Campus de Botucatu Instituto de Biociências – Seção de Pós-Graduação Distrito de Rubião Júnior s/n CEP 18618-000 Botucatu SP Brasil Tel 14 3811 6148 fax 14 3815 3744 posgraduacao@ibb.unesp.br Estudo das interações in vitro entre a proteína TRF de Leishmania amazonensis (LaTRF) e suas possíveis parceiras João Augusto Ribeiro Botucatu 2013 Campus de Botucatu Instituto de Biociências – Seção de Pós-Graduação Distrito de Rubião Júnior s/n CEP 18618-000 Botucatu SP Brasil Tel 14 3811 6148 fax 14 3815 3744 posgraduacao@ibb.unesp.br UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA "Julio de Mesquita Filho" INSTITUTO DE BIOCIÊNCIAS DE BOTUCATU Estudo das interações in vitro entre a proteína TRF de Leishmania amazonensis (LaTRF) e suas possíveis parceiras Aluno: João Augusto Ribeiro Orientador(a): Profª. Drª. Maria Isabel Nogueira Cano Botucatu 2013 Dissertação apresentada ao Instituto de Biociências, Campus de Botucatu, UNESP, para obtenção do título de Mestre no Programa de Pós-Graduação em Ciências Biológicas Genética. iii FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA SEÇÃO DE AQUIS. E TRAT. DA INFORMAÇÃO DIVISÃO TÉCNICA DE BIBLIOTECA E DOCUMENTAÇÃO - CAMPUS DE BOTUCATU - UNESP BIBLIOTECÁRIA RESPONSÁVEL: ROSEMEIRE APARECIDA VICENTE Ribeiro, João Augusto. Estudo das interações in vitro entre a proteína TRF de Leishmania amazonensis (LaTRF) e suas possíveis parceiras / João Augusto Ribeiro. – Botucatu : [s.n.], 2013 Dissertação (mestrado) – Universidade Estadual Paulista, Instituto de Biociências de Botucatu Orientador: Maria Isabel Nogueira Cano Capes: 20202008 1. Leishmaniose – Pesquisa. 2. Proteínas. 3. DNA. 4. Telômeros. 5. Proteínas de Ligação a Telômeros. Palavras-chave: Interação; Leishmaniose; Proteínas; Telomeros. iv Agradecimentos Agradeço aos amigos que fiz durante esses anos todos. Agradeço também meus parceiros de laboratório: Rita, Arina, Marcelo, Jomar, Camila, Paulo, Raphael, Bábara, Vinícius, Marcela e Camila que me ajudaram sempre que precisei e fizeram com certeza com que o ambiente de trabalho se tornasse muito agradável. A minha orientadora Maria Isabel por me dar a oportunidade de amadurecer profissionalmente, influenciando diretamente no meu crescimento e explorando sempre o que tenho de melhor. Aos colaboradores que me ajudaram a cumprir os objetivos de meu projeto de mestrado. Gostaria de agradecer minha namorada Mariane, que se mostrou incansável em sempre me oferecer apoio nos momentos que mais precisei. E principalmente meus pais João e Midori, que se mostraram extremamente fortes ao estarem sempre presentes em todos os momentos da minha vida. v Resumo A leishmaniose é um espectro de doenças causadas por parasitas do gênero Leishmania, afligindo mais de 15 milhões de pessoas e expondo outras 350 milhões que vivem em regiões de risco. Para manter a integridade de seu genoma, os parasitas dispõem de diversos mecanismos, dentre os quais estão a manutenção dos telômeros. As proteínas da família TRF (“TTAGGG telomere repeat-binding factor”) fazem parte de complexos multiproteicos responsáveis pela manutenção dos telômeros de alguns eucariotos, incluindo os tripanossomatídeos. Elas apresentam um domínio de interação com DNA telomérico na forma de dupla fita, um domínio de homodimerização e possíveis regiões de interação com outras proteínas teloméricas ou da maquinaria de reparo. O intuito deste projeto foi confirmar a existência nos telômeros de Leishmania amazonensis de possíveis proteínas parceiras da proteína LaTRF, já que resultados preliminares de nosso grupo revelaram uma possível interação entre a LaTRF e as proteínas LaRPA-1 e LaRbp38. No intuito de se obter a proteína telomérica LaTRF recombinante pura e em quantidade desejável, foi solicitada a síntese com códons otimizados, do gene que codifica a LaTRF e a subclonagem do mesmo na mesma fase de leitura do vetor de expressão pQE-2 (QIAGEN). A proteína recombinante gerada a partir desta construção foi expressa de forma solúvel, e em baixíssima concentração e a análise de sua estrutura secundária por espectroscopia de dicroísmo circular confirmou que a proteína foi expressa de forma enovelada. A LaTRF recombinante foi utilizada em ensaios in vitro de interação proteína:proteína com suas possíveis parceiras: LaRbp38 e LaRPA-1. Ensaios de imunoprecipitação, imunofluorescência e pull-down revelaram que LaTRF interage com LaRbp38 e que esta interação se dá via um motivo TRFH-docking like, presente na LaRbp38. Parece que a LaRbp38 atua como ponte para a interação entre LaTRF e LaRPA-1, sugerindo que a semelhança de proteínas descritas em outros eucariotos, ela cumpra o papel de estabilizar LaTRF na dupla fita e promover a interação desse complexo com proteínas que se associam ao DNA simples fita telomérico. O que explica o fato de LaTRF interagir fisicamente somente com LaRbp38 e não com LaRPA-1, apesar de estarem sendo imunoprecipitadas em um mesmo complexo. Aqui descrevemos que esta interação possivelmente se dá através de um novo motivo presente em todos os ortólogos de Rbp38 descritos em tripanosomatídeos, o qual apresenta similaridade de sequência com o core do TRFH docking motif descrito nas proteínas teloméricas TIN2 (TRF interacting fator 2) de vertebrados. Palavras-chave: Interação; Leishmaniose; Proteínas; Telômeros. vi Abstract Leishmaniasis is a spectrum of diseases caused by parasites of the genus Leishmania, affecting about 15 million people and exposing other 350 million that live in risk areas. Parasites have various mechanisms to maintain the integrity of its genome, among which is the maintenance of telomeres. Proteins belonging to the TRF ("TTAGGG telomere repeat- binding factor") family form part of a multiprotein complex responsible for telomere maintenance in eukaryotes, including trypanosomatids. TRFs present a DNA binding domain, a homodimerization domain and regions that allow the protein to interact with other proteins. The aim of this project was to confirm the existence in Leishmania amazonensis telomeres of LaTRF protein partners, since preliminary results from our group revealed a possible complex formed with LaTRF, LaRPA-1 and LaRbp38. In order to obtain the LaTRF recombinant protein, we ordered the optimized gene sequence and its subcloning in the bacterial expression vector pQE-2 (QIAGEN). Recombinant LaTRF was expressed in low amount, but in soluble form. Circular dichroism spectroscopy analysis showed that the recombinant LaTRF was in its folded state and able to be used in vitro protein:protein interaction assays with its potential partners: LaRbp38 and LaRPA-1. Immunoprecipitation, indirect immunofluorescence and pull-down assays revealed that LaTRF physically interacts with LaRbp38 using a TRFH-docking like motif present in proteins that interact with the TRFs, such as TIN2 (TRF interacting factor 2). This suggests that LaRbp38, similarly to TIN2, may play a role of stabilizing LaTRF in double strand and promote the interaction of this complex with for example LaRPA-1, previously described as a protein that binds to the single stranded telomeric DNA. This possibly explains why LaTRF physically interact with LaRbp38 but not with LaRPA-1, although they all co-immunoprecipitated in the same complex. Here we describe that this interaction possibly occurs through a new TRFH docking motif present in all Rbp38 orthologs described in trypanosomatids, which is similar to the core of the TRFH docking motif described in the TIN2 proteins from vertebrates. Keywords: Interaction; Leishmaniasis; Proteins; Telomeres. vii Lista de Figuras Fig 1. Ciclo biológico de L. amazonensis. Fig 2. Características gerais dos telômeros. Fig 3. Complexo shelterin de humanos. Fig 4. Panorama atual dos telômeros de Leishmania. Fig. 5. Ilustração esquemática das interações proteicas do complexo shelterin. Fig. 6. LaTRF é uma proteína ortóloga das TRFs de tripanosomatídeos e mamíferos. Fig. 7. LaRPA-1 e LaRbp38 co-imunoprecipitam com LaTRF em extratos nucleares de L. amazonensis. Fig. 8. Mapa do vetor pQE-2 (QIAGEN). Fig. 9. Padronização de expressão da proteína recombinante em sistema bacteriano. Fig. 10. Mapeamento da proteína LaRbp38 através da construção de mutantes truncados sobrepostos. Fig. 11. O gene LaTRF sintético foi clonado em vetor de expressão bacteriano pQE2. Fig. 12. Análise da expressão de LaTRFr utilizando sistema bacteriano (1). Fig. 13. Análise da expressão de LaTRF utilizando sistema bacteriano (2). Fig. 14. Gel SDS-PAGE 8% contendo as frações proteicas insolúveis (I) e solúveis (S) das bactérias (BL21DE3) induzidas a 30ºC em um tempo de indução de 3h em diferentes concentrações de IPTG. Fig. 15. Análise da expressão de LaTRF utilizando sistema bacteriano (3). Fig. 16. Gel SDS-PAGE 8% contendo as frações protéicas solúveis (S) e insolúveis (I) das bactérias (BL21DE3 pLysS) induzidas a 30ºC em um tempo de indução de 3h na concentração de IPTG de 1 mM. Fig. 17 A. Purificação da proteína LaTRF recombinante na forma solúvel. Fig. 17 B. Expressão e purificação da proteína recombinante LaTRF. Fig. 17 C. Obtenção da proteína LaTRF recombinante. Fig. 18. Espectro de CD da proteína LaTRF. Fig. 19. Análise in silico da sequência de aminoácidos da proteína LaTRF para predição de estruturas secundárias. Fig. 20. Modificações pós-traducionais da proteína LaTRF. Fig. 21. Localização do motivo putativo TRFH docking (FKLAP) na sequência de aminoácidos da proteína LaRbp38. viii Fig. 22. O core do motivo TRFH docking (FKLAP) presente em LaRbp38 é conservado entre os ortologos em outros tripanosomatídeos. Fig. 23. O TRFH docking motif das proteínas TIN2 é conservado em mamíferos e menos conservado em Xenopus laevis. Fig. 24. Não há pareamento entre os motivos putativos TRFH docking presentes em Leishmanias spp. e o TRFH docking motif da TIN2 humana. Fig. 25. LaTRF, LaRPA1 e LaRbp38 co-imunoprecipitam em extrato de núcleo de formas promastigotas de L. amazonensis. Fig. 26. LaTRF e LaRbp38 interagem fisicamente. Fig. 27. Digestão com trombina para a retirada da cauda 6X Histidina das proteínas recombinantes LaTRF, LaRbp38, LaRbp38mut4 e LaRbp38mut6. Fig. 28. LaRbp38 interage com LaTRF via mutante truncado de LaRbp38 que não possui motivo FKLAP (LaRbp38mut4). Fig. 29. LaRbp38mut4 possui uma sequência conservada do tipo ALKTL que pode estar envolvida na interação com LaTRF. Fig. 30. A sequência de aminoácidos ALKTL é conservada e está presente em todos os ortólogos de Rbp38 descritos nos tripanosomatídeos. Fig. 31. Ilustração da proteína LaRbp38 inteira e dos mutantes truncados sobrepostos em relação ao motivo ALKTL. Fig. 32. Co-localização subcelular entre LaTRF e as proteínas LaRbp38 e LaRPA-1. Fig. 33. Ilustração dos possíveis complexos presentes nos telômeros de L. amazonensis. ix Sumário Resumo................................................................................................................................. Abstract............................................................................................................................... Lista de Figuras.................................................................................................................. 1. Introdução e Justificativa.............................................................................................. 1.1. Leishmania e leishmaniose........................................................................................... 1.2. Biologia molecular dos parasitas do gênero Leishmania......................................... 1.3. Características gerais dos telômeros.......................................................................... 1.4. O complexo telomérico em eucariotos....................................................................... 1.5. O complexo telomérico em Leishmania amazonensis................................................ 