torna-se especialmente mais acentuado na medida em que elas representam os níveis mais elevados de intervenção antrópica na natureza. 17 Exemplo de problema enfrentado pelas administrações públicas são a correta coleta, tratamento e destinação dos esgotos sanitários. Eles são comumente lançados in natura nos corpos d’água sem prévio tratamento para que sejam eliminadas substâncias potencialmente poluidoras. O elemento natural relevo surge como ponto central no problema do tratamento de esgoto, no momento em que passa a ser visto com recurso para suporte de tubulações e estações de tratamento, principalmente no que se refere à disponibilidade e avaliação de áreas. E como será visto no decorrer do trabalho, essa relação de influência é determinante. 18 OBJETIVOS Perante o exposto, estabeleceu-se como objetivo geral do trabalho, verificar a adequabilidade ambiental, do ponto de vista geográfico/geomorfológico, das áreas escolhidas para receber as estações de tratamento de esgoto. Para alcançá-lo, traçaram-se os seguintes objetivos específicos: - Contextualização do relevo da cidade na geomorfologia regional; - Caracterização da gênese de formação e constante evolução dos relevos tabuliformes; - Caracterização do sistema de afastamento de esgoto da cidade de Marília-SP e sua relação com o relevo; - Caracterização do sistema de tratamento de esgoto da cidade de Marília-SP e sua relação com o relevo; - Caracterização das morfodinâmicas das paisagens dos locais escolhidos para instalação das estações de tratamento de esgoto da cidade; - Elaboração de documentos cartográficos, quais sejam: mapa hipsométrico e mapa clinográfico do município e perfis topográficos. 19 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Para melhor compreensão dos procedimentos utilizados nesse trabalho, resolveu-se dividi-lo em duas partes: organização, estruturação e elaboração dos capítulos e documentos cartográficos. O capítulo 1 diz respeito ao referencial teórico-metodológico do trabalho. Nele estão contidas as bases e referências utilizadas para o desenvolvimento do restante dos capítulos. Discutem-se as diferentes temporalidades e espacialidades envolvidas na pesquisa. O tempo é discutido através dos conceitos de morfogênese e morfodinâmica, onde estão inseridos os tempos geológico, geomorfológico e histórico, e o espaço a partir dos conceitos de morfoestrutura e morfoescultura. Há ainda a discussão acerca das paisagens e suas relações com a geomorfologia. Por meio do método de pensamento materialista histórico e dialético analisam-se suas formas de apropriação e modificações em suas dinâmicas, tendo como ponto balizador o relevo. Encerra-se o capítulo com o tema técnica e seu vínculo com o debate ambiental, onde se analisam seus usos e aplicações e conseqüências nas mudanças o ambiente e dinâmica das paisagens. O capítulo 2 trata da gênese de formação do relevo da cidade de Marília-SP. Busca-se nele, por meio das relações morfogenética, morfoclimática, tectodinâmica e litoestratigráfica que o relevo da cidade mantém com as unidades geomorfológicas de maior extensão espacial, as raízes de sua gênese, para melhor compreender sua formação e processo evolutivo. No terceiro capítulo se apresentam-se questões relativas a sistemas de esgotos sanitários. Faz-se uma breve história do tratamento de esgoto, suas origens, evolução e atual situação. A seguir listam-se algumas leis que respaldam, garantem e normatizam o direito dos cidadãos a um ambiente saudável por meio, dentre outras coisas, da coleta e tratamento de esgotos. Demonstram-se, ainda, as características e elementos que compõem um sistema de esgotos sanitários. Há também a discussão sobre os fatores que condicionam a escolha de áreas para estações de tratamento, que quantificam sua quantidade e o nível de tratamento que deverá atingir. Tendo esses elementos em mãos, o capítulo é encerrado com a apresentação do projeto 20 adotado para o sistema de afastamento e tratamento de esgoto da cidade, sempre procurando manter suas relações com o relevo. O capítulo 4 aborda a relação do relevo da cidade especificamente com o sistema de afastamento de esgoto. Analisam-se as relações existentes entre as locações dos emissários, os materiais de que são feitos e seus diâmetros com o relevo em cada subsistema. Os meios utilizados para demonstrá-las foram mapas hipsométricos, clinográficos e perfis topográficos dos condutos. No quinto e último capítulo aborda-se a relação do relevo da cidade especificamente com o sistema de tratamento de esgoto. Analise-se a morfodinâmica das paisagens dos locais escolhidos para a instalação das estações de tratamento por meio de condicionantes geomorfológicos, geológicos/hidrogeológicos e pedológicos para avaliação das áreas. Posteriormente, em cada estação, apresentam-se as características dos sistemas de tratamento, suas dimensões, projetos e pareceres geotécnicos. Os capítulos foram organizados de forma a apresentar uma linearidade de pensamento. Partiu-se dos referencias teóricos que, orientariam e balizariam metodologicamente a elaboração dos outros capítulos. Apresentou-se, a seguir, a gênese de formação do relevo da cidade e suas características com o intuito de já inicialmente ter-se claras as influências que dele poderia ter para o sistema de afastamento e tratamento de esgoto. Posteriormente colocam-se as características de um sistema de esgotos sanitários e se apresenta o projeto de Marília. Depois disso, o quarto e quinto capítulos discutem, separadamente, as relações do relevo com o afastamento e com o tratamento. As discussões acerca da adequabilidade ambiental das áreas das três estações sob o ponto de vista geomorfológico ficaram reservadas para as considerações finais. Após apresentar os procedimentos utilizados para a organização, estruturação e elaboração dos capítulos, passa-se agora aos procedimentos utilizados para a elaboração dos documentos cartográficos. Os mapas hipsométricos foram elaborados a partir de imagens SRTM (shuttle radar topography mission) do banco de dados “Brasil em Relevo” da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - http://www.relevobr.cnpm.embrapa.br/download/index.htm). As folhas utilizadas 21 foram: sf-22-x-c, sf-22-z-a, sf-22-z-b. Com o uso do software Global Mapper 81, fez-se o recorte do território municipal e, utilizando o software Corel Draw 132, arte final onde foram colocadas as coordenadas UTM (Universal Transversa de Mercator), a orientação do norte, a parte textual e de digitalização dos subsistemas. Os clinográficos foram elaborados a partir da extração das curvas de nível com eqüidistância de 20 metros do mapa hipsométrico do município no Global Mapper 8. Posteriormente, com a utilização do software Idrisi 3.2, por meio do estabelecimento da rede triangular entre as curvas de nível, obteve-se o mapa de declividades com cinco classes: 0-5%, 6-10%, 11-15%, 16-20% e acima de 20%. Com o software Corel Draw 13 fez-se arte final: colocou-se as coordenadas UTM, a orientação do norte, a parte textual e de digitalização dos subsistemas. Os mapas de localização de cada subsistema e dos emissários analisados foram elaborados no software Corel Draw 13 a partir da base digital cedida pela TCRE Engenharia Ltda., empresa que gerencia as obras. Os perfis topográficos foram elaborados no software Global Mapper 8, tendo como base o mapa hipsométrico do município. Com o uso de uma ferramenta específica, digitaliza-se sobre o mapa hipsométrico o perfil desejado a ser gerado. Quanto aos perfis dos emissários, esses foram sobrepostos ao mapa hipsométrico a partir da base digital e, com a mesma ferramenta, digitalizou-se os condutos, gerando assim, seus perfis. A arte final foi feita no software Corel Draw 13. 1 Global Mapper é marca registrada Global Mapper Software LLC. 2 Corel Draw é marca registrada da Corel Corporation. 