Novos insights nos mecanismos da ação protetora do selênio em relação à toxicidade do mercúrio em peixes da Amazônia: estudo envolvendo estratégias metaloproteômicas

Abstract

O mercúrio é um metal tóxico que se acumula ao longo da cadeia trófica, representando um risco para humanos e ecossistemas. O consumo de peixes contaminados é a principal fonte de exposição ao mercúrio (Hg) para as populações tradicionais da região Amazônica. Estudos mostram que a presença de selênio (Se) pode atenuar os efeitos deletérios do Hg no organismo humano e animal, no entanto, os mecanismos dessa ação protetora do Se ainda não foram completamente elucidados. Nesse contexto, a metalômica que tem como objetivo principal esclarecer o papel biológico de espécies metálicas e/ou metalóides que se ligam às biomoléculas e sua função no organismo poderá contribuir com novos insights para elucidar o efeito atenuante do Se em relação à toxicidade do Hg em peixes. Sendo assim, esta tese foi dividida em dois capítulos principais (Artigo 1 e 2). Artigo 1 – Reporta os resultados do estudo metalômico do Hg e Se no tecido hepático das espécies Psectrogaster amazonica (Branquinha) e Raphiodon vulpinus (Cachorra) do rio Madeira, Rondônia/Brasil utilizando a associação das técnicas de espectrometria de absorção atômica em forno de grafite (GFAAS) - eletroforese bidimensional (2D PAGE) - espectrometria de massas em sequência acoplada com cromatografia líquida (LC – MS/MS). Os resultados obtidos permitiram identificar cinco metal binding proteins (MBP) nos spots proteicos associadas ao Hg e Se no proteoma hepático de Psectrogaster amazonica e oito de Raphiodon vulpinus, indicando a possível formação de complexos Hg-Se na estrutura das MBP, e que a ligação com Se poderia mitigar os efeitos tóxicos do Hg. Análises de atividades das enzimas CAT (Catalase), SOD (Superóxido Dismutase), GPx (Glutationa Peroxidase), e de LPO (Lipoperoxidação de Lipídeos), demostraram não ocorrência de estresse oxidativo induzido pela concentração de Hg, o que corrobora com os dados metaloproteômicos. Artigo 2 – Reporta os resultados do estudo metalômico do Hg e Se no tecido muscular das espécies Psectrogaster amazonica (Branquinha) e Raphiodon vulpinus (Cachorra) do rio Madeira, Rondônia/Brasil utilizando a associação da técnica GFAAS com Shotgun – Espectrometria de massas em sequência acoplada com cromatografia líquida (Shotgun – LC – MS/MS). As determinações de Hg e Se por GFAAS no tecido muscular e frações proteicas permitiram o cálculo dos valores de Se para benefícios à saúde (Se HBVs). Os valores de Se HBVs foram superiores a cinco para Psectrogaster amazonica e superiores a dez para Raphiodon vulpinus, indicando que ambas as espécies de peixes possuem reservas de Se no tecido muscular necessárias para controlar os efeitos tóxicos do Hg. As análises da variação da abundância relativa de proteínas Shotgun – LC – MS/MS no proteoma muscular das duas espécies de peixes realizadas por comparação de indivíduos dos grupos com menores e maiores concentrações de Hg e Se (<CHg/CSe – controle; >CHg/CSe), indicaram que 15 e 20 proteínas foram expressas apenas nos grupos com >CHg/CSe (proteínas Uniques) de tecido muscular de Psectrogaster amazonica e Raphiodon vulpinus, respectivamente. Os resultados preliminares reportados na presente pesquisa fornecem novos insights para elucidar os mecanismos complexos do efeito protetor do Se em relação à toxicidade do Hg em peixes.

Mercury (Hg) is a toxic metal that accumulates throughout the food chain, posing risks to both humans and ecosystems. Consumption of contaminated fish represents the primary exposure route to mercury for traditional populations in the Amazon region. Studies indicate that the presence of selenium (Se) may mitigate the deleterious effects of Hg in both human and animal organisms; however, the mechanisms underlying this protective action remain incompletely understood. In this context, metalloproteomics, aimed at elucidating the biological role of metallic and/or metalloid species binding to biomolecules and their function in the organism, may provide new insights into the attenuating effect of Se on Hg toxicity in fish. Accordingly, this thesis is divided into two main chapters (Article 1 and 2). Article 1 – Reports the results of a metalloproteomic study of Hg and Se in the liver tissue of Psectrogaster amazonica (Branquinha) and Raphiodon vulpinus (Cachorra) from Madeira River, Rondônia/Brazil, employing a combination of techniques including graphite furnace atomic absorption spectrometry (GFAAS), two-dimensional gel electrophoresis (2D PAGE), and tandem mass spectrometry coupled with liquid chromatography (LC-MS/MS). The results identified in the protein spots five metal binding proteins (MBPs) associated with Hg and Se in the hepatic proteome of Psectrogaster amazonica and eight in Raphiodon vulpinus, suggesting the possible formation of Hg-Se complexes with the MBP structure and indicating that Se binding could mitigate the toxic effects of Hg. Enzyme activity analyses of CAT (Catalase), SOD (Superóxido Dismutase), GPx (Glutationa Peroxidase), and LPO (Lipoperoxidase) showed no occurrence of oxidative stress induced by Hg concentration, corroborating the metalloprotein data. Article 2 – Reports the results of a metalloproteomic study of Hg and Se in the muscle tissue of Psectrogaster amazonica (Branquinha) and Raphiodon vulpinus (Cachorra) from Madeira River, Rondônia/Brazil, using a combination of GFAAS and Shotgun – LC-MS/MS. Hg and Se determinations in muscle tissue and protein fractions were used in the calculation of Se values that are befenicial for health (Se HBVs). The Se HBV values were above five for Psectrogaster amazonica and above ten for Raphiodon vulpinus, indicating that both fish species possess Se reserves in muscle tissue necessary to control the toxic effects of Hg. Analyses of the relative abundance variation of Shotgun – LC-MS/MS proteins in the muscle proteome of both fish species, comparing individuals from groups with lower and higher concentrations of Hg and Se (<CHg/CSe – control; >CHg/CSe), indicated that 15 and 20 proteins were expressed only in groups with >CHg/CSe (Unique proteins) in the muscle tissue of Psectrogaster amazonica and Raphiodon vulpinus, respectively. The preliminary results reported in this research provide new insights into elucidating the complex mechanisms of the protective effect of Se against Hg toxicity in fish.