1.6. Função das proteínas TRFs......................................................................................... 1.7. A proteína LaTRF (L. amazonensis TTAGGG Repeat Binding Factor).......................................................... 2. Objetivos............................................................................................................................ 3. Material e Métodos.......................................................................................................... 3.1. Cultura de parasitas..................................................................................................... 3.2. Análise da expressão da proteína LaTRF em sistema bacteriano (pQE-2, QIAGEN)......................................................................................... 3.3. Padronização de expressão da proteína LaTRF recombinante em sistema bacteriano............................................................................................................... 3.4. Expressão da proteína LaTRF recombinante em larga escala e V Vii Vii 12 12 14 15 16 18 19 21 24 25 25 25 26 x purificação por cromatografia de afinidade....................................................................... 3.5. Análise da estrutura secundária de LaTRFr por espectroscopia de dicroísmo circular (CD)................................................................................................. 3.6. Obtenção dos extratos proteicos de núcleo de formas promastigotas de Leishmania amazonensis.................................................................................................. 3.7. Análise da expressão da proteína LaTRF utilizando SDS-PAGE seguido de “Western Blot” revelado com novo soro imune anti-LaTRF........................................... 3.8. Análise in silico por motivos conservados de interação proteína:proteína............... 3.9. Identificação in vitro das possíveis interações físicas entre LaTRF e outras proteínas teloméricas................................................................................. 3.9.1. Estudo das interações proteína:proteína por imunoprecipitação........................... 3.9.2. Confirmação das interações proteína:proteína por captura usando ensaio pull-down....................................................................................................... 3.9.2.1. Ensaio pull-down com uso de extrato nuclear do parasita como fonte de proteínas interatoras.............................................................................................. 3.9.2.2. Ensaio pull-down para verificar interações diretas entre proteínas recombinantes....................................................................................................... 3.9.3. Co-localização subcelular entre a proteína LaTRF e suas interatoras (LaRbp38 e LaRPA-1) por imunofluorescência............................................. 4. Resultados e discussão...................................................................................................... 4.1. Análise da expressão da proteína recombinante LaTRF a partir do gene otimizado clonado no vetor de expressão pQE-2................................................. 4.2. Expressão e purificação da proteína recombinante LaTRF utilizando cromatografia de afinidade (FPLC)................................................................. 4.3. Análise de espectroscopia de dicroísmo circular (CD)................................................... 27 28 28 28 29 29 29 30 30 30 32 33 33 38 40 xi 4.4. Análise da sequência de aminoácidos da proteína LaTRF para a presença de sítios de modificações pós-traducionais......................................................... 4.5. Caracterização das interações entre a proteína LaTRF e suas possíveis parceiras.................................................................................................................... 4.5.1. LaRbp38 possui um motivo putativo de ligação as TRFs, o TRFH docking motif................................................................................................................. 4.6. Identificação de proteínas parceiras de LaTRF............................................................ 4.6.1. Estudo das interações entre LaTRF e suas parceiras por imunoprecipitação............................................................................................................ 4.6.2. Ensaio de captura por pull-down usando LaTRFr como isca.................................... 4.6.2.1. Ensaio pull-down com uso de extrato nuclear do parasita como fonte de proteínas interatoras........................................................................ 4.6.2.2. A proteína LaRbp38 utiliza um motivo diferente de FKLAP para a interação com a proteína LaTRF................................................................ 4.6.3. LaTRF co-localiza com as proteínas LaRbp38 e LaRPA-1 no núcleo de formas promastigotas de Leishmania amazonensis........................................ 5. Conclusão.............................................................................................................................. 6. Referências bibliográficas.................................................................................................... 43 44 44 49 49 50 51 53 59 63 64 12 1. Introdução e Justificativa 1.1. Leishmania e leishmaniose O gênero Leishmania, família Tripanosomatidae, ordem Kinetoplastida, apresenta 13 espécies distintas de protozoários dentre as quais estão incluídos os agentes etiológicos da leishmaniose. Esses parasitas possuem ciclo de vida digenético em que há a alternância entre a forma amastigota intracelular com flagelo internalizado, que vive no hospedeiro mamífero e a forma promastigota extracelular flagelada, que vive no tubo digestivo do inseto vetor, insetos hematófagos pertencentes à família Psychodidae (gênero Lutzomyia). Roedores, canídeos, procionídeos, tamanduás, marsupiais, ungulados e primatas (inclusive o homem), servem de reservatório para o parasita (NEVES, 2000; REY, 2002). Durante o repasto sanguíneo a fêmea do inseto vetor introduz as formas infectivas (promastigotas metacíclicos) no hospedeiro mamífero, que são fagocitadas por macrófagos superficiais e no seu interior transformam-se em amastigotas. Estes amastigotas dividem-se causando a eventual lise do macrófago, e neste instante muitos amastigotas caem na corrente sanguínea e são novamente fagocitados por novas células do sistema monocítico fagocitário do hospedeiro (NEVES et al. 2000). O ciclo se completa quando um mosquito flebotomíneo não infectado alimenta-se do sangue de um hospedeiro infectado e as formas amastigotas voltam a se diferenciar em promastigotas no intestino do inseto (BASU e RAY, 2005; OLIVIER et al., 2005; LANG et al., 2009). A figura 1 apresenta uma ilustração simplificada do ciclo biológico de Leishmania amazonensis. 13 Fig 1. Ciclo biológico de L. amazonensis. Imagens bi e tridimensionais de amostras fixadas no interior do inseto vetor (Lutzomia) e em reservatório natural (Proechymis spp). (a) Promastigotas procíclicos no trato digestivo médio do inseto. (b) Promastigotas metacíclicos no trato digestivo anterior. (c) Promastigotas metacíclicos. (d, e, f, h, i) Macrófagos infectados. (g) Célula dendrítica infectada. (e, f) Promastigotas no fagolisossomo minutos após fagocitose. (f, h, i) Formação do vacúolo digestivo onde ocorre a transformação dos promastigotas metacíclicos em amastigotas e proliferação dos parasitas (imagem adaptada de LANG et al., 2009). A leishmaniose se caracteriza por um conjunto de síndromes complexas e multifacetadas, causadas por diversas espécies do gênero Leishmania, podendo se manifestar nas formas visceral, mucocutânea e cutânea. A leishmaniose visceral ou calazar em que os parasitas apresentam acentuado tropismo pelo sistema fagocítico mononuclear (SFM) do baço, do fígado, da medula óssea e dos tecidos linfóides. A leishmaniose mucocutânea apresenta complicações frequentes com o aparecimento de lesões destrutivas extensas nas mucosas do nariz, boca e faringe. Finalmente leishmanioses cutâneas produzem exclusivamente lesões cutâneas, ulcerosas ou não, porém de maneira restrita. Uma variação da leishmaniose cutânea é a forma cutânea difusa com disseminação cutânea que se apresenta em indivíduos anérgicos ou, tardiamente, em pacientes que haviam sido tratados de calazar (REY, 2002). 14 Desde 1980 a leishmaniose vem se espalhando por todas as regiões do Brasil, e dentre os 88 países que constituem regiões endêmicas para a leishmaniose, 76 são países em desenvolvimento, o que evidencia a íntima relação entre esta parasitose e os fatores sócio- econômicos dessas regiões (WHO, 1990; ARIAS et al., 1996). Além disso, o composto tradicionalmente empregado para combater os parasitas, o antimonial pentavalente, pode causar vários efeitos colaterais nos pacientes, como dores musculares e alterações cardíacas. O parasita alvo deste estudo é a L. amazonensis, agente causal da leishmaniose cutânea e cutânea-difusa apresentando ampla distribuição geográfica, encontrando-se por toda bacia amazônica, além de estados como Maranhão, Ceará, Bahia, Minas Gerais, Espírito Santo e São Paulo (NEVES, 2000; REY, 2002). Porém, em algumas regiões do Brasil, L. amazonensis aparece como agente causal de todo o espectro da leishmaniose (BARRAL et al., 1991; ALMEIDA et al., 1996). A leishmaniose se manifesta de forma mais grave em hospedeiros com o sistema imunológico enfraquecido. O número crescente de casos da doença em transplantados e em portadores do vírus HIV tem alarmado as comunidades médica e científica. Além disso, a Organização Mundial da Saúde considera a leishmaniose uma das doenças cuja incidência mais cresce na atualidade (juntamente com a dengue e a malária) (WHO, 2000). 1.2. Biologia molecular dos parasitas do gênero Leishmania Leishmanias são organismos diplóides, assexuados, cujo genoma difere dos genomas típicos de eucariotos. Seu genoma nuclear contém aproximadamente 70 Mb organizados em 34 a 36 cromossomos lineares que variam de tamanho entre 0,35 e 3,0 Mb. A condensação cromossômica durante o ciclo mitótico não é observável, dificultando assim quaisquer tipos de análises citogenéticas (WINCKER et al., 1996; JOHNSTON et al., 1999; IVENS et al., 2005). Em condições de estresse nutricional ou seleção por drogas, Leishmania spp. podem amplificar segmentos específicos do genoma e transformá-los em minicromossomos. Apesar disso, os genomas das espécies do gênero Leishmania são muito similares entre si e estão organizados em áreas centrais bem conservadas com polimorfismos concentrados nas extremidades dos cromossomos (STILES et al., 1999). Os genes de Leishmania não apresentam íntrons e são transcritos em grupos gerando RNAs precursores policistrônicos, fenômeno comum em protozoários Kinetoplastida. O processamento envolve o acréscimo, por trans-splicing, de miniéxons com CAP 7-Metilguanosina na extremidade 5’ de RNAs em maturação e adição de cauda poli-A, gerando assim mRNAs maduros. Devido a ausência de promotores gênicos individuais típicos, estima-se que a regulação gênica em Leishmania 15 ocorra principalmente em nível pós-transcricional (STILES et al., 1999). Recentemente foi demonstrado que sítios de transcrição policistrônicos estão localizados próximos a histonas H3 acetiladas, indicando que este processo possa ser um tipo geral de regulação da transcrição em Leishmania major (THOMAS et al., 2009). O sequenciamento dos genomas de Leishmania infantum e de Leishmania brasiliensis, mostrou que a composição genética dessas duas espécies apresenta pouca diferença quando comparado ao genoma de Leishmania major (IVENS et al., 2005; PEACOCK et al., 2007). Deste modo, pode-se concluir que poucos genes do parasita são importantes para determinar qual a forma clínica da leishmaniose será desenvolvida após a infecção e talvez o genoma do infectado tenha um papel importante nas manifestações clínicas da doença (PEACOCK et al., 2007). 