23 CAPÍTULO 1 REFERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO 1. Tempo e Espaço em Geomorfologia: morfogênese e morfodinâmica A discussão acerca de tempo e espaço em Geomorfologia faz-se remontar às origens dessa disciplina como campo de conhecimento específico, tanto por seu objeto quanto por sua construção teórico-metodológica, que mantém relações com a Geologia e com a Geografia. Em razão disso, há uma Geomorfologia construída por geógrafos, que possui referências teóricas distintas da Geomorfologia construída por geólogos (SUERTEGARAY, 2002). Baseado nessas duas interfaces da ciência geomorfológica há noções de tempo também distintas. Para o geógrafo, a Geomorfologia constituiu uma área de investigação que exige a compreensão do relevo em termos de processos e formas, ou seja, a explicação da gênese numa perspectiva histórico-evolutiva (SUERTEGARAY, 2002). Para os geólogos, a Geomorfologia é entendida como instrumento de análise geológica. Compartimenta-se o relevo no intuito de delimitar a espacialidade das rochas, bem como diferenciar estruturas geológicas. Assim, Suertegaray (2002) conclui genericamente que, a Geomorfologia de cunho geográfico privilegiou estudos morfogenéticos, enquanto a de cunho geológico privilegiou a configuração espacial na sua relação com a disposição interna das rochas. A concepção de tempo em geologia foi discutida por Gould (1991) apud Suertegaray (2002) onde afirma que os geólogos conceberam o tempo através das metáforas da seta e do ciclo. O tempo concebido como seta representa a evolução, isto é, a seqüência irreversível de eventos que não se repetem. Já o concebido como ciclo, representa a ciclicidade de eventos em temporalidade estável, ou seja, são sempre imanentes e jamais modificados. E os tempos de espiral e espiral rítmica, representam “um meio tempo entre o fluxo linear que, embora não se fechando em círculos, admite a possibilidade de um fluir curvo onde ocorrem aparentes retornos, assemelhados à condições pretéritas, mas aliados a um nível superior” (MONTEIRO, 2000). Estas perspectivas são bem ilustradas na Figura 2. 24 REPRESENTAÇÕES LINEARES DO TEMPO PASSADO PRESENTE FUTURO A SETA O CIRCULO A ESPIRAL A ESPIRAL RÍTMICA (Sistema de Alta Complexidade) Figura 2: Representações lineares do tempo (MONTEIRO, 2000). Das três concepções, duas são bem expressas na Geomorfologia. O tempo enquanto cíclico-evolutivo, conforme explica Suertegaray (2002), é referência tanto para a Geologia como para a Geografia/Geomorfologia, porém com uma distinção: enquanto na primeira o princípio do atualismo tem sido a regra, isto é, o presente explica o passado, na segunda o tempo é valorizado para a compreensão do presente. A mesma autora citando Rodhe (1996, p.131), afirma que “o atualismo não pode ser contemporaneamente mantido devido às evidências empíricas da existência, importância e contingência das catástrofes, à existência da mudança global e de origem antropogênica”. Tanto a Geologia como a Geomorfologia para dimensionar o tempo utilizam a escala geológica, contudo as periodizações se diferem. A temporalidade utilizada nas análises dos geólogos busca a compreensão da origem da Terra. Nas análises dos geomorfólogos, a temporalidade se 25 restringe, segundo Suertegaray (2002), em decorrência do seu objeto (relevo), à era cenozóica, privilegiando o período quaternário e seus eventos característicos, particularmente as glaciações, como fundamentais na explicação genética do relevo. Todavia, atualmente, com advento da discussão ambiental e dos questionamentos que ela traz consigo principalmente a da relação sociedade- natureza, em que o “progresso” econômico-social ao longo da história humana se deu baseado na degradação ambiental, faz repensar, de acordo com a mesma autora, a concepção de tempo nas análises geológicas e geomorfológicas. Entretanto, ao inserir as dinâmicas da sociedade às dinâmicas naturais, não só a concepção de tempo foi repensada, mas também o arcabouço teórico-metodológico, ora compartimentado e dicotômico entre métodos de pensamento para o natural e o social. Essa discussão teórica, fortemente presente na ciência geográfica, se refletiu para a Geomorfologia. Nunes et al. (2006) ao citar Casseti (1991) aponta algumas concepções deterministas e aspectos dicotômicos que ainda estão presentes na Geografia atual e principalmente na Geografia Física: as ciências naturais estudam a dinâmica da natureza e as ciências sociais estudam a dinâmica da sociedade; as ciências naturais estudam a natureza independente das atividades humanas e as ciências sociais analisam a natureza como uma criação social. O atual debate teórico-epistemológico propõe a conjunção e integração dos elementos físicos, biológicos e antrópicos para compreensão do meio ambiente como sugere Bertrand através do conceito de paisagem em sua obra “Paisagem e Geografia Física Global” de 1968. Nesse sentido, ao considerar dimensão antropogênica nas análises geográfico/geomorfológicas e geológicas muda-se a concepção de tempo. Portanto, baseado nos trabalhos de Suertegaray (1988) e Suertegaray e Nunes (2001), ao dimensionar a atuação da sociedade sobre o relevo e, consequentemente, sobre a paisagem, falam sobre uma periodização se referindo a uma temporalidade natural, que se acenta na escala geológica, e a uma temporalidade humana, acentada na escala histórica. 26 O chamado tempo da natureza está relacionado com dinâmicas estritamente naturais, enquanto o tempo do Homem está relacionado com dinâmicas combinadas da sociedade e da natureza. Percebe-se que, embora haja duas periodizações nas análises do tempo, na realidade elas ocorrem simultaneamente. Os eventos naturais não cessam enquanto os processos sociais de ocupação/apropriação do relevo e sua conseqüente transformação ocorrem. A análise da formação e estruturação das diversas formas e tipos de relevo por processos unicamente da natureza ocorre por meio do tempo geológico, o tempo da morfogênese. Por outro lado, quando as análises estão voltadas aos usos e ocupações do relevo pela sociedade e seus respectivos impactos, o recorte de tempo é o histórico, o tempo da morfodinâmica. Na morfogênese o tempo é geológico, o tempo que escoa. É o tempo das eras e períodos geológicos. Relaciona-se com as estruturas e modelados de relevo que foram e continuam sendo formados por processos geológicos e geomorfológicos. Assim, o tempo da morfogênese destaca-se quando o enfoque principal da análise geomorfológica recai sobre os processos morfogenéticos do relevo. O tempo aqui tende a ser linear, sem ritmos e oscilações decorrentes da ação humana. Os ritmos são resultados da própria ação da dinâmica da natureza. No tempo histórico ou o tempo que faz, as morfologias da paisagem são transformadas e esculturadas, seja por processos naturais ou por processos humanos. É o tempo em que as ações antrópicas manifestam-se consideravelmente no ambiente3, sendo facilmente percebido e sentido por estar em constante mudança. Difunde-se a compreensão do homem como agente geológico-geomorfológico, ou como produtor/intensificador de processos geológico-geomorfológicos. O tempo aqui é cheio de ritmos e oscilações, decorrentes tanto de dinâmicas da sociedade quanto da natureza. Reconhece-se, tanto na Geomorfologia quanto na Geografia, a escala como instrumento básico de análise dos fenômenos. Ela corresponde, no espaço, ao tamanho da área, e no tempo, a duração do evento (SUERTAGARAY, 2002). Essa afirmação é ratificada por Cruz (1974) e Nunes 3 Ambiente e Paisagem são categorias de análise distintas, no entanto podem ser complementares por se combinarem dialeticamente. 27 et al. (2006) ao afirmar que a unificação das ciências ocorre a partir da articulação dos conceitos fundamentais, no caso da Geografia, de tempo e espaço. Dessa forma, tem-se como tendência a utilização da escala geológica de tempo para escalas menores, isto é, que abrangem extensões de áreas muito grandes, em que se privilegiam estudos morfogenéticos. As alterações e modificações possuem dinâmicas lentas. Por outro lado, utiliza-se a escala histórica de tempo para escalas maiores, ou seja, áreas pontuais. Os estudos nessa perspectiva preocupam-se com as morfodinâmicas das paisagens. As transformações nelas ocorridas processam-se rapidamente (SUERTEGARAY, 2000). O estudo do relevo e o sistema de afastamento e tratamento de esgoto da cidade de Marília acenta suas análises temporo-espacialmente nos conceitos de morfogênese e morfodinâmica. Num primeiro momento, toda a análise da gênese evolutiva do relevo sobre o qual está situada a cidade é baseada no tempo geológico, em que se observam as influências que unidades geomorfológicas (Bacia Sedimentar do Paraná, Planalto Ocidental Paulista e Planalto de Marília) tiveram para a formação do relevo local. Esse estudo possui como fundamentação teórica os conceitos de morfoestrutura e morfoescultura, os quais, conforme Ross (2000) passam pelas concepções de Walter Penck (1953), que explicam a complexidade das dinâmicas geradoras das diferentes formas de relevo espalhadas pelo globo. Penck (1953) apud Ross (2000) definiu claramente que há duas forças geradoras das formas do relevo terrestre: uma endógena e uma exógena. O entendimento das atuais formas de relevo da superfície terrestre é produto do