De vigiados a vigilantes: o cotidiano dos policiais na Força Pública Paulista (1896-1901)

Abstract

A presente proposta busca contribuir para o profícuo campo da historiografia sobre a polícia e os policiais no Brasil, mais especificamente da polícia paulista, objeto de nosso recorte. Resgatamos as histórias dos soldados que assentaram praça na Força Pública Paulista nas décadas imediatamente após a Abolição e a Proclamação, a partir da leitura de processos internos, que se situam no período entre 1897 e 1901, lotados no Arquivo Público do Estado de São Paulo. Devido a natureza interna desses juízos foi possível traçar alguns objetivos que se impunham ao policiamento desejado pelos oficiais, bem como dificuldades históricas que assolavam a polícia paulista desde o Império. Não obstante, também lançamos luz a organização que se pretendia imbuir aos soldados, com uma descrição minuciosa das atribuições internas e externas, das circunstâncias do assentamento, das proibições à conduta dos soldados, entre outros aspectos, o que só foi possível devido a leitura do Regulamento da Força Pública, de 1896, o qual também se encontra no Arquivo do Estado. Essas análises permitiram resgatar como a inserção nas fileiras da Força representava uma alternativa frequente, aos nacionais despossuídos, especialmente aos não brancos, de inserção no mundo do trabalho republicano. Entretanto, essa opção inaugurava uma nova circunstância. Embora não fossem mais estigmatizados sob a infâmia das “classes perigosas”, foram constantemente fiscalizados por seus comportamentos, abrindo a possibilidade de sofrerem com desmandos não inscritos em regulamento, afirmativa que se vale especialmente aos não brancos. O texto que se segue não pretende esgotar o tema, mas antes contribuir com os historiadores dedicados ao estudo da polícia e dos policiais, bem como das relações de trabalho e dos preconceitos raciais no pós-abolição.

This proposal seeks to contribute to the fruitful field of historiography on the police and police officers in Brazil, more specifically the São Paulo police, the object of our study. We have retraced the stories of the soldiers who served in the São Paulo Public Force in the decades immediately after Abolition and the Proclamation, based on the reading of internal files from 1897 to 1901, stored in the Public Archives of the State of São Paulo. Due to the internal nature of these judgments, it was possible to trace some of the objectives imposed on the policing desired by the officers, as well as the historical difficulties that had plagued the São Paulo police since the Empire. However, we also shed light on the organization that was intended to imbue the soldiers, with a detailed description of internal and external attributions, the circumstances of deployment, prohibitions on soldiers' conduct, among other aspects, which was only possible by reading the Public Force Regulations of 1896, which are also in the State Archives. These analyses made it possible to see how joining the ranks of the Force represented a frequent alternative for dispossessed nationals, especially non-white ones, to enter the world of republican work. However, this option inaugurated a new circumstance. Although they were no longer stigmatized under the infamy of the “dangerous classes”, they were constantly monitored for their behaviour, opening up the possibility of suffer from excesses that are not enshrined in regulations, a statement that applies especially to non-whites. The following text is not intended to exhaust the subject, but rather to contribute to historians dedicated to the study of the police and police officers, as well as labor relations and racial prejudices in the post-abolition period.