1.3. Características gerais dos telômeros Telômeros são complexos de proteína-DNA localizados nas extremidades dos cromossomos. Entre suas principais funções destaca-se a proteção dos terminais cromossômicos, impedindo a fusão destes, e a degradação cromossômica pela maquinaria de reparo (BLACKBURN et al., 1984). Eles são formados por sequências repetidas em tandem do tipo 5’ TTAGGG 3’ terminando em uma protrusão 3' simples fita denominada “3' G- overhang”, que é substrato para a elongação dos telômeros pela enzima telomerase e para a interação de proteínas teloméricas envolvidas na manutenção do tamanho e proteção dos terminais cromossômicos (KLOBUTCHER et al.,1981; BLACKBURN, 2001; SMOGORZEWSKA e DE LANGE, 2004; LIRA et al., 2007a). Em humanos, leveduras, protozoários ciliados e Trypanosoma brucei foi observado que esses terminais cromossômicos podem adquirir conformações em forma de laço (t-loop) ou em forma de uma estrutura denominada G-quadruplex (“G-quartet” ou G4 DNA), as quais parecem proteger os telômeros da ação da maquinaria de reparo da célula e impedir o acesso da telomerase ao terminal dos cromossomos elongados (MUNOZ-JORDAN et al., 2001; TEIXEIRA e GILSON, 2005; GILSON e GELI, 2007). A figura 2 mostra o arranjo em t-loop dos telômeros. 16 Fig 2. Características gerais dos telômeros. Os telômeros humanos apresentam uma sequência de nucleotídeos em que o terminal da fita mais longa do DNA (em cima) é rico em guanina (letra ‘G’), e a fita mais curta (em baixo) é complementar à primeira e rica em citosina (letra ‘C’). Os telômeros são encontrados com esse terminal ‘livre’ (I) ou formando um arranjo em laço (t-loop, em inglês) (II), presente nos cromossomos de alguns eucariotos (as formas geométricas coloridas representam proteínas teloméricas que mantêm essa estrutura) (CANO, 2006). 1.4. O complexo telomérico em eucariotos Associadas aos telômeros e formando um grande complexo nucleoproteico, estão inúmeras proteínas que coordenam a dinâmica da estrutura telomérica. Tais proteínas constituem um complexo proteico responsável por manter a estabilidade do telômero e também por regular o acesso da telomerase (DIMITRIEV et al., 2003; AUBERT e LANSDORP, 2008). Estes complexos proteicos são dinâmicos, podendo variar de acordo com o ciclo celular, idade da célula e estímulos externos (STEWART e WEINBERG, 2002; SMOGORZEWSKA e DE LANGE, 2004). Proteínas teloméricas podem ter associação direta ao DNA, a outras proteínas teloméricas, ou ainda a outros fatores, como os que compõem a maquinaria de reparo a danos ao DNA. As funções destas proteínas teloméricas variam, mas parecem estar associadas a região do telômero com a qual elas interagem. Complexos proteicos que se associam a fita simples do DNA telomérico participam no recrutamento da telomerase e influenciam a elongação telomérica. Por outro lado, complexos proteicos que se associam a fita dupla estão envolvidos na manutenção do t-loop e regulam a telomerase negativamente (DE LANGE, 2005; AUBERT e LANDSORP, 2008). 17 Em mamíferos, o complexo multiproteico de interação ao DNA telomérico, inicialmente denominado telossomo, é conhecido como shelterin e recebeu esta denominação devido a sua função na proteção ao DNA telomérico (shelter, em português, abrigo, lugar de refúgio) (LIU, et al. 2004; DE LANGE, 2005). As proteínas que fazem parte do complexo shelterin possuem três características básicas: são abundantes nos telômeros, mas não se acumulam em outras partes da célula, estão presentes ao longo de todo o ciclo celular e tem função limitada aos telômeros. Não pertencer a shelterin, no entanto, não indica que a proteína não possua função telomérica. Significa apenas que a proteína não apresenta alguma das características citadas acima (DE LANGE, 2005). A figura 3 apresenta uma representação esquemática da dinâmica de atuação do complexo shelterin em humanos. Fig 3. Complexo shelterin de humanos. A cromatina telomérica de mamíferos contém uma série de proteínas que interagem com DNA. Na forma de t-loop (telômero fechado) ou forma não-replicativa, as proteínas TPP1 e POT1 formam um complexo com o DNA telomérico via TIN2 e TRF1/2 e a telomerase tem seu acesso bloqueado aos telômeros. Na forma aberta ou forma replicativa, o complexo TPP1/POT1 recruta e estimula a atividade enzimática da telomerase em telômeros curtos (figura extraída de AUBERT e LANSDORP, 2008). Em leveduras e humanos, pesquisadores demonstraram a existência de um complexo, denominado CST (Ctc1-Stn1-Ten1), cujas proteínas compartilham alta semelhança ao 18 complexo heterotrimérico RPA (RPA-1, RPA-2 e RPA-3), e estão envolvidas no metabolismo de DNA. RPA apresenta múltiplas funções no metabolismo do DNA, participando das maquinarias de replicação, reparo, recombinação, checagem do ciclo celular, transcrição e regulação dos telômeros (LONGHESE et al., 1994, WOLD, 1997, SMITH et al., 2000). Junto ao complexo shelterin, o complexo CST é responsável pela manutenção e estabilidade telomérica. Isto deixa clara a importância do complexo RPA e evidencia o alto grau de conservação deste complexo nos eucariotos superiores (MIYAKE et al., 2009; SUN, et al., 2009; WELLINGER, 2009). 1.5. O complexo telomérico em Leishmania amazonensis Em Leishmania amazonensis foi detectado a existência de três complexos proteicos que se associam in vitro ao DNA telomérico simples fita rico em G (FERNANDEZ et al., 2004). Em nosso laboratório, além da enzima telomerase (LaTERT, L. amazonensis telomerase reverse transcriptase), responsável pela elongação dos terminais cromossômicos, duas proteínas que compõem dois desses complexos foram identificadas utilizando-se métodos bioquímicos (CANO et al., 1999; GIARDINI et al., 2006). São elas as proteínas LaRBP38 (L. amazonensis RNA binding protein 38) e a proteína LaRPA-1 (L. amazonensis Replication Protein A 1) (FERNANDEZ et al., 2004). Ambas também interagem e co-localizam com os telômeros do parasita in vivo (LIRA et al., 2007b, SIQUEIRA NETO et al., 2007). Também foram identificadas proteínas que se associam in vitro e in vivo a dupla-fita telomérica. Entre elas estão LaTBP1 (Leishmania amazonensis Telomere Binding Protein 1), LaRBP38 (LIRA et al., 2007b e 2007c) e LaTRF (L. amazonensis TTAGGG Repeat Binding Factor), alvo deste estudo (DA SILVA et al., 2010). A figura 4 apresenta o panorama atual da composição dos telômeros de L. amazonensis. 19 Fig 4. Panorama atual dos telômeros de Leishmania. O DNA telomérico é composto por uma porção dupla-fita, formado pela repetição TTAGGG em tandem, sequências subteloméricas (LCTAS - Leishmania Conserved Telomere Associated Sequences) e uma protrusão 3´G-overhang. As formas coloridas representam as proteínas já identificadas interagindo com o DNA telomérico na forma de dupla fita: LaTRF, LaTBP1, LaRBP38 e simples fita: LaRBP38, LaRPA-1 e a enzima telomerase (LaTERT) com seu componente RNA intrínseco contendo o modelo reverso da sequência telomérica ( LIRA et al., 2007a). O Laboratório de Telômeros do Departamento de Genética da Universidade Estadual Paulista, campus Botucatu, é pioneiro em pesquisas com telômeros de protozoários patogênicos, principalmente os causadores da leishmaniose em humanos e animais domésticos. Uma das principais metas do nosso grupo é encontrar no ambiente telomérico do parasita novos e potenciais alvos que auxiliem no desenvolvimento de terapias antiparasitárias, incluindo o desenho de drogas de baixa toxicidade para o hospedeiro e mais eficazes no combate à doença. 1.6. Função das proteínas TRFs As proteínas que interagem com a dupla fita telomérica, ex: Rap1p (Repressor/activator site-binding protein 1) em Saccharomyces cerevisiae, TRF1 e TRF2 em humanos e AtTBP1- 3 (Arabidopsis thaliana telomere binding protein 1-3) e AtTRP1 (Arabidopsis thaliana telomeric repeat-binding protein) em Arabidopsis thaliana (BUCHMAN et al., 1988; BROCOLLI et al., 1997; SCHRUMPFOVA et al., 2004; HWANG et al., 2005), atuam em cis como reguladores negativos na manutenção dos telômeros e algumas, como a TRF2, estão envolvidas com a formação do t-loops (GRIFFITH et al., 1999). Todas as proteínas que interagem com a dupla fita telomérica possuem no mínimo um domínio do tipo Myb (ou homeodomínio) originalmente descrito em proteínas c-myb de mamíferos (HANAOKA et al, 2001). Em algumas proteínas teloméricas, como TRF1 e TRF2, e as do tipo “TRF1-like” (TRFL) de A. thaliana (BILAUD et al, 1996; KARAMYSHEVA et al., 2004), Taz1 (ortholog 20 of human Tafazzin) de Schysosaccharomyces pombe (COOPER et al., 1997) e Tbf1 (TTAGG- Binding Factor 1) de S. cerevisiae, o domínio Myb contém uma sequência conservada, denominado “consenso telobox” (BILAUD et al., 1996). Esse domínio se associa a dupla fita telomérica e a simples fita rica em G, mas não interage com a fita rica em C (BILAUD et al., 1996; KARAMYSHEVA et al., 2004). As proteínas TRF de humanos, assim como outras proteínas teloméricas já descritas, interage com uma terceira classe de proteínas, as quais não se ligam diretamente ao DNA, porém auxiliam na regulação da estrutura telomérica formando complexos de alto peso molecular (shelterin) (LI et al, 2003; YE et al., 2004; LIU et al., 2004). O mesmo é formado por três proteínas que interagem diretamente com o DNA: TRF1, TRF2 e POT1 (Protection Of Telomeres 1) as quais são são interconectadas por outras três proteínas: TIN2 (TRF Interacting Protein 2), TPP1 (Tripeptidyl-peptidase 1) e RAP1 (Repressor Activator Protein) que não interagem diretamente com o DNA. Este complexo não é estático, mas sofre bastante remodelamento atuando junto com fatores de reparo de DNA e desta forma protegem os telômeros e regulam a ação da telomerase (DE LANGE, 2005). Em vertebrados, incluindo mamíferos e anfíbios, as interações entre as proteínas teloméricas TRF1 e TRF2 são estabilizadas pela proteína TIN2. Esta proteína é o componente central do complexo shelterin que não somente conecta TPP1/POT1 a outros componentes, mas também estabiliza TRF1 e TRF2 na dupla fita telomérica. TIN2 une TRF1 e o complexo TRF2/RAP1 (associado a fatores que reconhecem danos ao DNA) pela associação com ambas as proteínas simultaneamente, porém através de domínios diferentes (Fig. 5). TIN2 também pode recrutar o heterodímero TPP1/POT1 ao complexo. POT1 é uma proteína que liga o 3’-G overhang (5’-TTAGGG-3’) associando-se a simples fita telomérica através de dois domínios do tipo OB-fold (oligonucleotide/oligosaccharide binding-fold), que são motivos estruturais presentes também em proteínas que ligam DNA simples fita, RNA ou outras proteínas, como as RPAs e os componentes do complexo telomérico CST, considerados RPA-like ( DIOTTI e LOAYZA et al., 2011; de LANGE et al., 2011, MIYAKE et al., 2009; SUN, et al., 2009; WELLINGER, 2009). 21 Assim, em vertebrados, além do complexo CST (MIYAKE et al., 2009; SUN, et al., 2009; WELLINGER, 2009) nota-se a presença de dois complexos dependentes de POT1 e com funções distintas. Um em que TRF1 e TRF2 interagem com proteínas presentes na simples fita telomérica através de TIN2-POT1 regulando o tamanho do telômero e outro através da interação de TRF2 com RAP1 que protege os terminais recrutando a maquinaria de reparo de DNA (LOAYZA et al., 2011; de LANGE et al., 2011). 