antagonismo de ação dessas duas forças. A endógena responde pelas forças provenientes do interior da crosta terrestre e a exógena, pelas impulsionadas através da atmosfera pela ação climática atual e do passado. As forças endógenas manifestam-se de duas maneiras distintas através das estruturas da crosta terrestre. Uma é por processo ativo, ou seja, comandado pela dinâmica da crosta: abalos sísmicos, vulcanismo, falhamentos, dobramentos, afundamentos e soerguimentos das plataformas e fraturamentos – com explicação atual pela teoria da tectônica de placas. A segunda se 28 processa imperceptivelmente através da resistência que a litologia e seus arranjos estruturais oferecem ao desgaste pelos processos exógenos ou de erosão. É uma ação passiva, porém desigual, tendo em vista o maior ou menor grau de resistência litológica. A ação exógena é ativa. Atua constantemente e diferencialmente tanto no tempo como no espaço, isto por causa das diferenças climáticas locais, regionais e zonais e às mudanças climáticas de longa duração. Tendo Penck (1953) como princípio teórico, Mescerjakov e Gerasimov (1980) apud Ross (2000) desenvolveram os conceitos de morfoestrutura e morfoescultura. São conceitos advindos da escola soviética de Geomorfologia (ABREU, 1983). Com eles resolveu-se um problema de cartografia geomorfológica para médias e pequenas escalas. Havia dificuldades ao representar as unidades geomorfológicas (bacias sedimentares, cinturões orogenéticos, escudos, depressões tectônicas), pois quando se valorizava o escultural, perdiam-se informações estruturais e vice-versa. Com o estabelecimento dos conceitos de morfoestrutura e morfoescultura, definiu-se com clareza a representação cartográfica que valoriza o escultural (morfoescultura) sem desprezar o estrutural, ou valorizar o estrutural (morfoestrutura) sem desmerecer a escultura. São enquadrados como morfoestruturas os cinturões orogênicos, os escudos cristalinos, as bacias sedimentares e depressões tectônicas (grabens). Representam-se por determinadas características estruturais, litológicas e geotectônicas que estão associadas as suas gêneses. Essas grandes unidades estruturais, face suas características macro-morfológicas que estão relacionadas com suas gêneses e com suas idades, definem na superfície terrestre padrões de relevo que lhes são inerentes. Dentro de morfoescultura estão as grandes morfologias: depressões periféricas, planaltos e planícies. Estão associados à influência climática atual e pretérita. São representadas pelo modelado ou tipologias de formas geradas sobre diferentes morfoestruturas através do desgaste erosivo promovido por ambientes climáticos diferenciados tanto no tempo quanto no espaço, que imprimiram e continuam a imprimir suas marcas no relevo. 29 É, portanto, a morfoescultura decorrente de um contínuo processo natural de esculturação por climas quentes e úmidos, secos e quentes, frios, temperados entre outros e por sucessões alternadas destes, dependendo de cada região do globo terrestre. [...] Assim, todo o relevo terrestre pertence a uma determinada estrutura que o sustenta e mostra um aspecto escultural que é decorrente da ação do tipo climático atual e pretérito que atuou e atua nessa estrutura. Deste modo, a morfoestrutura e a morfoescultura definem situações estáticas, produtos da ação dinâmica do endógeno e do exógeno (ROSS, 2000, 308-309). Num segundo momento, as análises recaem sobre o tempo histórico, o tempo da morfodinâmica, em que se observam as influências recíprocas entre o relevo, para a constituição do sistema de afastamento e tratamento de esgoto e, desse, por meio das modificações e alterações da paisagem. O próximo tópico analisa a relação da paisagem com a geomorfologia a partir do método materialista histórico e dialético, através do qual é possível observar como, historicamente, determinada sociedade se relaciona com a natureza, seja ocupando-a, apropriando-se dela, ou transformando-a. 2. Paisagem e Geomorfologia: um olhar materialista histórico e dialético A Geografia desde sua institucionalização como ciência autônoma em meados do século XIX sempre se preocupou com a busca de como o homem se relaciona com seu meio (entende-se entorno natural). Ela se diferenciou das demais ciências por possuir essa perspectiva de conjunção (Humboldt, 1982). Todavia, na modernidade, em razão do avanço da racionalidade e dos métodos de análise da realidade, o caminho foi a separação entre Ciências Naturais e Ciências Sociais. Essa disjunção, compartimentação do conhecimento, provocou o uso de métodos específicos, e a Geografia acompanhou essa tendência: a externalização do homem da natureza. Dessa forma, a proposição de unidade entre homem e 30 natureza da Geografia foi impossibilitada devido o contexto científico apontar para a separação e, consequentemente, para a utilização de métodos diferentes (SUERTEGARAY, 2000). Atualmente se observa um debate teórico-epistemológico em busca da conjunção sociedade/natureza. Entretanto, essa busca não se restringe a ciência geográfica, mas se estende às demais ciências. E o que se compreende como razão dessa tendência totalizante é a questão ambiental. Ela se torna o princípio norteador da união, uma vez que põe em xeque os postulados e métodos que entendem o homem como sujeito dominador da natureza e não como integrante de sua dinâmica. Assim, categorias tradicionais da Geografia, como por exemplo, espaço, tempo, paisagem, território, ambiente, tem tido seus conceitos revistos e reformulados na tentativa da conjuntividade baseados em métodos científicos de compreensão da realidade, cada um a sua maneira de percebê-la e analisá- la (SUERTEGARAY, 2000). Tradicionalmente, de acordo com Suertegaray (2000), o conceito de espaço geográfico tem sido o balizador do campo de conhecimento da geografia e, por conseqüência, o mais abstrato. Ao longo da história, inúmeras foram as maneiras de concebê-lo, portanto, possibilidades operacionais diferenciadas dentro da Geografia. Conforme a referida autora, devido a essas possibilidades operacionais, que se expressam por meio de alguns conceitos, tais como os de paisagem, território, ambiente e lugar, o espaço geográfico torna-se uno e múltiplo. Toma-se inicialmente como referência o conceito de espaço geográfico expresso por Santos (1996) em que, para o autor, constitui-se “um sistema de objetos e um sistema de ações...” [...] formado por um conjunto indissociável, solidário e também contraditório, de sistemas de objetos e sistemas de ações, não considerados isoladamente, mas como um quadro único no qual a história se dá. No começo era a natureza selvagem, formada por objetos naturais, que ao longo da história vão sendo substituídos por objetos fabricados, objetos técnicos, mecanizados e, depois cibernéticos, fazendo com que a natureza artificial tenda a funcionar como uma máquina. (SANTOS, 1996, p. 63). Grifos nossos. 31 Nunes et al. (2006) ao analisarem Santos (1996), afirmam que ao longo da história da humanidade as sociedades estruturadas pelos agentes sociais que lhe dão dinamicidade edificam suas realizações materiais e simbólicas, ou seja, produzem espaço geográfico. A materialidade desse espaço se constitui nas formas herdadas do passado, associadas e adaptadas ao presente, através das modificações realizadas pela dinâmica da sociedade. Segundo os referidos autores (op cit), as realizações simbólicas processam-se por meio das relações sociais: formas políticas, econômicas, culturais e ambientais, permeadas e possibilitadas pelos elementos da natureza: relevo, vegetação, clima, solo, etc. que, através das técnicas criadas pela dinâmica da sociedade, manifestam-se concretamente na realidade, construindo, destruindo e reconstruindo novos espaços geográficos. Para a finalidade a qual se propõe, busca-se operacionalizar o conceito de espaço geográfico pelo de paisagem. No entanto, verificam-se variações em sua conceituação conforme as referências teóricas que podem embasá-la. A abordagem realizada pelos geógrafos que trabalham com a Teoria dos Sistemas analisa essa categoria a partir de entradas e saídas de matéria e energia. Outra maneira é por meio da perspectiva fenomenológico- hermenêutica. Nela há a sobreposição do sujeito ao objeto, gerando descrições do objeto a partir do ponto de vista do sujeito, ou seja, através de suas identidades e experiências vividas. Existe ainda a abordagem realizada por autores que seguem a Geoecologia das Paisagens (TROLL, 1982). Eles combinam a visão de entradas e saídas de matéria e energia da Teoria dos Sistemas com o método histórico-dialético