1.7. A proteína LaTRF (L. amazonensis TTAGGG Repeat Binding Factor) Em tripanosomatídeos, foi descrita uma proteína ortóloga das TRFs de vertebrados que em T. brucei e L. amazonensis interagem in vitro e in vivo com o DNA telomérico dupla fita e co-localiza com os telômeros dos parasitas (DREESEN et al., 2007 et al.; DA SILVA et al., 2010), porém sua participação em outras maquinarias celulares, como a de reparo a danos no DNA, ainda são desconhecidos. É provável que a LaTRF seja um dos poucos representantes, em L. amazonensis, dos componentes do complexo shelterin, haja vista que outros fatores que fazem parte deste complexo, por exemplo um ortólogo da tbRAP1, ainda não foram identificados neste parasita. LaTRF interage com a dupla fita telomérica através de um Fig. 5. Ilustração esquemática das interações proteicas dos componentes do complexo shelterin. TRF1 e TRF2 ligam com alta afinidade e especificidade de sequência às repetições teloméricas. TIN2 pode ligar simultaneamente TRF1 e TRF2 e unir as duas moléculas. TPP1 é recrutada por TIN2 para interagir com POT1. POT1 é capaz de se associar ao overhang telomérico através de dois OB folds. RAP1 é o sexto componente do complexo shelterin e está presente em um mini-complexo 1:1 com TRF2. (DIOTTI e LOAYZA et al., 2011). 22 domínio do tipo Myb (ou homeodomínio) e possui um outro domínio putativo de homodimerização (TRFH, TRF homodimerization domain) (DA SILVA et al., 2010). Um dos objetivos deste projeto é a identificação das proteínas interatoras de LaTRF. Em Leishmania amazonensis, o complexo proteico que interage com o DNA dupla fita ainda requer mais investigações, mas é possível deduzir algumas características do complexo pelas interações de LaTRF a dupla fita telomérica e com suas possíveis proteínas parceiras. Em L. amazonensis não parece haver a presença de TRF1 e TRF2 como em outros eucariotos e sim uma proteína que pode ser uma quimera das duas proteínas (DA SILVA et al., 2010) (Fig. 6 e Tabela 1). LaTRF possui aparentemente o dobro do tamanho das outras TRFs inclusive quando se compara com a ortóloga descrita em outros tripanosomatídeos e as TRFs de mamíferos (BIANCHI, BROCOLLI e de LANGE, 1997, DA SILVA et al., 2010). Sendo assim, acreditamos que ela possa ter funções correlacionadas, pois apresenta grau significativo de similaridade com as outras TRFs e com os domínios de interação ao DNA (Myb) e de homodimerização (TRFH) das proteínas TRF1 e TRF2 de vertebrados (BIANCHI, BROCOLLI e de LANGE, 1997, DA SILVA et al., 2010). Fig. 6. LaTRF é uma proteína ortóloga das TRFs de Tripanosoma brucei e mamíferos. Diagrama esquemático mostrando as estruturas primárias das TRFs de mamíferos (Homo sapiens, Hs) e tripanosomatídeos (LaTRF e TbTRF). Em destaque, os domínios estruturais TRFH de homodimerização e interação a outras proteínas e o domínio Myb de ligação ao DNA dupla-fita (DREESEN et al. 2007). 23 Tabela 1. Análises de alinhamentos de sequência de aminoácidos de proteínas homólogas de LaTRF utilizando programa bl2seq sequences (protein-protein BLAST). (DA SILVA et al., 2010) Assim, investigamos a possibilidade da proteína LaTRF interagir com outras proteínas teloméricas e inclusive com proteínas que ligam DNA simples fita telomérico (Ex: LaRPA). Neste caso, em investigações mais detalhadas a proteína LaRbp38 parece se mostrar como fator importante na interação direta com LaTRF formando parte um possível complexo shelterin mínimo em L. amazonensis e também possivelmente atuando como um ligante entre LaTRF e o complexo que liga DNA simples fita. Em nosso laboratório, a sequência homóloga de TRF de L. amazonensis (LaTRF, GenBank Acc. EF559263), foi clonada a partir de uma sequência putativa de L. major a qual compartilha similaridades com a TbTRF e com o domínio Myb-like das TRFs de vertebrados (Tabela 1). O gene foi clonado, sequenciado e a análise in silico das sequências de nucleotídeos e de aminoácidos mostrou que o gene LaTRF codifica uma proteína de aproximadamente 82,5 kDa. LaTRF interage in vitro e in vivo com o DNA telomérico dupla fita e co-localiza com os telômeros de formas promastigotas do parasita (DA SILVA et al., 24 2010), porém sua participação em outras maquinarias celulares, como a de reparo a danos no DNA, ainda são desconhecidos e a obtenção da proteína LaTRF recombinante poderá vir a ser uma ferramenta valiosa para se realizar essas análises in vitro. Resultados preliminares apresentados na tese de Mestrado da aluna Camila Esteves, em nosso laboratório, sugerem que as proteínas teloméricas LaRPA-1 e LaRbp38 possam fazer parte de um mesmo complexo proteico onde a LaTRF está presente (Fig. 7 e dados não mostrados). 2. Objetivos Este projeto tem como objetivo principal caracterizar a proteína LaTRF e encontrar algumas de suas proteínas parceiras. Dentre as proteínas candidatas a interatores de LaTRF estão as proteínas teloméricas já estudadas em nosso laboratório como por exemplo, LaRBP38 e LaRPA-1 (vide Fig.7). Para alcançar este objetivo foram utilizadas as seguintes estratégias metodológicas: 1. Expressão e purificação da proteína recombinante LaTRF utilizando sistema bacteriano. 2. Verificação de interações físicas diretas e indiretas entre a proteína LaTRF e as proteínas teloméricas LaRBP38 e LaRPA-1 através de ensaios de imunoprecipitação, usando-se soro imune anti-LaTRF e extrato de núcleo das formas promastigotas do parasita como fonte de proteínas interatoras. As misturas de proteínas imunoprecipitadas foram fracionadas em gel SDS-PAGE e analisadas por Western blot utilizando-se soros imunes específicos. Fig. 7. LaRPA-1 e LaRbp38 co- imunoprecipitam com LaTRF em extratos nucleares de L. amazonensis. Proteínas nucleares de formas promastigotas de L. amazonensis foram imunoprecipitadas com soro imune anti-LaTRF acoplado a proteína A sepharose (DA SILVA et al., 2010). Os eluatos da imunoprecuipitação foram submetidos à análise por Western blot (WB) revelado com os soros imunes: anti-LaTRF, anti-LaRPA-1 e anti-LaRbp38. Linha 1, imunoprecipitação com soro pré-imune (PI); linha 2, extrato de núcleo (I, input); linha 3, imunoprecipitado (IP). 25 3. Confirmação das interações proteicas por: a) ensaios de captura do tipo pull-down. As misturas de proteínas capturadas por interação a LaTRF foram fracionadas em gel SDS- PAGE e analisadas por Western blot utilizando-se soros imunes específicos e b) ensaio de co- localização subcelular por imunofluorescência dupla. 3. Material e Métodos 3.1. Cultura de parasitas Formas promastigotas de L. amazonensis, cepa MHOM/BR/73/M2269, foram cultivadas em fase exponencial a 27oC em meio “199 (Earle)” (Cultilab), pH 7,4, suplementado com 5% de soro fetal bovino (Cultilab) e 1X solução de Antibióticos (penicilina/estreptomicina) com antimicótico (Cultilab). 3.2. Análise da expressão da proteína LaTRF em sistema bacteriano (pQE-2, QIAGEN) Na tentativa de se obter sucesso na expressão e na purificação da proteína recombinante LaTRF (LaTRFr), foi solicitada a síntese com códons otimizados da sequência que codifica o gene LaTRF (GenBank Acc. EF559263) pela empresa GenScript. A mesma foi otimizada para conter códons modificados no intuito de ser expressar em sistema bacteriano de forma solúvel e em maior quantidade. Além disso, foi solicitada também a subclonagem em vetor de expressão pQE-2 (QIAGEN) (Fig. 8) o qual permite que a proteína seja expressa fusionada a uma cauda de 6x Histidina. 26 Para realização de testes de mini-indução da expressão da proteína LaTRF recombinante, foram testadas duas cepas bacterianas de Escherichia coli (BL21 DE3 e BL21DE3 pLysS). Em ambos os casos a expressão da proteína foi induzida com diferentes concentrações de IPTG (0,05 mM, 0,1 mM, 0,2 mM, 0,5mM e 1,0 mM) e nas temperaturas de 37ºC ou a 30ºC. Bactérias transformadas com o plasmídeo pQE2+LaTRF foram inoculadas em meio LB contendo os agentes de seleção (antibióticos) adequados e crescidas sob agitação de 200 ciclos por minuto até atingirem DO600nm entre 0,6 e 0,8, quando se adicionou IPTG para induzir a expressão. Foram retiradas amostras antes e depois da indução nos tempos de 1h, 2h, 3h, 4h e 16h. Para análises em gel SDS-PAGE 8-10% as amostras foram centrifugadas e as células foram ressuspensas em 50 µl Loading Buffer (4X) juntamente com as frações proteicas solúveis e insolúveis do extrato. 3.3. Padronização de expressão da proteína LaTRF recombinante em sistema bacteriano A figura abaixo mostra um esquema resumido das etapas seguidas para a otimização da expressão e purificação da LaTRF recombinante. Fig. 8. Mapa do vetor pQE-2 (QIAGEN). As setas em vermelho indicam os sítios de clivagem utilizadas na subclonagem da sequência que codifica o gene LaTRF na mesma fase de leitura do vetor. Fig. 9. Padronização de expressão da proteína recombinante em sistema bacteriano. Guia para indução da expressão heteróloga de proteínas fornecida pelo prof. Dr. Julio cesar Borges (Lab BMB – IQSC). 27 A indução da expressão da proteína LaTRFr ficou definida com a utilização de cepa bacteriana BL21(DE3)pLysS e indução com 1 mM de IPTG a 30 ºC em um tempo de 3h. 3.4. Expressão da proteína LaTRF recombinante em larga escala e purificação por cromatografia de afinidade Após a padronização das condições ideiais de expressão, procedeu-se com a expressão da proteína recombinante LaTRF em larga escala. Esta foi realizada a partir da cepa bacteriana BL21DE3 pLysS transformada com o plasmídeo recombinante em culturas de 0,5 L e 1,0 L crescidas a 30ºC por 3h em meio LB contendo cloranfenicol (50 µg/ml) e ampicilina (100 µg/ml). Coletou-se uma alíquota de 1 ml antes da adição de 1 mM de IPTG (amostra não-induzida) que foi submetida à centrifugação a 10.000 rpm por 1 minuto. As células desta amostra não induzida foram ressuspensas em 50 l de Loading Buffer (4x) e analisadas em gel SDS-PAGE. Após a indução com 1mM de IPTG por 3h, a cultura contendo as bactérias tranformadas com o DNA de interesse (pQE-2 + LaTRF), foi submetida à centrifugação a 4.000 rpm por 15 minutos. O meio de cultura foi descartado e as células foram ressuspensas a 4 oC em 10 ml de tampão de lise (50 mM NaH2PO4 pH 8,0; 300 mM NaCl; 10 mM imidazol), seguido de 6 seções de sonicação por 15 segundos com intervalos de 1 min. cada. Em seguida, a amostra foi centrifugada a 4.000 rpm por 15 minutos separando-se a fração insolúvel da fração solúvel do extrato. A fração insolúvel foi descartada e a fração solúvel recebeu adição de 2l de -mercaptoetanol, inibidor de protease (1/1000) e foi equilibrado no tampão de início (start buffer; 50 mM NaH2PO4 pH 8,5; 300 mM NaCl; 20 mM imidazol) para subsequente purificação em coluna de afinidade contendo níquel. As purificações foram realizadas em aparelho de cromatografia FPLC (Fast Performance Liquid Chromatography) ÄKTAprime plus da Amersham Biosciences – GE Healthcare, utilizando-se a coluna HistrapTM HP Níquel de 5 mL (Amersham Biosciences - GE-Healthcare). Os eluatos da purificação foram coletados através de um gradiente de imidazol. Foi utilizado tampão de eluição (elution buffer, 50 mM NaH2PO4 pH 8,5; 300 mM NaCl; 300 mM imidazol) lembrando que o pH é invariável (pH=8.5), pois foi baseado no ponto isoelétrico (PI) da proteína recombinante LaTRF, obtido através de análise no programa ProtParam (http://ca.expasy.org/tools/protparam.html). Após a purificação, a proteína LaTRFr passou por diálise em tampão contendo 50 mM NaH2PO4 pH 8,5 e 100 mM NaCl para a retirada do imidazol. 28 3.5. Análise da estrutura secundária de LaTRFr por espectroscopia de dicroísmo circular (CD) Medidas foram feitas utilizando cubeta de quartzo de 0,5mm e os seguintes parâmetros: scanning speed 100 nm/min; band width 2nm; step resolution 0.5nm, temperature 20C. Cada espectro obtido correspondeu a média de 20 acumulações. Todos os espectros foram coletados no intervalo de 195-260nm. A amostra contendo LaTRFr foi analisada na presença de fluxo de N2 para que O2 presente no ar não interferisse na leitura dos dados dentro do equipamento. A concentração de proteína utilizada foi de 420 µg.ml- para todas as medidas. A proteína estava dissolvida no tampão: 50mM NaH2PO4 e 100 mM NaCl. Os espectros de CD foram analisados em termos de estrutura secundária utilizando o algoritmo CONTINNL (SREERAMA & WOODY, 2000) disponível no pacote de programas para deconvolução de curvas de CD, CDPro (Sreerama & Woody, 2000). A unidade utlizada para os espectros de CD foi a MRE (Mean Residue Ellipticity/ degrees cm2dmol-1residue-1). As coordenadas x e y de todos os espectros apresentados foram plotadas no programa Origin 8.0. Estas análises foram realizadas utilizando-se o equipamento: Jasco J-815 / Softwares: Spectra Manager™ II em colaboração com o grupo do Prof. Marcos Fontes, Laboratório de Biologia Molecular Estrutural – IB-UNESP Botucatu. 