diante da relação homem/natureza e das alterações antropogênicas na paisagem. Rodriguez et al (2004) confirmam esse posicionamento ao afirmarem que [...] a modificação e transformação da paisagem pelas atividades humanas subordinam-se, em primeira instância, às normas de interação entre a Natureza e a Sociedade. Estas têm, antes de tudo, um caráter dialético e complexo. [...] a paisagem original (natural), depois de finalizada a ação humana trata de restabelecer o equilíbrio, de tal forma, que qualquer paisagem modificada ou transformada pelo homem, como regra, é menos estável que a paisagem original, pois o 32 mecanismo natural de auto-regulação é alterado. (RODRIGUEZ et al., 2004, p. 154;156). Percebe-se na afirmação que são as entradas e saídas de matéria e energia que mantêm a paisagem auto-regulada. Em uma paisagem natural, a auto-regulação é feita por mecanismos advindos unicamente da dinâmica da natureza. Entretanto, sob modificação antrópica, isto é, entradas e saídas de matéria e energia advindas de dinâmicas da sociedade, o mecanismo natural de auto-regulação é alterado, buscando uma maneira de restabelecer o equilíbrio. Nesse trabalho, adota-se a perspectiva de conjunção e integração dos elementos formadores e constituintes da paisagem de Bertrand (2007, p.7 e 8), onde o autor a conceitua com sendo [...] determinada porção do espaço, resultado da combinação dinâmica, portanto instável, de elementos físicos, bióticos e antrópicos que, reagindo dialeticamente uns sobre os outros, fazem da mesma um conjunto único e indissociável, em perpétua evolução. No mesmo sentido de Bertrand, somam-se as idéias de forma e funcionalidade da paisagem presentes na compreensão que Suertegaray (2000) faz desse conceito relacionando-o ao de espaço geográfico. [...] De nosso ponto de vista, percebemos paisagem como um conceito operacional, ou seja, um conceito que nos permite analisar o espaço geográfico sob uma dimensão, qual seja o da conjunção de elementos naturais/tecnificados, socioeconômicos e culturais. Ao optarmos pela análise geográfica a partir do conceito de paisagem, poderemos concebê-la como forma (formação) e funcionalidade (organização). Não necessariamente entender forma- funcionalidade como uma relação de causa e efeito, mas percebendo-a como um processo de constituição/reconstituição de forma na sua conjunção com a dinâmica social. Neste sentido, a paisagem pode ser analisada como a materialização das condições sociais de existência diacrônica e sincronicamente. Nela poderão persistir elementos naturais, embora já transfigurados (ou natureza artificializada). O conceito de paisagem privilegia a coexistência de objetos e ações sociais na sua face econômica e cultural manifesta. (SUERTEGARAY, 2000, p. 22). 33 Nota-se que o posicionamento diante do conceito de paisagem que se adota perpassa pela relação homem/natureza a partir da perspectiva do materialismo histórico e dialético. É por meio dele que se compreende a funcionalidade e forma (morfodinâmica) das paisagens analisadas. Nesse aspecto é importante destacar que a história da filosofia é dividida em duas correntes filosóficas distintas: uma que abrange desde a natureza e a origem da vida e do universo, e a outra que aborda a relação do próprio ser humano com essa realidade, o qual rompe com a visão mística no qual tudo era dominado pelos deuses da natureza (FOSTER, 2005). Essas teorias dividiram-se de modo esquemático em duas grandes tendências: materialismo e idealismo. Enquanto ao materialismo corresponde toda concepção filosófica que aponta a matéria como substância primeira e última de qualquer ser, coisa ou fenômeno do universo, o idealismo é a concepção filosófica que aponta a idéia, o pensamento ou espírito. As origens do materialismo remontam a antiguidade. Epicuro, filósofo grego do período helenístico, assume uma postura materialista que, segundo Foster (2005), implica a expulsão do poder divino e todos os princípios teleológicos da natureza. Em proposições inicias de sua Filosofia Natural, por meio de duas proposições, constituí o que hoje se conhece como “o princípio de conservação”, quais sejam: “Nada é jamais criado pelo poder divino a partir de nada” e “a natureza... jamais reduz qualquer coisa a nada” (FOSTER, 2005, p. 58). Em outra citação, Foster (op. cit.) confirma a crença do materialismo ao se contrapor ao idealismo, de que é a matéria o centro de explicações da realidade. [...] A matéria passou a ser entendida como consistindo em átomo e, portando, seguindo Epicuro, em termos de partículas de matéria que podiam ser explicadas simplesmente em termos de tamanho, formato e movimento. (FOSTER, 2005, p. 65). É, portanto, baseado nas idéias de Epicuro, conforme Foster (2005), que Marx tem sua concepção materialista de natureza. 34 Utilizando-se da citação anterior, a explicação dos fenômenos em termos de movimento/evolução suscitou a concepção materialista de história de Marx. Nesse momento, seu pensamento materialista passa da natureza a história, em que o foco de análise e ênfase de crítica social passou da evolução mais ampla da natureza para o desenvolvimento histórico da humanidade. Embora seja a partir desse posicionamento teórico-filosófico que suas obras ganham reconhecimento e amplitude, Marx não nega a prioridade ontológica da natureza, ou seja, sua concepção materialista de história está enraizada na concepção materialista de natureza, ambas constituindo o domínio da história natural (FOSTER, 2005). Para melhor ilustrar sua concepção materialista de história, Foster (2005) diz que Marx, juntamente com Engels, partiu de uma ontologia materialista, em que entendiam que a natureza, mundo material (concepção materialista de natureza), era precondição da existência humana e a produção dos meios de subsistência uma precondição da vida humana em todas as suas múltiplas determinações, portanto, da sociedade humana. O autor segue dizendo que a análise de Marx e Engels que se segue é construída a partir desse ponto, traçando o desenvolvimento de diferentes modos de produção, associados com diferentes fases de desenvolvimento da divisão do trabalho e das classes ao longo do prolongado curso da história humana, e particularmente, com as grandes eras representadas pela sociedade antiga, feudal e capitalista. O que se observa ao analisar o pensamento de Marx é que em toda sua crítica da economia política, tendo o materialismo como concepção teórico-filosófica, em que analisa historicamente a maneira pela qual cada sociedade organiza sua produção material a partir dos conceitos centrais de seu pensamento, trabalho, divisão do trabalho, classes sociais e mais-valia, não nega a natureza com condição de existência humana. Foster (2005) mostra com clareza a extrema relação existente entre a concepção materialista de natureza e de história de Marx e Engels ao afirmar que [...] O verdadeiro socialista, incapaz de distinguir entre os seres humanos como seres naturais e como seres sociais – e 35 incapaz de compreender que o trabalho, através do qual a humanidade transforma a natureza e as suas relações sociais, é a essência do processo histórico humano - simplesmente reduz os seres humanos à igualdade de qualquer pulga, qualquer fiapo de palha, qualquer pedra. (FOSTER, 2005, p. 177-178). Marx utilizou o método dialético (influência da dialética hegeliana) para explicar as mudanças importantes ocorridas na história da humanidade através dos tempos. Ao estudar determinado fato histórico, ele procurava seus elementos contraditórios, buscando encontrar aquele elemento responsável pela sua transformação num novo fato, dando continuidade ao processo histórico. A dialética hegeliana afirma que cada conceito possui em si o seu contrário, cada afirmação, a sua negação. O mundo não é um conjunto de coisas prontas e acabadas, mas sim o resultado do movimento gerado pelo choque destes antagonismos e destas contradições. A afirmação traz em si o germe de sua própria negação (tese X antítese); depois de se desenvolver, esta negação entra em choque com a afirmação e este choque vai gerar um terceiro elemento mais evoluído, que Hegel chamou de "síntese" ou "negação da negação". (SPINDEL, 1984, p.31). Dessa forma, Marx além de desenvolver um método de pensamento aplicável a economia, política, história, também o é para a análise ambiental, uma vez que permite pensar a relação sociedade/natureza a partir de como a sociedade está organizada e como se dão as relações de produção. “Na concepção marxista, a relação do homem com a natureza é sempre dialética: o homem enforma a natureza ao mesmo tempo em que esta o enforma” (BERNARDES; FERREIRA, 2003, p.19). No acontecer dessa dialética, a natureza humaniza-se e o homem naturaliza-se, e a forma como isto ocorre é determinada historicamente de acordo com cada momento. É através da produção que se altera a forma da natureza: pelo trabalho o Homem modifica as formas das matérias naturais de modo a satisfazer suas necessidades. A maneira como se dá a relação homem/meio é a própria relação homem/homem, ou seja, se a relação em sociedade é desigual e contraditória, assim se estabelece a relação com a natureza (desigual e contraditoriamente). 36 Vê-se que a apropriação da natureza pelo indivíduo está sempre inserida numa determinada forma social. Marx apud Casseti (1991) afirma que “todas as relações sociais estão mediadas por coisas naturais e vice-versa. São sempre relações dos homens entre si e com a natureza”. É nos processos de apropriação e intervenção na natureza, através de técnicas utilizadas na construção do sistema de afastamento e tratamento de esgoto da cidade de Marília-SP, que se analisam as morfodinâmicas das paisagens com um olhar materialista histórico e dialético. Tendo em vista o relevo ser o elemento central da pesquisa e principal fator de análise das morfodinâmicas das paisagens, utiliza-se a afirmação de Casseti (1991) para ressaltar sua importância ao dizer que o relevo [...] Assume importância fundamental no processo de ocupação do espaço, fator que inclui as propriedades de suporte ou recurso, cujas formas ou modalidades de apropriação respondem pelo comportamento das paisagens e suas conseqüências (CASSETI, 1991, p. 33). O comportamento das paisagens e suas conseqüências diante de sua apropriação e ocupação estão vinculados à maneira pela qual a sociedade fará uso ao apropriá-la. E essa maneira está intimamente ligada às técnicas a serem utilizadas. O próximo tópico demonstra como, por meio das técnicas, o homem se relaciona com seu meio, e de que forma elas se tornam o elemento central para se entender a atual problemática ambiental. 3. Técnica e Desafio Ambiental Incluir o debate teórico sobre técnica envolve questões implícitas relacionadas ao seu uso, tais como tempo e espaço e sociedade e natureza. Seu debate parte de uma discussão teórica acerca do conceito de técnica, perpassa pelas conseqüências ambientais de sua utilização, até alcançar sua aplicação com o caso do sistema de afastamento e tratamento de esgoto da cidade. 37 Santos (1996), afirma que a principal forma de relação entre o homem e o meio é dada pela técnica. Complementa, afirmando que elas “são um conjunto de meios instrumentais e sociais, com as quais o homem realiza sua vida, produz e, ao mesmo tempo, cria espaço” (SANTOS, 1996, p. 29). O mesmo autor (op. cit.), em um inventário dos estudos sobre técnica, mostra que frequentemente ela é analisada extraindo-se dela o território, como se não fizesse parte ou fosse um elemento de sua constituição. Como um exemplo, cita Adam Schaff (1990, 1992), onde este se refere às conseqüências sociais da revolução técnico-científica, quatro tipos de mudanças: econômicas, políticas, culturais e sociais. Mas não dá lugar específico às mudanças geográficas. Já Pierre George (1974) apud Santos (1996, p.33) demonstra interesse por essa relação entre técnica e espaço ao lembrar que [...] A influência da técnica sobre o espaço se exerce de duas maneiras e em duas escalas diferentes: a ocupação do solo pelas infra-estruturas das técnicas modernas (estações de tratamento de esgoto, por exemplo) e, de outro lado, as transformações generalizadas impostas pelo uso da máquina e pela execução de novos métodos de produção e existência. (palavras nossas). Outra obra analisada é a de Maximilien Sorre (1948) que, segundo Santos (1996), é o primeiro geógrafo a propor com detalhe a consideração do fenômeno técnico em toda sua amplitude. Conforme o autor analisado, a consideração sobre técnica deve ir além de suas aplicações mecânicas, “estende-se a tudo o que pertence à indústria e à arte, em todos os domínios da atividade humana” (SANTOS, 1996, p.35). André Fel (1978) apud Santos (1996, p.35) em sua obra traça um inventário das múltiplas relações entre a técnica e o fato geográfico, lembrando que “se os objetos técnicos se instalam na superfície da terra, fazem-no para responder a necessidades materiais fundamentais dos homens: alimentar-se, residir, deslocar-se, rodear-se de objetos úteis”. Embora se perceba a preocupação de alguns autores com as técnicas, seja considerando-as um fato geográfico ou até mesmo mediando as relações sociais, não há um esforço de generalização no sentido de uma teoria 38 e método geográficos (SANTOS, 1996). Santos (1996) defende uma postura abrangente diante do fenômeno técnico, em que não se considere apenas a técnica específica como meio de se realizar este ou aquele resultado específico, mas também todas as manifestações das técnicas, incluídas as técnicas da própria ação. Aqui, ao se observar o caso estudado nesse trabalho, verifica-se a presença da técnica na totalidade do sistema de afastamento e tratamento de esgoto. Ela está presente em todo o projeto: desde o processo político/ decisório, análises de viabilidade econômica, escolha de áreas, construção e implantação, até o meio físico, antes mesmo de ser alterado pelas estações. Nesse sentido, os objetos naturais são incluídos entre os objetos técnicos, considerando seu possível uso. Segundo Seris (1994, p.24) apud Santos (1996, p.38), “será objeto técnico todo objeto susceptível de funcionar, como meio ou como resultado, entre os requisitos de uma atividade técnica”. Ocorre, em alguns momentos no uso das técnicas, o que Santos (1996) chamou de especialização máxima e intencionalidade extrema. Ele responsabiliza os progressos da ciência e da técnica, que possuem a possibilidade de construir objetos com funcionalidades sobredeterminadas. Essas funções específicas podem ser limitadas tanto pela sua finalidade de realização, quanto pelo espaço geográfico ao qual está inserida, onde uma pequena mudança pode interferir nas condições iniciais de utilização. Retorna-se ao exemplo do sistema de afastamento e tratamento de esgoto para se vislumbrar com maior clareza o anteriormente afirmado. Todo fenômeno técnico envolvido em todos os processos do projeto (incluí-se as construções) possuem finalidades específicas. Portanto, objetos e decisões técnicas específicas: os maquinários de perfuração, os condutos (diâmetros e materiais de que são feitos dependendo da vazão de transporte e pela forma de relevo por onde vão passar), o funcionamento das estações (dependendo do nível de eficiência no tratamento e do meio físico onde se instalarão), etc. As técnicas expressam uma relação tempo e espaço através dos objetos. Santos (1996, p.48) descreve que as técnicas são: 39 [...] história no momento de sua criação e no de sua instalação e revela o encontro, em cada lugar, das condições históricas (econômicas, socioculturais, políticas, geográficas) que permitiram a chegada desses objetos e presidiram à sua operação. O desenvolvimento tecnológico de um dado lugar é representativo de uma história local, e está inserido dentro de uma lógica de desenvolvimento tecnológico maior, de uma história geral. Em outras palavras, os objetos técnicos e o nível tecnológico de um determinado espaço geográfico refletem um conjunto historicamente determinado de técnicas. Assim, o fenômeno técnico é histórico, por isso passível de datação de sua origem, tanto na escala do lugar quanto do mundo. As técnicas sempre estiveram presentes na história do homem. Não há sociedade sem técnica. O atual desenvolvimento tecnológico foi e é baseado na ciência e na técnica, e ela, mediando a relação do homem com a natureza, reflete uma regra de proporcionalidade de que quanto maior o desenvolvimento das técnicas, maior é o avanço sobre a natureza. Diante de uma relação do homem externalizado da natureza, essa passa a ser entendida como um meio para se atingir um fim. Sob o pressuposto de acumulação de riquezas, a atual sociedade capitalista mantém uma relação regida, científica e tecnologicamente, de dominação da natureza. O aumento da capacidade qualitativa e quantitativa de se explorar recursos naturais se processa num ciclo evolutivo4 e a um ritmo constante de aceleração apoiado na relação: ciência5 � desenvolvimento tecnológico � desenvolvimento econômico � ciência. Coloca-se ciência no fim e ao mesmo tempo início do ciclo evolutivo devido ao aumento de riqueza permitir investimentos para avanços científicos. Na seqüência do ciclo, há avanços em tecnologia, e assim por diante. Essa vem sendo a lógica capitalista de produzir e acumular riquezas. 