3.6. Obtenção dos extratos proteicos de núcleo de formas promastigotas de Leishmania amazonensis Extratos de núcleo de formas promastigotas foram obtidos na presença de inibidores de proteases, segundo protocolo proposto por FRAGAKI et al. (2003). 3.7. Análise da expressão da proteína LaTRF utilizando SDS-PAGE seguido de “Western Blot” revelado com novo soro imune anti-LaTRF Extratos proteicos da proteína recombinante LaTRF antes e após a purificação foram aplicados em géis de 10% (19% polyacrilamida:1% acrilamida) SDS-PAGE e transferidos para membranas de nitrocelulose (Bio-Rad) em 1 X tampão de transferência (48 mM Tris- Base, 39 mM glicina, 20% metanol, 0.0375% SDS) por 16 h a 4oC utilizando o aparato Trans- Blot Cell (SAMBROOK AND RUSSEL, 2001). A detecção das proteínas foi realizada utilizando-se os soros imunes produzidos em coelho anti-LaTRF (produzido a partir do peptídeo sintético N-CSSSPSRPLPRSSTP-C pela empresa GenOne). A revelação foi feita 29 utilizando-se o kit AmershamTM ECLTM Western Blotting Analysis System (GE healthcare). Vale dizer que para os ensaios de Western blot e de imunoprecipitação, testamos também o novo soro imune anti-LaTRF produzido pela Célula B (UFRGS). 3.8. Análise in silico por motivos conservados de interação proteína:proteína Estas análises foram realizadas no intuito de se verificar se algum dos possíveis interatores de LaTRF contém motivos de interação proteína:proteína conservados e/ou já descritos na literatura. Nestas análises usamos o programa Eukaryotic Linear Motif (elm.eu.org) que prediz a existência de motivos lineares curtos de interação proteína:proteína em eucariotos. Também utilizamos os programas ClustalW e Blastp para realizar pareamentos múltiplos entre as sequências das proteínas LaRbp38 de tripanosomatídeos e as TIN2 descritas em diferentes vertebrados. 3.9. Identificação in vitro das possíveis interações físicas entre LaTRF e outras proteínas teloméricas 3.9.1. Estudo das interações proteína:proteína por imunoprecipitação Para esse experimento utilizamos o kit SeizeR X Protein A Immunoprecipitation que oferece vantagens sobre os métodos clássicos de imunoprecipitação, porque permite a imobilização do anticorpo a Proteína A usando um agente que liga covalentemente o anticorpo a resina (cross-linker DSS). Isto resulta em um suporte contendo o anticorpo apropriadamente orientado o qual não é eluído juntamente com as proteínas imunoprecipitadas. Para estes ensaios foram usados extratos proteicos (nucleares) obtidos de formas promastigotas dos parasitas. As proteínas contidas nestes extratos foram imunoprecipitadas com o soro imune produzido em coelho (Célula B) contra a proteína LaTRF, a partir de um peptídeo sintético (GeneOne). As proteínas que co-eluirem com a proteína alvo foram fracionadas em gel SDS-PAGE e identificadas por Western blot utilizando-se soro imune específico. Dentre as proteínas esperadas para co-eluirem com LaTRF estão as já citadas LaRPA-1, LaRBP38. http://en.wikipedia.org/wiki/Eukaryotic_Linear_Motif_resource 30 3.9.2. Confirmação das interações proteína:proteína por captura usando ensaio pull- down Para este ensaio utilizamos a proteína recombinante LaTRF fusionada a uma cauda 6xHistidina como ligante a resina de níquel. Para os ensaios de pull-down utilizamos dois protocolos, descritos a seguir. 3.9.2.1. Ensaio pull-down com uso de extrato nuclear do parasita como fonte de proteínas interatoras Extratos proteicos nucleares obtidos de formas promastigotas de parasitas foram utilizados como fonte para possíveis proteínas parceiras de LaTRF. Para o experimento foram incubados previamente 100 µg de extrato de núcleo com 150 µg de proteína LaTRF recombinante por 12 horas a 4 ºC. Após a primeira incubação, o possível complexo formado por LaTRF foi incubado por 4 horas a 4 ºC com 100 µl de uma resina de níquel (NiNTA Superflow – Qiagen). Após lavagens em tampão para pull-down (50 mM Tris-HCL pH 8,0, 1% NP40 e 1% inibidor de protease), foi adicionado Loading buffer 5X a resina de níquel contendo o possível complexo formado por LaTRF e esta foi estocada a -20 ºC para análise por Western blot. 3.9.2.2. Ensaio pull-down para verificar interações diretas entre proteínas recombinantes Para confirmação das possíveis interações verificadas pelo método acima, seguimos com ensaios de pull-down com incubações diretas entre as proteínas recombinantes. Para o experimento, foram utilizados mutantes truncados de LaRbp38 recombinantes na tentativa de encontrar a possível região de LaRbp38 que interage com LaTRF (Fig. 10). Para isso as caudas 6xHistidina das proteínas recombinantes purificadas LaTRF, LaRbp38, LaRbp38mut4 (sem o motivo FKLAP) e LaRbp38mut6 (com o motivo FKLAP) foram clivadas utlilizando trombina (Sigma). Segue abaixo um diagrama contendo o mapa da estrutura primária da LaRbp38 e a posição dos mutantes truncados em relação a proteína inteira (PEREZ et al., submetido). 31 Para estes experimentos as proteínas recombinantes (100 µg de LaTRF, 50 µg de LaRbp38, 100 µg de LaRbp38mut 4 e 100 µg de LaRbp38mut6) foram tratadas com 200 µg de trombina (sigma) por 12 horas a 4 ºC para a retirada da cauda 6xHistidina. Como controle, amostras tratadas com trombina foram analisadas por SDS-PAGE. Após o tratamento, as proteínas foram testadas nos ensaios de captura, duas a duas, nas proporções (1:1 e 1:2), em relação a quantidade de proteínas em microgramas, seguindo-se com incubação das misturas por 12 horas a 4 ºC. Foram testadas as seguintes combinações: LaTRFrec – LaRbp38ΔHis tag , LaTRFrec – LaRbp38mut4ΔHis tag, LaTRFrec - LaRbp38mut6ΔHis tag, LaRbp38rec - LaTRFΔHis tag,LaRbp38mut4rec - LaTRFΔHis tag,LaRbp38mut6Δrec - LaTRFΔHis tag (*rec – proteínas contendo cauda 6xHistidina). Em seguida as amostras foram incubadas com 100 µl de resina de níquel (NiNTA Superflow – Qiagen) por 4 horas a 4 ºC. As resinas contendo os possíveis complexos foram lavadas 3X em tampão para pull-down (50 mM Tris-HCL pH 8,0, 1% NP40 e 1% inibidor de protease), ressuspensas em 50 µl de Loading buffer 2X e estocadas a -20 ºC para posterior análise da formação dos complexos em gel 8-12% SDS-PAGE. Fig. 10. Mapeamento da proteína LaRbp38 através da construção de mutantes truncados sobrepostos. Foram construídos seis mutantes truncados sobrepostos no intuito de mapear a proteína LaRbp38 inteira para a presença do motivo putativo TRFH docking identificado utilizando-se o programa ELM. Em vermelho, é representado o core do motivo putativo TRFH docking (FKLAP) o qual não é encontrado nos mutantes truncados Mut1 e Mut4). 32 3.9.3. Co-localização subcelular entre a proteína LaTRF e suas interatoras (LaRbp38 e LaRPA-1) por imunofluorescência Inicialmente procedemos com o ensaio de Imunofluorescência Indireta (IFI), na qual amostras contendo aproximadamente 1x 106 parasitas em fase mid-log de crescimento, foram centrifugadas, lavadas com PBS 1X e fixadas em formaldeído 1% durante 5 min. As amostras foram então novamente centrifugadas, lavadas com PBS 1X e permeabilizadas pela adição do detergente Triton X-100 0,1% diluído em PBS 1X durante 15 min a temperatura ambiente. Logo em seguida as amostras foram incubadas durante mais 5 min na presença de Glicina 0,1M diluída em PBS 1X (para retirada total de grupos aldeídos remanescentes). Em seguida as amostras foram novamente centrifugadas e incubadas por 12 h à 4°C com o soro anti- LaTRF diluído em PBS 1X + 4% BSA na proporção 1:1000. Logo após as amostras foram lavadas com PBS 1X e incubadas em ambiente escuro por 4 h à 4°C com o anticorpo secundário Alexa Fluor 555 diluído em PBS 1X + 4% BSA na proporção 1:4000. Após este período de incubação, as amostras foram lavadas novamente com PBS 1X e procedemos com o ensaio de imunofluorescência dupla. Em nosso laboratório, os soros que reconhecem as proteínas LaTRF, LaRPA-1 e LaRbp38 foram produzidos em coelhos. Deste modo, se realizássemos ensaios de imunofluorescência indireta dupla correríamos o risco de obter imagens falso positivas devido a reações cruzadas entre soros primários e secundários. Para solucionar este problema, enquanto novos soros estão sendo produzidos em camundongos, decidimos utilizar o kit Zenon (Invitrogen), o qual permite a realização de ensaios IF-duplos através de uma reação de imunofluorescência indireta normal (IFI), como descrito anteriormente e uma reação de imunofluorescência direta (IFD) utilizando o segundo anticorpo marcado no fragmento Fab com fluoróforo Alexa flúor 488, segundo protocolo descrito pelo fabricante. As amostras foram adicionadas delicadamente em lâminas pré-preparadas com poli-L- lisina. Após os parasitas terem aderido às lâminas, as mesmas foram lavadas novamente de maneira exaustiva com PBS 1X. Após secagem da lâmina a temperatura ambiente, foi adicionado 5 µL de Vectashield suplementado com DAPI (Vector). A lâmina foi então selada com lamínula de vidro e incubada por 24h à -20°C para posterior observação em microscópio de fluorescência (Nikon 80i). Devemos ressaltar que após a adição do anticorpo secundário, todas as etapas seguintes foram realizadas em local com baixa luminosidade. 33 4. Resultados e discussão 4.1. Análise da expressão da proteína recombinante LaTRF a partir do gene otimizado clonado no vetor de expressão pQE-2 Devido a inúmeros problemas que tivemos para obter a proteína LaTRF recombinante, expressa de forma solúvel e em quantidade suficiente para a utilização da mesma nos experimentos previstos no projeto, resolvemos solicitar a síntese do gene LaTRF (GenBank Acc. EF559263) para a empresa GenScript, de forma otimizada para que a mesma contivesse códons modificados para facilitar sua expressão em sistema bacteriano. Além disso, foi solicitada também a clonagem no vetor de expressão pQE-2 (QIAGEN) o qual permite que a proteína seja expressa fusionada a uma cauda de 6x Histidina (Fig. 11). Fig. 11. O gene LaTRF sintético foi clonado em vetor de expressão bacteriano pQE2. Gel de agarose que mostra digestão realizada na presença de enzimas de restrição específicas para os sítios NdeI e HindIII presentes no sítio de policlonagem do vetor pQE2. 1-vetor pQE2 + LaTRF. 2- gene LaTRF (2,5 kb) digerido do vetor pQE2 (4,8 kb) indicando sucesso na clonagem . M – DNA 1kB Ladder da Guangzhou Dongsheng BiotechCo.,Ltd (http://dongsheng123.en.busytrade.com/selling_leads/info/1648988/1kb- Dna-ladder.html).Imagem fornecida pela empresa GeneScript. 34 De posse da construção pQE-2 + LaTRF, esta foi transformada em cepas diferentes de E. coli, (BL21DE3 e BL21DE3 pLysS) e assim seguiu-se para a realização de testes de mini- indução na tentativa de encontrar melhor nível de padrão de expressão da proteína recombinante para dar seguimento com a purificação da mesma. Em princípio, a expressão foi verificada em análises de pequena escala através de induções a 37 ºC com 1mM de IPTG. Foram retiradas amostras não induzida e induzida nos tempos de 1h, 2h, 3h, 4h e 16h, seguido de fracionamento das proteínas em gel 10% SDS-PAGE (Fig. 12). Nessa situação, observou-se que a indução da expressão não foi visível em nenhum dos tempos analisados comparados com a amostra não induzida. Assim, foram feitos diversos testes combinando diferentes variáveis relacionadas a temperatura de indução, concentração de IPTG e cepa bacteriana seguindo instruções de um esquema de produção de proteínas recombinantes a partir de sistemas bacterianos, que nos foi gentilmente cedido pelo Prof. Dr. Júlio Cesar Borges do IQ-USP São Carlos (Fig. 9, Material e Métodos). Fig. 12. Análise da expressão de LaTRFr utilizando sistema bacteriano (1). As bactérias (BL21DE3) transformadas com o vetor de expressão contendo o gene sintético (pQE-2 + LaTRF) foram cultivadas a 37ºC e a expressão foi induzida por 1h, 2h, 3h, 4h e 16h com 1 mM de IPTG em 50ml de meio LB + amp/clo. Gel SDS-PAGE 10% contendo as frações proteicas de amostras não induzidas (N) e induzidas . M- marcador de peso molecular Page RulerTM Prestained Protein Ladder (Sinapse); S- frações proteicas solúveis (sobrenadante); I- frações proteicas insolúveis (pellet). 