4 A opção de se utilizar ciclo evolutivo não está apoiada na idéia de melhorias, nem de um ciclo evolutivo mecanicista, mas sim à idéia de progressão e crescimento. 5 Utiliza-se ciência no ciclo evolutivo como sinônimo de conhecimento, já que a origem das ciências não é concomitante a origem dos homens e remontam ao século XVII. As ciências estão fortemente presentes na produção de conhecimento no atual período, que Santos (1996) chamou de Meio Técnico-Científico-Informacional. 40 Entretanto, na realidade, o ciclo evolutivo se processa de maneira mais complexa e delicada conforme ilustra a Figura 3. Figura 3: Ciclo evolutivo de avanços sobre a natureza. Organizado por Santos, 2009. A idéia de avanço é baseada em dois sentidos. O primeiro, de chegada, de utilização de recursos naturais através de técnicas para um determinado fim. No início do ciclo para produzir ciência, conhecimento. O segundo sentido, de avanço, se amarra à própria idéia de crescimento. Em cada início e fim de ciclo há avanço, e feito com maior força, pois houve desenvolvimento, por essa razão, evolutivo. Com o aumento gradativo dos avanços sobre a natureza e conseqüente utilização dos recursos naturais por meio de um aumento gradativo no nível tecnológico, tem-se a idéia de dominação da natureza pelo homem. É somente com a emergência da questão ambiental que se percebe que os avanços sobre a natureza se processa às custas de um avanço 41 de sua degradação, às custas de um avanço na produção de resíduos, às custas de um avanço na produção de poluição, etc. Percebe-se que os impactos ambientais são escritos no tempo e incidem diferencialmente no espaço, assim como os desenvolvimentos tecnológicos e econômicos. Implicitamente, baseado no atual pensamento arraigado na idéia de dominação da natureza, explicitamente tem-se a crença absoluta de que a solução para os problemas ambientais é tecnológica. A solução encontrada por muitas cidades para que não haja poluição por esgotos é técnica: estações de tratamento de esgoto. Elas representam uma relação sociedade/natureza apoiada na idéia de que os elementos naturais servem como recurso e substrato para sua implantação. No caso específico desse trabalho, o relevo e o sistema de afastamento e tratamento de esgoto de Marília-SP. Além de representarem uma relação sociedade/natureza, representam também relação tempo e espaço em alguns sentidos: 1-) Espaço por ocupar determinada área, território, determinado meio físico que, ao ocupar, modifica e produz novas dinâmicas na paisagem. 2-) Tempo por ser uma técnica de origem humana com o objetivo de acelerar o tempo da natureza. Com elas, o tempo que o curso d’água demandaria para se autodepurar da contaminação por sua própria dinâmica é reduzido. Tempo por ser uma técnica representativa de um momento da história, de certo desenvolvimento tecnológico. Aqui está arraigada a discussão sobre recursos naturais renováveis ou não-renováveis. Na realidade, todos são renováveis do ponto de vista do tempo geológico. Entretanto, há outros que sua dinâmica e abundância retornam à natureza no tempo histórico. Todavia, diante de tamanho avanço e degradação dos recursos naturais, até mesmo os renováveis têm se tornado escassos. Essa idéia de não preservação e conservação até pouco tempo muito presente apóia-se na capacidade cientifica/tecnológica de resolver os problemas ambientais, por isso essa capacidade estar pautada no tempo histórico (RODRIGUEZ et. al., 2004). Para finalizar, concorda-se que a solução do desafio ambiental que ora se apresenta é técnica, além também de política, econômica e cultural, 42 na sua relação sociedade/natureza. Que o desenvolvimento não seja apoiado na idéia que Porto-Gonçalves (2006) denomina de des-envolver o homem da natureza. Ao final desse primeiro capítulo, percebe-se que, embora o separe em tópicos específicos, os temas neles tratados estão intimamente ligados, sendo possível, portanto, ilustrar nosso referencial teórico- metodológico através da Figura 4. Nela se observa a operacionalização do espaço geográfico por meio do conceito de paisagem, através do qual se estabelece a conjunção de dinâmicas da natureza e dinâmicas da sociedade com a visão do materialismo histórico e dialético. Figura 4: Interação entre as dinâmicas da natureza e da sociedade. Adaptado de Suertegaray (2002) e Nunes et al. (2006). O próximo capítulo trata da gênese de formação do relevo da cidade de Marília-SP e suas relações com unidades geomorfológicas de maior extensão espacial. 43 CAPÍTULO 2 GÊNESE E FORMAÇÃO DO RELEVO DA CIDADE DE MARÍLIA-SP Entender a gênese, a formação e a constante evolução do relevo sobre o qual está situada a cidade de Marília requer compreender suas relações, processos e dinâmicas entre unidades geomorfológicas de maior abrangência espacial. A busca por essas relações dá-se pela identificação da compartimentação geomorfológica. Ela tem por objetivo individualizar um conjunto de formas semelhantes que tenham sido elaboradas em determinadas condições morfogenéticas ou morfoclimáticas, e que apresentem relações litoestratigráficas ou que tenham sido submetidas a eventos tectodinâmicos. Ela evidencia os resultados das relações processuais e respectivas implicações tectônico-estruturais que são registradas ao longo do tempo, considerando as dinâmicas e processos envolvidos na elaboração e constante evolução do modelado, em que as condições climáticas e a litologia tendem a condicionar a origem de formas diferenciadas (CASSETI, 2001). Um dos referenciais para o estudo de compartimentação geomorfológica são as unidades taxonômicas (ROSS, 1992) (Figura 5). Na macrocompartimentação das morfoestruturas do Brasil, de acordo com Ross e Moroz (1997), destacam-se as áreas cratônicas ou plataformas, os cinturões orogenéticos, as bacias sedimentares e as depressões tectônicas. 44 Figura 5: Representação Esquemática das Unidades Taxonômicas (ROSS, 1992). No Estado de São Paulo, de acordo com o mapa geomorfológico elaborado por Ross e Moroz (1997), os autores, através dos conceitos de Morfoestrutura e Morfoescultura do relevo, associados aos aspectos morfoclimáticos atuais, apresentam as unidades morfoestruturais do Cinturão Orogênico do Atlântico, Bacia Sedimentar do Paraná, Bacias Sedimentares Cenozóicas e Depressões Tectônicas. Para cada uma das unidades morfoestruturais aparecem várias unidades morfoesculturais 45 (planaltos, depressões e planícies litorâneas e fluviais) que, conseqüentemente, estão associadas a diversas formas de relevo (colinas, morros, escarpas, etc.). A cidade de Marília, assim, enquadra-se, morfoestruturalmente, na Bacia Sedimentar do Paraná e, morfoesculturalmente, no Planalto Ocidental Paulista, mais precisamente no Planalto Residual de Marília. 1. Bacia Sedimentar do Paraná A Bacia Sedimentar do Paraná apresenta uma superfície que chega aos milhões de quilômetros quadrados. Morfoestruturalmente sustenta a Formação Marília, substrato rochoso do Planalto Residual de Marília e do relevo da cidade de Marília, apresentando mergulho das camadas e estruturas geológicas com inclinação nas bordas e horizontalizadas em direção ao seu centro. Esse fato influencia a gênese dos relevos tabuliformes, tipo de relevo do Planalto de Marília. São três as grandes bacias sedimentares em território brasileiro: a Amazônica, do Parnaíba ou Maranhão e do Paraná (ZALÁN, 1990). Essas bacias formaram-se ao longo do Fanerozóico, ou seja, nos últimos 600 milhões de anos. Essas bacias, quando se organizaram os terrenos do continente sul- americano encontravam-se em posições altimétricas bem mais baixas. As rochas sedimentares dessas bacias foram formadas por depósitos marinhos e continentais. Nelas são encontrados, sobretudo, arenitos de diferentes idades e granulações, às vezes intercaladas por siltitos, argilitos, conglomerados e calcários. Especificamente na Bacia do Paraná ocorreu um extensivo derrame de lavas vulcânicas que se depositaram sobre camadas sedimentares em planos horizontais e estratificados. Essa atividade vulcânica ocorreu nos períodos Jurássico e Cretáceo na era Mesozóica e deu origem à Formação Serra Geral, pertencente ao Grupo São Bento. Algumas bacias sedimentares se formam nas faixas intracratônicas e o processo de entulhamento são favorecidos pela subsidência que gera compensação isostática. Diante disso, assumem espessuras pronunciadas responsáveis pela subsidência central, permitindo a continuidade 46 da sedimentação. As bacias sedimentares brasileiras, por exemplo, apresentam espessuras que chegam a 6.000 metros (PETRI & FULFARO, 1983 apud ZALÁN, 1990). Normalmente, as bacias apresentam características de sinéclises, ou seja, a espessura das camadas cresce da borda para o centro, com mergulhos que acompanham o substrato cristalino, parcialmente atribuído ao próprio processo de subsidência: ligeiramente inclinados na periferia das bacias em direção ao centro e tendência de horizontalização na seção central da mesma. É evidente que a sedimentação se inicia em discordância angular (contato dos sedimentos iniciais com o fundo da zona intracratônica dobrada, fraturada ou falhada) ou discordância erosiva e continua com tendência de manutenção de concordância (seqüências sedimentares subseqüentes sobre antecedentes), razão pela qual se entende que, enquanto a periferia das bacias possui seqüências concordantes inclinadas, o centro se caracteriza por concordâncias que tendem a horizontais (Figura 6). Figura 6: Disposição das camadas nas seqüências sedimentares (CASSETI, 2006). 