35 Com base na nova estratégia, o primeiro teste de indução foi realizado utilizando-se a cepa bacteriana (BL21DE3) transformada com o vetor de expressão contendo o gene sintético (pQE2 + LaTRF). A expressão foi induzida a 30ºC por 3h com concentrações variadas de IPTG (0,05 mM, 0,1mM, 0,2 mM e 0,5 mM) em 100ml de meio LB contendo os antibióticos específicos (Fig. 13). Frações proteicas de amostras não induzida e induzida assim como frações solúveis e insolúveis das amostras induzidas foram analisadas por SDS-PAGE. (Fig. 13 e 14) Nessa situação, foi posssível concluir que a indução da expressão da proteína recombinante foi visível principalmente em baixas concentrações de IPTG (0,05 M, 0,1 mM e 0,2mM) e na fração solúvel do extrato. Fig. 13. Análise da expressão de LaTRF utilizando sistema bacteriano (2). As bactérias (BL21DE3) transformadas com o vetor de expressão contendo o gene sintético (pQE2 + LaTRF) foram cultivadas a 30 °C e a expressão foi induzida por 3h com diferentes concentrações de IPTG em 100ml de meio LB + amp/clo. Gel SDS-PAGE 10% contendo as frações proteicas de amostras não induzidas (N) e induzidas (I). M- marcador de peso molecular Page RulerTM Prestained Protein Ladder (Sinapse). 36 Seguindo com os testes de indução, foi verificado a expressão da proteína recombinante desta vez em cepa bacteriana BL21DE3 pLysS com indução na presença de diferentes concentrações de IPTG (0,05 mM, 0,1 mM, 0,2 mM e 0,5 mM), porém não houve diferença significativa no padrão de expressão comparado com fração proteica da amostra não induzida (dados não mostrados). Desta forma testamos a indução da expressão da LaTRFr na presença de 1,0 mM de IPTG por 3h a 30ºC em uma cultura de 100 ml de meio LB. As frações proteicas das amostras não induzida e induzida, assim como as frações solúvel e insolúvel do extrato foram analisadas em gel 8% SDS-PAGE (Figs. 15 e 16). Fig. 14. Gel SDS-PAGE 8% contendo as frações insolúveis (I) e solúveis (S) do extrato proteico das bactérias (BL21DE3). Expressão foi induzida a 30ºC por 3h em diferentes concentrações de IPTG. M – marcador de peso molecular Page RulerTM Prestained Protein Ladder (Sinapse). / N – frações proteicas da amostra não induzida / E1 – extrato de E. coli (BL21DE3) / E2 - extrato de E. coli (BL21pLysS). 37 Fig. 15. Análise da expressão de LaTRF utilizando sistema bacteriano (3). As bactérias (BL21DE3 pLysS) transformadas com o vetor de expressão contendo o gene sintético (pQE2 + LaTRF) foram cultivadas a 30ºC e a expressão foi induzida por 3h na concentração de 1 mM de IPTG em 100ml de meio LB + amp/clo. Gel SDS-PAGE 8% contendo as frações proteicas das amostras não induzida (N) e induzida (I). M- marcador de peso molecular Page RulerTM Prestained Protein Ladder (Sinapse). Fig. 16. Gel SDS-PAGE 8% contendo as frações proteicas solúveis (S) e insolúveis (I) dos extratos das bactérias (BL21DE3 pLysS). Expressão foi induzida a 30ºC por 3h na presença de 1 mM de IPTG. M – marcador de peso molecular Page RulerTM Prestained Protein Ladder (Sinapse). / N – fração proteica da amostra não induzida / E1 – extrato de E. coli (BL21DE3) / E2 - extrato de E. coli (BL21pLysS). 38 Os resultados apresentados demonstram que a expressão da proteína foi mais eficiente em BL21DE3 pLysS, já que a proteína LaTRFr aparece na fração proteica solúvel dos extratos bacterianos o que serviu como base para as expressões em larga escala e tentativas de purificação apresentadas a seguir. 4.2. Expressão e purificação da proteína recombinante LaTRF utilizando cromatografia de afinidade (FPLC) A partir de então, foi estabelecido um padrão para indução da expressão (cepa BL21DE3 pLysS, 30ºC, 3h, 1 mM de IPTG) e as tentativas de purificação da proteína recombinante foram realizadas a partir da fração solúvel de extratos obtidos de 1 L de cultura bacteriana. As proteínas do extrato foram fracionadas em coluna de afinidade ao níquel, usando tampão de eluição contendo imidazol como mostrado na Fig. 17. Fig. 17 A. Purificação da proteína LaTRF recombinante na forma solúvel. Gel SDS- PAGE 8% corado com Coomassie Blue. A proteína purificada foi obtida a partir de extratos solúveis de BL21DE3 pLysS transformada com o plasmídeo pQE2-LaTRF. A indução da expressão ocorreu a 30ºC por 3h na presença de 1 mM de IPTG em cultura de 1L de meio LB + amp/clo. M- marcador de peso molecular Page RulerTM Prestained Protein Ladder (Sinapse); F- Flow through; L- Lavagem em tampão de início (start buffer); 1 - 10- amostragem dos eluatos da purificação contendo a proteína LaTRFr. 39 A análise mostrou que foi obtido êxito na purificação da proteína LaTRFr já que foi possível visualização da banda (~84KDa) correspondente a proteína LaTRFr em gel SDS- PAGE 8%. Foi possível verificar que a proteína é eluída com concentrações crescentes de imidazol (0-300 mM) e aparece em 25 frações da coluna como mostrado na Fig. 17 A (linhas 4 – 8). Após o fracionamento, os eluatos da coluna contendo a proteína LaTRFr foram juntados e dialisados contra tampão de diálise (50 mM NaH2PO4; 100 mM NaCl; pH 8,5) para retirada do imidazol. A fração proteica resultante desta diálise foi novamente fracionada em gel SDS-PAGE 8% como mostrado na Fig. 17B. Vale dizer que a partir de 1L de cultura, conseguimos obter por volta de 2,0 mg de proteína total, solúvel e com bom nível de purificação após fracionamento em coluna de níquel seguido de diálise que removeu contaminantes de baixo peso molecular. Por fim, foi realizado ensaio de Western blot revelado com soro anti-LaTRF que comprova que a proteína recombinante reage especificamente com o soro assim como a proteína nativa presente em extrato proteico obtido de núcleo de formas promastigotas de L. amazonensis (Fig. 17 C). Nota-se que na amostra da proteína recombinante aparecem duas bandas com peso molecular aproximado de 82.5-84 kDa, sendo que a proteína recombinante deve migrar mais lentamente no gel (~84 kDa) por conter a cauda 6xHistidina. Porém não Fig. 17 B. Expressão e purificação da proteína recombinante LaTRF. Gel SDS- PAGE 8% corado com Coomassie Blue mostrando as frações proteicas de amostras não induzida (N) e induzida (I). M- marcador de peso molecular Page RulerTM Prestained Protein Ladder (Sinapse); P- proteína LaTRFr purificada. Foram aplicados 20 ul da LaTRFr que correspondem a 1,6 ug de proteína purificada. 40 sabemos ainda se a banda de 82.5 kDa que aparece co-migrando com esta, corresponde a um produto de clivagem ou degradação da proteína recombinante. Além disso, foi realizada análise por espectrometria de massa de amostra contendo a proteína LaTRF recombinante, porém os dados obtidos não permitiram a identificação da proteína após a digestão in gel da banda utilizando tripsina. Em todas as análises, corremos uma amostra controle (proveniente de uma banda de albumina digerida in gel com trypsina) para confirmar que o sistema (massas, hplc, colunas) estava em condições ótimas. Como hipóteses podemos inferir que, ou os peptídeos que foram gerados não foram bem ionizados, ou por o fato de a proteína possuir muitos resíduos de arginina (89 resíduos, dados não mostrados), fez com que a tripsina digerisse em vários sítios, resultando em peptídeos muito pequenos que impossibilitaram a detecção da proteína de origem. As análises de espectrometria de massa foram realizadas em colaboração com a Dra. Julia Cunha, Laboratório Especial de Ciclo Celular, Instituto Butantam, SP. 4.3. Análise de espectroscopia de dicroísmo circular (CD) Com o êxito na expressão e purificação da proteína LaTRFr usando o protocolo que padronizamos, o próximo passo foi o de aumentar a concentração da proteína nestes extratos e analisar se a mesma estava sendo expressa de forma enovelada usando análise da estrutura secundária por espectroscopia de dicroísmo circular. Fig. 17 C. Obtenção da proteína LaTRF recombinante. Western blot revelado com soro anti-LaTRF. E- Extrato de núcleo de L. amazonensis; P- proteína LaTRF recombinante. 41 A seguir, o espectro de CD da proteína LaTRF mostra que ela apresenta características de uma proteína rica em alfa hélices, com mínimas de 208 e 222nm que são características de proteínas com este tipo de estrutura secundária (Fig. 18). Para confirmação do resultado acima, foi realizado análise in silico para a predição de estruturas secundárias a partir da sequência de aminoácidos da proteína LaTRF utilizando o programa GOR4 Secundary Structure Prediction (Fig. 19). Fig. 18. Espectro de CD da proteína LaTRF. A predição da quantidade dos elementos de estrutura secundária a partir dos espectros obtidos mostrou que esta proteína apresenta 4,9% de folhas beta, 41,2% de alfa hélices, 21,0% de loops e 32,6% de elementos desordenados. Laboratório de Biologia Molecular Estrutural – IB – Unesp Botucatu 42 Os dados encontrados por dicroísmo circular revelaram que a proteína LaTRF estava sendo expressa de forma enovelada (Fig. 18) e quando comparados com uma análise in silico Fig. 19. Análise in silico da sequência de aminoácidos da proteína LaTRF para predição de estruturas secundárias. Estão demarcadas as regiões na proteína LaTRF caracterizadas por apresentar estruturas secundárias. Em azul, as alfa hélices no total de 37,69% e em vermelho as folhas-beta no total de 9,80% (GOR4 Secundary Structure Prediction). 43 de predição de estruturas secundárias (Fig. 19), confirmou-se que esta proteína é rica em alfa hélices. Assim, foi atingido um importante passo do projeto, no qual a obtenção da proteína recombinante foi uma ferramenta útil em ensaios de interação proteína:proteína. 4.4. Análise da sequência de aminoácidos da proteína LaTRF para a presença de sítios de modificações pós-traducionais De acordo com resultados observados na figura 17 B, nota-se uma baixa eficiência na expressão e consequentemente na purificação da proteína recombinante LaTRF. Assim, resolvemos realizar uma análise mais detalhada sobre possíveis modificações pós-traducionais na sequência de aminoácidos de LaTRF que possam ter influenciado na obtenção da proteína recombinante em sistema bacteriano (Fig. 20). Modificações pós-traducionais são modificação químicas em uma cadeia proteica após sua tradução. Estas são importantes para a caracterização da funcionalidade da proteína. Estendem o conjunto de possíveis funções proteicas pela adição de novos grupos funcionais (pro ex: grupos heme, acetato ou sulfato) ou de cadeias de carboidratos e/ou lipídios. Essas alterações químicas podem alterar a hidrofobicidade de uma proteína e assim determinar a localização celular desta (por exemplo, proteínas hidrofóbicas tendem a se ancorar em membranas fosfolipídicas). Outras modificações, como a fosforilação, são parte de um sistema para controlar o comportamento proteico (por exemplo, ativando ou inativando uma enzima) amplamente utilizado pela célula. http://pt.wikipedia.org/wiki/Prote%C3%ADna http://pt.wikipedia.org/wiki/Tradu%C3%A7%C3%A3o_(gen%C3%A9tica) http://pt.wikipedia.org/wiki/Heme http://pt.wikipedia.org/wiki/Acetato http://pt.wikipedia.org/wiki/Sulfato http://pt.wikipedia.org/wiki/Carboidratos http://pt.wikipedia.org/wiki/Lip%C3%ADdios http://pt.wikipedia.org/wiki/Fosforila%C3%A7%C3%A3o 44 De acordo com a análise in silico utilizando-se o programa Expasy:SIB Bioinformatics Resource Portal/MotifScan, foram identificados diversos sítios de modificações pós- traducionais na proteína LaTRF (figura 20). Dentre eles podemos identificar um sítio para Glicosilação (adição de sacarídeos a cadeias proteicas) e diversos sítios para Fosforilação (adição de um grupo fosfato (PO4)) e Miristoilação (ligação covalente de um ácido graxo saturado de 14 carbonos (miristato),a resíduos de aminoácidos, principalmente glicinas). Como o processo de expressão de proteínas heterólogas em E. coli, se caracteriza por possuir uma capacidade limitada para modificações pós-traducionais (por ex: adição de pontes disulfeto), consequentemente a atividade biológica e imunogenicidade da proteína recombinante expressa neste sistema podem diferir da proteína natural, o que a nosso ver pode ter interferido fortemente na expressão e na estabilidade da proteína recombinante LaTRF (Fig. 17 B). Apesar disso, a proteína recombinante LaTRF foi útil em ensaios in vitro de interação proteína:proteína. 4.5. Caracterização das interações entre a proteína LaTRF e suas possíveis parceiras Resultados preliminares em nosso laboratório, sugerem que as proteínas teloméricas LaRPA-1 e LaRbp38 possam fazer parte de um mesmo complexo proteico onde a LaTRF está presente (Fig. 7, Introdução). Encontramos fortes indícios de que possa haver uma interação física entre LaTRF e a proteína LaRbp38. LaRbp38 é uma proteína exclusivamente expressa em parasitas tripanossomatídeos, incluindo L. amazonensis. É caracterizada por interagir in vivo com GT- rich DNAs (kDNA e telomeros) e está envolvida com a replicação do DNA no núcleo e no cinetoplasto (FERNÁNDEZ et al., 2004; LIRA et al.,2007; PEREZ et al., submetido). 4.5.1. LaRbp38 possui um motivo putativo de ligação as TRFs, o TRFH docking motif LaRbp38 contém um domínio não conservado de ligação a DNA e por análise in silico usando o programa ELM (elm.eu. org) encontramos um motivo putativo, curto e conservado Fig. 20. Sítios de modificações pós-traducionais da proteína LaTRF. Estão demarcadas as regiões onde ocorrem modificações pós-traducionais em relação a sequência de aminoácidos da proteína LaTRF. Em verde os sítios de Miristoilação, em cinza de Fosforilação e em vermelho os de Glicosilação. Expasy:SIB/MotifScan (http://myhits.isb-sib.ch/cgi-bin/motif_scan). 45 de interação com as proteínas TRF. Este motivo é denominado de TRFH docking motif e comum às proteínas teloméricas associadas ao complexo shelterin via TRF1 e TRF2 (CAMPISI et al., 2004). As proteínas TRFs contém no seu domínio de homodimerização (TRFH) uma região denominada TRFH surface groove, o qual reconhece motivos do tipo TRFH docking cujas sequências conhecidas são do tipo [FY]xLxP (Tabela 2). Por exemplo, proteínas que interagem com a TRF1 usam um motivo TRFH docking do tipo FxLxP e as que interagem com TRF2 usam um motivo TRFH docking do tipo YxLxP. Uma das proteínas que reconhecidamente possui em sua sequência de aminoácidos esse pequeno motivo conservado é a TIN2 a qual foi caracterizada por interagir simultaneamente com hTRF1 e hTRF2 (CAMPISI et al., 2004). Além disso, assim como Rbp38, TIN2 possui localização tanto nuclear quanto mitocondrial, sugerindo que ela pode cumprir funções em ambas as organelas (SONGYANG et al., 2012). Segundo a análise no ELM, na LaRbp38 o motivo putativo TRFH docking possui a sequência FKLAP (Fig. 21), similar ao motivo TRFH docking da TIN2 (FNLAP). Assim, especulamos se a LaRbp38 pode ter função análoga a TIN2 e participar de processos de metabolismo de DNA além de formar um complexo com a TRF nos telômeros dos parasitas. Tabela 2. Sequência dos motivos TRFH docking nas porteínas interatoras das TRFs. 46 Em colaboração com o bioinformata Dr. Elton Vasconcelos (Seatle Biosciences Institute), foram realizados diversos alinhamentos entre as sequências preditas das proteínas Rbp38 dos tri-tryps, que mostram que o core do motivo putativo TRFH docking (FKLAP) só é conservado nos três primeiros resíduos de aminoácidos de todos os ortólogos de Rbp38 (Fig. 22). Por outro lado, o pareamento global entre sequências TIN2 de vertebrados (Fig. 23) mostra que o core deste motivo é idêntico entre as TIN2 de mamíferos, cuja sequência é FNLAP, porém é mais divergente na TIN2 de Xenopus laevis (PKQTL), embora em todos estes organismos as proteínas sejam funcionalmente ativas (SIMONSSON, 2009). Fig. 22. O core do motivo TRFH docking (FKLAP) presente em LaRbp38 é conservado entre os ortologos em outros tripanosomatídeos. O pareamento global entre as sequências de aminoácidos usando o programa ClustalW, revelou conservação do motivo putativo TRFH docking motif entre os diferentes tripanossomatídeos Porém em L. brasiliensis e nos tripanossomas somente os três primeiros primeiros resíduos de aminoácidos (sinalizado em vermelho) são identicos. (*) sinaliza resíduos de aminoácidos idênticos, (.) aminoácidos quimicamente similares. Fig. 21. Localização do motivo putativo TRFH docking (FKLAP) na sequência de aminoácidos da proteína LaRbp38. O core do motivo TRFH docking (FKLAP) da proteína LaRbp38 foi identificado entre os resíduos de aminoácidos 218-222. 47 Quando realizamos um pareamento múltiplo entre as Rbp38 de Leishmania spp. e a TIN2 de humanos verificamos que não ocorre pareamento entre a região demarcada pela localização dos motivos TRFH docking dessas proteínas( Fig. 24). Fig. 23. O TRFH docking motif das proteínas TIN2 é conservado em mamíferos e menos conservado em Xenopus laevis. O pareamento realizado através do programa ClustalW entre sequências de aminoácidos das TIN2 dos mamíferos, revelou conservação do TRFH docking motif representado pelos resíduos de aminoácidos FNLAP (em destaque), enquanto que em Xenopus laevis, o TRFH docking motif (PKQTL) é menos conservado. (*) sinaliza resíduos de aminoácidos idênticos, (:) aminoácidos quimicamente similares, (.) aminoácidos quimicamente pouco similares. 48 De qualquer maneira, levamos adiante os experimentos in vitro na tentativa de confirmar as interações previamente observadas entre LaRbp38 e a LaTRF (Fig. 7, Introdução). Fig. 24. Não há pareamento entre os motivos putativos TRFH docking presentes em Leishmanias spp. e o TRFH docking motif da TIN2 humana. O pareamento por ClustalW entre sequências de aminoácidos da Rpb38 de e Leishmania spp. (FKLAP) e a TIN2 humana (FNLAP), revelou que não ocorre alinhamento de sequências de aminoácidos na região do TRFH docking. (*) sinaliza resíduos de aminoácidos idênticos, (.) aminoácidos quimicamente pouco similares. 49 4.6. Identificação de proteínas parceiras de LaTRF Na busca de possíveis proteínas parceiras de LaTRF foram realizados ensaios de imunoprecipitação utilizando-se soro imune específico anti-LaTRF, assim como confirmação das interações através de ensaios de pull-down utilizando a proteína LaTRF recombinante como isca. Os resultados apresentados a seguir, embora preliminares, são bastante sugestivos da veracidade desta interação. 4.6.1. Estudo das interações entre LaTRF e suas parceiras por imunoprecipitação A imunoprecipitação é um procedimento comum para se estudar as interações entre uma ou mais proteínas utilizando-se um anticorpo que imunoprecipite a proteína utilizada como isca (bait) e por sua vez co-imunoprecipite qualquer proteína que interaja especificamente com ela (prey: presa). Para ensaios de imunoprecipitação foram obtidos extratos proteicos de frações nucleares de L.amazonensis, de forma a se testar se entre as proteínas imunopreciptadas pela LaTRF encontram-se outras proteínas teloméricas tais como: LaRPA-1 e LaRbp38. Assim, o conteúdo proteico de extratos nucleares obtidos de formas pormastigotas de L amazonensis foi imunoprecipitado na presença de soro policlonal de coelho anti-LaTRF obtido de peptideo sintético (Célula B). Os eluatos da imunoprecipitação foram testados por Western blot utilizando-se soro anti-LaTRF, e os soros anti-LaRPA-1 e anti-LaRbp38 (Fig. 25). Soro anti alfa-tubulina foi utilizado como controle no ensaio. 50 Os resultados mostraram que o soro anti-LaTRF foi capaz de co-imunoprecipitar LaTRF com as proteínas LaRPA-1 e LaRbp38 e não co-imunoprecipita alfa-tubulina, sugerindo que LaTRF, LaRPA-1 e LaRbp38 fazem parte de um mesmo complexo nos telômeros do parasita. Para confirmar estas interações, foram realizados ensaios de pull-down seguido de Western blot. 4.6.2. Ensaio de captura por pull-down usando LaTRFr como isca O método pull-down é muito utilizado para determinar a interação física entre duas ou mais proteínas. Também são muito úteis para se confirmar interações preditas entre proteínas e que foram previamente observadas por outras técnicas, como as de imunoprecipitação ou co-imunoprecipitação. O requisito mínimo para este ensaio é a disponibilidade de uma proteína purificada (marcada com um tag ou não), que servirá como isca para capturar sua(s) proteína(s) parceiras (interatores). Como forma de comprovar ou comparar os resultados obtidos por imunoprecipitação, estamos padronizando o ensaio de captura do tipo pull-down acoplando-se a resina de níquel a proteína recombinante LaTRFr contendo um tag de 6x Histidina, obtida conforme mostrado no item 5.2 de Resultados e Discussão. Este ensaio foi realizado com extrato nuclear de formas promastigotas de L. amazonensis usado como fonte de possíveis proteínas parceiras de LaTRF e também com incubações diretas entre a proteínas recombinantes LaTRF e LaRbp38. Os complexos proteicos presos a resina foram fracionados em gel SDS-PAGE 10%, transferidos para membrana de nitrocelulose e revelados por Western blot com os soros anti-LaTRF, anti-LaRbp38 e anti-LaRPA-1. Fig. 25. LaTRF, LaRPA1 e LaRbp38 co-imunoprecipitam em extrato de núcleo de formas promastigotas de L. amazonensis. A) Proteínas nucleares de formas promastigotas de L. amazonensis foram imunoprecipitadas com soro imune anti-LaTRF obtido de peptídeo sintético acoplado a proteína A sepharose. Os eluatos da imunoprecipitação foram submetidos à análise por Western blot (WB) revelado com os soros imunes: anti-LaTRF, anti-LaRPA-1, anti-LaRbp38 e anti-alfa tubulina (controle). B) Proteínas nucleares de formas promastigotas de L. amazonensis foram imunoprecipitadas com soro imune anti-LaRbp38 e os eluatos da imunoprecipitação foram analisados por Western blot e revelados com soros imunes anti-LaTRF e anti-tubulina (controle). Ig - imunoglobulina. 51 4.6.2.1. Ensaio pull-down com uso de extrato nuclear do parasita como fonte de proteínas interatoras Com objetivo de comprovar os possíveis complexos capturados na imunoprecipitação, seguimos com ensaio de pull-down para detecção de interações físicas entre LaTRF e as proteínas teloméricas LaRbp38 e LaRPA-1. Para evitar a possível formação de homodímeros ou oligômeros pela LaTRFr ou qualquer outra modificação conformacional que poderia esconder o sítio de ligação a algumas proteínas parceiras, impossibilitando assim as interações físicas entre as proteínas, decidimos incubar a proteína LaTRF recombinante com o extrato proteico antes da ligação do complexo a resina de níquel (BIANCHI et al.,1997; COOPER et al., 1997; YU et al., 2000, LI et al., 2000). Porém para análise das interações entre LaRbp38 e seus mutantes truncados 4 e 6, utilizamos o protocolo descrito por WEB et al. (1997), o qual prevê a incubação das proteínas recombinantes portando um tag 6xHistidina com a resina de níquel. Para ambos os protocolos, as interações foram reveladas fracionando-se os complexos em gel SDS-PAGE 8% e 12% seguido de Western blot usando soros específicos para as proteínas em estudo (Fig. 26). 