47 Considerando, sobretudo, o comportamento das camadas e características litológicas dos estratos, constata-se uma evidente diferenciação morfológico-estrutural, generalizada através dos relevos tabuliformes e cuestiformes (CASSETI, 2001). A principal relação, portanto, existente entre a Bacia Sedimentar do Paraná com o relevo de Marília é litoestratigráfico, pois os relevos tabuliformes, tipo de relevo que caracteriza o Planalto Residual de Marília, possui estratificação que varia de horizontal a sub-horizontal, por ser típico em centros de bacia, onde as camadas geológicas deixam de ser concordantes no plano inclinado para serem no plano horizontal. Conforme a coluna litoestratigráfica da Bacia do Paraná (IPT, 1981 a: 48), as formações geológicas dominantes que afloram no Planalto Ocidental Paulista e no Planalto Residual de Marília são: Formação Serra Geral, pertencente ao Grupo São Bento, Formações Caiuá, Santo Anastácio, Adamantina e Marília, pertencentes ao Grupo Bauru, e os Depósitos Cenozóicos (Figuras 7 e 8). Figura 7: Seção Geológica Esquemática do Estado de São Paulo (Ab’Saber, 1958). 48 A formação geológica que dá sustentação à morfologia do Planalto Residual de Marília é a Formação Marília. Sua ocorrência é restrita quando comparada às demais formações do Grupo Bauru. Ela depositou-se em um embaciamento desenvolvido ao término da deposição Bauru, repousando, geralmente, sobre a Formação Adamantina, e mais para leste, diretamente sobre os basaltos da Formação Serra Geral (IPT, 1981). Sua cimentação é feita, em sua maior parte, por carbonato de cálcio, o que explica sua resistência aos agentes intempéricos ser maior que a Formação Adamantina. Almeida et. alli (1980) apud (IPT, 1981) apontam diferenças entre a Formação Marília que sustenta o espigão norte (Garça-SP, Marília-SP) e aquele do espigão sul (Echaporã-SP). A textura dos sedimentos é geralmente mais fina no espigão norte, onde a passagem para a Formação Adamantina sotoposta se dá através de interdigitações. Enquanto que no espigão sul, a passagem dos sedimentos da Formação Marília, ali mais grossos, para a Formação Adamantina é aparentemente brusca. A espessura máxima do 49 Marília no espigão norte é 180m e no espigão sul é 110m, o que indica uma elevação da base de formação. Pode-se interpretar a idade da Formação Marília (Figuras 9 e 10) com base nas suas relações de contato com as diversas litofácies da Formação Adamantina com deposição no final do Senoniano, no Cretáceo Superior. Figura 9: Afloramento da Formação Marília. Corte na rodovia SP-333 (SANTOS, 2006). Figura 10: Perfuração sobre a Formação Marília para passagem de tubulação do Sistema de Afastamento de Esgoto. Nota-se o afloramento do aqüífero freático. 50 2. Planalto Ocidental Paulista As unidades dos planaltos, ou seja, sua compartimentação foi identificada por Ross (1990 e 1995) apud Ross (2006) em quatro grandes categorias morfogenéticas: planaltos em bacias sedimentares, planaltos em intrusões e coberturas residuais de plataforma, planaltos em núcleos cristalinos arqueados e planaltos em cinturões orogênicos. Confirma-se, assim, com essa compartimentação dos planaltos, a intrínseca relação que há em geomorfologia entre a estrutura geológica e o modelado. Vê-se que cada estrutura, juntamente com processos e dinâmicas climáticas, respondem por uma escultura diferente com formas semelhantes, mas que permitem serem compartimentados (ROSS, 2006). A morfoescultura do Planalto Ocidental Paulista (Figura 11), de acordo com Ross (op. Cit.), enquadra-se na categoria planaltos em bacias sedimentares. Esses são quase inteiramente circundados por depressões periféricas ou marginais. Essas unidades também possuem a característica de apresentar em contato com as depressões, relevos escarpados caracterizados por frente de cuestas. No estado de São Paulo, aparece uma única frente na borda leste. 51 Figura 11: Mapa Geomorfológico do Estado de São Paulo (ROSS; MOROZ, 1997). 52 A epirogenia Cenozóica da Plataforma Sulamericana, que soergueu de modo desigual o continente, induziu novas fases de processos erosivos longos com alternância de climas secos e úmidos juntamente com a epirogenia. Esses processos tectônicos e climáticos foram os responsáveis pela gênese das unidades morfoesculturais do Planalto Ocidental Paulista e Depressão Periférica Paulista. A primeira subdivisão do relevo do Estado de São Paulo, de acordo com Nunes (2002) foi apresentada por Moraes Rego (1932), delimitando o Planalto Ocidental, a Depressão Periférica, os relevos cuestiformes e as áreas cristalinas (IPT, 1981b, p.6-7). Posteriormente vieram os trabalhos de Deffontaines (1935), Monbeig (1949), Ab’Saber (1956), Ab’Saber e Bernardes (1958), e Almeida (1964). Este último serviu de base para a elaboração do Mapa Geomorfológico do Estado de São Paulo – escala 1:1.000.000, feito pelo IPT (1981b). De acordo com esse mapa, o Estado de São Paulo está dividido em cinco províncias geomorfológicas: I – Planalto Atlântico; II – Província Costeira; III – Depressão Periférica; IV – Cuestas Basálticas e V – Planalto Ocidental Paulista. Geomorfologicamente, o Planalto Ocidental Paulista abrange uma expressiva parcela da Bacia Sedimentar do Paraná, com área estimada em torno de 100 mil km2, aproximadamente 50% do Estado de São Paulo, indo desde a província das Cuestas Arenítico - Basálticas até ao limite norte (rio Grande), oeste (rio Paraná) e sul (rio Paranapanema) (SUDO, 1980). Para Sudo (1980, p.2), o Planalto Ocidental Paulista se desenvolve em uma Superfície de Reverso de Cuesta, onde suas altitudes decrescem de 900 a 1000 metros nos altos da Cuesta Arenítico-Basáltica, até 250 a 300 metros nas barrancas do rio Paraná. Ele apresenta, litoestruturalmente, através do espesso pacote vulcânico-sedimentar da Bacia do Paraná [...] a disposição das camadas com caimento suave para noroeste, e a presença de marcado horizonte de basaltos separando as rochas paleozóicas e mesozóicas inferiores, dos arenitos cretácios pós-basálticos (IPT, 1981 b, p.21). 53 Ainda de acordo com IPT (1981), situa-se essencialmente, sobre rochas do Grupo Bauru, constituído por diversas formações, com predomínio de arenitos e, em algumas regiões cimentadas por carbonato de cálcio (Formação Marília, por exemplo). Há afloramentos descontínuos de basaltos nos vales dos principais rios, exceto ao longo do Paranapanema e do Pardo, onde se expõem extensivamente. As camadas geológicas que formam o Planalto Ocidental Paulista, de acordo com IPT (1981 b, p.21), apresentam um grau de caimento em direção à calha do Rio Paraná, nível de base regional, condicionando uma tendência à formação de relevos estruturais. No trabalho “Os baixos chapadões do oeste paulista”, Ab’Saber (1969, p.1) caracteriza o Planalto Ocidental Paulista como [...] uma vasta extensão de chapadões areníticos de vertentes convexas suaves e constitui uma das áreas de relevos tabuliformes de centro-de-bacia (Planalto de Marília), das mais típicas do país. (palavras nossas). Mesmo tendo uma configuração regional parecida [...] em vários setores dos espigões dos chapadões ocidentais paulistas, mesmo em setores de grande rebaixamento topográfico, existem relevos que escaparam aos efeitos homogeneizantes das aplainações neogênicas. Ross e Moroz (1997) identificam nesse planalto variações fisionômicas regionais, possibilitando delimitar unidades geomorfológicas distintas, tais como: Planalto Centro Ocidental, Patamares Estruturais de Ribeirão Preto, Planaltos Residuais de Batatais/Franca, Planalto Residual de São Carlos, Planalto Residual de Botucatu e Planalto Residual de Marília. Esses também podem ser visualizados na figura 8, anteriormente citada. 