52 Fig. 26. LaTRF e LaRbp38 interagem fisicamente. Proteínas recombinantes contendo uma cauda 6XHis tag foram incubadas com extrato proteico nuclear de L. amazonensis e depois ligadas a uma resina de níquel na tentiva de captura de proteínas interatoras. A) Western blot revelado com soro anti-LaRbp38 na busca da forma nativa da proteína estar interagindo com LaTRFr ligada ao níquel. B) Western blot revelado com soro anti- LaTRF na busca da forma nativa da proteína estar interagindo com LaRbp38r ligada ao níquel. C) e D) Western blot revelado com soro anti-LaTRF na busca da forma nativa da proteína estar interagindo com LaRbp38mut4r (C) e LaRbp38mut6r (D) ligadas ao níquel. E) e F) Western blot revelado com soro anti-LaRPA-1 na busca da forma nativa da proteína estar interagindo com LaTRFr (E) e LaRbp38r (F) ligadas ao níquel. 53 Quando e proteína LaTRFr é ligada a resina, podemos verificar uma interação física com LaRbp38 (Fig. 26 A) mas não com LaRPA-1 (Fig. 26 E) a partir de extrato nuclear do parasita. Quando LaRbp38r é ligada a resina, podemos verificar tanto interação com LaTRF (Fig. 26 B) quanto com LaRPA-1 (Fig. 26 F). Isto pode sugerir que a interação de LaTRF com LaRPA-1 aconteça através de sua interação com a LaRbp38 que neste caso pode atuar como ponte nas interações entre as duas proteínas. Curiosamente, quando fomos iniciar o mapeamento do sítio de interação a LaTRF na proteína LaRbp38 usando dois mutantes truncados, o LaRbp38rmut4r (não contém o motivo FKLAP) e o LaRbp38mut6r (contém o motivo FKLAP), detectou-se interação somente entre LaTRF nativa (presente nos extratos nucleares do parasita) e o LaRbp38rmut4r (porção da LaRbp38 que não contém o motivo FKLAP) (Fig. 26 C e D), sugerindo que a interação entre as duas proteínas se dá via um outro motivo que não o FKLAP identificado in silico pelo programa EML. Por isso resolvemos tentar entender este resultado. 4.6.2.2. A proteína LaRbp38 utiliza um motivo diferente de FKLAP para a interação com a proteína LaTRF Com objetivo de confirmar as interações observadas anteriormente, o passo seguinte foi realizar ensaios de pull down entre as proteínas recombinantes LaTRFr, e LaRbp38 e os mutantes truncados de LaRBP38, todos expressos com cauda 6xHistidina (detalhes sobre os mutantes de LaRbp38 estão na Fig. 10 em Material e Métodos). Para isso os ensaios foram realizados com uma das proteínas tratadas com trombina para a retirada das caudas de 6X Histidina (Fig. 27). Depois de analisar os produtos da digestão com trombina por SDS-PAGE, foi possível constatar que a cauda de 6X Histidina das proteínas recombinantes foi clivada ou parcialmente clivada, pela diferença na migração das proteínas. Nestes géis também evidenciamos bandas de possíveis clivagens inespecíficas realizadas pela trombina, o que pode ter ocorrido devido a padrões de concentração e tempo de incubação inadequados e por isso, esses parâmetros estão sendo repadronizados. 54 Com isso, decidimos seguir com os ensaios de interação direta entre LaTRF e LaRbp38 e/ou seus mutantes truncados. Neste ensaio, proteínas recombinantes fusionadas a uma cauda 6X Histidina são incubadas diretamente com outras proteínas recombinantes sem a cauda. Esta mistura é incubada em seguida com a resina de níquel, seguido de várias lavagens. Caso seja formado um complexo, ambas as proteínas serão detectadas em gel SDS- PAGE. Para o experimento, foram incubadas as proteínas LaTRFr diretamente com a proteína LaRbp38 e seus mutantes truncados mut4 e mut6 sem a cauda 6X Histidina. Foram verificadas também as interações quando são incubadas LaRbp38 e seus mutantes com a proteína LaTRF sem a cauda. Essas possíveis interações e os controles foram analisados por SDS-PAGE (Fig. 28). Fig. 27. Digestão com trombina para a retirada da cauda 6X Histidina das proteínas recombinantes LaTRF, LaRbp38, LaRbp38mut4 e LaRbp38mut6. Gel 10-15% SDS- PAGE que mostra tratamento das proteínas LaRbp38 (2), LaTRF (4), LaRbp38mut4 (6) e LaRbp38mut6 (8) com trombina. 1) LaRbp38 recombinante, 3) LaTRF recombinante, 5) LaRbp38mut4 recombinante e 7) LaRbp38mut6 recombinante. M - marcador de peso molecular Page RulerTM Prestained Protein Ladder (Sinapse). 55 Fig. 28. LaRbp38 interage com LaTRF via mutante truncado de LaRbp38 que não possui motivo FKLAP (LaRbp38mut4). Gel SDS 10-12%, que mostra interações diretas entre as proteínas recombinantes LaTRF, LaRbp38 e o mutante truncados de LaRbp38 mut4. A1) LaRbp38 recombinante. A2 e A3) LaRbp38 foi ligada ao níquel e incubada com 50 µg (2) e 100 µg (3) de LaTRF tratada com trombina. A4) LaTRF recombinante. A5 e A6) LaTRF foi ligada ao níquel e incubada com 50 µg (5) e 100 µg (6) de LaRbp38 tratada com trombina. B1) LaTRF recombinante. B2 e B3) LaTRF foi ligada ao níquel e incubada com 100 µg de mut4 (2) e mut6 (3) tratados com trombina. B4) mut4 recombinante. B5) mut4 ligado ao níquel e incubado com 100 µg de LaTRF tratada com trombina. B6) mut6 recombinante. B7) mut6 ligado ao níquel e incubado com 100 µg de LaTRF tratada com trombina. M- marcador de peso molecular Page RulerTM Prestained Protein Ladder (Sinapse). 56 Em relação à incubação direta realizada entre LaTRF e LaRbp38, podemos realmente concluir que esta interação aconteceu e que se dá de forma mútua entre as duas proteínas recombinantes, onde uma ora é presa e a outra é o ligante e vice-versa (Fig. 28 A). Quando repetimos estes mesmos ensaios entre as proteínas LaTRF e os mutantes de LaRbp38 (mut 4 e mut6) pudemos observar interação física somente entre a LaTRF e a LaRbp38mut4 (Fig. 28 B), que é aquele que não contém o motivo FKLAP, o que sugere mais uma vez que a interação entre LaTRF e LaRbp38 se dá via a um novo motivo ainda não descrito ou a um motivo TRFH docking-like motif menos conservado. Esses resultados estão de acordo com os ensaios de pull-down utilizando extrato proteico nuclear do parasita (Fig. 26 C-D). Porém é importante dizer que o LaRbp38mut6 contém uma região que se sobrepõe ao LaRbp38mut4, sugerindo que a interação entre LaRbp38mut4 e a LaTRF se dá em região da LaRbp38 que é exclusiva de LaRbp38mut4. Com isso, resolvemos analisar mais profundamente os alinhamentos múltiplos entre as proteínas em estudo. Primeiramente foram feitos pareamentos globais usando o programa ClustalW utilizando a região correspondente ao LaRbp38mut4 entre as Rbp38 de diferentes Leishmania e a TIN2 de X. laevis . Lembramos aqui que não foi possível o pareamento entre TRFH docking motifs presentes em Leishmanias spp. (FKLAP) e o TRFH docking motif da TIN2 humana (FNLAP) (Fig. 24). O resultado mostrou que o TRFH docking motif presente em Xenopus laevis (PKQTL) pareia com uma sequência de aminoácidos bastante conservada entre as Rbp38 de Leishmania spp. (ALKTL) (Fig. 29 A). Este mesmo motivo presente nas Rbp38 de Leishmania spp. (ALKTL) também pareia com bom grau de conservação com o TRFH docking motif da TIN2 humana (FNLAP) como mostrado na figura 29 B. Porém, a região acima mapeada encontra-se presente no extremo C-terminal do LaRbp38mut6 e a ausência de interação entre este mutante truncado e a LaTRF nos leva a especular que para que esta interação ocorra a contento seriam necessários resíduos de aminoácidos que estão presentes na região central ou mais C-terminal da LaRbp38, os quais são encontrados somente no LaRbp38mut4 (ver detalhes sobre a estrutura destes mutantes em Fig. 10 de Material e Métodos). 57 Quando pareamos as Rbp38 de Leishmania spp. com os ortólogos de Rbp38 de outros tripanosomatídeos verificamos alto grau de conservação deste motivo o qual é compartilhado entre todas as Rbp38, sugerindo que esta sequência possa ser um TRFH docking-like motif das Rbp38 dos tri-tryps (Fig. 30). Fig. 29. LaRbp38mut4 possui uma sequência conservada do tipo ALKTL que pode estar envolvida na interação com LaTRF. Pareamento utilizando ClustalW entre as sequências de aminoácidos conservadas do tipo ALKTL e A) sequências de aminoácidos do TRFH docking motif presentes em Xenopus laevis (PKQTL) e B) sequências de aminoácidos do TRFH docking motif da TIN2 humana (FNLAP). 58 Com isso, podemos concluir que apesar de preliminares, nossos resultados sugerem fortemente que ocorre uma interação mútua entre as proteínas LaTRF e LaRbp38 e que esta interação se dá via um motivo TRFH docking-like motif presente na região C-terminal da LaRbp38 (correspondente ao Mut4), provavelmente específico de tripanosomatídeos. E que este motivo é diferente do que foi previamente mapeado in silico (FKLAP) usando o programa EML. Também que é possível que a região de interação se estenda mais para o C- terminal da LaRbp38 onde está localizado o LaRbp38mut4, pois o motivo TRFH docking-like motif aqui descrito encontra-se em partes no extremo C-terminal do LaRbp38mut6, o qual não faz interação com a LaTRF devido a possível perda de aminoácidos essenciais que estende além do core do motivo (Fig. 31). Assim, para uma confirmação destes dados, serão necessário ensaios utilizando outros mutantes truncados da proteína LaRbp38 e a indução de mutagênese sítio-dirigida para se verificar quais são os resíduos de aminoácidos implicados nesta interação. Fig. 30. A sequência de aminoácidos a ALKTL é conservada e está presente em todos os ortólogos de Rbp38 descritos nos tripanosomatídeos. Pareamento utilizando ClustalW entre as sequencias que contém o possível motivo ALKTL em diversos tripanosomatídeos. 59 4.6.3. LaTRF co-localiza com as proteínas LaRbp38 e LaRPA-1 no núcleo de formas promastigotas de Leishmania amazonensis Nesse ensaio podemos observar que existe uma co-localização em foci de LaTRF com LaRbp38 e LaRPA-1 nas principais fases do ciclo celular do parasita. Observa-se também que na imunolocalização de LaTRF (vermelho), esta aparece em grande quantidade na região periflagelar do parasita, sugerindo que a proteína possa estar sendo degradada ou então um problema técnico gerado devido longo tempo de permeabilização dos parasitas para a realização do ensaio. A figura 32 A, dividida em 3 painéis (DAPI, LaTRF e Merged) com amostras de formas promastigotas de parasitas em fase mid-log de crescimento ao longo das principais fases do ciclo celular G1/S, G2 e M, apresenta reação de IFI com soro anti-LaTRF e a imunolocalização de LaTRF (vermelho). A figura 32 B, dividida em 3 painéis (DAPI, Zenon alexa 455 e Merged) com amostras de formas promastigotas de parasitas, apresenta um ensaio controle para demonstrar a especificidade do kit utilizado, onde apenas o anticorpo secundário não é suficiente para marcar quaisquer parasitas. Fig. 31. Ilustração da proteína LaRbp38 inteira e dos mutantes truncados sobrepostos em relação ao motivo ALKTL. Em vermelho, é representado o core do motivo putativo TRFH docking (FKLAP). Em azul, é representado o novo motivo (ALKTL) presente no mut4 e nos extremos C-terminais do mut3 e mt6. 60 As figuras 32 C e D apresentam 5 painéis (DAPI, LaTRF, LaRbp38 (Fig. 32 C) ou LaRPA-1 (Fig. 32 D), Merged-A e Merged-B) com amostras representativas de formas promastigotas de parasitas em fase mid-log de crescimento, ao longo das principais fases do ciclo celular G1/S, G2 e M. Vale ressaltar que as fases do ciclo celular foram previamente determinadas com base na morfologia das organelas (núcleo - N e kinetoplasto - K), como descrito em artigo submetido por da Silva et al. (2013). 61 62 Esse resultado, junto aos ensaios de IP e pull down apresentados anteriormente, sugerem fortemente que LaTRF forma um complexo proteico, no qual está presente LaRbp38 e LaRPA-1. Como já mencionado, isso pode ser resultado da ação conjunta dessas proteínas na proteção dos telômeros. Aqui vale lembrar que poucas proteínas teloméricas foram descritas até o momento em L. amazonensis além de LaRbp38, LaTRF e da própria LaRPA-1, que parece ser uma das únicas que apresenta similaridade funcional e estrutural às proteínas do complexo CST de vertebrados e fungos (Price et al., 2010). Entre as proteínas que i