3. Planalto Residual de Marília A unidade geomorfológica do Planalto de Marília (Figura 12) distingue-se fisionomicamente na paisagem do Planalto Ocidental Paulista por dois motivos principais: sua relação com a Bacia Sedimentar do Paraná através 54 do comportamento das camadas que se dispõem horizontalmente em direção ao seu centro, constituindo, assim, um típico relevo tabuliforme; e pelos longos processos erosivos ativados pela epirogenia Cenozóica, associados às alternâncias de climas secos e úmidos em associação com a resistência litológica oferecida. Figura 12: Mapa hipsométrico de parte do Planalto Ocidental Paulista. O retângulo indica a localização do Planalto de Marília. Organizado por Santos, 2009. Ao observar a figura, verifica-se uma diminuição das altitudes de leste para oeste. Confirma-se o fato de que o caimento das camadas geológicas se dá no sentido do rio Paraná (nível de base). Onde se visualiza pontos altimétricos que variam de 940 metros até 750 metros corresponde ao reverso das cuestas arenítico-basálticas, início do Planalto Ocidental Paulista. Em direção ao centro do mapa distingue-se o Planalto Residual de Marília. Nota-se que ele se destaca na paisagem por estar em posição altimétrica superior ao seu entorno, fato explicado pela resistência litológica oferecida pelo arenito da formação Marília. As variações climáticas, que ocorreram com maior freqüência no quaternário, produziram efeitos nas taxas de erosão e pedogênese, nos regimes fluviais e nível dos oceanos e na distribuição ecológica dos seres 55 vivos. Dessas contínuas mudanças nas condições ambientais resultaram transformações mundiais na paisagem. A cada variação do clima associa-se um processo esculturador da paisagem: entalhamentos de talvegues (clima úmido) e entulhamentos dos mesmos (clima seco), de intemperismo químico (clima úmido) e desagregações mecânicas (clima seco). A gênese, formação e constante evolução do Planalto de Marília seguem o modelo esquemático evolutivo de Casseti (2001) por meio da ação tanto da litologia quanto do clima, em que se procura evidenciar a participação estrutural, através das diferenças litológicas e esforços tectônicos sob ação de processos morfoclimáticos distintos. Segue-se, portanto, o seguinte esquema: I-) Organização do sistema hidrográfico em fase climática úmida, associada a efeitos epirogenéticos (esses definem novos níveis de base, o que influencia os sentidos das drenagens). Considerando que as seqüências litoestratigráficas superiores das bacias sedimentares brasileiras datam do Cretáceo, entende-se que a organização da drenagem e a evolução vertical do modelado dada pela incisão linear da drenagem tenham acontecido a partir daquele período (Figura 13). Além disso, a orientação do sistema fluvial pode estar associada à imposição do mergulho das camadas ou à orientação topográfica ligada ao processo de pediplanação (inclinação em direção ao nível de base local ou regional). Para o Planalto de Marília, o mergulho das camadas, como dito anteriormente, está orientado em direção à calha do rio Paraná, nível de base regional. 56 Figura 13: Organização da drenagem em estrutura concordante horizontal, com início da incisão do talvegue (CASSETI, 2001). II-) Devido aos esforços epirogenéticos considerados, há uma tendência de aprofundamento dos talvegues e de elaboração de seus vales. Nessa circunstância, as alternâncias litológicas podem originar patamares estruturais (Figura 14) ou formas específicas relacionadas à imposição estrutural (Figura 15). Dada a disposição horizontal das camadas, os vales comumente apresentam formas simétricas. A manutenção da resistência litológica, entretanto, é relativa, transitória, ou seja, o recuo da camada resistente pode se dar pelo solapamento do material subjacente, mais tenro, provocando aluição da camada superior (Figura 16). A retirada do material friável pode também exumar uma superfície estrutural, individualizada pela resistência litológica. Vale ressaltar que no caso do Planalto de Marília a manutenção da resistência litológica se processa somente pelo arenito da formação Marília. Materiais mais resistentes e mais friáveis são variações de concentração de carbonato de cálcio (agente cimentante). 57 A A B B Figura 14: Fundo de vale em berço resultado do entalhamento linear em uma das bordas do Planalto de Marília. Ao longo das vertentes é possível identificar terraços fluviais. As letras correspondem aos antigos níveis do curso d’água (SANTOS, 2006). Figura 15: Evolução do entalhamento dos talvegues por imposição tectônica (efeitos epirogenéticos). (CASSETI, 2001). 58 Figura 16: Recuo da camada resistente por solapamento basal da camada friável, subjacente (CASSETI, 2001). III-) A tendência de alternância climática, como a passagem do clima úmido para o seco, evidenciada na evolução morfológica pós-cretácea brasileira (provavelmente no Plio-Pleistoceno), teria sido responsável pela evolução horizontal do modelado, dada a aceleração do recuo paralelo das vertentes por desagregação mecânica. A abertura dos vales, tendo como nível de base os talvegues abandonados, teria proporcionado entulhamento do próprio nível de base com tendência de elaboração de pediplano intermontano (Figura 17). Enquanto o clima úmido, por meio do entalhamento dos talvegues, teria respondido pela evolução vertical da morfologia, o clima seco tenderia a destruir as formas criadas pelo clima úmido, proporcionando a evolução horizontal da morfologia, caracterizando, deste modo, mais uma das relações antagônicas da natureza. Observa-se que enquanto no clima úmido as camadas resistentes ficam pronunciadas, no clima seco a desagregação mecânica tende a reduzir as diferenças litoestratigráficas (no caso do relevo de Marília, suavizando as camadas pronunciadas). Teoricamente, portanto, pode-se deduzir que quanto maior a abertura dos vales, mais espessas tendem a ser as rampas colúvio- aluvionares. A proximidade entre as bordas tendem a formar fundos de vale em “V” (Figura 18), enquanto que o aumento da distância tende a formar fundos de vale de fundo chato (Figura 19). 59 Figura 17: Recuo Paralelo das vertentes por desagregação mecânica (clima seco), com conseqüente soerguimento de nível de base (CASSETI, 2001). Figura 18: Fundo de vale em “V”. A tendência de evolução do relevo seria a abertura do vale (nível de base) e a incisão do talvegue seria remontante, ou seja, em direção a malha urbana circundante. Observa-se a camada resistente pronunciada (SANTOS, 2006). 60 Figura 19: Fundo de vale de fundo chato. Evolução do relevo se verifica pelo distanciamento das bordas e a camada resistente se suavizando (SANTOS, 2006). IV-) Uma nova fase climática úmida ensejaria uma nova organização da drenagem e, conseqüentemente, um reentalhamento dos talvegues, proporcionando o alçamento de antigos depósitos, como os pedimentos detríticos que inumaram áreas depressionárias. Tem-se assim o prosseguimento do trabalho evolutivo por erosão remontante e denudação dos topos interfluviais com exumação parcial de camadas subjacentes resistentes, originando as superfícies estruturais, ou simplesmente a esculturação dos sedimentos que compõem a camada sobrejacente, caracterizando as superfícies esculturais. O trabalho comandado pelo sistema hidrográfico enseja a evolução do relevo via erosão regressiva, promovendo ramificações de cursos de primeira ordem, podendo, então, aparecer formas residuais, como os morros-testemunhos associados a materiais resistentes. As diferenças litológicas poderiam ainda proporcionar saliências morfológicas, parcialmente mascaradas na fase anterior, de clima seco, denominadas cornijas. Com a abertura dos vales, haveria uma tendência a se formarem vales simétricos, denominados vales em “manjedouras’’ (Figura 20). A presença de pedimentos 61 detríticos em processo de retrabalhamento morfológico pela incisão da drenagem é testemunha do clima seco correspondente à fase anterior. Figura 20: Morfologia tabuliforme atual, evidenciando os principais elementos resultantes da evolução das estruturas concordantes horizontais (CASSETI, 2001). O Planalto de Marília corresponde, segundo Ross e Moroz (1996), a um prolongamento para oeste do Planalto Residual de Botucatu, desempenhando um vasto planalto de topo aplanado no interflúvio Tietê/Paranapanema delimitado pelo Planalto Centro Ocidental. Ele, de acordo com IPT (1981), corres